Brasília, 25/01/2005 – 15:37h
“O prazer nascendo dói tanto no peito que se prefere sentir a habituada dor ao insólito prazer.”
(Clarice Lispector)
A alegria que desconheço
dói-me tanto quando chega
que não sei muito se mereço.
Agarro-me àquela dor negra
que conheço há tanto tempo,
que já se tornou companheira.
Ela corta, mas já há tanto
que vem convivendo comigo
que quando o prazer me espanta
tão novo, desconhecido,
recorro de novo à dor.
Por confundida que estou.
Por medo de errar o tiro.
A alegria que desconheço,
o prazer que me é novo,
por costume, por pudor,
por espanto ou o que for,
me levam de novo a ela:
me amarram ao que já vi,
me prendem ao que já fui,
não me deixam ver quem sou.
A dor do prazer que nasce
é tão intensa e tão linda,
é tão grande que finda
criando-me um impasse
entre a dor costumeira,
a qual nos acostumamos
e a dor da alegria
que por tudo e até por nada
tantas vezes recusamos.
A dor do prazer nascendo
tem que se aceitar aos poucos,
é deixar a vida ir crescendo
no nosso jogo de loucos.
E não há escolha:
é a dor do prazer que raia
e a vida que dele vem
ou se cobre com a mortalha
e vai-se morrendo. Amém.
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