Conheci um ancião diferente. Ele me dizia: " Nicola, não esquenta não, vou morrer mas vou levar uns três ou quatro comigo." Sábias palavras. Uma maneira diferente de pensar a velhice e a morte. É quase uma concepção revolucionária, melhor dizendo, terrorista da morte. Uma resistência primal e vingativa. O último gesto para purgar o mundo de alguns vermes. Se percebemos as condições dos idosos, o isolamento em que vivem, o nojo que provocam nos normais, o preconceito, então, entendemos as palavras do velho.
Dois escritores vasculharam os mistérios da velhice: Dino Buzatti e Albert Camus. Ambos perceberam as angústias da idade. A solidão, a dor, o afastamento e a indiferença social. Buzatti, em tom cético, denuncia a onipotência juvenil dos anos 50/60. No livro intitulado "Naquele exato momento", Buzatti mostra a difícil ultrapassagem da vergonhosa barreira da idade, a empáfia jovem e o desprezo que vitima o idoso. Seus contos oscilam entre o pessimismo e a busca de uma sinistra magia que parece mover a vida.
Albert Camus, o repatriado, mergulhou no estranhamento . Seu livro "O Avesso e o Direito" narra a história de três velhos: uma mulher que é esquecida na escuridão enquanto a família vai ao cinema; um homem que tenta conversar com jovens que não lhe dão a mínima e uma mulher que cria nove filhos com mão de ferro e morre agonizante. Em comum, a avançada idade dos personagens, o sentimento do nada, um racionalismo tétrico e nada belo. " De repente, ele descobre que amanhã será igual, e depois de amanhã, e todos os outros dias. E essa irremediável descoberta o esmaga."
Palavras nada reconfortantes sobre mais este tabu: ser velho. Não sou tão pessimista quanto os dois escritores acima. Nem tão pouco um otimista falastrão. Prefiro agir como o homem que citei no começo. Se sei que vou morrer, posso melhorar esta merda de mundo levando alguns cretinos comigo. Sublime e último gesto de vingança contra os que me oprimiram.