Tomei o ónibus para ir almoçar em casa. Fazia isso quase todos os dias de segunda a sexta. O ónibus estava vazio, todavia, Ã medida que ia percorrendo o trajeto, mais e mais passageiros iam subindo.
Naquele horário, por volta de meio dia, a maioria dos passageiros era de estudantes saindo da escola. Durante o itinerário, passa-se por três escolas diferentes, e não é por acaso que ele fica extremamente lotado. É engraçado, porque aqueles jovens ficam a olhar para os passageiros sentados com um olhar de inveja. Não por acaso, alguns deles parecem até sentir vontade de nos arrancar do banco para sentarem.
Nunca prestei muita atenção em quem estava ou não no ónibus. Preferia aproveitar meu tempo para ir lendo um livro. Assim não sentia a demora para chegar a casa e não me irritava por estar faminto.
Certo dia estava, nesse mesmo ónibus, lendo um volume da "História do Marxismo", obra organizada por Eric Hobsbawm. Era o décimo volume da obra. Um livro de capa vermelha com a foto de Mão Tse-tung na capa. Quando o ónibus estava muito cheio e não estava muito longe do meu ponto, eu parei de ler o livro e o fechei; mas deixe-o bem visível por sobre as minhas pernas. Então virei para o lado e meus pensamentos criaram asas. Lembro-me que fazia um calor infernal naquele dia.
Em dado momento meus ouvidos captaram o seguinte diálogo:
-- Eu acho ridículo esse negócio de machismo - comentou uma jovem.
-- Eu também acho! - concordou a outra. - Esse negócio de machismo não tem na a ver.
No mesmo instante meu rosto corou e eu levantei a cabeça para olhar para elas. Eram duas mocinhas até muito bonitinhas. Pela aparência, deviam ter aproximadamente 16 ou 17 anos. Não sei em que ponto elas haviam subido para o ónibus, mas certamente eram alunas que cursavam o segundo grau.
Depois do choque imediato, eu comecei a pensar: "Como nossos jovens de hoje são analfabetos! Não sabem nem distinguir a palavra marxismo de machismo". Pensei isso porque eu tinha certeza absoluta que o comentário partiu após uma delas ou as duas terem lido o título do livro sobre minhas pernas.
O absurdo não foi só as duas terem cometido o erro de não saberem distinguir uma palavra da outra, mas o fato de serem alunas do segundo grau e provavelmente não terem conhecimento da palavra marxismo. Na hora eu pensei: "Será o que nossos alunos andam aprendendo de história na escola? Provavelmente nada!... Porque um aluno desse nível que nunca tomou conhecimento das teorias de Marx não pode dizer que sabe alguma coisa de história...". É claro que talvez eu tenha exagerado um pouco, mas isso não justifica o quanto desinformado são nossos alunos.
A conversa prosseguiu por mais alguns metros, até que uma delas despediu-se da outra e desceu.
Quanto a mim, deu-me vontade de falar para elas que ali não estava escrito o que elas pensavam que estava, mas preferi não passar por deselegante. Fiquei calado e continuei meu trajeto inconformado com a ignorància de tão belas jovens. Mas fazer o quê? A educação de nossos jovens é o reflexo do fracassado sistema de ensino brasileiro, principalmente aqui no estado de São Paulo.
