Sempre tive uma paixão por cronistas. Sou fã mesmo. E penso nisso ao voltar para a casa dos meus pais em visita de começo de ano.
No meu quarto há uma quantidade de papel fora de qualquer paramento literário. São cartas, bilhetes, livros. Até papel de carta achei, dá para acreditar? E a maioria do "lixo"de palavras são cronicas. É uma quantidade impressionante. Tenho de todos os gêneros, guardadas em meio à s fotos de infància.
O que mais me surpreende é uma coleção, carinhosamente plastificada, de cronicas do César Seabra, tiradas do Jornal o Lance. Tenho as primeiras e até a última, sua despedida derradeira. Fico espantada pois são sobre esporte (maioria futebol). As páginas grifadas com caneta vermelha parecem representar os momentos mais interessantes contados por César. Tento imaginar quando foi o momento exato que elas começaram a se alinhar na minha vida. Recordo que fazia reportagens sobre o Clube de Futebol Barcelona e Seabra sempre comentou muitas coisas sobre o time.
Continuo perdida em meio aos papéis. Sei que daqui a pouco minha mãe vai entrar por esse quarto e dirá: até que enfim você está limpando isso! Mal sabe ela que vou deixar tudo como está. Encontro minha pasta de frases, contos. Meu quarto parece, por um instante, o único lugar que quero estar. Encontro também o rascunho de um texto de Fernando Pessoa chamado Análise. Tive que recitá-lo no colégio e lembro como foi difícil fazer isso.
Os velhos e novos cronistas já dormiram muito comigo. Foram amantes nesse quarto perdido no tempo. E, infelizmente, não tenho tempo para conversar com eles. Minha vida não é mais aqui. Agora minha coleção fica presa no computador.
Houve uma eleição para o melhor jogador do mundo, feita pela coluna de César Seabra no Lance. Pela história de vida do jogador do Barcelona Rivaldo (só pela história de vida, pois pelo futebol está difícil), eu queria que ele ganhasse essa eleição. Reuni amigos da faculdade, alguns vizinhos e mandei uma carta para Seabra mostrando os votos que consegui. Dois dias depois o telefone tocou lá em casa. Uma amiga atendeu e falou que era um tal de César Seabra. Eu achei que fosse alguma gozação, mas não era. César ligou para agradecer a votação, disse que Rivaldo tinha ganho e perguntou sobre minha vida. Brincou com meu sobrenome, dizendo parecer "espanhol demais" e rimos por alguns minutos. Desliguei o telefone sem acreditar. O meu cronista teve a bondade de ligar! Por isso, e pelas cronicas tenho um carinho especial por ele. Acho que por isso a coleção plastificada de seus textos está aqui, perdida no tempo.
Muitos cronistas não sabem a satisfação que passam através das palavras. Não conseguem ter a noção de quantas pessoas analisam o dia a dia através disso. Olhando agora para esse quarto, posso dar uma vaga idéia a eles.