Convidei a Ritinha para um jantar antes e um filminho depois. A Ritinha é uma garçonete do aeroporto, que eu conheci numa final de campeonato e que serve uma coxinha como ninguém. Pimenta pura! Eu me apaixonei por ela durante um risólis de palmito. Acho que foi o jeito dela colocar o paliteiro no balcão. Que
cruzada de direita!
Depois de muita insistência, ela topou jantar numa terça-feira, véspera de feriado, mas só se fosse na casa dela.
- Truco! Topei no ato. Paguei a conta e esperei na soleira. Ela despiu o avental e veio até mim com uma elegància de Marta Rocha. Saímos pela porta da frente, com ares de Fred Astaire e Ginger Rogers.
O motorista do táxi abriu a porta de trás. Charme é charme e andar de cabrocha nem Channel nº 5 encara. Sentamos cansados, como dois pastéis. Ela abraçada no meu braço. Eu, explicando ao motorista onde ficava a rua 10, bloco 15, aptº 121.
E lá fomos nós. Não sem antes passar no Jumbo 24 horas, onde adquiri um sadio peru congelado. - Ela me pega, nem que seja pela vesícula! - acredite se quiser.
Ela ligou a TV e foi tomar um banho. Eu fiquei revirando os discos. João Nogueira, Elis, Emílio Santiago e um bom disco de Noel. Decidi na hora que meu presente de noivado seria uma imagem de São Francisco. Ela tem sangue azul. Fiquei verde de ciúmes do chapeiro da lanchonete.
Ela voltou. Perfume mulato, linda num traje bandido. Eu amoleci feito espaguete nº 9 na caçarola da tia Pepa. Fiquei com cara de provolone. Ela balbuciou: - Põe na Globo, bem!
Dei dois cliques e lá estávamos. Jornal Nacional: Descoberta uma trama de bastidores na càmara. Eu olhei para ela, como uma càmera de VHS com tecla SAP e raios-x. E imaginei a trama que havia naqueles bastidores. Fiquei com feições de Rubinho na largada. Quase chorei na rampa. Ela ponderou: - Vê se tem coisa melhor noutro canal.
- Coisa melhor? - pensei. Impossível. Nem o Amaral Neto, Repórter, conseguiria em dia de chuva e vento noroeste pelas bandas da Arena. Fiz pose de Lacerda e dei o veredicto: - Cinquenta anos em cinco! E pulei sobre ela, feito o Ratinho, quando vê a Hebe, isto é, a lebre. A carne fraquejou...
Ela acionou o controle remoto: - Alto! O que é isso companheiro? Xeque-mate! - ela decretou com sotaque de Evita.
- Você decide! - gaguejei. E fiquei com cara de danoninho, prostrado no sofá-cama verde-rosa-mangueira.
Ela continuou, altiva como Mãe Menininha do Gantois: - Tá pensando que aqui é casa da sogra?
Lembrei da dona Dolores - Deus a tenha. - Mas, bombonzinho, a que viemos? O troca-troca é só de canal? Não se aplica aos telespectadores? Olha o jeito que ficou meu ibope. Despencou!
- Càmeras, close! - retrucou a TV. - If I had a thousand of women...
- Componha-se! - ela retorquiu. E trocou de canal, para um programa pentecostal.
Eu assumi uma postura de garoto-propaganda e sorri meus dentes amarelos-nicotina. Dei uma baforada ao estilo James Dean e fiz umas rosquinhas no ar.
- Gravando! - protestou o contra-regra.
- Vem logo, que o peru está pronto. Só falta a farofa! - ela declamou "claricemente" lá da cozinha.
- Inspector Clouseau, ao seu dispor! - arrematei. E saí num pas-de-deux hercúleo.
Ela me olhou com olhos de pantera. Eu sinalizei com faróis de ovos cozidos.
- Desliga o controle, amor! - ela sugeriu, candidamente.
Eu pisquei para a TV. E pareceu-me ouvir ao fundo: - É com você, Lombardi! Ou era: - Vai que é tua, Taffarel!
Não importa, dá na mesma. O ibope subiu.