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Contos-->Vício -- 28/04/2004 - 15:45 (Bruno D Angelo) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
- Mas e aí? O que você falou pra ela?
- Nada cara. Nada!
- Como assim nada? Tem que ter uma continuação essa história.
- É, mas essa não tem.
- Peraí, você me chama pra conversar. Fala que tem uma “bomba pra me dizer”. A gente chega aqui no bar e você me conta isso!
- Você não achou sacanagem o que ela fez comigo?
- Não, achei, achei, mas tem que ter uma continuação.
- Como, se eu tô falando que não aconteceu nada depois.
- Mas você não bateu nela, não xingou, não esperneou, não chamou a mamãe?
- Por favor, não coloca minha mãe no meio.
- Desculpa. Mas o que aconteceu depois?
- Nada.
- Isso você já disse, mas alguma coisa aconteceu, ou você ficou congelado igual estátua.
- Ah! Eu saí.
- Saiu, simplesmente deixou o recinto?
- É.
- Puxa cara, depois de tudo o que ela disse, você só conseguiu ter essa reação. Que sangue de barata!
- Só porque eu não reagi, não quer dizer que eu não sofro. Eu tô sofrendo. Só que as pessoas são assim: umas brigam, outras choram, tem até aquelas que perdoam, eu simplesmente saio.
- Simplesmente... sai.
- ...
- Nossa, se fosse comigo juro que ela iria ouvir “poucas e boas”. Iria mostrar como ela é uma ingrata filha da mãe, uma hipócrita degradante. Um ser humano na última escala dos seres humanos, aquela desgra...
- Calma cara, calma! Isso aconteceu comigo, não com você.
- Desculpa, você é meu amigo do peito e eu prezo pelos meus amigos.
- Obrigado.
- ...
- ...
- Então, mas isso foi quando?
- Já não te falei, foi hoje de manhã, antes dela sair para trabalhar.
- Que puta! E jogou isso na sua cara assim, antes do galo cantar?
- É cara, foi assim mesmo.

O garçom chega trazendo os pedidos: uma cerveja pra cada. Eles agradecem e se preparam para beber.

- Peraí! Antes vamos fazer um brinde.
- Brinde? Eu não tenho motivo para brindar.
- Puxa cara, que desânimo. Sempre se encontram motivos para brindar.
- E o que você sugere?
- Deixa eu pensar...Vamos ver... Ah! Já sei! Vamos brindar a você, que finalmente descobriu a verdadeira cobra que ela era.
- Tá bom.
- Tim Tim!
- Tim Tim!
- ...
- ...
- Assim que eu gosto. Geladinha!
- Sabe... eu tenho que te contar uma coisa.
- O quê?
- Então...
- Desembucha!
- Então, eu não descobri a cobra que ela era.
- Não entendi (engasgando).
- Bom. Hoje à tarde, antes de combinar essa cervejinha com você, eu liguei pra ela. A gente conversou e... a gente se perdoou.
- Como assim?
- É! Eu continuo com ela.
- Não é isso. Como assim, a gente se perdoou? Que eu saiba, só ela te devia desculpas.
- Isso foi no calor do momento. Depois, eu ponderei e percebi que boa parte disso que acontece comigo é culpa minha.
- Não é preciso ser nenhum gênio pra saber disso. O que não quer dizer que ela não seja uma grandessíssima filha da
- Epa! Epa! Epa! Vamo com calma. Ela ainda é minha mulher.
- Desculpa.
- ...
- Eu não entendo! Eu juro que não entendo. Por que você me contou tudo e me fez acreditar que estava puto com ela, se você não estava?
- Quem disse que eu não estou. Claro que eu estou. Só que eu preciso dela, como sei lá ... a tempestade da bonança.
- Cara, você é maluco, só pode ser isso.
- Não sei, não sei, isso eu não sei. Talvez eu seja. Eu só sei, que tem essa coisa dentro de mim quando ela chega perto. Não é amor. Não é paixão. Não é desejo. É uma necessidade.
- Eu li que toda necessidade nasce de um desejo.
- O quê?
- É. Eu li isso num livro do Nietzs
- Corta esse papo vai. Eu não quero filosofar agora.
- Tá bom. Mas você tem que reconhecer que a sua situação é um dilema filosófico.
- É.
- É.
- Vou terminar essa cerveja e vou indo.
- Eu vou ficar mais um pouquinho. O bar só fecha as duas.
- Beleza. Já vou indo.
- Tchau!
- Tchau!

O amigo ficou num bar de esquina. Sozinho em uma mesa, cercado por muitas outras recheadas de burburinhos. Deve ter ficado ali horas. Para ele, apenas uma piscadela de olhos. Quando os abriu outra vez, não havia mais tanta gente. Ele e um bêbado lambendo o cachorro que dormia na sarjeta.
Aquela história ficara cravada em seus pensamentos e por mais que divagasse, divagava pensando no que o outro lhe havia contado. Pelo menos era o que se certificava quando subia a superfície da consciência. Eram amigos de longa data e desde que o parceiro de noitada começara a namorar, suas noitadas ficaram sem parceiro. Ele se tornara um homem só. E só ficara.
Embora soubesse que um homem precisa aprender a ser só, aquilo de se sentar a beira do abismo e conversar com ecos já não lhe agradava mais. Nunca lhe agradou. Era nisso que pensava, ali, absorto e incomunicável. Talvez quisesse a briga do seu amigo com a namorada. Talvez quisesse ter o passado de volta. Mais uma vez ficava sem respostas
Ele também não entendia muito, o porquê da necessidade doentia do amigo para com a quase esposa. Só sabia que as coisas não eram tão simples quanto pareciam e nem tão complexas. Mas, o que ele podia fazer? Nada. “Todas as pessoas tem vícios”, chegou a essa conclusão quando caminhava de volta para casa. Sozinho, observava o dia amanhecer.
Todas as pessoas são viciadas. Umas necessitam de Deus, outras de um psicólogo e de um amor. E tudo isso vem do desejo de não se sentirem sozinhas. Mas, o que há de tão horrível assim em ser sozinho? Não sabia e se entregou ao cansaço de uma noite passada em claro. Veio uma vontade de chorar. Chegou em casa. Abriu a porta e viu o apartamento vazio, mais uma vez.


Por Bruno Moreira
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