O Requinte da Música
Luís Gonçalves
No requinte da generosa sombra de uma mangueira faceira, no regaço de uma rede preguiçosa passo adiante a treler com meus botões as doces notas que emana do meu peito. Encharcado numa moção de aplauso vejo gotejar em minha frente o meu saudoso passado.
O ranger de uma viola lavrada no açoite de um verso franchado de dor rebenta na feição do caboclo um sabor de terra banhada pelas lágrimas da fé. De frente para o pór-do-sol se ergue imponente um altar para as orações.
Chega, chega meus irmãos! E dali por diante chega toda a irmandade porque vamos falar da música da nossa terra.
Por detrás daquela serra, aonde passa boi e passa boiada, também, passa um violeiro com sua viola a tira colo.
Em cima daquele rio, de lombo arrepiado, também, passa uma chalana carregada de paixão. Ali vai correnteza abaixo mais um seresteiro do sertão.
Quando a chuva de molhar bobo se desmancha no vazio dessa ilusão se misturam na dança do povo humilde que assiste o rio passar.
Nem que eu tenha de viver o tempo inteiro a sonhar, quero guardar na lembrança o canto bom do meu lugar.
O canto do rio que passa na varanda da cozinha, saindo da porta do meio ao lado da camarinha dá comichão de saudade e vontade de dançar.
E lá se vai a galope curto de emoção a doce música da minha terra querida.