Passava das três da manhã, quando Maria entrou em casa e tropeçou num par de sapatos femininos na sala. O marido ouviu o barulho, saltou da cama e foi ver que barulho era aquele.
- De quem são esses sapatos, Mário?
- Não adivinho. Você os trouxe de onde?
- Pára de gracinha.
- Falo sério. Saiu com amigas e ganhou um par de sapatos...? - ironizou.
- Parece meu número, mas é ridículo pensar que saio com dois pares de sapatos.
- Não vai sustentar que um par de sapatos surgiu do nada na sala?
- Não. Nada tenho a dizer sobre o mistério. O esclarecimento cabe a quem estava em casa.
- A mim?!
- Sim, claro! Talvez seja a hora de admitir que traz mulher, quando saio com as amigas.
- Mulher em nossa casa? Ora! Acabei de chegar também. Fui dar uma volta com amigos.
- Ah, é?! Não havia falado nada.
- Recebi um telefone, depois de você sair.
- Ãhram.
- A propósito, Maria, o Zé comentou sobre seu pé 39. Quanta indiscrição...!
- O Zé é doido.
- Mas foi outro dia, quando você ficou em casa. Lembra? Hoje, ele não esteve conosco.
- A Marina, mulher dele, veio com a mesma conversa sobre o tamanho do seu pé 39. Foi outro dia, quando ninguém ligou para você. Recorda?
- A Marina é doida.
Os dois se entreolharam meio surpresos, meio irritados.
- Está bem. São da Marina. Esqueceu-se certamente..
- Quer dizer...
- Não, não. Não tire conclusões apressadas.
- ?
- Marina saiu com os meus sapatos...
- Você é cara de pau, Mário.
- À noite ela é Mário...
- Como?!
- Arranjou uma namorada, mas não pode montar guarda-roupa em casa por causa do Zé.
- Estou perplexa!
- Não tanto quanto eu!
- O que quer dizer?
- Você conhece todos os detalhes... Todos... Precisa me falar a verdade a seu respeito.
Maria desata a chorar.
- Perdão, Mário. Nunca pensei que pudesse me apaixonar por uma mulher!
Mário se aproxima da mulher, comovido.
- Não perca tempo com lágrimas. A Marina me empresta sapatos também.
- À noite você é Marina?!
- Perdão. Nunca pensei que fosse me apaixonar por um homem.
- Santo Deus! Que o Zé, que toma meus sapatos emprestados, nunca saiba!
- Ele sabe. A gente sai juntos para curtir a noite.
- Mas cadê o Zé? Nem havia notado que está usando os sapatos dele?
- Não sei. Mas pode estar tendo diálogo semelhante com a Marina, depois de ela tropeçar num par de sapatos brancos na porta de entrada da casa deles.