Os três foram visitar a prima Naná (cujo nome era Marta, sem relação, eu acho...). Foram lá para a Baixada Fluminense. Município de Mesquita. Precisavam cumprir promessa antiga de um almoço. Eram avó, filha e neto.
Papo-furado, deram duas da tarde e nada da comida. Naná virou-se para o maridão e disse com bastante tranquilidade:
- Cardoso, pode ir buscar as galinhas para o almoço. Num instante boto as penosas pra assar. O resto já está praticamente pronto.
Dona Rosa, a avó, salvou-se da fome com uma penca de bananas vislumbrada sobre a mesa da copa, enquanto esperava. E como esperou!
Teresa, preocupada com o filho, abusando da pouca intimidade, mas resoluta, perguntou se não havia biscoitos.
A dona da casa, na inocência, sem constrangimento, oferecia suco de maracujá e continuava desenvolta na conversa. Afinal, há anos não se encontravam para uma boa prosa. A última vez foi nos anos 1980, em uma festa de Cosme e Damião. Naná era conhecida por festas grandiosas em homenagem aos santos meninos. A casa ficava enfeitada a valer e as guloseimas eram encomendadas em casa de bufê. Meninos do orfanato eram convidados, assim como amigos e parentes.
Por volta das quatro horas, as pessoas foram chamadas para almoçar. Finalmente puderam comer. A sobremesa ficou por conta das bananas restantes e foi passado um cafezinho para arrematar.
Daí, não demorou a despedida.
Dentro do carro, já voltando, o desabafo era único. A fome persistia. A comida não estava boa. As galinhas mais cruas que assadas. As batatas coradas exageradas na pimenta e no cominho não permitiam ser degustadas e o arroz parboilizado não estava ao gosto deles, que não tinham costume do tal tipo.
Dinho, de Osvaldinho, então, quase implorando para as duas, pediu que fossem comer de verdade, em um restaurante de presidente, segundo o seu jeito de se expressar, de menino aos oito anos, para bem exemplificar do que estava necessitado no momento.
Cruzaram a cidade indo chegar à zona sul do Rio, no Leme.
A churrascaria escolhida tinha fama de excelente. Ao chegarem, Teresa, precavida, logo avisou ao garçom que o menino não deveria contar como uma pessoa, devido à idade tenra e ao reduzido apetite. Pensava na economia, na certa!
Sentaram-se ao lado da grande janela de vidro, com direito à vista para o mar e deram início, num pestanejar, a saborear o bom e o melhor.
Encontraram entradas surpreendentes e as carnes pra lá de nobres, sem falar nos pratos frios e quentes, cuidadosamente expostos nos balcões para dar prazer e despertar o interesse.
Tamanha a gula demonstrada e tantos os pratos aceitos, que o dono do estabelecimento, conhecida figura da noite carioca pelo empreendedorismo e longos cabelos louros, resolveu falar com o trio. De perto, notou a fúria gastronómica do pequeno, que contradizia o aviso da mãe, e achando graça no que via passou a privilegiar aquela mesa. De quando em vez, ele voltava para saber se tudo andava bem. Agradou-se com o voraz apetite de Dinho.
Findo o banquete, o carrinho de tortas e doces foi trazido, proporcionando uma verdadeira exibição das maravilhas. Ficou claro que os três continuavam na "passeata" contra a fome, e não se negaram a pedir a parte doce da festa.
Escolhidas as sobremesas, receberam a bela notícia de que a do menino era por conta da casa. Maravilha!
Na hora da despedida, o homem da cabeleira fez-se presente novamente para anunciar que a despesa do pirralho não seria cobrada nas vezes que lá fossem. Tudo terminou da melhor forma, ainda mais com a última cortesia.
Saciados enfim, regressaram à casa avaliando que o dia tinha sido ótimo, embora com altos e baixos. Um pouco cansativo pelo deslocamento de ida e volta da visita, angustiante pelo atraso e depois pelo desagradável cardápio oferecido pelos parentes, porém plenamente exitoso no que tocou à churrascaria.
Sabe o que ficou prometido entre eles? Respondo: voltarem sempre.
Sabe o que fizeram em consequência? Respondo, também: cumpriram o prometido, e como cumpriram. Viraram assíduos do lugar!
Conto mais para você: as línguas ferinas revelaram, "en passant", que recheadas quentinhas vinham do Leme - todas presenteadas. Mel na chupeta! Gente esperta!
Dizem os acusados, talvez por desculpa, em defesa própria, que o motivo do comparecimento era somente a "divina" comida. As mesmas línguas duvidam, acrescentando que, além das iguarias, havia o benefício financeiro, com base na benesse concedida, um tanto mais atraente, não é? Vai saber...