Sou a eternidade de um momento, a minha alma espreita através da minha janela afortunada e penso-te neste fim de tarde, em que o Outono aspira os cheiros da humidade na terra coberta de folhagens secas que vagueiam sem destino. Aquieto-me neste silêncio enamorado, e verdejante como as ervas tenras, despojo-me da aridez de uma alma acorrentada para um novo recomeçar, absorvendo o ar sustentado pelos sons primaveris.
Anuncia-se a minha sede de um amor que brota da terra quente, e lentamente se vai transformando na esperança de um florir singelo nas madrugadas, que exalam as essências doces de um remanescente leitoso. O teu olhar inspira-me a serenidade de um amor sem pressas, o teu corpo encontra-se já colado ao meu, sem a dureza que sombreia os cumes mais desejáveis. O sol penetra neste fim de tarde, a maciez de um véu transparente e esconde-se na linha do horizonte. Este céu que sobrevoa a praia, é um vitral semi-transparente, de onde se podem ver bandos de gaivotas que iniciam a sua caminhada, oscilando sobre estes corpos que se querem sós.
Extinguem-se os movimentos e os desejos na sua pequenez, e surge uma nova dimensão do ser nos momentos em que nos encontramos no silêncio da alma. Olho ao longe o sol que se despe, deixando resquícios das cores que representam a sua altivez.O meu olhar foca-se agora nas ondas que dançam ao sabor de um vento ameno com cheiro a maresia, e esta agitação amplia-se no ar, na construção deliberada de uma estrada que se perde no longínquo. Somos num momento que se estende no infinito, e os corpos que ficaram, anulam-se num céu serpenteado. Trespassamos as marés que se encontram para além destes muros esbranquiçados.Indiferentes, as gaivotas deixam no colorido azul, auréolas e sinfonias, num momento em que o amor segrega agora uma energia quente, que abalroa as ondas e se expande no mar.