Sombras despejam seu peso nas pálpebras do inseto noturno que se agita em sua jornada incompreensível, num traçado ritmado e tenso como as batidas de seu pequeno coração.
Estamos no limiar da Escuridão, imaginando as dores dos amores que partem, nutrindo as raízes de nossas flores ou chorando perdas que não se reparam.
Curvamos nossas colunas vertebrais ao peso de nossa necessária sobrevivência mas o pouco que conquistamos poreja em nossa pele, vermelha de tanto esforço.
O inseto continua sua imutável trilha, escrupulosamente traçada rumo ao canto da mesa que se esvai ao fundo de uma luz baça, que é nossa luz.
As sombras que perseguem o inseto são as nossas mesmas, o rumo que traçamos imutável sofre curvaturas, o frio intenso escarnece de nossos sonhos, mas é nossa lida. Nossos olhos fixam o mágico instante, o exato momento da transformação de nossas asas em vóo, nossa vida em sonho, nossos passos em espera.
É nossa vida que vai ao fundo do sonho do Inseto, pego em palpos de aranha, é nosso triste recomeço que pensamos ao fim, na grande batalha sobre a Terra, mas zumbe o inseto irremovível, com todo seu brilho e aparato: voa o estranho besouro sobre o Abismo de fato.