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cronicas-->CONVERSA AO PÉ DO OUVIDO (I) -- 06/12/2010 - 17:22 (GERMANO CORREIA DA SILVA) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


CONVERSA AO PÉ DO OUVIDO (I)
(Por Germano Correia da Silva)

- Lembro-me como se tudo tivesse acontecido algumas horas atrás - suspirou o camponês Domingos, sentado numa cadeira de balanço no alpendre de sua casa, apoiando uma das mãos no ombro do seu primogênito, o garoto Manoel Messias, de quatorze anos, que estava sentado ao seu lado, numa outra cadeira. E assim o varão se expressou:

- Sabe meu filho, já faz bastante tempo, quando eu ainda era uma criança, todos os anos eu e os meus irmãos, nos reuníamos algumas vezes no decorrer do ano, para fazermos uma "vaquinha" com o objetivo de comprarmos presentes para a mamãe e para o papai. Era um "deus-nos-acuda", pois naquela época nenhum de nós tinha sequer um emprego fixo, mas fazíamos questão de homenageá-los de forma brilhante no dia dedicado a todas as mães e a todos os pais, respectivamente, bem como nas datas dos aniversários de cada um deles.

Procurávamos agir sempre da mesma forma, dando-lhes alguns presentes e, tanto numa data quanto na outra, nos reuníamos com alguns dias de antecedência, tentando, assim, surpreendê-los e até com o intuito de dar mais ênfase à comemoração que pretendíamos fazer. Na maioria das vezes, perguntávamos-lhes de forma sutil e carinhosa:

- Meu velho e minha velha, o que vocês gostariam de ganhar de presente?

As respostas eram sempre as mesmas:

- Nada, meus filhos, a presença de todos vocês é bem mais importante que qualquer presente.

O tempo foi passando no seu compasso natural e nós, aos poucos, fomos crescendo e observando que os nossos pais agiam com aquela mesma serenidade, humildade e bondade de espírito, sempre de peito e coração abertos e cheios de amor para dar, além de serem pessoas que detinham uma sabedoria popular acima de qualquer suspeita.

Ali, naquele nosso mundo de sonhos, também observávamos que alguns garotos da nossa vizinhança faziam tudo da mesma forma que nós. Hoje, eu ainda acho que aqueles garotos nos imitavam, pois eles estavam quase sempre a comprar presentes semelhantes àqueles que nós comprávamos e, por incrível que ainda possa parecer, cantavam as mesmas músicas que nós cantávamos durante as nossas festividades ou comemorações.

Durante muito tempo eu cheguei a acreditar que festas do dia das mães, do dia dos pais e de vilarejos e comunidades em geral eram todas iguais e que presentes de mães e de pais eram muito parecidos uns com os outros: flores, perfumes, camisas e caixas de bombons ou de chocolate, sempre.

O tempo, essa dádiva da natureza, sempre implacável, continuou sua trajetória e nós, os "filhinhos da mamãe e do papai" (era dessa forma que eles nos tratavam), dávamos a entender que nunca seríamos adultos, ou melhor, nunca iríamos crescer. Estávamos sempre carecendo da atenção, do carinho e da proteção deles.

A comemoração dos aniversários deles e as comemorações rotineiras alusivas ao dia das mães e ao dia dos pais continuaram sendo realizadas todos os anos, e nós estávamos fazendo a mesma pergunta clássica:

- Meu velho e minha velha, o que vocês gostariam de ganhar de presente?

As respostas deles, na maioria das vezes, eram as mesmas:

- Nada, meus filhos, vocês não precisam comprar nenhum presente para nós, a presença de todos vocês é muito mais importante que qualquer presente.

- Muitos anos se passaram - continuou o camponês Domingos - e nós, já crescidos, passamos a proceder da mesma forma que fazíamos quando éramos crianças: reuníamo-nos, religiosamente, eu e os meus irmãos, todos os anos para comprarmos o presente da mamãe e do papai.

De festejos e mais festejos, fomos levando a vida e, evidentemente, não percebemos que a mamãe e o papai envelheceram, ou melhor, não nos demos conta disso.

De uma forma natural e até certo ponto egoísta, também não nos apercebemos que deveríamos retribuir, ou seja, "pagar na mesma moeda", a atenção, o carinho e a proteção recebidos deles durante nossa infância, adolescência e juventude. E ali, no mesmo pacote que acondicionávamos aqueles presentes (bens materiais) ocasionais, deveríamos incluir um pouco mais do nosso amor, da nossa compreensão, do nosso respeito aos seus cabelos brancos e à sua voz e mãos trêmulas, sempre a orar por nós.

Assim, depois de tanto tempo, acendendo e apagando velas nos aniversários deles, bem como subindo e descendo ruas e avenidas à procura de uma novidade para presenteá-los nessa e noutras datas, é que fomos entender a razão de eles estarem a nos dizer que não precisavam de presentes (bens materiais) e que o mais importante era a nossa presença.

Algumas vezes, eu me pus a pensar a respeito da reação dos meus pais naqueles momentos em que prendíamos a atenção deles com o intuito de homenageá-los. E finalmente acabei descobrindo que aquela "presença" que eles nos cobravam era um bem mais valioso que aquela presença física, de todos nós, nos dias comemorativos dos aniversários deles e no dia dedicado a todas as mães e a todos os pais, conforme o costume social moderno.

- Meu querido filho, é interessante a forma como a máquina que move o tempo age em relação ao homem - confidenciou o camponês Domingos para o filho dele com um ar de preocupação:

- Nascemos, crescemos, procuramos nos instruir, traçamos os nossos caminhos e até achamos que aprendemos algumas das lições que a vida nos proporciona no decorrer de nossa trajetória de sonhos, mas não as apreendemos de forma plena.

- Por mais conhecimento que detenhamos, de vez em quando estamos precisando de um consultor ou de um ombro amigo para nos auxiliar. A voz da experiência nos recomenda que, nessas horas, por mais árduo que seja o caminho a ser seguido ou a decisão que necessitarmos tomar, devemos nos aconselhar com alguém experiente de nossa confiança. Em geral, as figuras maternas e paternas são as pessoas que deverão ser consultadas. No nosso caso, em particular, a mamãe e o papai sempre estiveram de peito e coração abertos e cheios de amor para dar e, diga-se de passagem, nunca quiseram nada em troca.

- Meu filho, as lições que os pais de cada um de nós vierem a ministrar no decorrer da existência deles, visando à criação e educação dos filhos, por certo servirão como um norteador básico nos momentos em que necessitarmos tomar alguma decisão.

Por acreditar que esse é o caminho certo a ser seguido, eu gostaria muito que você procurasse ouvir um pouco mais as orientações de sua mãe, uma vez que é ela que está mais presente na sua vida e de seus irmãos.

O que estou lhe pedindo não é nenhuma coisa absurda. A nossa Bíblia Sagrada, em o Livro de Provérbios, Capítulo I, versículos 8 e 9, nos ensina, textualmente, a esse respeito.

Ali, encontramos, nas palavras de Salomão, filho de Davi, rei de Israel, uma orientação básica familiar que deveria ser seguida por todos os pais que desejarem progresso no desenvolvimento e criação de seus filhos. Portanto, eu gostaria que você prestasse bem atenção na sabedoria destas palavras:

- "Filho meu, ouve a instrução de teu pai, e não deixes o ensinamento de tua mãe (versículo 8); Porque (eles) serão como diadema gracioso em tua cabeça, e colares ao teu pescoço" (versículo 9).

Aquele pai prosseguiu, noite adentro, com o espírito envolto por uma forte emoção, disposto a orientar bem o seu filho a respeito das regras básicas do bom viver...


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