Resolvi escrever o que me vem à cabeça. Ora, pois o que me vem de fato é uma enxurrada, um verdadeiro torpor de desconexas imagens, aparentemente fatos reais que se vistos de outro modo, irreais ficam. Penso que se fosse de outro modo, talvez se eu fosse pensado, um simulacro de mim se encheria de espanto, outro de êxtase, talvez a maior parte de mim permanecesse infensa, ou mais ainda, surpresa. Só assim eu me convenceria que, de fato, não sou pensado, sou eu quem vejo e reg...istro tudo o que me vem aos olhos e são tantos os registros que, se de fato eu pensasse, talvez me desfizesse de meus sonhos e andasse meio de lado, qual caranguejo, pronto a ser flambado e derretido e posto à mesa sem minhas pernas e sem meus braços, num horrível degredo de mim mesmo, um escárnio de um medo que sufocaria, depois que a tampa se erguesse e várias vozes gritassem, meio bêbadas de tanta coragem:
--Prefiro as patas mais gordas.
--Passa o vinho, Gambá.
--...Olha quem fala!
--Sabe por quê o gambá fica bêbado?
--E eu vou lá saber?
--Os gambás entram nos galinheiros, sugam o sangue dos pescoços das galinhas e ficam depois em total apatia...
--...Bêbados.
Coragem: A primeira pata a gente jamais esquece.