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cronicas-->Cheiro de Chuva -- 30/11/2010 - 18:28 (flavio gimenez) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Em dias de chuva, o insustentável me apóia. Torno-me outro, vejo caírem as gotas grossas, feito poças flutuantes ou promessas sadias de uma revitalização milagrosa. Ela vem na forma de uma brisa que engrossa, sacode os galhos das árvores todas e cada uma delas carrega todas as promessas de uma estação. Na índia, as monções são recebidas com alvoroço pela multidão colorida; em vários países, a água sagrada corre pelos sulcos abertos nas plantações e se infiltra na terra, engolida aos borbotões. Toda uma seca desesperadora se esvai com a primeira ventania que pressagia o segredo da vida...

Quando chove ou vai chover, algo como uma espécie de espírito da leveza se apossa de mim, fazendo exatamente daquele momento que sucede ao sol arrasador e precede a tempestade mais sombria um tempo especial que percorro com uma lànguida satisfação. Quem me olhar pode notar que eu sorvo o ar que se torna rarefeito, nebuloso; que eu estendo as mãos para a promessa de limpeza que se aproxima, a remissão dos meus pecadilhos diários e de meus pensamentos mais sórdidos. Pode haver um ou outro que estranhe, no entanto todos estão tão empenhados em fugir da chuva ou se abrigar dela ou simplesmente olhar o céu, o relógio e exclamar:"Bem na hora do rush!", que ninguém me toma por louco, bêbado ou coisa que o valha.

Na verdade, todos estão absolutamente preocupados com milhares de questões que não vêm ao caso, não para você em especial, principalmente numa hora em que se tolda o humor do mundo e as nuvens negras formam caratonhas sinistras que se esvaem e se iluminam em lampejos de raios distantes, próximos, repetidos, cavos; nenhuma questão se torna tão ou mais importante que a da sobrevivência, num eco de nossas origens ancestrais. Procura-se uma caverna próxima, um buraco que nos esconda de nossos mais primevos medos.

Corridas, pés que perdem sapatos, gritinhos de colegiais assustadiças, moços que dão risada dos tropeções, um caos que precede a desordem plúmbea, o ruído dos ventos nas copas das poucas árvores, o zumbido dos redemoinhos nos altos dos prédios que se escondem rapidamente. Tudo se registra em minha retina e eu sinto como um halo de energia me envolvendo. Tiro meus créditos da tempestade, ganho meus minutos no interregno. Um mundo à parte em que ninguém se preocupa com ninguém, daí a sutileza do ar apesar da pestilência eventual dos miasmas.

--Cheiro de chuva!

Aí desce a cortina d`água, estrepitosa, caudalosa. Enchem-se as calhas entupidas, catadupas de barro e lama vindos de terrenos descuidados, montanhas de lixo nas bocas de lobo...É a vez dos desavisados apanhados nas correntezas, dos carros que flutuam em poças inacreditáveis. Nestas horas, apenas o fato de sentir a brisa nos olhos me contagia do poder infinito da Natureza. Somos minúsculos, rastejamos num planeta lindo e mal nos damos conta, quando a tempestade chega arrastando casas, carros, saias, sapatos, vivendas, morros...Daí vem o silêncio. Todos o respeitam.

Ninguém se engane, quando se pensa que o que não se escuta pode ser o aviso que faltava.

--Cheiro de chuva!

Quando criança uma tempestade torrencial fez desabar um muro de um edifício, perto de nossa casa. Tivemos tempo de ouvir os tijolos sendo expulsos de sua morada por uma pressão de águas espessas e brancas, numa catarata que jamais se formara ali. Temi pela nossa casa, tive medo de perder meus amigos, minhas pequenas coisas. O mundo da infància se compõe de pequenas coisas, pequenos objetos. Nosso quarto ficava próximo da cachoeira fora de hora. Lembro de minha mãe me consolando e, num momento de extrema ameaça, nos estreitando a todos num abraço que mitigava nosso pavor. Ninguém se engane, no local onde caiu a chuva, das cataratas que se formaram, nasceu a flor da primavera que nos cercava.
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