Alegria de pobre dura pouco. Eu pensei em comprar para ela um anel de ouro vermelho, que combinaria com seus dedos lindos e seu cabelo acobreado, liguei ao banco e o saldo nem chegava perto de um anel de latão, desses que se compra em loja de quinquilharia, mal que daria para enganar um coió, quanto mais minha amada, qual!
Dura pouco esta condição, a de falso rico, toda surpresa que tenho é de no fim do mês cortarem a luz ou o telefone: Vou pedir emprestado ao agiota que nunca me deixa em paz, sei que o que lhe pago me traz um inferno em vida, mas, daí, sem luz para o banho ou o telefone para ligar, como é que a encontro linda e perfumada?
Não dá nem para o cheiro, que diria o meu, camarada, alegria de pobre é que nem uma lufada de vento que vem e leva tudo o que ele tem, só não leva sua pobreza embora, quá quá quá. A única certeza que fica é que se tem fome e que se não se fizer algo, nem miudeza entra no estómago, então, como é que faço para levar minha amada num parque para um sorvete?
Derrete a paciência de minha aveludada amante, minha companheira de cabelos avermelhados como o fogo e sardas que povoam uma pele alvíssima, assim descrevo aquela que salta do ónibus e chama toda a moçada para um olhar mais aprofundado, que ela tira a concentração até de padre acostumado com estas coisas, pobre de mim!
Ela vem e me olha assim com um jeito que desmonta as juntas de qualquer sovina, a diferença é que eu não guardo o que não existe, então, só falta dar uma de Carlitos e comer a bota que insiste em usar o meu pé. Lá está, em plena forma, a moça que afogueia as faces quando me vê e abre um sorriso que mata o que está me matando, assim eu vou ao desespero, com que roupa eu não sei, mas vou ao seu encontro e ela fecha os braços em torno de meu pescoço e me fala, entre os dentes alvíssimos que combinam com os cachos de seus cabelos de anjo:
--Não se preocupe não, amor. Para tudo tem um jeito nesta vida!