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cronicas-->Echoes -- 12/03/2014 - 14:21 (flavio gimenez) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Nas montanhas, o ar é rarefeito. Falta-me a respiração, mas aprendi a não violar as regras desse mundo por vezes inóspito, por outras vezes violento e ventoso. Vezes há em que, caminhando, vejo os rastros de pássaros loucos, talvez de uma ou outra fera, um lobo, um urso. Nunca, jamais os encontrei frente a frente. Prefiro evitar o sofrimento inevitável de ser mastigado, fatiado e desfeito em tiras.

Hoje, no entanto, acordei mais animado, após a fria noite alimentada de frutos silvestres, um passarinho que assei, a água de um regato cristalino. Hoje acordei estranho. Ví vultos lá embaixo, apurei o ouvido:

--Ahooooyyyy!

Esse grito ecoa nas paragens e repassa o fundo da montanha, enche o vale de sombras coloridas e cai como uma gota na superfície do lago gelado que tem lá suas trutas.

--Evoéeee!!!
--Ahoyyyyyy!!!
--...yyyy...yyyy...

O eco açoita as nuvens. Desço com calma, porque as rochas escorregam. A vegetação escasseia lá para cima. cá embaixo, algumas moitinhas, uns arbustos e olhe lá. Sinais de cobras, peles descamadas expostas ao sol passageiro...E mais rastros de bichos.

Chego junto ao grupo. Um deles usa um óculos colorido e espelhado. Outro usa aparatos de esqui. Mais dois trazem aparelhos de sobrevivência. Tenho de lhes dizer:

--Nisso aqui, nada disso serve; se quiser sobreviver, tem de se desfazer de tudo!

Um olha para o outro,assustados, vendo que nada tenho senão minhas botas gastas, meu abrigo de pele, minhas peles todas e meus ossos secos, salientes nas faces.

--Há quanto tempo reina aqui nestas mesmices, moço?
--Há muito, muito tempo.

Um e outro se incomoda. Percebo o que lhes espanta, é minha secura, minha aspereza. Nesse mundo das altas esferas, aprende-se a ser seco, comedido nas falas, económico nas efusões. Nada de desnecessário se exige; é a paz das alturas.

--Conhece o local?
--Como a palma de minha mão.
--Viemos procurar alguém.
--Posso ajudar.

Confabulam, eles entre si, eu comigo mesmo. Enfim, chegamos ao acordo tácito.

--Está bem, vamos todos juntos.

Lá vamos então, eu na frente, o batedor aos lados, os esquiadores com as peças nas mãos e o homem do óculos engraçado à minha direita. Subimos com dificuldade, eu já me acostumei ao abraço das frias nuvens e ao frio garoar dos lados da montanha mais enganadora que eu conheço. Ouvimos um ruído, faço que não, tenham calma, é um coelho. Para nossa panela, isso sim!

Depois do guisado, preparado com a agilidade adquirida pela frieza da fome e do requinte da sobrevivência, eu estou descansando. Pergunto sem mais:

--A quem procuram, posso saber?
--Claro que sim.

E mostram minha foto. Arre Que estou me procurando ainda e até hoje não me achei.
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