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Contos-->O Fatalista -- 28/04/2004 - 15:48 (Bruno D Angelo) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Após 2 relacionamentos fracassados, dos quais saiu com um imenso rombo no coração, Bernardo pensava em desistir de tudo. Já se imaginava trancafiado em um mosteiro, servindo a Deus. Cuidando do jardim, indo dormir cedo e vivendo pacificamente. Longe de tudo e de todos, principalmente das mulheres. Mas, ele encontrara aquela garota no cinema, já havia ficado com ela uma vez há meses e todo aquele seu medo desapareceu. Ficou com um sorriso no rosto e dias depois já andava de mãos dadas com a menina pelas ruas do bairro.
Mas voltemos ao início. Quando todo esse trauma começou. Voltemos ao primeiro amor, ao primeiro chifre e a primeira decepção amorosa.

Primeiro Round
O namoro durou 2 longos anos e três meses. Digo longos anos, pois ele mesmo não suportava a criança. Começou a namorar por comodidade e por comodidade foi se deixando ficar. Mas, o convívio direto causa dependência e aos poucos Bernardo foi se afeiçoando a menina. Ela se chamava Heloísa. Miúda, de traços fortes, Bernardo simpatizou com ela no começo, mas o namoro, o namoro foi um engano, coisa de jovem com carência afetiva, ávido por uma companhia. A garota tinha uma voz mansa, fininha. Ela era um tanto chatinha, bem chatinha, coisa que Bernardo só foi perceber depois de seis meses de namoro e aí já não adiantava mais. Sentiria falta de sua voz, se a largasse.
Certa vez, tomando um banho, entre uma ensaboada e outra, pensou:
- É a mulher da minha vida! Sou feliz com ela, só não queria ver.
Foi obstinado contar tudo a ela. Já via os olhos de Heloísa brilhando por saber que ele a amava tanto. Estava com o ar dos apaixonados. Não andava, saltitava de alegria e felicidade. As crianças brincando nas ruas deixaram de lhe causar impaciência e aos seus olhos todas pareciam lindos anjinhos: “Como são puras nessa idade”.
Ao chegar no local marcado, uma estação de metrô, a garota já estava lá, esperando impaciente ao lado das catracas. Ele nem se ligou, estava louco para contar a velha novidade. Esperaria o momento certo. Antes precisavam decidir para onde iriam:
- E aí, vamos para onde?
O que ela friamente respondeu:
- Não sei, preciso te falar um troço antes.
Bernardo já aflito, a interpelou com força:
- Fala, desembucha, o que foi? O que pode ser de tão grave? Alguma morte?
E brincando soltou a pérola:
- Ou será que você me traiu?
Batata! Heloísa não conseguiu disfarçar o constrangimento, a confissão ficou estampada em sua fisionomia e consentiu chorando:
- Foi um erro, desculpa!
Ele parecia não entender: “Aconteceu isso mesmo? Eu não acredito! Eu não acredito!”. A garota tentava amenizar a situação, mas a cada fala sua, a bola de neve crescia: “Foi apenas um beijo, apenas um beijo. Eu ainda gosto de você.”
Bernardo, um sujeito manso por condição, não reagiu. Não xingou, não a esbofeteou, não fez nada. Simplesmente, saiu caminhando em direção a sua casa. Não chorou também, nem depois que estava longe dos olhos alheios. Engoliu a seco a bebida amarga da decepção, pela primeira vez.
Os dias se passaram. Uma vez ou outra, Bernardo e Heloísa se trombavam. Depois de se esbaldar com outras mulheres, ele até tentou uma reconciliação. A garota foi cruel:
- Eu não! Agora que eu aprendi a viver sem você. Vê se me esquece!
Além de corno manso, Bernardo ainda conseguiu sair mais por baixo ainda do relacionamento. Como sofreu o coitado. Os amigos tinham até pena e não economizavam frases feitas para animar o companheiro: “Sai dessa Bernardo! A vida é assim mesmo. Um dia você tem tudo, no outro, nada”. “Ah meu! Mulher é igual a ônibus, você perde uma, mas logo atrás vem outra”. Nada adiantava. O homem ficou irreconhecível. Ele que sempre foi o palhaço da turma, chorava até em final de piada.
Aos poucos foi retomando a vida normal. Já não chorava mais e até ficava com algumas mulheres. Mas não era a mesma coisa e Bernardo sabia que nunca seria. As saudades apertavam constantemente. Ele precisava de um novo romance para se refazer daquele. Ele precisava de uma garota que lhe fizesse esquecer toda a merda em que tinha afundado.
Um sábado, seu amigo Aníbal ligou:
- Vamos a um churrasco da firma? A mulherada vai comparecer em peso! E aí, o que me diz?
Bernardo não queria aceitar o convite, mas a insistência do amigo foi tanta, que ele acabou acatando a intimação:
- Está bem. Mas voltou logo.
No churrasco encontrou Julia, e entre espetinhos de carne e de frango, acabaram rolando uns beijinhos, uns amassos e ele que pretendia voltar cedo, acabou prorrogando sua saída. No final, trocaram números de telefone e prometeram se ligar:
- Você me liga, ou eu te ligo?
- Ah! Você me liga!
- Não! Você.
- Não! Você.
E por aí foi. Quem os visse ali de longe, não esperava o porvir. Pareciam dois adolescentes retardados.

Segundo Round

Julia era assim, de formas arredondas. Mas isso nunca foi problema para Bernardo, ele sempre gostou das rechonchudas, as quais chamava pelo singelo apelido de fofinha. Com Julia não foi diferente. Era “fofinha isso” “fofinha aquilo”. Os amigos viviam rindo as escondidas.
Durante seis meses foram extremamente felizes. Juliana não via defeitos em Bernardo e vice-versa. A mania de tirar meleca do nariz em público dele passava em branco aos olhos de sua fofinha, e as roupas bregas, que ela costumava vestir, eram fashion diante da cegueira apaixonada do rapaz. Certa noite, eles decidiram sair com os amigos em comum. Bernardo e seus camaradas chegaram primeiro no bar. Quinze minutos depois, apareceu Julia e a patota feminina. As meninas estavam encapotas, mas elegantes, próprias para o frio de agosto e Julia, bem, estava um tanto quanto chamativa: blusão rosa-choque; saia azul turquesa e meia calça amarela. Além do sapatinho vermelho que dava o tom. O bar parou. Os amigos de Bernardo explodiram em gargalhadas disfarçadas. Ele apenas exclamava:
- Você é a mulher mais linda da noite. A mais linda com certeza!
Bem. Após seis meses, Bernardo já dava sinais de cansaço. O relacionamento estava desgastado. Os defeitos dela já não eram mais qualidades. Julia, apesar de sentir a decadência da relação, demonstrava estar mais apaixonada que o outro.
Ainda não era insuportável e o namoro se arrastou durante três intermináveis anos. Durante esse tempo, os amigos do casal presenciaram brigas escandalosas dos dois. O clima costumava ficar pesado quando eles estavam juntos. Sexo, puro sexo, era o que mantinha Bernardo e Julia unidos. Ele gostava de trepar com sua fofinha. Da parte dela, parecia ainda brilhar alguma fagulha de paixão.
Ao deixá-la em casa as 4h00 da madrugada, depois de voltar do motel, Julia tomou coragem, respirou fundo e fez a fatídica pergunta:
- Você me ama?
A pergunta se transformara em carne de vaca nos lábios de Julia. Era a quinta vez na semana que Bernardo a ouvia. Mas dessa vez, algo parecia ter mudado. Ao olhar atentamente para os olhos azuis de sua fofinha, ele sentia que dessa vez a pergunta traria conseqüências devastadoras. E tudo dependia de sua resposta. Sim ou não. O rapaz refletiu um pouco e durante alguns segundos tudo ficou em silêncio. Até a quietude ser entrecortada novamente pela indagação da menina:
- Então, você me ama?
Bernardo respondeu com um profundo e sucinto pesar:
- Lamento, mas há tempos não te amo.
E foi mais cruel:
- Sabe! Eu gosto de você, de transar com você, mas não te amo.
Era primeira vez que Bernardo lhe proferia aquelas palavras. Há meses, ele vinha angariando coragem sei lá de onde para contar toda a verdade, mas sempre ia se deixando ficar, se acomodar, se deixar levar pelo tempo e pela mediocridade.
Julia mostrou uma decência e abnegação que desancou o rapaz. Enxugou as lágrimas que saiam aos montes e sussurrou em seu ouvido:
- Tudo bem meu amor. Um dia você vai me amar.
Deu-lhe um beijo na bochecha vermelho- vergonha e saiu com a elegância das gordinhas. Fechou suavemente a porta do carro e sem olhar para trás caminhou para seu prédio.
Apesar da situação estranha, as coisas não podiam estar melhores para Bernardo. Estava tudo em pratos limpos. e no final das contas ainda tinha o amor da namorada. Podia não amá-la, mas a garota já havia se tornado peça do seu cotidiano. Sentiria muita a ausência dela, como sentiria de uma orelha, se essa viesse a faltar. Quando entrou no apartamento, aquela noite, Julia sabia que o namoro estava acabado. Mas antes iria cumprir a promessa. Bernardo ainda amaria. Deitou na cama e não dormiu, pensando na melhor forma de se vingar.
No dia seguinte, o rapaz voltava do almoço quando viu aquela cena bizarra. Aos olhos das vizinhas fofoqueiras, Julia se esbaldava com os beijos de Ernesto, um amigo de infância da moça. Bernardo quis vomitar, mas não fez nada pela segunda vez. Atônito só conseguia falar:
- Eu mereci! Eu mereci!
E Julia conseguiu o desejado. Nunca, Bernardo amou tanto uma pessoa como naquele momento. No mais, todos já conhecem. Ele agora, todo apaixonado quis voltar e ela mais mulher do que nunca o enxotou, como se enxotam cães vadios. A vida passou. Bernardo quis se suicidar, mas não era forte o bastante e nem fraco o suficiente. A vida passou e Bernardo não. Era o mesmo de dois anos atrás, fixado em Julia. Mas aí, veio um beijo, um simples beijo em Maria e ele julgou ter encontrado a mulher de sua vida novamente. Depois veio o cinema, o reencontro e agora, os dois, Bernardo e Maria, andam de mãos dadas pelas ruas do bairro.

Terceiro e último round

Maria era a mais linda das três. Moreninha de cabelos pretos, olhos puxados e lábios pequenos que lembravam pequenos morangos, tinha a alma livre e temperamento arredio. Não foi à toa que Bernardo caiu de quatro por ela. Namoravam há apenas um mês e o rapaz a pediu em casamento. Ela aceitou sem grandes rodeios. Estavam em março e o casório fora marcado para meados de maio. Não podia ser mais ridículo. Não podia ser mais romântico, casar no mês das noivas.
Tudo ia bem, muito bem, e eles agradeciam. Maria, garota segura, sempre teve certeza do que quis. Quando encontrou o homem da sua vida, se envolveu e pronto. Bernardo tinha medo, mas perto dela, sentia-se um filhote no colo da mãe. Mais seguro, impossível. Porém, durante uma sessão de cinema, lembrando-se de um nome, sem pretensão alguma, Maria deu o visto para relação entrar no inferno:
- Lembra do Ronaldo?
Bernardo prestando atenção no filme, indagou com displicência:
- Ronaldo, que Ronaldo?
- Um rapaz, colega seu. Trabalha no departamento pessoal. É psicólogo.
Percebendo que ela sabia muito da vida de tal homem, Bernardo deixou pra lá o filme e deu atenção restrita a Maria:
- Hum! Ronaldo? Um magrelo loirinho, com um sorriso de bobo?
A garota detectando uma ponta de ciúmes na voz , provocou:
- Ah! É esse mesmo, mas ele não é magrelo e o sorriso dele é bem simpático.
Bernardo esbugalhou os olhos de ciúmes, Maria logo emendou:
- Mas nem se compara com o seu sorriso, meu deus grego!
Ele relevou as brincadeiras da noiva e prosseguiu com a conversa, agora mais interessado ainda:
- Então. Por que você lembrou dele?
- Dele quem?
- Do Ronaldo, oras!
- Ah! Por nada, é que antes de namorar você, eu quase o namorei. Por pouco, você já não me pega com ele.
- Que história é essa Maria?
- Bobagem, meu bem. É que você não me dava bola sabe, mas agora isso já é passado e você está comigo e eu só tenho você no meu pensamento.
Bernardo achou toda aquela conversa muito estranha, mas esqueceu o diálogo por hora. No dia seguinte, ao chegar no trabalho, deu de cara com Ronaldo e a conversa de Maria na noite anterior veio à tona. Pronto! Obcecado de ciúmes, Bernardo observou o rival do passado durante todo expediente. Agora, Ronaldo já não parecia tão magrelo e seu sorriso não era tão bobo assim.
Ao chegar em casa, a figura de Ronaldo ficou zanzando pelas idéias de Bernardo. As poucas palavras proferidas por Maria sobre ele e o encontro daquela manhã no escritório foram suficientes para despertar no rapaz a velha insegurança e medo de ser trocado novamente por outro. Mas dessa vez não havia motivos. Ele nunca havia amado uma mulher como amava Maria. Sabia os defeitos de sua noiva, mas os adorava tal qual adorava sua pele, seus cabelos e seu sorriso. Ligou para ela:
- Oi Maria. É o Bernardo, tudo bem?
Ela, com voz de quem foi acordada, balbuciou algo:
- Bernardo, meu filho. São 3 horas da manhã, o que você quer?
Afoito, o rapaz respondeu perguntando:
- Nada, só quero saber se você me ama?
- O quê? Claro que te amo. E muito
Tu!Tu!Tu!
Após o telefonema Bernardo foi dormir mais tranqüilo. Maria não entendera nada. Achava que o namorado estava ficando louco. Três dias depois do ocorrido, o rapaz caminhava alegremente pela rua em direção ao prédio em que a noiva morava, quando a viu em frente ao portão do edifício conversando com Ronaldo. Um pouco perdido, um pouco atordoado, esgueirou-se até uma árvore e se escondeu atrás dela. Ficou espiando, espionando. Não conseguia ouvir as palavras que um dizia para o outro, mas tentava adivinhar por meio da leitura de lábios. Não conseguiu. Que diabos, nunca fora bom nisso!
Bernardo estava constrangido ali, naquela posição. Espionando a própria namorada, como se ela fosse uma criminosa. E não era? Por que precisava ficar conversando horas com um rapaz quase desconhecido? Afinal ela tinha namorado. Não houve contato corporal entre os dois, a não ser um beijinho no rosto no final do papo, mas a cada sorriso que Maria dava para Ronaldo e a cada olhar que ambos trocavam, Bernardo sentia uma estocada no coração. Nunca mais fora o mesmo. Passava as noites acordado, insone. Falava pouco no trabalho, falava pouco com a noiva. Ensimesmado, fechado em seus pensamentos, tentando achar uma solução para o maior de seus problemas, Bernardo dizia consigo mesmo: “Não serei corno novamente, não serei!”.

Jogando a toalha

Na véspera de seu casamento, Bernardo pediu emprestado um revolver para um amigo seu. Ele disse que era para assustar uns moleques que viviam enchendo sua paciência com brincadeiras em frente a sua casa. O amigo sabendo do temperamento dócil do rapaz entregou-lhe a arma sem pestanejar. Na mesma noite, Bernardo descobriu o endereço de Ronaldo e foi até lá. Com o pretexto de lhe entregar umas papeladas do trabalho, o rapaz conseguiu subir facilmente aos aposentos do psicólogo.
Duas da manhã, Bernardo bate na porta de Maria e grita fora de si:
- Maria! Maria! Abre esta porta agora! Abre esta porta, se não eu arrombo!
Ouvem-se os passos de Maria dentro do apartamento. Pelo olho mágico, ela reconhece o futuro esposo. Abre a porta com um ar mais assustado do que surpreso. Olhando as faces transtornadas do rapaz, pergunta:
- Bernardo, o que aconteceu? Por que está aqui a esta hora, o casamento é só amanhã.
O rapaz quase chorando responde:
- Não vai haver mais casamento Maria! Não vai a ver mais casamento. Acho que foi um erro, mas foi a única solução que eu encontrei.
Ao ver a arma na mão de Bernardo, Maria já pensa o pior:
- O que você fez Bernardo? Por que não vai haver mais ...
Parado em frente à porta de Maria, Bernardo nem espera a ex-futura noiva terminar a pergunta e puxa de trás da parede um homem todo amarrado e com uma mordaça na boca. Maria grita:
- Ronaldo! Mas, Bernardo o que você fez? Por que você trouxe....
Bernardo a interrompe novamente:
- Eu não fiz nada com o seu amado. Ele está intacto, só tive que usar a arma, as cordas e a mordaça, porque ele não estava querendo vir até aqui.
Maria sem entender nada, indaga novamente:
- Mas Bernardo, o que você está dizendo? Amado? Meu amado é você Bernardo. Só você.
- Tanto faz Maria! Eu só sei que eu não posso viver assim, com a sombra de mais um chifre a rodear minha cabeça. Por isso, fiz a gentileza de antecipar os fatos. Já que vai ficar com ele, fica com ele agora e não depois do casamento.
Dito isso, Bernardo sorriu, deu meia volta e desceu as escadas rumo à saída do prédio. Enquanto da janela de seu apartamento, Maria gritava desesperadamente por seu nome, o rapaz andava tranqüilamente pela rua., agora sem medo, sem paranóia, sem qualquer preocupação de que um dia poderia levar outro chifre.


































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