A poesia popular brasileira perde o seu poeta maior - Antônio Gonçalves da Silva (março/1909-julho/2002),apelidado Patativa do Assaré.
A "indesejada das gentes" acertou as contas com ele na casa da Praça da Matriz de Nossa Senhora das Dores,padroeira de Assaré.E Deus recebeu a alma dele envolvida em poesia.
Há vinte e tantos anos morava ali.Viera da casa de taipa da Serra de Santana,nos confins do município,onde nascera e crescera ao cabo da enxada,na agricultura de subsistência.Meninote,teve meses de aulas pagas a um mestre-escola que lia soletrando.E só.Por esse tempo,sentiu "o borbulhar do gênio".Viviam fins de bom inverno.Tempo de Quaresma.No verso o perfil amaldiçoado de Judas;o chacotear dos conhecidos com a alegação versificada de deixarem o mato "comer"a roça;e,versejando,as brincadeiras em roda das fogueiras de junho.Uma festa!...No ano seguinte,miunça vendida compra viola.Repentista.Orgulham-se dele os conhecidos nos ajuntamentos festivos.A convite de parente,mete a viola no saco e ganha o oco do mundo.Vai bater em Belém do Pará.Lá firma-se a alcunha "Patativa",divulgada em jornal de Fortaleza.Por amor à terrinha,acrescenta o nome dela ao apelido. "Assaré!Meu Assaré!/Terra do meu coração!/Sempre digo que tu é/O mió lugá do chão!"
A saudade o manda de volta das terras do Norte para o Ceará.Serra de Santana o recebe.Aí ele cresce no verso.Faz cantorias.Encosta a viola.
Sua inteligência poética o levou aos píncaros da fama: seis livros publicados,reedições ("Cante lá que eu canto cá",Editora Vozes,está na 11ªedição);em discos e fitas recita;em filme é exibido nos cinemas;poemas são letras gravadas por famosos intérpretes da nossa música popular.Quatro universidades brasileiras o homenagearam com o título de "Doutor Honoris Causa".Estudam as suas obras aqui e no exterior.
A poesia de Patativa do Assaré,em versos de feição popular e linguajar caboclo,guarda forte conotação social.O sentido dela,em princípio,circunscrito ao Nordeste pela temática da seca,adquire abrangência e se dimensiona nacional com a questão dos "sem-terra", rendendo ao autor o qualificativo de "poeta dos oprimidos".
Sempre se disse despreocupado com a morte."Seria bem triste a sorte/e todos teriam medo/se a hora da nossa morte/não fosse um grande segredo."
Ao sair de internação hospitalar,onde chegara transido de dor: "Morte,você é valente,/O seu poder é profundo,/Quando eu cheguei neste mundo/Você já matava gente;/Eu guardei na minha mente/Esse seu grande rigor,/Porém,lhe peço um favor:/Para ir ao campo santo/Não me faça sofrer tanto,/Morte me mate sem dor."