Na rua, sob o sol baço da invernada e do peso do céu aberto e claro, eu caminho em meio à multidão, massa amorfa de braços semoventes e sobrancelhas franzidas em cenhos contritos.
Somos a angústia .
Aqueço as mãos em gesto inútil, vão. Sonho com o avesso da estação, sol a pino num meio-dia perdido no tempo e vem sua imagem em luz fracionada; vem você, minha bela amada.
Vem você num meio dia de um tempo estanque, num instante sereno de um dia de Outubro onde ainda sonhava com suas costas luminosas. Vem você e me assalta a saudade de um gosto de sal e limão.
Estremeço.
No meio da multidão salta o olhar do Tigre solto, todos correm, é meio-dia de um dia qualquer no pior da estação, qualquer um pode ser qualquer coisa e você já não faz parte do cenário, eu salto a ponto de escapar das garras do felídeo-sou bom nisto.
Na rua, eu relembro seu passo e andar de felina ao fitar o tigre em mansa procura, os olhos de mel puro, a boca de marfim num convite sanguíneo, tenso e seco. Era sua boca, minha amada, era a sua.
Boca.
Olho o relógio, a multidão avança o sinal, os carros passam zunindo, o gelo corta nossos pulsos, é suicídio coletivo e as sirenes agora pausam nosso movimento, as buzinas ensurdecem os poucos que ousam levantar as cabeças; Me vem você de novo, calma, olhos enxutos, saindo do mar envolta na nuvem de gotas das ondas de Outubro.