"Quem casa, quer casa". Esta era uma expressão muito usada pelo avó do garoto Zezinho quando queria atribuir responsabilidades a alguns cónjuges, em especial aos filhos dele, sobretudo nos momentos em que estes reclamavam das agruras e efetivas confusões criadas no àmbito familiar, envolvendo a rotina, a responsabilidade e a dinàmica própria da vida de um casal em razão das peculiaridades atinentes à instituição casamento.
A expressão em questão também serviu para dar nome a uma comédia escrita por Martins Pena, em meados do Século XIX, cujo texto em forma de drama faz alusão, de forma sutil e bastante divertida, à s polêmicas e confusões vivenciadas no seio de uma família, principalmente pela falta de moradia dos filhos, que são amenizadas após ter uma casa para morar. O enredo dramático dessa comédia mostra-nos, nas entrelinhas, que é preciso muita maturidade e experiência para quem pretende constituir uma família e uma vez constituída é necessário que cada um dos envolvidos saiba assumir todas as responsabilidades inerentes à vida a dois, cumprindo as suas etapas de cabo a rabo.
Voltando a falar do avó do garoto Zezinho, justamente daqueles momentos de brigas e discussões que ele travava com a D.ª Mariana, a avó do garoto, visando com isso "consertar os elos quebrados" durante os longos anos de debates da relação, ele sempre fazia questão de dizer em alto e bom som, que se casamento fosse um bom negócio não necessitaria de testemunhas e nem de ser definido antecipadamente o regime de bens entre os casais...
Segundo Zezinho, que naquela época era apenas uma criança, ele ficava intrigado vivendo naquele ambiente de rusga existente entre os avós dele e que naquela sua fase pueril não tinha como entender as razões dos altos e baixos da rotina familiar de uma vida a dois.
Deixando de lado as impressões que o avó do garoto Zezinho tinha acerca do casamento, principalmente aquelas voltadas para a necessidade de se ter responsabilidades, dentro e fora de casa, o casamento em si mesmo, enquanto instituição não mudou de ritual: continua, até hoje, sendo o ato solene de união entre duas pessoas de sexos diferentes, capazes e habilitadas, com legitimação religiosa e/ou civil. Tanto naquela época, quanto agora, a cerimónia em que é celebrada essa união também leva o nome de matrimónio, núpcias, esponsais, bodas e sempre necessitou de testemunhas.
Por se tratar de um tema muito complexo e de origem muito antiga, eu resolvi sair por aí escarafunchando os anais da história antiga e contemporànea que tratam desse assunto. Descobri que alguns historiadores e/ou estudiosos do assunto afirmam, de pés juntos, que a cerimónia de casamento nasceu na Roma antiga e que todo esse ritual da noiva se vestir especialmente para a cerimónia, também veio de lá e que acabou virando uma tradição. Juram que foi em Roma que aconteceram as primeiras uniões de direito e a liberdade da mulher poder casar por sua livre vontade. Asseveram, ainda, que o papel do casamento como eixo da estabilidade social, tanto antes, quanto agora, tem sido mais importante do que o amor entre os casais, e que as funções do casamento eram voltadas, basicamente, para a criação da prole, para a efetiva transmissão de valores e servia, principalmente, para organizar e administrar as tarefas inerentes à formação da célula familiar.
Eu sei que nós poderíamos ficar aqui tratando desse assunto de uma forma bem mais detalhada, falando das fases que envolvem o casamento na sua plenitude, pormenorizando o antes, o durante e o depois, por mais algumas laudas.
Decerto, começaríamos falando do namoro, que é aquela fase da conquista, onde quase tudo é novidade; do noivado, que é a fase onde um anel (de ouro, de prata ou de latão), acaba simbolizando um compromisso mais acentuado com o futuro do casal; ou da lua-de-mel, que é aquele momento inesquecível que todo o casal torce para que ele não seja transformado no futuro em lua-de-fel. Ou falaríamos da cerimónia matrimonial, propriamente dita, que se constitui num acontecimento expressivo, numa passagem espiritual muito forte, que além do significado religioso, ela formaliza o amor e o respeito mútuos entre duas pessoas, mas deixaremos por conta dos nubentes, estes certamente, saberão o que fazer após responder, um para o outro, na hora daquela clássica pergunta:
- É de livre e espontànea vontade que o fazeis?
Já no tocante ao ritual que envolve todas essas fases, eu acho que o garoto Zezinho não sabe dizer se no tempo do avó dele era diferente ou não desse tempo que ora vivemos, até porque ele ainda é muito jovem e não deve estar pensando em desposar alguma garota... Mas esse não é o propósito inicial da nossa conversa.
Já foi dito pelo avó do Zezinho e também por muitas pessoas, ao longo dos tempos, que "quem casa quer casa", ou seja, que o casal que assume o compromisso de viver uma vida em comum, tem de ter muita responsabilidade. Todavia, temos visto que o tempo passa e com ele tem passado muitas vidas e sempre foi desse jeito: o senso de responsabilidade, as polêmicas e confusões envolvendo o dia-a-dia dos casais nem sempre mudam de figura, apenas de endereço...
Vemos, assim, que se no passado um jovem casal que começava uma vida matrimonial podia contar com o apoio de algumas figuras de suas famílias, auxiliando-o naqueles momentos mais cruciais, nos dias de hoje não é bem assim; a maioria dos casais está sendo formada à revelia das famílias, muitos são identificados por interesses comuns, frequência a lugares e muita atração física e em razão disso muitos têm encontrado dificuldade para levar adiante seus projetos familiares, sem contar que a maioria trabalha fora e a criação dos filhos tem se tornado cada vez mais complexa.
Trocando-se por miúdos tudo isso que já dissemos antes, é fácil chegarmos à conclusão que um casamento, pouco importando seu regime de bens, e por mais romàntico e atrativo que ele seja sempre irá necessitar, no mínimo, de uma base financeira muito sólida para sua continuidade.
Destarte, quem casa, quer casa e quem quiser continuar por muito tempo dentro de casa, por certo, irá precisar de algo mais...