Há dias em que não se deveria levantar da cama, mas no meu caso, isso é impossível. Para começo de assunto, um senhor toca flauta no meu prédio. Há anos ele só consegue tocar uma música. Fica na mesma por toda a manhã. E hoje, especialmente, acordou à s seis horas e não largou mais.
Como faço da madrugada minha companheira, estou em uma manhã de tirar o fólego, onde o pensamento tem a obrigação de fluir com a máxima rapidez. E como levo uma vida diferente, pago o preço.
Por um único minuto fico na cama pensando se vai chegar um dia em que não acordaremos mais. Hoje mesmo comentei com minha mãe que não vou nunca morrer dormindo, pois simplesmente não durmo. Trabalhei até Ã s seis horas da manhã. Cheguei em casa e quando ia dormir, o senhor da flauta começou a cantoria e estou aqui pensando e escrevendo a vida.
Meu pensamento está no perdão. Acho que não consigo dormir por causa disso. Dia 18 de junho foi aniversário da minha melhor amiga. Beatriz comemorou mais um ano e não consegui falar com ela no dia. Esperei que ela entendesse telepatia, porque pelo telefone estava difícil dar os parabéns. Mas sei que o perdão virá mais cedo ou mais tarde. Beatriz esquece as coisas. Ela aprendeu desde cedo que o que é ruim, temos que jogar fora, num lixo bem longe da nossa casa. E o barulho que Beatriz faz na hora de jogar o mal para fora do coração não é o mesmo da flauta, é uma canção lenta e feliz.
A única coisa boa das minhas manhãs, é saber que Beatriz está acordada. A menina acorda cedo demais! Sei que nesses primeiros raios de sol, já está colocando a vida para funcionar. E como funciona!
O perdão não é exigência, é apenas um desejo. Eu já perdoei muitas pessoas e já fui perdoada também. O caso é saber quando se perdoa com vontade. Quando estamos felizes, somos capazes de perdoar os nossos maiores inimigos. Por isso e por muito mais, espero que Beatriz esteja com a vida plena de felicidade. Não só para que o meu perdão seja concedido, mas para que ela continue a entender e esquecer o que não importa em sua vida.
Portanto, amiga querida, feliz aniversário atrasado. E me perdoe por qualquer dia em que eu não tenha compreendido sua felicidade. Hoje eu compreendo tudo. Até um senhor que não ganha de ninguém uma nova letra de música e buzina uma canção aqui no meu apartamento. Vai ver Beatriz, ele não seja como nós. Talvez só tenha restado a música como amiga.