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cronicas-->Resiliência -- 19/01/2016 - 10:36 (flavio gimenez) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Quando se vê um velhinho andando na rua, em que você pensa? Eu penso na fragilidade, penso na quietude dos ouvidos moucos, na turvação da vista já um pouco avariada. Não falo do idoso serelepe, corredor que enfrenta maratonas: falo daquele que anda devagarinho, olhando para os lados desconfiado, em geral com a infatigável companheira bengala. Falo deste idoso que me causa impressão de ser um nó que resiste ao vento da vida, prestes a ser arrebatada dele. Eu o vejo aqui na padaria aonde fui tomar uma sopa. Uma sopa de feijão saborosa ainda mais apimentada que o normal. Aí me vem esse homem, como quem não quer nada, de pé olhando a moça que serve os pratos. Eu imagino o mais óbvio: Deve ser que ele está esperando uma sopinha de graça, deve ser que ele olha assim para ela a ver se sobra um pãozinho assado ou um suco feito com carinho.

 

 

Ledo engano. Dizem que a primeira impressão é o que vale. Errado,ou eu estava ainda mais enganado, porque, ao ver se aproximar a moça dos pratos e quitutes, ele estendeu uma nota de dois reais em sua mão. Ela educadamente a aceitou para não feri-lo ainda mais; ela aceitou porque ele gosta dela. Sai o antigo homem, sai o senhor trôpego, olhando para os lados e seus olhos encontram os meus: Há um cansaço profundo, há medo, há resignação mas antes de tudo há resiliência. Será mesmo?

A moça que recebeu o trocado olha para mim, penalizada.

--Ele é tão só! Diz que prefere morrer.
--Por quê?
--Ele tem noventa e três anos; já viveu tudo o que tinha de viver. Vive sozinho em casa. Enterrou seus dois filhos e a mulher. Apenas mora sozinho, aqui, a uma quadra. Um sobrinho vez em quando o visita. Seus amigos se foram. Ele vem aqui para conversar com a gente e eu fico em torno dele. Pago para ele um lanche gostoso, ele nem sabe disso. O dono da padaria o conhece há anos, faz questão. Já ele, ele diz que quer morrer. Não quer mais nada, só morrer.
--Que triste!
--Pois é, seu moço. Digo a ele, bobagem! O senhor está com saúde, veja, o senhor vem aqui e conversa com a gente; não pense nisso. Pense que nós estamos aqui para o senhor conversar a hora que quiser, sempre que quiser. Tendo saúde, tem-se tudo, não é?

Olho a moça, alta, esguia e morena; seu rosto ostenta um brilho raro hoje em dia, o brilho da compaixão. Seus olhos vivos refletem a alma pura de quem faz o que diz e diz o que sente. Raridade hoje em dia. O que posso fazer senão cumprimentá-la e louvar sua atitude?

--Parabéns. Continue assim.
--Olha ele lá, tão sozinho...Ele não merece?

Lá vai a bengalinha, batendo ritmada ao chão, um órgão a mais num homem a mais no mundo. Um mundo que desvaloriza o próximo, onde as pessoas assim se tornam invisíveis ao olho nu. Um homem que tem as marcas do Tempo na alma. Um homem só. Um.

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