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cronicas-->Um passeio na capital. -- 09/02/2003 - 16:03 (Aparecida Nunes Ferreira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Hoje eu vou para a Capital. Coloco o que considero minha melhor roupa de passeio. Confiro a listinha de encomendas. Nossa, quanta besteira...! Mas, fazer o quê? Dou um beijo nas crianças. Deixo as recomendações quanto aos cuidados com o que fica. Recebo as recomendações de quem teme que eu vá. Lá vou eu...
Ainda dentro do ónibus, arrisco-me a tentar entender como aquele mundo de carros não se choca uns contra os outros. Faço um cálculo de quantas pessoas passam prá lá e prá cá na calçada larga. É gente demais! Prá onde estarão indo? Passo, então, a examinar os prédios que se erguem em tantos andares, sem desabar. Como são belos! Distraída, vejo do outro lado os barracos que se amontoam em ruelas. Aqueles podem desabar. Como são feios...!
Desço na rodoviária. Meu coração se aperta. Seguro contra o peito minha bolsa. Tenho medo de me perder...Tenho medo de ser assaltada... Tenho medo de ser atropelada... Sinto vontade de voltar prá casa. Mas, minha vergonha de não conseguir é maior que meu medo de tentar. E começo a aventura.
Vejo quanta gente bonita...Mulheres bem vestidas se equilibram em saltos altos. Homens musculosos desfilam seu corpo malhado. Ópa!...Crianças dormindo no chão? Na mesma calçada onde a saúde mostra seu vigor, pernas ulceradas são exibidas por quem pede um trocado. Caem ali moedas que seriam jogadas ao chão.
Olho, deslumbrada, as vitrines das lojas bem enfeitadas. Quanta coisa linda! Na minha cidade não tem disso. Mas, vejo os preços das coisas belas. Na minha cidade não se ganha prá comprar isso. Entro, então, na loja onde um homem feio de voz bonita anuncia promoções imperdíveis. Percorro as bancas com roupas amontoadas. Examino as peças que escondem pequenos defeitos. Perco as promoções...Mas não perco meu dinheiro.
No hipermercado, encho meu carrinho com coisas que nem sei prá que servem. Estão baratas. São bonitas. Parecem gostosas. O importante é que vou levar coisas da capital. E matar minhas amigas de inveja!!! Na fila do caixa, quase perco a paciência. Por que tanta demora? A moça uniformizada faz com que eu entenda porque um mais um são dois. É tudo barato...Mas quase que meu dinheiro não dá.
De volta às ruas, perco-me na multidão. Ninguém me ajudará a segurar as pesadas sacolas. Eles não param. Esbarram em mim, quase me derrubam...E não pedem desculpas. Um senhor, logo adiante, cai ao chão, depois do empurrão de um menino. Coitado do senhor! Não era apenas um garoto. O pivete corre com a carteira na mão. Sinto pena. Não posso fazer nada. Ninguém faz nada. Somos apenas um monte de nada perdidos no meio daquilo tudo.
Penso em ir ao teatro...Um cinema talvez. Vejo os anúncios da próxima seção. Pensando melhor...Verei os filmes no vídeo em minha casa. Um passeio na pracinha? A praça da minha cidade é mais bela. Um passeio no zoológico? Ali, os animais têm olhares tristes. Não...Não vou suportar. O parque no centro da cidade? Na minha cidade, existem árvores espalhadas até se perder de vista. E com cachoeiras em forma de nuvem de água.
Com os passos mais pesados do que quando cheguei, dirijo-me à rodoviária. Guardo no bagageiro o meu tempo perdido. Cumprimento os rostos conhecidos como se não os visse há anos. Vejo neles o mesmo sorriso de alívio. Desabo na poltrona meu corpo enjoado do que eu achava que seria um passeio. Que saudades da minha terra!
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