O Saber do silêncio: a plataforma para o infinito, os olhos voltados ao céu. Creio que ela sabia disso, mais do que eu voltada para as coisas do espírito, tão mais do que eu voltado à s coisas do corpo e suas exalações, suspiros, vontades férreas e apetites. Ela não: Sempre com um pé aqui, outro acolá, na ponte que separa o joio do trigo, sendo nós a mais impura das sementes.
Sempre a considerei assim, meio anjo e a mim, meio abismal. Não que eu simpatize com as coisas do Impuro, do Renegado. Ele que se aferre à s suas hostes; eu jamais faria parte de um plano como o dele, aquele da maçã já nos bastou a todos. Eu digo abismal porque em mim sempre foi a sensualidade uma coisa inata como nela a fatuidade, o fogo nos olhos que surpreendia uma estrela que nascia. Ela tinha um quê de impermanência assim como eu de finitude eterna. Nós talvez nos completássemos, se os caminhos paralelos se encontrassem enfim como se diz na obtusa lenda do incomensurável e do não dito.
Mas não, as lendas são pré-fabricadas, como o são as bombas caseiras e todo o arrependimento que tal ato falho provoca nas arrepiadas vestes de carne que reveem a cena, mil vezes repetida, dos bombardeios do mundo. Na realidade lendas não existem, mitos são histórias que se inventaram para que se suportasse a ideia do fim e da decadência. Almas são energias que se adensam mas que se vão na hora em que se apaga a vela da vida e assim foi, com ela e será comigo.
Agora eu caminho solto no mundo como um autómato sem rédeas, um apenas-corpo que se avoluma no espaço e carrega tristonho o limite da própria carne, sem saber direito se o que principia é forma ou, pior se apenas foi conteúdo. E no silêncio, no alto do penhasco que antecede a Queda, eu vejo os cadentes astros que terminam a vida onde começou a nossa.
O sol rasga o horizonte, sem piedade e eu viro as costas.