Guardado no ventre materno, vivo instantes de ansiedade marcados pelo caos interno onde minhas atitudes retratam receio de me ver chegar ao mundo. No útero, me protegi e seguro me sentia ao passear entre os labirintos estreitos cujo cordão umbilical não permitia que me perdesse. O período em que o conflito de vir ao mundo e querer permanecer guardado naquele lar maternal, apresento-me inseguro diante do fato da existência. O momento do corte do cordão umbilical, acredite leitor, é o de maior sofreguidão para quem reluta em existir fora do sagrado oratório de pré-existência humana. O cheiro forte do líquido que por nove meses me fez flutuar, ainda é forte. Nele, tudo me era permitido inclusive estar ausente quando a presença era necessária. Meu útero prepara-se para expulsar mais um ser que deixará de ser único num só lugar, para ser apenas mais um a se submeter aos princípios da existência. O nascimento preenche espaços, onde o físico corpóreo me faz cotidianamente ser sempre um recém-chegado à vida... ao palco da existência. Contudo, simultaneamente vivo a morrer a cada passagem milimétrica do tempo e vou celebrando as conquistas, vitórias e derrotas. Não consigo viver pela metade, pois a existência exige intensidade em ser amplamente vida e morte. Sou tudo e nada, sou mestre e aprendiz, sou verdade e mentira, sou o que se ver e o que não se vê, sou a alegria e a tristeza, sou a resiliência e a rebeldia, sou a resistência e a entrega... de passagem, vou acenando aos que no caminho me fazem sentir um recém-chegado nascido das minhas próprias entranhas.