João Pedro nunca fora muito bom no futebol. Era daqueles que nos jogos da turma era insistentemente convocado para jogar no gol, o que à s vezes aceitava, sob veementes protestos. Noutros, se recusava terminantemente, então os amigos lhe arrumavam um lugar no time. Na zaga, naturalmente, que é onde jogam os pernas-de-pau que conseguem sobreviver no futebol. Ele nem mesmo era aquele zagueiro típico, alto, forte e tosco. Era apenas tosco, o infeliz.
Já Mariana jogava muito. Era uma atacante veloz e habilidosa, além de bonita, do que resulta que a rapaziada adorava convidá-la para jogar. Nos meus tempos de garoto chamávamos aquele jogo em meia-linha, onde jogam apenas dois jogadores contra si, com uma só goleira, marcada por chinelos, pedras ou qualquer outra coisa que se prestasse a fazer à s vezes das imaginárias traves de "jogar goleirinha".
João Pedro vivia querendo jogar goleirinha com Mariana, menos pelo prazer do jogo, mais pela companhia e com o indisfarsável objetivo de fazer gols. Na verdade, queria uma goleada, gols e golaços sem fim.
Lá pelas tantas ela resolveu aceitar a proposta e os dois passaram a jogar juntos. O problema é que João Pedro era ruim de cintura, de modo que embora partisse para o gol com muita vontade, sempre perdia a bola no caminho, seja porque Mariana, com classe e elegància, lhe tirasse a pelota, seja porque não conseguia controlá-la direito. Já quando a bola estava com ela a história era outra, coitada dele, era só humilhação, dribla para lá, dribla para cá, drible da vaca, elástico, meia-lua, todo o repertório. Ela nem queria fazer gols, se divertia mesmo era em tirar uma onda com ele, chegava em cima da linha do gol, fazia embaixadas, volta para trás, driblava, voltava de novo ...
Os jogos foram se repetindo, sem gols. João Pedro louco para fazer pelo menos um golzinho, até porque, quando a retranca é forte, sempre dizem os boleiros, depois que entrar a primeira entra um balaio. Enquanto isso, ela só se divertindo com a ruindade dele e nada de botar a bola para dentro.
Um belo dia João Pedro cansou daquele negócio, futebol é bola na rede, pensou. Decidiu que não jogaria mais com a Mariana e ponto. Ia jogar noutra freguesia. Mariana, sem saber da grave decisão, liga para ele:
- E daí, tudo bem? Vai ter jogo hoje?
- Não, eu sou um brócolis, responde ele.
- Hãããã??
- Sou um brócolis, não sou carne-de-pescoço.
- Pirou? Bebeu? Qual é, meu?
- Tu não sabes cozinhar não?
- Hum ...médio ...
- Olha só, mulher, carne-de-pescoço é carne dura. Para ficar boa, a gente tem que cozinhá-la bem, por bastante tempo, se possível na panela de pressão que é para carne ficar macia e comível, sacou?
- Tá e daí?
- E daí que no brócolis a gente só dá uma fervurinha rápida e ele já está pronto. Se cozinhar muito ele vai ficar rígido e borrachento, além do gosto que não será lá essas coisas.
- Muiiiito obrigada pela aula de culinária, mas o que o nosso jogo tem a ver com isso?
- Ai, meu deus! É que eu sou um brócolis e já fui cozido demais.
- Cara, piraste de vez. Eu nem gosto de brócolis. Meu negócio é filé com fritas.
João Pedro desligou. Têm coisas que as mulheres não entendem, pensou. Mas estava errado, elas entendem sim, só se fazem de tansas. Nunca mais rolou um jogo entre eles. Dizem que o infeliz brócolis, a esta altura, já estaria quase podre por falta de quem queira consumi-lo. Já a Mariana, ah!, essa continua jogando um bolão ...