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Cronicas-->Perdido na Metrópole (21) O dia em que Mafalda chorou! -- 18/06/2003 - 14:15 (Silvio Alvarez) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Perdido na Metrópole - Silvio Alvarez
Ilustração: Bruno César

Domingo. Esboço um acordar preguiçoso! O mundo não acabou. Não quero saber de nada além do conforto da minha cama. Desisto de acordar e sair dali.

Raios de luz em filetes intransigentes invadem sem permissão o único espaço só meu na face da terra. Tocaia. O edredom, campo magnético protetor, como em Jornada nas Estrelas, resiste e protege até mesmo meu rosto. Prossegue o ataque impiedoso.

Hoje não quero existir, quero dormir. Cada milímetro de minha carcaça corporal continua, feito manifestante do MST, firme sob a coberta fiel e aconchegante, protestando: - Este é meu lugar. Daqui não saio, daqui ninguém me tira.

Inusitadamente surge a sensação de que algo líquido toca o meu corpo. Balanço levemente a cachola. Com extremo desànimo e má vontade meus dois neurónios travam um longo embate. Àquela hora da manhã? Duas da tarde. Concluem que seu amo (eu) deixara na noite anterior, inconvenientemente sobre a cama, uma caneca a la Jó Soares com capuccino pela metade. Neste momento o líquido ítalo-tupiniquim encharcava o colchão semi-ortopédico, agora aquático. Desastre. Levanto bruscamente em meio ao mar cafeinado. Por que comigo? Nado até a janela para abri-la.

Noto algo estranho em minha kitchenette. Tudo tão quieto. Ligo o Adilsom, o rádio. Nenhuma palavra. A Mafalda, a geladeira, em silêncio. O Epaminondas, o forno microondas, sem piscar as tradicionais e minúsculas lampadinhas verdes. O que está acontecendo? É o apocalipse? O interruptor também não corresponde. Chuveiro? Frio! Quase sem forças admito estar sem força a força. Visto as primeiras peças que encontro. Desço seis andares a pé. O zelador, senhor Santos, com um jeitinho amuado todo sem graça informa que a companhia de energia era a responsável por uma falha técnica. Cortaram um cabo subterràneo que não era para cortar. E eu com isto? O pior ele deixou para contar em segunda instància. - O senhor não sabe, na hora que caiu a força queimou o motor do nosso elevador. O Meu elevador de filme noir parado? Sim!

Retornei à toca. Seis andares. Para subir nenhum santo ajuda, nem o Santos. Tudo bem! Aproveito o dia para desertificar meu colchão. Meu estómago implora por algo. O quê? Macarrão Instantàneo. Não. Tenho fogão de uma boca. Todavia, elétrico. Lasanha? Epaminondas inconsciente. Mafalda? Vazia. Bolachas? Não compro há séculos. Meu celular-tijolo reclama que sua bateria está no fim. Vou carregá-la. Como? Estou agora sem relógio e despertador também. Desço os seis andares. Almoço e janto um sanduíche big alguma coisa na padaria 24 horas. Subo os seis andares, convicto de que não deveria ter acordado.

Espremido no único canto seco do meu leito, desisto daquela fatídica jornada dominical. Hiberno!

Sete da manhã de segunda-feira. A Luz voltou! A vida é linda! A vida é bela! Adoro Éguinha Pocotó! Amo a Hebe Camargo! Mafalda e Epaminondas conversam animadamente. Bebo meu cappuccino quentinho! O Adilsom dispara eufórico: - Já sei namorar, já sei beijar de língua... - Quero sua risada mais gostosa. Este seu jeito de achar que a vida pode ser maravilhosa. Que a vida pode ser maravilhosa!

Vou trabalhar. Dois quilómetros para ir (de ónibus), dois para voltar (a pé). Volto cansado! Escalo os seis andares para descansar e... Descobrir que estava sem luz novamente. Por que? Desço seis andares.
- Cortaram a luz do senhor por falta de pagamento, diz Santos dando os pêsames. - Precisava pagar? Respondo. Esqueci este pequenino detalhe. Apenas dois meses. As contas ficaram escondidas e abandonadas no buraco negro que é minha inseparável mala 007. Apesar do nome tecnológico, não está gabaritada em lembrar pagamentos. Mala multimídia ninguém inventa.

Subo seis andares. Vou comer o que? Desço seis andares. Sanduíche big alguma coisa... Subo seis andares. Clima romàntico. Solidão à luz de vela. Mafalda está chorando encharcando a sala. O degelo! Enfim o degelo prometido há seis meses! Por livre e espontànea pressão o iceberg está finalmente derretendo. As lágrimas de Mafalda irradiavam felicidade.

Por falar em rádio, mesmo quieto, a silhueta do Adilsom no canto da sala faz lembrar uma de suas frases preferidas.
-Vivendo e aprendendo a jogar. Nem sempre ganhando, nem sempre perdendo. Mas aprendendo a jogar.

No dia seguinte paguei minhas contas com taxa de urgência e devolveram minha força. O elevador? Só um minuto. Desço seis andares. Tem uma placa informativa vermelha bastante sutil na porta. Quebrado. Subo seis andares.

Voltando ao dia da escuridão, uma certa tristeza tomou conta deste pretenso cronista. A sensação de incapacidade, frente ao problema, incomodou! Ao tremular da chama de uma vela solitária encosto meu débil esqueleto na Mafalda. Choramos juntos até de madrugada. Cúmplices deserdados, porém conscientes, da dependência energética planetária. Adilsom, ainda mudo pensou alto:

- Mas é claro que o sol...Vai brilhar amanhã!

Silvio Alvarez é assessor de imprensa da banda rock pop YSLAUSS, artista plástico de colagem e colunista. silvioalvarez@terra.com.br
Ilustração - Bruno César: brunoartes@uol.com.br
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