Uma primeira frase, simples, sucinta: não gosto de apresentações. Em geral, elas me trazem lembranças de uma pequena e indefesa menina. Em sua escola, mergulhada naquelas longas e terríveis aulas em que cada um deveria falar um pouco sobre si mesmo, sobre sua vida, seus sonhos, suas vontades, gostos ou mesmo medos, lá estava ela torcendo para que tudo aquilo passasse depressa e, principalmente, para que não houvesse tempo suficiente para ser perguntada. Pode parecer engraçado, mas muitas vezes sonhei em ser invisível, muitas vezes tive vontade de ficar em paz em algum lugar, sem chateações, no meu próprio mundo, sem qualquer pessoa para me aborrecer ou interromper meus pensamentos que fluiam incessantemente, pairando no ar como uma leve pena carregada pelo vento, sem qualquer destino ou necessidade...
Hoje, não sou muito diferente. Mais tolerante talvez. O tempo me ensinou a amar mais, pelo menos a aceitar com relativa facilidade determinadas situações e pessoas. A escola da vida por vezes foi cruel, mas tenho enfrentado. Não tenho a pretensão de dizer que dou o máximo de mim, mas procuro pelo menos dar o suficiente. Exatamente isso. Meramente o suficiente para conseguir levar um dia a dia digno de uma pessoa normal. Vejam... isso é apenas a minha apresentação. Dessa vez, parece que está ficando perfeita. Fugiu da habitual forma: "meu nome é tal... tenho tantos anos...sou isso... sou aquilo...". Absteve-se daquela pretensão de procurar qualidades que não tenho e evitou a dor de não poder dizer realmente a verdade sobre o que se passa comigo. Realmente, achava extremamente cínicos aqueles que chegavam contando sobre todas as suas vantagens pessoais, como se fossem o máximo ou os donos da verdade, sem defeitos, com "mil e uma utilidades". Agora penso... o que estaria o meu prezado leitor achando de mim? O que quer que seja, não tem problema. Ao menos estou falando a verdade aqui. Durante anos, fiquei presa ao "achismo" das pessoas e só consegui chegar a uma conclusão: isso não me traz nada de positivo.
Bem amigos... já que praticamente despejei aqui alguns traços (negativos ?) da minha digníssima pessoa, passarei agora a falar algumas de minhas vantagens, afinal nem tudo são espinhos.
Debaixo de uma carapaça dura, existe dentro de mim uma menina, doce, insegura, que tenta em vão fazer o dito "bem", que procura a maior parte do tempo ser "cordial", que luta para ser amada e respeitada. Pairam dúvidas, incertezas, ilusões que me levam a viajar, a filosofar em caminhos labirínticos, conturbados. Por vezes me perco nesses caminhos, as respostas me fogem e acabo me afogando num oceano imenso, sem noções mínimas sobre o que significam para mim a vida, as pessoas, o mundo enfim. Já tirei, contudo, da minha vivência, algumas certezas, não absolutas, não irrevogáveis, mas que servem como um eixo necessário para minha própria sobrevivência.
Pretendo não estender-me mais. Falei bem pouco, é verdade. No entanto, minha intenção é apenas dar uma pequena visão do que sou, não quero me aprofundar. Termino por aqui. Espero que tenham conseguido captar ao menos um pouco do que tentei transmitir. Receio não ter atingindo meu objetivo, tendo em vista que não acredito nas palavras. Na maior parte do tempo, dizem por nós o que não queremos dizer realmente. Contudo, necessitamos delas. Não há como fugir de seus falsos sentidos. Suas armadilhas e suas diferentes concepções acabam levando-nos a idéias erróneas, limitadas e simplistas. A complexidade de um ser humano é tal, que sempre será impossível descrever alguém com meras palavras, por mais fiéis e apropriadas que sejam. Deixarei, no entanto, escapar a minha verdade: não quero ser corpo e sim espírito, disperso num espaço infinito, atemporal. Desejo apenas ser livre...