Até onde se podia ver, era o mar verde que se descortinava, com os recifes de coral delimitando uma lagoa cheia de peixes dourados, azuis, amarelos e fugidios. O mar em sua amplidão desafogava seu poder nas rochas para além dos recifes de coral, na zona de arrebentação. Ele fumava um cigarro, lentamente, sorvendo o sabor da nicotina sem prazer algum - prometera a si mesmo parar de fumar assim que pudesse. Ele recordava os olhos dela
De um verde profundo como as águas que banhavam os corais dos recifes, misturados ao azul dos peixes que ornavam aquele aquário natural, olhos profundos insondáveis à s vezes, que o interrogavam deveras e ele se lembrava das questões profundas que se levantavam nos momentos em que podia fixá-los
Agora era tarde, anunciava o bramido das ondas, agora era tarde para ele tentar alguma coisa. Olhou ao longe o farol que ficava no promontório, a eterna làmpada a iluminar fugazmente o litoral recortado pelas rochas e a branca espuma das ondas
Como pudera deixá-la ir? Como pudera ser tão insensível?
Anêmonas, polvos, lulas, mariscos, peixes minúsculos, um ouriço do mar, vários pássaros de maresia, gaivotas, algumas garças, pardais em mergulhos na areia e andorinhas em revoada, em meio ao vento cálido que anunciava uma noite quente e calma
Mais uma noite sem ela, onde ele revolveria os lençóis, onde ele se perguntaria onde ela andaria agora que era livre, mais uma noite em que ligaria o rádio e ouviria as músicas de sempre, mais uma noite sem o cheiro dela penetrando os poros da casa, mais uma noite sem ela
O que ele faria agora? Prosseguiria sua vida, como ela, que decidira se livrar daquele marasmo, daquela pasmaceira? Ou pegaria seu carro, sairia dali para nunca mais ter que ver ou ouvir falar daquela cidade litorànea?
Voltou os olhos à praia e viu um vulto. Largou o cigarro quando percebeu que a espera terminara.