Minha máquina fotográfica quebrou, de modo que vou descrever para vocês o que vejo: Ã minha direita, tem um cachorro sarnento comendo um pedaço do que sobrou de um frango de despacho, retirado de uma vasilha com farofa e mel. Em frente, uma imagem de uma pequena mulher disfarçada com um véu, dizem ser Iemanjá ou Uiara, a mãe dágua. Ã minha esquerda um enfeite que tem sete pontas para fechar as sete encruzilhadas. Várias velas vermelhas e brancas; um tapete colorido sob toda esta parafernália. Acima, o céu chuvoso de uma quinta-feira, Ã frente o cemitério com suas tumbas e estátuas tristes. O cachorro manquitola comeu o frango e pulula para longe com seus nacos roubados ao despacho. Meus pés estão forrados de um tênis velho de dar dó. Minhas mãos agradecem ao céu a chuva que cai depois de meses, as árvores têm galhos torcidos e folhas amareladas. Ã distància, passa um carro de polícia cheio de canos por todos os lados; um ou outro me fitam. Ficam de longe vendo o cão sarnento e manco comer seu frango roubado. Passam uns transeuntes que se benzem, olhando com temor o que foi feito com tanto amor. A moça veste uma saia preta, uma bota de cano longo e tem uma franja encantadora, ela tem a pele morena e mãos nervosas. Numa delas o cigarro danoso, na outra o papel da carta.
Saio andando, vou ao encontro dos fotógrafos sem máquina, pois que, Ã falta delas, cada um descreve o que viu. Grupo semelhante aos poetas sem livros que guardam de memória o que leram e se encontram em dezembro, coletando o que jamais houve.
Muito bem.
Bom dia.
(atropelaram o manquinho depois, fiquei sabendo. Pelo menos, teve uma última refeição decente)