Essa é uma daquelas histórias que o compadre Veridiano me conta quando vou a Vitorino Freire, Maranhão, nas férias. O Veri, como é mais conhecido, sempre tem uma história nova ou um ditado, que acaba virando moda. O último ditado, se me permitem, fazia referência a um pássaro, conhecido regionalmente por "pai Luiz", que só faz ninho em roça abandonada.
As roças por lá ainda são da forma tradicional, ou roça de toco. Quando se dizia que o "pai Luiz tinha tomado conta da roça", indicava que o dono dela deixou o mato crescer e ali não dava mais nada. Só que, aquele povo criativo, já utilizava a frase também quando o sujeito deixava de dar atenção à sua casa. E, nesse sentido, o pai Luiz era o "pé-de-pano".
Me conta o Veri, uma história que aconteceu na época que ele morou no Pará e trabalhara na hidrelétrica de Tucurui. Numa cidadezinha próxima, diz o Veri, toda a força policial local era um cabo da polícia, que fazia as vezes de delegado, e um soldado. Também não precisava de mais. As ocorrências eram poucas ou quase inexistentes, salvo algumas "briguinhas" de bar ou desentendimento de vizinhos.
Um dia, chegou por lá um sujeito alto, forte. O Veri exagera na descrição, dizendo que ele tinha mais de dois metros de comprimento por 2 de largura. Um caixote, se essas medidas forem levadas a sério. Ele dirigiu-se ao bar do local e, encostado no balcão, pediu um copo de pinga. Tomou num gole só, reclamando que era muito fraca. Pediu uma mais forte. Nessas altura o dono do boteco já sentiu o "cheiro" de encrenca.
Para atender ao pedido, ele preparou um coquetel com várias pingas. Colocou até uma pitadinha de um molho de pimenta forte, daqueles que faz o baiano gemer sem sentir dor, completando com um punhado de pólvora. O sujeito tomou como quem toma água.
"Tem tira-gosto?", perguntou ao dono do bar.
"Não, senhor!", respondeu com voz trêmula.
O sujeito sacou uma peixeira, cortou e assou na lamparina a orelha de um freguês que tranquilamente tomava sua pinga no balcão. Nessas alturas a cidade toda já sabia o que se passava no bar. Na delegacia, o delegado-cabo já se preparava para colocar sua força policial em ação:
"Soldado! vá até o bar e traga o sujeito até aqui!"
O soldado armou-se com sua espingarda chumbeira e andou uma curta distància, da delegacia até o local da ocorrência. Lá chegando viu aquele sujeito com a mão na orelha, esvaindo-se em sangue e, ao lado, aquele fortão tomando o "coquetel" e saboreando o estranho tira-gosto.
"Teje preso por ordem do delegado Leriano!", disse o meganha, apontando sua arma para o grandào.
O sujeito se virou de uma vez e, nesse movimento, já tomou a arma do soldado, quebrando-a em diversos pedaços. O soldado voltou à delegacia quase correndo.
"Cadê o homem, soldado!"
"Ele não quis me acompanhar delegado!", disse o esbaforido soldado.
"Prenda o homem e traga-o aqui de qualquer maneira, soldado!"
O soldado retornou. Na frente do bar a coragem minguou e ele preferiu ficar esperando fora, armado com uma estaca de aroeira que ele arrancara de uma cerca. Horas depois, o sujeito resolveu sair, meio cambaleante. Quando ele apontou a cabeça na porta do bar, recebeu aquela tremenda pancada, caindo desmaiado. O soldado imediatamente providenciou uma viatura - um carrinho de mão que estava ali perto -. Depois de muito trabalho, ele conseguiu "agasalhar" o sujeito no veículo.
"Delegado, taí o desobediente!", disse ao chegar à delegacia, despejando a carga do carrinho aos pés do valente delegado.