Menino de rua. Todos o conhecem. Muitos o amam. Alguns o odeiam. Outros ficam indiferentes à sua existência.
Ele ama a todos. Simpático, educado, rápido no raciocínio, prestativo ao extremo.
Só não gosta de estudar. E daí? Ele é igual à grande maioria das crianças de sua faixa etária. A escola da vida o está ensinando e vai ensinar muito mais.
Tomara que ele absorva apenas as coisas boas que essa escola possa transmitir. As ruins, que são em muito maior número, oxalá sejam esquecidas por ele.
Seu futuro é incerto. Mas, isso não é prerrogativa dele; quem tem certeza do futuro?
Alguns, mais pessimistas, teimam em achar que ele vai se desviar do caminho do bem. E até cometem o crime de lhe dizerem isso.
Outros acham que, levando-se em conta sua boa índole de hoje, jamais poderá se desviar amanhã.
O fato é que ele está aí, é uma criança, precisa de carinho e, pelo menos isso, a sociedade lhe deve.
Grande narrador de rodeio.
Usa a imaginação para narrar um rodeio inexistente. Inventa nomes para os cavalos. Se bobear, arruma nomes até para os jurados.
Ah, mas os peões existem. São as pessoas que estão por perto no momento da narração.
Ao final de cada montaria, ele atribui notas para os peões que montam os cavalos imaginários.
Notas altas para aqueles de quem ele gosta mais e notas menos altas para aqueles de quem ele gosta menos. Nota baixa, jamais. Seu coraçãozinho não permite que ele menospreze alguém.
Se o peão não fica contente com a nota, ele joga a culpa nos jurados que só existem em sua cabecinha:
- Você aguentou só 18 segundos, como é que você vai querer que os jurados dêem nota melhor que essa?
É mole?
E a viagem para Santos? Até hoje não sei se aconteceu ou foi, também, fruto de sua fértil imaginação.
Aliás, as viagens, pois foram duas.
Numa delas, ele e seus familiares se hospedaram dentro da própria Kombi que os transportou para lá e sofreram um pouquinho.
Na outra, porém, houve a compensação: hospedaram-se, segundo ele, num "hotelzinho legal que fica pertinho da praia".
- E era bom mesmo o hotel?
- Ó. O hotel era bem legal. Limpinho, quartinho bem arrumado. . . A gente acordava cedo e já aparecia o garçom com a bandeja do café da manhã.
- E o café era reforçado? O que vinha de gostoso?
- Ah, vinha pão, manteiga, café, leite, presunto, queijo, porquinho. . .
- Porquinho?
- É. Você conhece porquinho?
- Vai dizer que é aquele peixinho?
- É.
- Mas, peixe no café da manhã?
- É uma delícia! Hummm, bem fritinho então...!