Os estudiosos brasileiros, assim como os legisladores brasileiros são uma raça, realmente, sui generis. Por qualquer dá cá uma palha, uns criam as leis, outros a estudam, analisam e dão os seus pareceres. Só que, pelo que parece, tanto estes como aqueles, se não agem, sempre, de acordo com interesses próprios, o fazem de acordo com interesses corporativos.
No Brasil, legislar é a coisa mais fácil do mundo. Por isso, tantas leis existem no emaranhado jurídico desta terra. Certas leis são feitas para serem usadas em ocasiões determinadas, não determinadas porque se repetem de tempos em tempos, mas situações em que se faz necessário mudar alguma coisa em proveito daqueles que não podem perder nada, naturalmente. Essas, depois, são esquecidas, perdem o uso, até que um dia, são revogadas por não interessarem mais, dando lugar a outras mais interessantes.
Nesses dias de eleição, alguma coisa está pegando. Imediatamente após o dia 6 passado, quando começaram a surgir os primeiros resultados do pleito, daí, surgindo, em São Paulo, um Eneas como o campeão de votos, a coisa ficou esquisita. De repente, a televisão já estava discutindo o fenómeno, não como algo bem-vindo, um sintoma de alguma mudança, mas como alguma coisa que não fazia nenhum sentido, haja vista que a eleição daquele estranho fora do ninho levou a reboque outros correligionários seus com uma contagem insignificante de votos, incapaz de eleger um vereador numa cidade de vinte mil habitantes.
Um analista já falava em mudar a legislação. Dizia com ênfase que isso era, no mínimo, esquisito e que São Paulo, com os seus vinte e cinco milhões e lá vai fumaça, de eleitores, não podia ter um deputado eleito com algo perto de duas centenas de votos. Muito menos um deputado que mora no Rio de Janeiro.
Certamente, esse infeliz analista se esqueceu que existe uma legislação regulamentando o processo eleitoral e que tudo está de acordo com ela. E se esqueceu que essa legislação é quem disciplina as eleições no Brasil, a despeito de entendimentos particulares de quem se ache o dono da verdade. Além disso, resta o fato de que a legenda que arrastou os partidários do Dr. Eneas é a mesma que tem arrastado candidatos de todos os grandes partidos até hoje, sem nenhuma reclamação.
Mas o analista não vê isso, e não vê porque não quer. Pra ele qualquer coisa que emancipe, nesse caso, um pequeno partido, é esdrúxula e deve estar errada.
- Onde já se viu? - devia estar pensando - esse nanico derrubar um monte de "candidatões" do PSDB, do PMDB, do PFL...
E o infeliz se esqueceu, também, o mérito do Dr. Eneas. Ele, sozinho, teve mais votos que o eleitorado individual do Amazonas, do Distrito Federal, de Mato Grosso do Sul, de Sergipe, ou de Rondónia. Além disso, suplantou a soma do eleitorado dos estados do Acre, do Amapá e de Roraima em um total de 704.701 votos, ou seja, quase o estado do Tocantins que totaliza 785.397 eleitores. Desse jeito, não deveria ter chiadeira nenhuma por parte dos pregadores da democracia que não gostam dela quando ela se manifesta.
Campo Grande-MS, 15.10.2002 - 12:27
Indalus