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Roteiro_de_Filme_ou_Novela-->CIÚME E MEDO -- 17/08/2006 - 10:54 (divino antonio de sousa) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Ciúme
& Medo

Um romance de Divino Antonio de Souza













PREFÁCIO


A instrução acadêmica de Divino Antonio foi concluída em colégios públicos, pois foi no seio de uma humilde família que surgiu esse talento. Após familiarizar-se com as letras, ele começa a trilhar caminhos do mundo literário, folheando e lendo livros dos romancistas: Rachel de Queiroz, Jorge Amado, Paulo Coelho, entre outros. Divino então percebe que tinha sua própria história para contar, relatando fatos da sua infância, como ocorreu a paralisia de suas pernas, que sua vida registrava momentos que refletia sentimentos de dor, alegria, amor e coragem. Escreveu sua biografia e não pára mais de escrever, esse é seu quarto romance. O escritor revela que sua imaginação flui e cria diversos personagens que se ajudam num enredo.
CIÚME E MEDO, nesse romance o autor se supera em dramatização dos conflitos entre seus personagens, arrancando do leitor, risos, choro e todo tipo de emoções. Divino tem a forma certa para satisfazer a preferência dos leitores, até mesmo dos mais exigentes. Fica caracterizada neste livro a profundidade dos sentimentos que o escritor transcreve em seu personagem de nome Sérgio, que após sofrer um terrível acidente de moto fica paraplégico e mergulha em um desespero total, julgando que sua vida não tem mais sentido. Porém, felizmente Sérgio encontra em um amigo o apoio necessário para continuar vivo. Outro fator importantíssimo é que ele é agraciado pela sua namorada, de nome Rosana; que mesmo depois dele ter ficado preso em uma cadeira de rodas ainda o quer como seu esposo.
Romancista como Divino Antonio são comparados como semideuses, pois são os criadores do seu mundo e dá vida para suas criaturas, não importa se é só em sua imaginação.
Obrigado Divino por ter escrito este livro tão fascinante, pois, história vinda de você mexe com a sensibilidade do leitor.


Mário Ribeiro Martins
Escritor






























Ciúme & Medo
Divino Antonio de Souza

Revisão
Jaqueline Meira

Diagramação e ilustrações
Michele Silva

Capa
Michele Silva
É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem a prévia autorização do autor.







Sumário
capitulos

1 - Dia de Aula 7
2 - O Presente 14
3 - O Acidente 22
4 - A Deficiência 30
5 - Fugindo do Amor 39
6 - A Festa 48
7- A Dança 60
8 - Jogo de Cartas 71
9 - Buscando a Verdade 82
10 - Reconciliação 109
11 - Farsa de Irmão 122
12 - Vítima Trocada 136
13 - Superando Barreiras 153



Agradecimentos:

Aos amigos que colaboraram na confecção desse livro deixo registrado aqui meus sinceros agradecimentos. Agradeço também, de forma especial, a minha mãe (em memória) e estendo a toda minha família minha gratidão.
Um abraço a todos os amantes da literatura.




















DIA DEAULA

Rosana despertara de um gostoso sono aquela manhã de verão, depois de bocejar, confere as horas e percebendo que já estava atrasada para ir ao colégio, se levanta e rapidamente se apronta para seu primeiro dia de aula. Era o dia que ela estreava na faculdade. Que emoção, novos amigos!
A moça é muito vaidosa. Diante do espelho da penteadeira ela se embeleza: exagera no batom e na sombra. Porém esse seu cuidado tem a justa causa, pois Rosana é realmente muito bonita: têm olhos esverdeados, cabelos pretos e lisos, dividido de lado.
Na companhia da família ela saboreia o café da manhã.
Sua família é composta pelo pai chamado Carlos Alberto, a mãe, Célia: costureira de mão cheia e seus filhos. Além de Rosana há seus irmãos mais novos: Daiane de 12 anos de idade e Danilo de 11. Rosana encontrava – se com 18 anos. Seu Carlos Alberto é microempresário, seus filhos são todos estudantes. Tem uma família bem estruturada e um lar feliz.
O ônibus escolar buzina lá fora, Daiane e Danilo dependem do ônibus para irem ao colégio. Rosana, por sua vez, tem seu próprio meio de ir ao colégio. O percurso de casa até a faculdade era feito em cima de uma bicicleta. A moça prefere pedalar, pois além de ser mais saudável, a bicicleta é sua fiel companheira. Em todo lugar que ia, Rosana utilizava a bicicleta e para a faculdade não seria diferente. O patriarca da família também sai da mesa, dá um beijo em cada membro da família e vai para o seu trabalho, em seguida é a vez de Rosana se aventurar no caminho para a faculdade. Mal termina seu café e lá vai ela para estrear – se como universitária. No centro da cidade de Anápolis - Go. Rosana dribla os carros em sua bicicleta, indo à direção ao colégio.

Foi engano de Rosana pensar que aquele ano de curso ficaria livre da desagradável companhia de Rodrigo. Rodrigo a cortejava há muito tempo, desde quando começaram a fazer o ginásio juntos, no mesmo colégio, na mesma sala e agora até na faculdade estava ele lá ao lado da moça. Infelizmente Rodrigo foi a primeira pessoa que Rosana viu na sala que iria estudar. Não havia nada entre eles, mas Rodrigo conservava um ciúme doentio pela moça. Para ele foi um enorme prazer saber que mais um ano passaria em companhia de Rosana, já ela não pensava o mesmo.
A turma é praticamente a mesma do ano passado, do tempo em que todos fizeram o ginásio, vestibular e agora faculdade. Nem um rosto estranho, que diferencia dos habituais. Rosana vistoria rosto a rosto para certificar se havia entre eles um novato, mas nada, todos já conhecidos. Que coincidência, a turma escolheu o mesmo curso!
Aqueles rapazes sempre misturam amizade com algo mais, por isso as meninas tinham que ser bastante vivas, senão eram vítimas das cantadas, das piadinhas dos rapazes. Havia casos em que eles disputavam a moça pretendida até no palito, ou de outras formas. Rosana sempre era a mais cortejada por eles, porém nenhum daqueles moços interessava Rosana, por isso os rapazes a consideravam arrogante.
Para falar a verdade, Rosana jamais teve um namorado que realmente gostasse, se bem que Rosana quase se casou com um moço de Goiânia - Go. Só não casou porque não se deixou ser induzida pela pressão de seus pais. Seu Carlos Alberto e dona Célia queriam de todas as formas casá-la com Fernando. O motivo pelo quais os pais da moça faziam tanto gosto pelo casamento, talvez fosse porque Fernando era o único filho herdeiro de uma grande empresa na Capital, além disso, era um conceituado advogado. Rosana suportou até o dia do casamento, bastou ela ficar diante do vestido de noiva para se dar conta do absurdo que ia cometer. Nesse dia ela acabou com tudo e não quis mais saber do casamento. De início os pais da moça condenaram essa atitude da filha, mas uma menina com tantas qualidades, tão prendada como Rosana, logo eles a perdoaram. Hoje essa página está virada e ninguém fala mais nisso.



Rosana viu um amigo entre aqueles rostos, o único amigo entre os estudantes: havia uma amizade sadia e sincera entre Rosana e Adilson, o nome do amigo.
Adilson era defensor da lei, o rapaz era policial. Trabalhava à noite, fazendo ronda pela cidade, no período da manhã estudava e à tarde, (como ninguém é de ferro), descansava.
No meio de uma aula de biologia Adilson entra na classe, interrompendo a aula, pede licença para o professor roubando a atenção de todos. Adilson não foi nenhuma novidade, a curiosidade da turma é aquele que trazia em sua companhia. Rosana não tira mais os olhos do estranho e pergunta a si mesma: “Quem será esse moço que está com Adilson?”.
Durante poucos segundos, Rosana que esta sentada na fila perto da parede na primeira carteira, fica a contemplar o desconhecido. O professor usa de sua autoridade e diz:
- Seu Adilson que esse atraso não se repita!
Adilson explica:
- Perdi a hora, desculpe professor!
Adilson ia tomar uma carteira vazia, sempre instruindo o amigo, mas o mestre ordena:
- Vamos aluno Adilson, apresente seu amigo à classe!
Diante de todo ele apresenta o amigo e diz:
- Esse é Sérgio, ele irá concluir o curso conosco.
- Seja bem - vindo Sérgio! - desejam todos em coro.
Sérgio meio envergonhado fala:
- Quero ser amigo de todos vocês! Podem ter certeza que vou me relacionar muito bem com todos, vou fazer de tudo para merecer de cada um aqui suas confianças e amizades. Certamente levarei boas recordações daqui!
O professor ajunta - se a ele:
- Não tenha dúvidas Sérgio. O fundamental aqui é o companheirismo e o bom relacionamento de todos. Sua carteira é aquela vazia ao lado de Rosana, pode se assentar.
Logicamente Sérgio e Rosana trocam algumas palavras:
- Oi!
- Oi!
Mas o que realmente trocaram entre si foram olhares desconfiados.

Naquela noite Sérgio lê um livro deitado em sua cama para atrair o sono. A leitura parece interessante, pois Sérgio esta bem concentrado no texto.
Assim eram quase todas as noites. Não tinha namorada e não fazia questão de ter, era por opção própria, pois além de ser um rapaz muito bonito era muito simpático e por isso não lhe faltava o assédio das mulheres. Namoradas no momento não estavam em seus planos. Ao contrário dele, era o irmão Alexandre, de dezesseis anos de idade, mais novo que Sérgio quatro anos. Alexandre insistia sempre com Sérgio para saírem juntos, irem às boates, às casas noturnas, se distrair em sua companhia. Alexandre acabava indo sozinho, Sérgio preferia ficar em seu quarto, lendo um bom livro. Isso combinava mais com ele.
Do mundo fantástico da leitura, ele foi despertado com um chamado ao telefone, o aparelho tocou três vezes, mesmo deitado Sérgio atende. No primeiro “ALÔ” que disse nada responderam, no segundo sim. Uma voz feminina do outro lado da linha diz:
- Por favor, eu quero falar com Sérgio!
Sérgio foi rápido em responder:
- É ele quem está falando.
Quando ouviu falar que era Sérgio, Rosana ficou tensa, empalideceu, por um instante perdeu a voz, Sérgio ignorava totalmente quem poderia ser, insistiu:
- Quem está falando? Alô?!...
Mas Rosana se revela:
- Oi Sérgio, é Rosana sua nova amiga da faculdade.
- Oi Rosana, que surpresa você me ligar, mas como soube o número do meu telefone?
Sérgio não entende porque aquela moça o ligara.
- Foi Adilson, ele também é meu amigo e conversando sobre você ele me passou o número do seu telefone, fiz mal em te ligar?
- Não, imagina! Uma voz tão doce como essa! Realmente foram poucas as palavras que nós trocamos na faculdade, mesmo estando perto de você o tempo todo.
Rosana argumenta:
- Acho que fiz mal interromper você, creio que foi burrice da minha parte te ligar, não pensei que poderia estar fazendo algo bem mais interessante, desculpe incomodar você Sérgio com esse telefonema.
- Olha Rosana, foi ótimo você ter me ligado, pois assim poderemos nos conhecer melhor e este telefonema veio mesmo em boa hora, porque agora tenho alguém para conversar.
Rosana pergunta:
- Você não tem namorada, nunca sai de casa com ela?
- Pode parecer mentira Rosana, mas ninguém me interessa nessa cidade.
- Ah, coitadinho! Estou morrendo de pena de você, aposto que metade das mulheres dessa cidade deseja você!
Sérgio libera uma risadinha e rebate:
- Que exagero Rosana, você sim, que deve ter os rapazes todo dessa cidade aos seus pés!
E aquela noite os dois conversaram bastante.

Alexandre tinha seu destino certo todas às noites. Sua boate preferida era a ZOON. Já nos fins de semana, havia uma casa de espetáculos que atraia não só Alexandre, mas boa parte da cidade de Anápolis, o badalado Jóquei Clube.
Os pais de Alexandre, seu Cabral e dona Dulce condenavam o comportamento do filho, pois apesar de ser menor de idade, Alexandre tinha um hábito não saudável, sempre se metia em confusões conjugais. Teve até o episódio no qual Alexandre se engraçou com uma mulher casada, foi um dos mais complicados disparates, entre muitos de Alexandre.
O relacionamento durou até quando o marido da coroa flagrou os dois numa cena de amor, aquele poderia ter sido o fim de Alexandre, só não foi porque este correu muito para escapar do homem. O apuro de Alexandre deveria servir de lição pra ele, mas pelo contrário, não se amedrontou.
Se aquele homem pega Alexandre certamente ele seria triturado, pois o marido da mulher era um troglodita.

Já quase rompendo o dia, era que Alexandre chegava em casa, de pileque é claro. Aquela noite não foi diferente. Sérgio estava mergulhado em profundo sono, mas tem o sono esvoaçado, e lá fora Alexandre o chama:
- Sérgio, oh Sérgio, abre aqui...
Não restavam dúvidas, era o irmão, pensava Sérgio. Teimando com o corpo, Sérgio levanta e vai a socorro de Alexandre, que entra mesmo pela janela do quarto. Alexandre não continha o riso sem motivo, sempre era assim, mas estava demais aquela noite. Auxiliado pelo irmão, Alexandre é conduzido à sua cama. O beberrão só sabia contar vantagem em suas aventuras noturnas, mas nem forças para tirar os sapatos ele tinha. Deita - lo não foi difícil, difícil mesmo era ter que ouvi - lo falar sem parar palavras mal coordenadas. Sérgio usou de paciência, até que o irmão apagara de vez e ele também pôde dormir.

























O PRESENTE

O pai de Sérgio, seu Cabral, dando conta da dedicação do filho nos estudos e o seu desempenho no trabalho, resolveu presenteá - lo. Seu Cabral era proprietário de uma loja de autopeças, mas era Sérgio que dirigia os negócios, pois seu pai já estava quase aposentado, ficava mais em seu sítio, nas proximidades de Corumbá em Goiás.
Há muito tempo o patriarca da família queria retribuir o esforço e a responsabilidade do filho. Economizou a quantia necessária e realizou o desejo do filho. Naquele dia, quando a família estava reunida na sala almoçando, seu Cabral, como sempre estava no sítio. De repente, sem que ninguém esperasse, o mesmo adentrou alegremente à sala e após cumprimentar a esposa e os filhos, participa também do almoço e em seguida diz limpando a boca com um guardanapo:
- Quero fazer um brinde a vocês meus filhos... E falou do amor que sentia pela família, do quanto confiava em Sérgio à frente dos negócios da microempresa. Falava até com certa emoção na voz. Abraçado com Alexandre, ele chamou Sérgio e dona Dulce para acompanhá-lo até lá fora, sem entender, a família o acompanha, Alexandre sempre abraçado com o pai. Em cima de sua caminhonete estava uma linda motocicleta modelo XL, preta metálica com faixas douradas, novinha que dava gosto olhar. Do bolso da calça seu Cabral tirou a chave, entregou - a a Sérgio e emocionado com o brilho nos olhos do filho, disse o pai:
- Esse é o presente que te prometi, você merece isso e muito mais meu filho, aqui está a chave, pegue!
Sérgio, também comovido diz:
- Pai, não acredito que o senhor fez isso! Pai, não precisava! - e abraçou seu pai.
Seu Cabral advertiu o filho;
- Desfrute dela com cuidado, pois a bicha é muito rápida. Sérgio essa moto é a recompensa por você ser tão ajuizado, você é um filho de ouro!
Alexandre demonstrou que estava com inveja do irmão. Uma bobagem, certamente ele ia dar uma voltinha na moto.
A família estava fascinada com o gesto de seu Cabral. Sérgio, não suportando ficar só olhando, desceu a moto da carroceria da Ford, aciona a ignição da moto e sai em disparada para estreá-la. Sua mãe lhe recomenda:
- Tenha cuidado Sérgio!

Sérgio e Rosana ficaram grandes amigos, amizade que prometia quem sabe um futuro compromisso. Já havia passado alguns meses que Sérgio e Rosana se conheciam e para a casa dela Sérgio conduziu a moto. Na casa da moça ele parou a moto no portão e fez o convite. Rosana sentia por Sérgio uma atração, porém secreta. Sérgio também dava a entender que sentia o mesmo, no entanto ambos não deixavam transparecer seus sentimentos.
Rosana não pensou duas vezes, montou na garupa e os dois cortavam a cidade. Não tinha nada mais alucinante para Sérgio do que passear de moto com Rosana, não era diferente para Rosana, que percorre suas mãos no peito peludo do rapaz, provocando certa sedução. Contudo Sérgio se mantém bastante concentrado na direção, mas sua atenção estava voltada para a maneira de como a moça o apertava. Sem perceber Sérgio cruzou com Rodrigo. A cena de Sérgio e Rosana na moto provocou ciúmes em Rodrigo, o rapaz ficou muito revoltado.
A partir daquele dia Rodrigo passou a sentir um ódio obsessivo por Sérgio. Para ele, Sérgio e Rosana estavam namorando. Rodrigo começou a pressionar Sérgio na faculdade. De amigo, Sérgio passou a ser visto como rival do rapaz. Sérgio não entendia porque Rodrigo estava tão indiferente com ele, então um clima tenso se instalou entre os rapazes. Sérgio questionava Rodrigo o por quê de sua mudança com ele. Rodrigo jamais o respondia.

É, Rodrigo estava certo, Sérgio e Rosana estavam mesmo apaixonados, só que ainda não estavam namorando, a amizade entre o casal se tornara muito íntima. Rosana jamais dava oportunidade para Rodrigo, pelo contrário, ela passara a sentir medo do rapaz, Rosana recebia ameaças de Rodrigo, não dizia para ninguém, mas Rodrigo fazia de Rosana sua vítima. Imagine que Rodrigo jurou que se Rosana não fosse dele não seria de mais ninguém, afirmou também para alguém que seria até capaz de matar se isso acontecesse.
Na intenção de ficar mais próximo de Rosana, Sérgio a convida para sair. Rosana há muito tempo esperava que Sérgio tomasse essa iniciativa. Sem dúvidas aquela seria a grande noite, noite que finalmente começaria o romance tão sonhado.
Na hora certa exatamente às 20h00min horas, Sérgio aparece na casa da moça, o rapaz caprichou no seu visual. Estava com o carro de seu pai, um Passat já velho. Do quarto, onde retocava a maquiagem, Rosana ouviu o chamar da buzina do automóvel de Sérgio, ansiosa ela se apressa em reforçar a maquiagem e vai ao encontro do seu príncipe encantado.
Sérgio primeiramente fez seu elogio à moça, Rosana realmente estava deslumbrante. Em seguida coloca em prática seu cavalheirismo: Abriu a porta do carro e disse:
- Madame!!!
Rosana sorriu e entrou no carro impressionada com finíssima cortesia do rapaz.
Os dois dançaram muito, falaram de suas preferências, de seus gostos, conversaram bastante, falaram principalmente sobre sentimentos íntimos naquela noite.
Passava das duas horas da manhã quando o carro que levava os pombinhos pára novamente na casa da moça. Sérgio desliga o motor e diz:
- Está entregue senhorita Rosana!
Ambos não conseguiam mais conter o desejo de se abraçarem e se beijarem. Mesmo já estando íntimos, ainda não haviam se entregado aos beijos e abraços.
Rosana não descia do carro, Sérgio não fazia questão que ela descesse. Havia silêncio entre eles, quebrando o silêncio, Sérgio disse:
- Foi ótimo sair com você, obrigado pelos bons momentos que você me proporcionou!
- Eu também gostei Sérgio. Bem, até amanhã! - Rosana abriu a porta do carro e ia saindo, Sérgio se encoraja de repente ele segura nas mãos da moça e ordena:
- Espere!
- Que foi!? Rosana estava tensa.
Os jovens fixam os olhos um no outro e os olhares falam por eles. Lentamente se aproximam seus rostos, até seus lábios se tocarem e saciam os desejos num beijo demorado.

Aquele período de faculdade transcorreu normalmente, todos levaram o curso muito a sério, até mesmo Rodrigo, todos tiveram uma honrosa formatura. Sérgio e Rosana tinham dois motivos para comemorarem: por concluírem o curso e por estarem apaixonados. No entanto Sérgio infelizmente fez um grande inimigo na faculdade, nem é necessário dizer o nome desse inimigo.
O colégio Couto Magalhães havia preparado uma grande festa para os formandos universitários, a festa também era de interesse de Sérgio, pois no meio da festa ele ia anunciar seu noivado com Rosana. Ele preparava essa surpresa para os amigos e até mesmo para Rosana, pois a moça não estava ciente de suas intenções.
Uma vez Sérgio e Rosana juraram que não importaria o que acontecesse, jamais iriam se separar, o amor entre eles estava selado, nada no mundo poderia afetar esse sentimento tão forte.
A noite da grande festa de formatura chegara. Todos os professores falaram um pouco. No local do baile montaram um palco e todos discursavam. Sérgio se mantém quieto ouvindo os pronunciamentos dos mestres, porém o rapaz estava um pouco trêmulo, mas ia falar. Decidido ele pede a palavra, sobe no palco e improvisa seu discurso, iniciando:
- Essa noite é muito especial para mim, não só porque terminei a faculdade, porém, muito mais pelo anúncio que quero fazer. Peço que me perdoem pela emoção, porém prometo que não vou chorar! Rosana venha até aqui, suba aqui no palco, por favor! Concluiu Sérgio.
Todos aplaudem quando Rosana sobe no palco.
Rosana fica ao lado de Sérgio sem entender o que esta acontecendo. Fica sorridente diante de todos. Sérgio segura nas mãos de Rosana e continua:
- Quando entrei aqui nessa faculdade, disse que faria bons amigos, pois bem, além das amizades que conquistei aqui, algo mais aconteceu comigo, algo que está me fazendo muito bem, quero que vocês saibam que foi nesse período de faculdade que me apaixonei de vez!
Rodrigo se perturba na cadeira onde estava sentado assistindo. Suas desconfianças foram confirmadas, por pouco não deu um basta naquilo tudo, se levanta da cadeira e ameaça barrar aquela cena, só não fez porque um amigo o impede.
Ainda no palco, Sérgio tira do bolso do paletó uma caixinha, exibe a todos os presentes. Olha para Rosana e pergunta:
- Quer ser minha mulher Rosana? Para sempre?
Rosana fica pálida, atônita, não soube o que dizer emocionada ela disse:
- Sérgio você é louco?
- Por você Rosana! Quer se casar comigo?
Os pais da moça, que assistem, não conseguem conter a emoção.
Ela olha para o público, meio desajeitada, ajeita o microfone e fala:
- Sérgio, eu não consigo ficar um minuto longe de você, eu te amo demais! É lógico que quero ser sua mulher!!!
Os dois se abraçam e beijam - se merecendo novamente aplausos, exceto o de Rodrigo, que esta se mordendo de ciúme, não sabe se conseguiria controlar - se.
Em seguida foi a vez de Adilson se manifestar. Já de porre ele se levanta da cadeira. O chato foi que ao se levantar Adilson deu uma vacilada e não consegue evitar que a cadeira fosse derrubada, os amigos rapidamente procuram apoiá-lo, ele por sua vez dispensa – os dizendo:
- Ôpa! Não precisa, estou bem pessoal, pode me largar que eu tô bem!
Sua voz também não era das mais nítidas, Adilson, no entanto não ligava para o vexame, estava feliz por Sérgio e queria saudar o estimado amigo.
- Quero... – continuou falando –... Somente dizer algumas palavras, palavras que expressam o que penso desse cara, do meu grande amigo Sérgio... – todos voltam às atenções para Adilson, mais atentos ficam Sérgio e Rosana, que ainda permaneciam no palco –... Sérgio para mim pessoal representa mais do que um amigo, ele para mim é um irmão, só Deus sabe a gratidão que tenho por esse cara, fico muito feliz com seu casamento com Rosana, que Deus abençoe vocês, sejam felizes!
E erguendo o copo com uísque, continua dizendo:
- Pode ficar certo Sérgio que aqui está um verdadeiro amigo seu e agora também seu, Rosana. Conte comigo, irei defender essa união, se caso alguém interfirir no amor de vocês vai se ver comigo, vou lutar para que ninguém roube sua felicidade cara, pois é muito importante para eu saber que você está bem! Parabéns para vocês!
Rodrigo não mais se controla, levanta da cadeira e se irrita, debochando e achando ridículo aquilo tudo, diz:
- Bravo! – começa a aplaudir – Estamos todos comovidos, não é pessoal? Menos eu, pois fiquem sabendo que esse casamento jamais se realizará, sabem por quê? Porque Rosana é minha! Você Adilson, não sabe o que diz, é um bêbado! Você se lembra da minha promessa Rosana? Ela continua de pé, ninguém vai te tirar de mim, se você não for minha, não será de mais ninguém! Hei Sérgio, fique sabendo que a partir de hoje somos rivais. Ouviu babaca? Se você insistir em ficar com ela, você está correndo sérios riscos!
Adilson parte para cima de Rodrigo, porém seus colegas o impedem. Rodrigo foi saindo do salão cheio de posse, com ar vitorioso. Sérgio às pressas desce do palco e se põe a correr atrás de Rodrigo dizendo:
- Hei cara, espere!
Adilson se coloca na frente de Sérgio e diz:
- Calma rapaz, não te disse que eu ia cuidar da felicidade de você e Rosana? Deixa que cuide disso.
Sérgio responde:
- É Adilson, acho que você tem razão, não é hora de tirar isso a limpo, não vamos estragar nossa festa.
Rodrigo era um dos formandos, mas a festa acabou para ele nesse momento. Ninguém mais o viu por ali. Rodrigo tinha personalidade forte, não sabia perder. Sérgio e Rosana estavam muito contentes, recebendo os cumprimentos de todos os presentes, mas no fundo estavam com medo, pois no fundo sabiam que Rodrigo não os deixaria em paz.

Adilson era um solteirão, tinha várias aventuras amorosas, compromisso mesmo não era para ele. Sua família morava em uma cidadezinha chamada de Abadiânia, no interior de Goiás. Seu pai trabalhava na lavoura.
Adilson tinha 30 anos de idade. Havia bastante tempo que ele morava na cidade de Anápolis. Aos 15 anos de idade fora para Anápolis concluir os estudos. Logo prestou concurso para ser policial e passou. Sonho de infância. Tornou-se um policial civil. Era um dos melhores policiais da corporação. Qualquer missão, que exigisse cautela, Adilson era convocado e com malícia e agilidade, (qualidades estas adquiridas exercendo a profissão), sabia resolver os mais difíceis casos.















O ACIDENTE

Rodrigo não era mais visto na cidade há dias, nem Sérgio nem Rosana sabiam de seu paradeiro. Que bom seria se Rodrigo nunca mais aparecesse. Com o desaparecimento de Rodrigo a paz vigorava entre o casal. Se aparecesse certamente iria infernizar a vida de Sérgio e Rosana, se bem que para Sérgio ele estava por perto arquitetando um plano para atrapalhar seu romance com Rosana.
O casamento fora marcado para o dia 10 de Maio do corrente ano, estava bem próximo o dia, pois já era mês de Abril do ano de 1990.

Parece que o destino era cúmplice de Rodrigo, porque Sérgio ia ser vítima não só de Rodrigo, mas também do destino.

Sexta – feira, dia de muita movimentação de fregueses na loja do pai de Sérgio, os dois irmãos, Sérgio e Alexandre se desdobravam para atenderem os clientes que ali entravam e saiam. A moto de Sérgio estava estacionada na entrada da loja, em baixo da sombra de uma pequena árvore na calçada. Tudo parece normal e tranqüilo. Sérgio não percebe, mas outra moto parou ao lado da sua e sem desligar o motor, o condutor da moto é bem rápido: tira seu capacete, desce da moto, mas não entra na loja. O motoqueiro que ali chegou não é outro se não Rodrigo. Rodrigo conhece que aquela moto estacionada à sombra da árvore é a de Sérgio. Rodrigo disfarça e tira da sua mochila um canivete, caminha em direção a moto de Sérgio e ninguém nota quando ele corta os cabos de ligação dos freios da moto do rapaz. Após executar seu sujo plano, monta em sua moto e sai em alta velocidade. Dentro da loja Sérgio está ao telefone atendendo um cliente e não percebe que lá fora o perigo ronda.
Obra do acaso ou não. Mas aquele cliente, que Sérgio atendia ao telefone, queria uma peça que não tinha na loja no momento, Sérgio, muito prestativo e para não perder o cliente, faz uma proposta, em consideração ao freguês e para preserva – lo, ele se propõe em ir à Brasília buscar a referida peça, já que na Capital do País ele tinha um amigo, que também era proprietário de uma sofisticada casa de autopeças, lá tinha tudo que o cliente precisava. Então ele iria à Capital Federal buscar a peça e logo estaria de volta com ela, o homem do outro lado da linha concorda em esperar por Sérgio.
Rapidamente Sérgio tomou algumas providências antes de sair para a viagem.
Talvez servindo de aviso, no momento que Sérgio caminha rumo a sua moto, uma viatura de polícia pára em sua frente. Era Adilson que passou na casa de Sérgio para tomar um pouco de água, também estava se dirigindo para Brasília. Notando a pressa de Sérgio, ele pergunta:
- Aonde vai cara, por que essa pressa?
- Estou indo para Brasília. Respondeu ajeitando o capacete.
- Espere, vamos de carro, vou só tomar um pouco de água lá dentro, também estou indo para Brasília.
- Não, é melhor ir de moto, estou muito apressado, tenho que voltar logo e não quero atrapalhar seu serviço.
Adilson lhe recomenda:
- Cuidado Sérgio, moto é muito perigoso, vai devagar!
Infelizmente Sérgio não aceitou a carona com Adilson e saiu em disparada com sua moto.
No centro da cidade a moto parecia uma beleza, não apresentou nenhuma anormalidade. Sérgio então pega a saída da cidade, logo depois já está na rodovia Anápolis / Brasília.
Depois de poucos quilômetros percorridos, os cabos dos freios arrebentaram de vez, Sérgio, no entanto não percebe que a moto está sem freios, o ponteiro, que marca a velocidade esta girando, acusando que a moto estava adquirindo mais velocidade. Sem saber ele ia de encontro a sua desgraça. O velocímetro atinge seu limite. A moto adquiri a velocidade de 130 kms por hora.
Porém no quilômetro 40, logo depois de ter passado pela cidade de Abadiânia, Sérgio depara com a fatalidade; vê em sua frente uma lombada, reduz o acelerador e aciona os freios, percebe que a moto não dá sinal de freio, o rapaz se desespera, era seu fim. Em certo ponto, a estrada era inclinada e uma longa descida Sérgio tinha pela frente, na descida a moto parece voar.
Sem tempo para raciocinar, ele dribla, com a moto os carros que tinha de ultrapassar, pois sua velocidade era superior a qualquer outro veículo. Sérgio tinha de fazer uma ultrapassagem perigosa, porque se aproximava muito rápido de um caminhão de carga. A carga do caminhão era bem alta e larga, tirando toda visão de Sérgio. Sem opção ele invade a pista contrária, sem chance de certificar se a pista estava livre, dá de cara com outro caminhão de carga. Para não se jogar de frente com o caminhão, ele joga a moto contra um barranco as margem da estrada. Sérgio evita um acidente frontal com o caminhão, porém não escapou de outro acidente. A moto subiu no barranco. O morro amorteceu a velocidade da moto, mas com o impacto da moto, batendo no barranco, Sérgio perde o equilíbrio e é lançado a uma longa distância.
A moto dá várias piruetas no ar e não tem mais serventia, vira sucata. Mas o que interessa é saber se Sérgio estava vivo. Podemos afirmar que sim, seu pulso confirmava que tinha vida. Todavia o acidente tinha característica de ser uma tragédia. Os carros foram parando, as pessoas se aglomeram em torno do acidentado e logo formou - se um tumulto. Seu corpo fica estirado no asfalto. Para alguns ele estava morto, mas Sérgio estava vivo, porém, inconsciente.
Adilson, que vinha logo atrás, ao passar pela multidão, resolveu parar, mesmo estando com pressa. Para a viatura e se informa com alguém:
- O que houve aqui senhor, por que essa gente toda?
- Um acidente de moto, parece que o motoqueiro morreu na hora.
Adilson estaciona a viatura mais adiante, desce do carro e vai conferir de perto o possível cadáver. Logo uma ambulância se aproxima do local, sua sirene esta acionada, por isso as pessoas saem da frente para dar passagem. Da ambulância desce uns homens de branco e com rapidez providenciam uma maca, colocando - a ao lado da vítima, removem o corpo do rapaz ferido para a maca. Adilson empurra as pessoas para chegar ao acidentado. O corpo de Sérgio esta todo ensangüentado e Adilson não consegue passar no meio das pessoas. A moto do rapaz ninguém soube onde foi parar, Adilson não vê a moto. Então fica perto da ambulância. Sua intenção era de conferir se o rosto do rapaz era de um conhecido, por isso espera o momento em que a maca fosse posta novamente na ambulância.
Na verdade Adilson esta muito impressionado, não descartava a hipótese de o acidentado ser Sérgio.
Quando os homens ergueram a maca de volta na ambulância, Adilson pede para esperarem, justificando que queria reconhecer a vítima, descobrindo o rosto do rapaz e constatando assim que realmente é seu amigo Sérgio. Nesse momento Adilson entrou em pânico, chora amargamente abraçado com o corpo de Sérgio. Suplicava-o:
- Não meu amigo, não faça isso comigo!
Os homens de branco não permitem que Adilson continue abraçado com a vítima, tinham pressa em remove – lo para o hospital. Para os homens fechar a porta da ambulância, voluntários tem que segurar Adilson.
A ambulância toma a direção de volta para Anápolis. Adilson não perde o veículo de vista, mesmo com os olhos marejados ele dirige a viatura, seguindo a ambulância.
Rodrigo era mesmo um desocupado. Universitário, boa aparência, era qualificado a exercer uma boa profissão. Mas “trabalho” nunca fez parte da sua vida. Também por que se preocupar? Seu pai, seu Messias era parlamentar, morava em Brasília aprovando e desaprovando leis na Assembléia Legislativa. Rodrigo tinha do pai uma gorda mesada. Seu Messias só ia a Anápolis nos fins de semanas para visitar a família. Dona Magda, a mãe de Rodrigo, acreditava que seu marido, não os levava para a Capital, porque seu Messias tinha outra família lá por isso evitava comentar com os outros esse assunto. Mas guardava isso só para ela. Seu Messias não ficava sabendo das ações do filho. Rodrigo manipulava sua mãe facilmente, ela não opinava em nada na vida do filho, mesmo porque Rodrigo não permitia palpite de sua mãe. Seu passatempo era desfilar pela cidade de Anápolis com um luxuoso carro, presente do seu pai.
Rodrigo teve um bom motivo para se alegrar naquela tarde. Quando dirigia, no centro da cidade, avistou a mulher que tanto o fascinava. Rosana trafegava na Rua Desembargador Jaime, caminhava para o ponto de ônibus, evidentemente para pegar o ônibus das 17:00 horas. Rodrigo vai diminuindo a velocidade do carro até pará - lo de vez em frente à moça. Ao perceber que o condutor do carro é Rodrigo, tenta disfarçar e foge dele, porém foi impossível ela escapar do rapaz. Era só Rosana se apressar, andando na calçada, para Rodrigo também avançar com o carro, ao lado dela.
Com a cara de cinismo Rodrigo pergunta para a moça:
- É só entrar aqui e dizer pra onde quer ir que eu te levo, prometo que não vou te tocar!
Rosana anda em passos largos e rebate:
- O que você quer Rodrigo? Deixe - me em paz, pare de me seguir, por favor!
- E eu não estou deixando você em paz? Faz tempo que não a vejo, será que nenhuma gentileza eu posso te fazer? Não precisa mais ter medo de mim, vai! Entra aqui e eu te levo em casa!
- Vai embora Rodrigo, por favor! Insistia Rosana.
Rodrigo fica nervoso, bruscamente freia o carro e desce com rapidez do veículo, corre atrás de Rosana e segura em seus braços. A moça repudia a valentia de Rodrigo dizendo:
- Hei, me solte! Você não estava sumido? Por que foi aparecer para me infernizar?
Ele nada diz e não se intimida; segura mais forte a moça. Rosana é coagida pelo o rapaz. Sem forças, ela é obrigada a entrar no carro. Rodrigo coloca Rosana no banco do passageiro e trava a porta. Portanto Rosana fica impedida de sair do carro. Dentro do carro Rosana fica quieta, começa a chorar. Rodrigo realmente não tinha intenção de aborrecer a moça.
Demonstrou ser um perfeito cavalheiro. Muito comportado ele levou Rosana para sua casa. Por volta de 18h00min horas Rodrigo estaciona seu carro diante da casa de Rosana. Quando Rosana ia saindo do carro, Rodrigo diz:
- É lamentável que você não me ame mais Rosana, não vê que eu mudei?
- Eu vou me casar com Sérgio, que é o homem que eu amo. Mas fiquei feliz Rodrigo, porque agora sei que entendeu isso!
- Mesmo que eu quisesse Rosana não conseguiria deixar de te amar, mas tudo bem, sei quando eu perco uma parada!
Rosana se arrisca em pergunta – lo:
- E aquelas suas ameaças Rodrigo?
Rodrigo continua em seu fingimento:
- O tanto que gosto de você Rosana me impede de cometer qualquer coisa que te prejudique, era tudo mentira minha, só queria assustar você, me desculpe! Só esteja certa Rosana que nunca deixarei de te amar e, se um dia você e Sérgio se separarem, promete que vai me procurar?
- Nós nunca vamos nos separar! Nada vai mudar esse amor que sinto por Sérgio, nascemos um para o outro Rodrigo, Sérgio é o grande amor da minha vida!
Rodrigo era ousado, leva sua mão para o rosto de Rosana e tenta acaricia – lá, Rosana se esquiva do gesto de Rodrigo, agradece a cortesia do rapaz e sai do carro:
- Obrigado pela carona e até nunca mais.
Depois Rodrigo comenta consigo:
- Pobre Rosana, você num merecia essa crueldade, mas também não vou permitir que aquele cara tire você de mim!
Aciona o motor do carro e foi embora sorrindo.
Dentro de casa, Rosana encontra os pais bastante tristes, por várias vezes ela puxa assunto, mas não obtém nenhuma resposta dos pais para suas perguntas. Sua mãe começa a chorar, não suportando olhar para a filha, dona Célia se retira para o quarto. Rosana desconfia de algo e indaga o pai:
- Por que minha mãe está chorando pai? Vocês estão muitos estranhos, o que aconteceu?!
Seu Carlos Alberto abraça a filha e procura preparar seu espírito para receber a triste notícia do acidente com Sérgio. Pausadamente ele fala:
- Senta aqui filha, vou te contar. Olha, sinto muito, mas temos que enfrentar a dura realidade!
- O que foi meu pai? Fale logo!
- Olha, não faz muito tempo ligaram aqui para casa do hospital e nos disseram que ouve um acidente e que a pessoa está muito mal!
- Acidente com quem pai? Fala pelo amor de Deus!
Seu Carlos Alberto se levanta da poltrona, se encoraja e diz:
- O acidente foi de moto, seja forte filha – Rosana muda seu semblante – O condutor da moto era Sérgio, há muita pouca chance dele escapar com vida!
Rosana fixa os olhos em seu pai e as palavras se ausentaram, seus lábios tremiam muito, seu Carlos Alberto se incomoda com a reação da filha:
- Rosana, que foi filha, fale alguma coisa, Rosana o que está acontecendo, o que quer dizer?
A moça só chora e percorre a sala de um lado para o outro com passos indecisos. O pai segura a filha nos braços, por um instante Rosana se consola com o aconchego gostoso do pai. Seu Carlos Alberto também chora ao ver a filha naquele estado. Mas após alguns segundos Rosana levanta a cabeça, olha para o pai, com os olhos vermelhos e começa a lamentar:
- Meu Deus, por quê? O que vai ser de mim agora pai sem ele? Por que tinha de acontecer isso com a gente?!
Dona Célia, ouvindo o clamor da filha veio em seu consolo, abraça a filha e aconselha:
- Calma Rosana, Sérgio vai ficar bem filha. Você vai ser muito feliz com ele ainda!
- Por que tinha de ser assim mãe, fizemos tantos planos, me diz que isso não está acontecendo mãe, pelo amor de Deus!
Rosana estava totalmente sem controle, não fazia uma desgraça porque estava amparada pelos pais.






A DEFICIÊNCIA

Sem dúvidas aquela estava sendo a noite mais tenebrosa e longa para Rosana. Seus pais foram vencidos pelo sono e dormiam no quarto. Rosana estava sentada na poltrona com as pernas encolhidas e com a cabeça por entre os joelhos, já não tinha forças para chorar. Mesmo sem ter esse hábito, ela insiste em fumar e tomar uma bebida forte, a moça se dopava. Não sabia se ia agüentar essa situação. Se porventura Sérgio morresse, só tinha um caminho, cometer suicídio. O relógio na parede acusava 03h20min da manhã.
De repente ela escuta umas batidas na porta. Apreensiva, Rosana se recusa a atender o chamado e não levanta para abrir a porta, porém a batida continua mais forte. Rosana bebe outra dose da bebida, traga o cigarro, tosse muito e levanta, andando sem controle das pernas, ela foi atender o chamado. Sem noção das horas, Rosana abre a porta.
Rosana se apóia na parede e ao vê Adilson em sua frente começa novamente a chorar, Adilson se abraça com Rosana e também não se controla, chora junto com Rosana. Aos prantos e abraçada com Adilson, Rosana fala:
- Já sei Adilson, acabou né, todo meu sonho acabou né, acho que minha vida também acabou, foi muito rápido né, nossa felicidade foi muito rápida!
Adilson conteve as lágrimas e disse:
- Estou vindo do hospital agora, ele precisa muito da gente Rosana. Sabe, uma qualidade que sempre percebi no Sérgio foi sua vontade de viver, tenha fé Rosana, se Deus quiser ele vai sair dessa!
- Me leva até ele Adilson, pelo amor de Deus, eu quero ver ele agora, preciso estar perto dele! Por que isso está acontecendo comigo meu Deus?!
Mesmo depois de muito choro, Adilson consegue acalmar a moça.
Logo cedo, no clarear do dia os médicos já tinham em mãos o resultado do quadro clínico do rapaz e, o resultado não era nada animador. Sérgio sofrera uma hemorragia interna, teve um traumatismo craniano e uma lesão na coluna. Os médicos, no entanto poupavam a família, nenhum deles se dispõe contar a verdade para a família, mas a família estava alerta e um dos médicos não pôde mais evitar a notícia. A sala de espera do hospital estava repleta de gente. Familiares e amigos de Sérgio que aguardavam por um médico para explicar qual era o real estado de Sérgio. Rosana era sempre amparada por dona Dulce, a mãe de Sérgio. Porém naquele momento uma amparava a outra. Depois de muita espera finalmente um dos especialistas veio atender a família. O médico se comove ao ver Rosana tão abalada. Para saber o que havia acontecido com seu noivo, Rosana suplica para o médico:
- Doutor, pelo amor de Deus, eu não suporto mais essa aflição, nós íamos nos casar daqui a três dias doutor, deixe-me vê-lo, me diga que não é nada sério, salve meu noivo doutor!
O médico diz:
- Sem dúvidas essa é a hora mais difícil para um médico ter que contar a verdade para a família. Olha, é preciso que vocês entendam a luta de um médico, dos recursos que nós dispomos e muitas vezes nos desdobramos para reverter uma situação, mas existem certos casos que a medicina não é capaz de se manifestar, não tivemos como reverter o caso do rapaz. Deus poupou sua vida, o rapaz escapou com vida.
- Graças a Deus! Interrompe a mãe do rapaz.
- Mas infelizmente - continua o médico - o acidente vai deixar sua marca. Bem, Sérgio sofreu uma lesão na coluna cervical, ele está impossibilitado de andar com as próprias pernas. Sérgio nunca mais vai poder andar. Mais do que nunca ele vai precisar do apoio da família, dos amigos e principalmente de você Rosana. Sérgio ainda não sabe que está paraplégico e quando souber ele vai sofrer muito, o rapaz é bem forte, estamos surpresos que ele tenha sobrevivido a esse acidente, mas essa notícia vai ser um choque para ele, geralmente a pessoa prefere morrer a ficar numa cadeira de rodas. Pensamos na hipótese de uma cirurgia, mas descartamos essa possibilidade, não há o que ser feito... Uma cirurgia só ia complicar o quadro do rapaz. Eu sinto muito, mas é irreversível. Rosana case-se com ele, isso não impede de vocês serem felizes, até filhos vocês poderão ter.
O médico fez uma pausa, esperava alguém dizer alguma coisa.
Todos estavam vidrados no médico sem saber como iam proceder com essa tragédia. Depois de alguns segundos de silêncio, o pai de Sérgio indaga ao médico:
- O senhor está afirmando que meu filho está inválido, entrevado pra sempre?
- Não seu Cabral – responde o médico – Eu não diria que ele está inválido, apenas não pode mais andar.
Seu Cabral retruca:
- Apenas?! O senhor diz “apenas”? Meu filho está morto da cintura pra baixo e o senhor diz “apenas”? O senhor sabe o que é ter um filho inválido em casa doutor?
Dona Dulce corrige:
- Que isso Cabral, eu quero meu filho vivo, não importa seu estado físico, temos é que agradecer a Deus por permitir que ele continue vivo!
- Ainda bem que a senhora pensa assim dona Dulce - concorda o médico. - Olha, isso é muito comum, milhares de famílias convivem com a paralisia em suas casas, não é bicho de sete cabeças.
Seu Cabral, levantando do seu assento e é categórico:
- Mas eu não aceito doutor, trate de curar meu filho, não sou obrigado a ver um filho meu condenado em uma cadeira de rodas, isso não!
Todos olham para o pai de Sérgio abismados com sua atitude. Não adiantava alguém falar algo para convencê - lo, ninguém mudava sua opinião. Com ódio dos médicos ele sai da sala. Dona Dulce quer seguir o marido, mas é impedida por Rosana que diz:
- Deixa dona Dulce, talvez seu Cabral queira ficar sozinho.
Rosana se dirige ao médico, que permanece à disposição da família. Rosana suplica ao médico:
- Me leva até o meu amor doutor! Vocês todos podem acreditar que essa notícia só serviu para aumentar mais meu amor por ele! Por favor, doutor deixe-me ver Sérgio!
- Só de longe. Disse o médico.
- Tá bom, de longe!
Na verdade seu Cabral não era velho, apesar de já está aposentado era bastante vistoso, cheio de vigor. Não foi por idade que se aposentou e sim por tempo de serviço, era professor da rede pública.
Aliás, foi em um de suas aulas de biologia que conheceu dona Dulce. Ela foi sua aluna, por sinal, uma brilhante aluna.
Seu Cabral é homem de certa posição, muita influência e respeitado na cidade de Anápolis. Andava sempre bem alinhado, ternos caros. Não abria mão de usar um cavanhaque com barba sempre feita. Tinha pose de galanteador, mas era um cinqüentão.
A notícia da paralisia do filho o deixou muito perturbado. Pegou sua caminhonete e saiu pela cidade em disparada, com intuito de refrescar a cabeça. Vez por outra uma lágrima insistia em rolar no seu rosto. Pensava na possibilidade de voltar ao hospital e abraçar o filho, mas isso era sinal de fraqueza. Seu Cabral era homem de personalidade forte, não chorava por coisa alguma, mas essa fatalidade o fez chorar.
Mesmo sem destino certo dirigia em alta velocidade, de tão desnorteado, às vezes desviava sua atenção da direção, todavia, antes de cometer qualquer delito, controlava a caminhonete, no entanto, em um desses delitos não conseguiu evitar que acontecesse um pequeno acidente. Por pouco, muito pouco não atropelou uma mulher que atravessava a rua. Seu Cabral quando vê a mulher na sua frente freia bruscamente a caminhonete, porém a mulher é atingida de leve. Seu Cabral desce rapidamente do carro. Se bem que a culpa desse atropelamento não recai só em nele, a mulher tem sua parcela de culpa, parece que ela queria provocar esse acidente.
A mulher estava estirada no asfalto bem consciente, sofrera uma pancadinha de nada. Seu Cabral ficou apavorado. A mulher já se levantava, seu Cabral a ajuda e pergunta:
- O que foi isso minha senhora, como se joga assim na frente de um carro? Machucou - se? Deus do céu, nunca aconteceu isso comigo, vem cá, vou levar a senhora para o hospital, está se sentindo bem, consegue andar?!
A mulher o tranqüiliza:
- Calma senhor, eu estou bem. Só um pouco tonta com o susto. Desculpe, não vi seu carro, sou muito distraída mesmo.
- Puxa vida, que susto! Tem certeza que não quer ir ao hospital, ver se está tudo bem mesmo?
- Não, não precisa se incomodar comigo, não prestei atenção ao atravessar a rua. Somente pegue minha bolsa ali, por favor.
A bolsa da mulher continua no chão.
- Claro!
Seu Cabral entrega a bolsa para a mulher e ambos ficam segurando a bolsa, seus olhares dizem algo, depois ele novamente pergunta:
- Não quer mesmo que eu te leve no pronto - socorro para fazer um curativo?
- Mas fazer curativo onde? Não precisa, estou bem, estou apenas impressionada!
- Com quê senhora?
- Com nada, adeus.
E soltam as mãos. Mas seu Cabral avança na mão da mulher novamente e salienta:
- Espera, me deixa pelo menos te levar em sua casa!
- Não precisa senhor.
- O que posso fazer pra você não levar má impressão de mim?
- Eu não estou com má impressão do senhor, mas já que quer ser gentil comigo, então me leva para tomar um chope.
O homem sugere:
- Não é melhor um sorvete?
- Não! Prefiro tomar uma cerveja!
Seu Cabral achou estranha essa atitude da mulher, pois nunca esteve com ela antes. A mulher parece um tanto ousada, contudo concordou com a mulher e disse:
- Certamente. Vamos então.
Os dois pareciam já íntimos. Auxiliada por seu Cabral ela entra na caminhonete.
No dia seguinte no hospital, um dos médicos, que cuidavam de Sérgio, procura a família do rapaz e diz:
- Olha, é preciso que Sérgio saiba a verdade e a pessoa certa para falar isso a ele é você Rosana.
Rosana não sabe como proceder:
- Não doutor, não tenho coragem, não sou capaz de olhar nos olhos dele e falar que ele não vai mais poder andar!
- Tem que ser você Rosana! - Insiste o médico.
Adilson menciona:
- É preciso Rosana, seja forte. Só não o deixe perceber que você está triste!
O médico conclui:
- É necessário que vocês providenciem também uma cadeira de rodas, porque ele já pode ir para casa.
Adilson se prontifica:
- Deixa que eu cuido disso. Vem comigo Alexandre?
Adilson e Alexandre saem. Rosana ressalva:
- Dona Dulce, vai pra casa mais a mamãe e o papai. Vocês não dormiram nada essa noite, eu fico com ele.
Depois de dizer essa frase se encaminha para o quarto onde está Sérgio.
Sérgio dormia, Rosana sorrateiramente sentou – se à cama e ficou a contemplar seu amor chorando baixinho. Verifica a temperatura do rapaz, passando as mãos em suas pernas, constata que elas estão como gelo mesmo estando embrulhadas. Sozinha Rosana comenta:
- Você está suando muito meu querido, mas suas pernas estão muito frias, pode deixar que cuidarei de você meu amor!
Lentamente Sérgio desperta do seu sono, ao ver Rosana diz, ainda acordando:
- Oi meu amor, o que faz aqui?
Rapidamente Rosana disfarça; limpa seus olhos e libera um sorriso forçado, dizendo:
- Oi, seu dorminhoco, olha tenho uma novidade pra você, vamos para casa amanhã cedo!
- É, isso é bom, me sinto preso aqui nesse quarto, não agüento mais essa cama. Mas você não me parece bem Rosana, por que está chorando?
- Eu chorando Sérgio? Imagina! Não tô chorando!
- Tá me escondendo algo Rosana?
- Não Sérgio, que idéia é essa meu amor!
-Foi um horrível acidente – lembra Sérgio – Ainda bem que não precisamos adiar nosso casamento, não é mesmo Rosana?
Rosana se segura:
-É, está tudo bem, ou melhor, vai depender de você meu amor se tudo está bem mesmo. Sérgio, você vai ter que superar essa barreira, aliás, nós dois teremos que superar essa barreira. Não tenha medo Sérgio, porque nada vai mudar entre a gente, nada! Você confia em mim? Promete que vai ser forte e me deixar cuidar de você meu amor? Por favor!
Rosana começa a chorar.
- Do que você está falando Rosana? Que conversa é essa? Não estou te entendendo! Quer me ajudar a levantar dessa cama?
Vendo que Sérgio se esforçava para se levantar, Rosana tenta impedi - lo, já não escondendo as lágrimas ela diz:
- Não adianta Sérgio, você não vai conseguir se levantar, você está paraplégico meu amor!
Sérgio fica perplexo, confuso com o que ouvira de Rosana. Fixa os olhos no teto do quarto. De início ele sorri, depois muda seu humor:
- Você está brincando comigo Rosana? Por que disse isso? Quer dizer que só saio dessa cama se for para uma cadeira de rodas? Que loucura é essa?
Sérgio começa a chorar, reluta na cama, mas não consegue se levantar, então se torna agressivo, lamentando:
- Oh Deus, por que não sinto minhas pernas?!
Com o ódio que sentia, Sérgio amontoava o lençol da cama com as mãos. Rosana se curva em cima do seu amado, tentando deter sua fúria e acalmá-lo. Sérgio não diz coisa com coisa:
- Me chama o médico, quero falar com esse médico inútil e sai daqui você também Rosana, não quero ver você, não quero ver ninguém. Cadê o médico?
Rosana não perde seu controle:
- Não fique assim meu amor, nada vai mudar, eu estou aqui! Olha meu querido, vamos nos casar, vamos ser felizes do mesmo jeito, não fique assim!
- Pare de se enganar Rosana, por favor! Você sabe o que aconteceu comigo, esquece casamento, esquece tudo!
- Sérgio, pelo amor de Deus, não diga isso, nosso casamento não vai acabar por isso, nunca, nunca!
- Por que está sendo tão ingênua Rosana? Você acha que vou fazer você infeliz por resto da vida, quer se casar com uma pessoa que não serve mais pra nada? Ouça bem Rosana, eu não quero mais casar com você, me esquece, não quero saber de mais nada, não quero saber do mundo!
- Não fale assim Sérgio, não me deixa mais aflita do que já estou, eu quero cuidar de você, eu te amo muito Sérgio!
Sérgio destrói seu sonho de vez:
- Pois eu não te amo mais Rosana, saia daqui, não quero te ver nunca mais, desapareça, me deixa em paz!
Sérgio, chorando, vira a cabeça para o lado oposto a Rosana. Contra sua vontade, Rosana também chorando, deixa o quarto. Sem dúvidas Sérgio estava sofrendo com a separação daquela que tanto o ama, mas no momento achava que tinha que agir assim...







FUGINDO DO AMOR





FUGINDO DO AMOR

Seu Cabral passa à noite com a vítima do acidente. Aconteceu que a mulher se excedeu na bebida e estando embriagada, pediu para seu Cabral levá-la em sua casa. Ele fez questão de levá-la, também porque já estava com “umas” na cabeça e tinha esse plano. Na casa da mulher, foi convidado por ela para entrar e dentro de casa sozinhos liberaram os desejos, se beijaram e acabaram parando na cama. No outro dia, pela manhã, depois de uma noite ardente de amor, se acordam abraçadinhos. Seu Cabral, com a mulher envolvida em seus braços e acariciando seu rosto. O homem fumava seu cigarro e acompanhava com os olhos a fumaça sumindo no ar. Depois de minutos de silêncio ele comenta:
- Estranho, não é mesmo?
- O quê?
- Estou surpreso e tentando entender como isso aconteceu. Posso te dizer que isso nunca aconteceu comigo antes. Veja só, não conheço você, não sei seu nome, quase te matei e estamos aqui nessa cama abraçados, será que pode me dizer o que foi que aconteceu com a gente?
- Estou tão confusa como você Cabral, mas você sabe que gostei muito, precisava de um homem como você: Forte, experiente, atraente e misterioso, eu sou muito sozinha Cabral!
- Você também é uma mulher interessante, mas me fale de você vai!
Os dois continuavam agarradinhos, a mulher então apóia a cabeça no peito de seu Cabral e diz:
- Meu nome é Vânia. Moro sozinha nessa casa, já fui casada, mas atualmente sou desquitada. Ah Cabral, você não faz idéia do que é viver sozinha nesse casarão, me sinto tão só meu amor, preciso ser amada. Sabe o que eu queria Cabral, queria que você não fosse mais embora, ficasse comigo pra sempre!
- Você não tem filhos, Vânia?
- Nem filhos, nem família!
- Mas é jovem, bonita. Aposto que existem muitos homens que te querem como esposa.
- É, e de que adianta ser bonita, como você disse, ser assediada por vários homens, às vezes até gosto da companhia de um deles, como a sua Cabral e não ser feliz!
- Quem não quer uma vida como a sua Vânia? Mora numa casa imensa como essa, é independente, não tem filhos, o que precisa para ser feliz?
- Filhos, talvez.
- Filhos só servem para nos dar incômodo, aborrecimento, preocupação!
- Por que diz isso Cabral? Você tem filhos?
- Tenho dois. Eu tinha orgulho de meus filhos, da minha família!
- Não tem mais?
- Algo muito triste aconteceu na minha família que destruiu a harmonia do meu lar!
- O que aconteceu em seu lar Cabral?
- Pra que falar em coisas triste Vânia? Não vamos estragar esse momento tão gostoso entre a gente!
Seu Cabral ia se levantando e compondo – se com seu fino terno diante do espelho. Enquanto ajeitava a gravata comenta:
- Tenho que ir até a fazenda tomar algumas providências.
Vânia também se levanta e vindo na direção de seu Cabral pergunta:
- Mas você não vem mais me vê Cabral?
Ambos ficam frente a frente, se beijam e ele a tranqüiliza:
- Lógico que vou voltar aqui. Olha, de hoje em diante Vânia, você não se sentirá mais só e te prometo que qualquer dia desses vou te levar pra conhecer minha fazenda, pode até morar lá comigo, você quer?
Vânia vibra de contentamento:
- Eu adoraria Cabral, vou te esperar ansiosa. Mas e seus filhos, eles vão me aceitar lá? Não quero criar problemas pra você, por que você não vem morar comigo aqui?
- Eles não moram na fazenda, vivem aqui em Anápolis com a mãe, nunca vão lá, mas se for o caso, eles terão que te aceitar; fique tranqüila!
Vânia ajuda seu Cabral a ajeitar a gravata e abraçados, caminham para a sala. Na porta de saída da casa, cessam os passos e outro beijo reacende entre eles, beijo de despedida.

Quando um casal chega a esse ponto, como foi o caso de seu Cabral, que se envolveu com amante, não há mais solução para o casamento, sua vida se torna um inferno. Se espelhe bem nesse exemplo.

Nesse dia Sérgio deixa o hospital. Tortura - se calado enquanto as providências são tomadas. Todos demonstram estar contentes por Sérgio deixar o hospital e um batalhão de amigos segue o rapaz. Cada um conta uma história diferente na intenção de animar o rapaz. Era uma disputa para arrancar um sorriso de Sérgio. Sérgio não pára de pensar em sua triste sina, jamais esqueceria sua deficiência, como seria sua vida de agora para frente. Rosana, coitada, o acompanhava um pouco distante, Sérgio não permite que ela se aproxime dele. Sérgio esta com vergonha de si mesmo. Adilson é quem empurra a cadeira de rodas.
“Êpa!” Alguém mais acompanha Sérgio de longe, é ele, o responsável pela desgraça de Sérgio. É Rodrigo que de dentro de seu carro observa a saída do rapaz do hospital. Mesmo alguns pedindo a Rosana para que entrasse no carro, que estava Sérgio, ela se recusava e não entrou, com receio dele expulsá-la, pois Sérgio confrontava qualquer aproximação da moça. Rodrigo avista Rosana sentada no banco da praça, nota que a moça está chorando. Não perde tempo, desce do carro e vai até ela, atravessando uma avenida para chegar à moça, pois não quis que ninguém o visse ali. Cauteloso ele senta ao lado de Rosana, com ironia pergunta:
- Por que está chorando por uma pessoa que está inválida Rosana? Não precisa ficar lamentando por um cara que tá de cadeira de rodas. Se Sérgio não merecia você, agora que ele não te merece mesmo!
- Seu estúpido – a retruca – Monstro insensato, sai da minha vida, desaparece! Você teve está feliz né? Seu assassino!
- Que isso meu amor, só quero ser cordial com você!
Rosana se levanta e sai correndo dali. Rodrigo também se põe em pé e vai atrás dela dizendo:
- Espera Rosana, me perdoa, não queria dizer isso, seja razoável vai, por favor, fale comigo!
Mas de repente Rosana parou, algo não estava bem com a moça, Rodrigo pergunta:
- O que foi Rosana?
- Você não sabe o que é amar tanto e ser desprezada por quem você ama! Ressalta a moça.
- Sei sim, Rosana.
- Meu Deus, porque Sérgio está me evitando, eu não entendo, será que ele não vê que isso só nos causa mais sofrimento?! É... Mas eu não vou desistir dele!
- Não?
- É natural que ele esteja agindo assim, ter ficado paralítico foi um golpe muito assustador para ele, tenho que ficar ao lado dele. Sérgio precisa de mim!
Segurando no maxilar de Rosana, Rodrigo diz:
- Acho que você está sendo muito otimista Rosana, tá enganando a si mesmo. Ouça: Você não pode ficar assim, Sérgio não quer mais você, deixa eu te fazer feliz, eu te amo muito, fica comigo, por favor!
Todo o medo que ela sentia de Rodrigo se manifesta:
- Por que você está aqui Rodrigo, deve tá contente né? – Rosana dá um tapa na mão de Rodrigo – Me deixa em paz, eu não suporto você. Sérgio está numa cadeira de rodas sim e daí? Eu vou lutar por ele mesmo assim, jamais terei olhos para outro homem, eu te odeio Rodrigo, porque é calculista e nojento!
Rosana retorna a caminhada. Rodrigo ignora suas palavras e segura forte a moça, virando - a para ele e a beija contra a sua vontade, valendo - se de sua fragilidade, Rosana é obrigada a beijar Rodrigo, depois ele diz:
- Você vai ser minha Rosana! Você disse que vai lutar por ele e, eu vou lutar por você e pode apostar que vou ganhar essa parada! Adeus meu bem, logo nos veremos de novo!
Rodrigo, sentindo - se vitorioso volta para seu carro. Rosana, transtornada, cospe e limpa os lábios, enojada com o beijo de Rodrigo.

No outro dia, por volta de 08h00min horas, Sérgio ainda permanecia deitado, porém estava bem acordado. Aliás, ele não dormiu aquela noite. Procura resposta no teto do quarto para o que havia acontecido com ele. Do seu lado a cadeira de rodas. Alexandre já esta de pé e disse:
- Bom dia irmão!
Sérgio nada diz e começa a se retorcer na cama para se levantar, Alexandre oferece ajuda para rapaz, mas Sérgio se acha independente e dispensa o irmão dizendo:
- Não, não preciso de ajuda de ninguém, você me acha incapaz de levantar dessa cama e sentar nessa cadeira de rodas?
Mas Sérgio teve de consentir que seu irmão o auxilie, pois nem se levantar da cama conseguia sozinho.
O acidente não prejudicou os movimentos dos braços de Sérgio, então ele mesmo manipula a cadeira de rodas.
Dona Dulce esta na cozinha preparando o café da manhã. Mãe e filhos se sentam à mesa. Dona Dulce pergunta:
- Como foi sua noite Sérgio?
Sérgio se mantém calado, disse somente:
- Bem.
- Você quer seu leite com café ou sem café? Pergunta Dona Dulce.
Ele muda de assunto:
- Cadê o pai, hein?
- Seu pai está na fazenda, como sempre.
- Acho que ele não quer me ver assim.
- Que isso Sérgio! Que bobagem meu filho! Na certa não veio porque está tendo problemas com o gado, com o pasto...
- Quem vai atender os fregueses? Pergunta Sérgio.
Alexandre se manifesta:
- Eu naturalmente, mas se quiser me fazer companhia, será um prazer!
- E pra quê? Pra todo mundo ficar me perguntando o que aconteceu? Querendo saber por que estou nessa cadeira de rodas?! Tenho que arrumar outro tipo de trabalho pra fazer!
- O que?! Já está pensando em trabalho? – disse dona Dulce – Saiu do hospital ontem e já quer trabalhar e esse seu ferimento no rosto? Nada disso! Pode se aquietar, você vai é ficar aqui, do meu lado.
Sérgio, em virtude do acidente teve um leve corte na face direita, ainda em processo de cicatrização.
A família recebe a primeira visita do dia: é Adilson com sua contagiante alegria, que adentra a cozinha saudando a todos. Só que nesse dia não consegue contagiar a todos com seu humor. Depois do “Bom Dia”, diz para Sérgio:
- Que bom ver você de pé Sérgio!
Sérgio faz a correção:
- Você quer dizer sentado né Adilson?
- O que importa isso cara? O importante é que você tá aí cheio de saúde, né mesmo tia?
Dona Dulce era chamada por Adilson carinhosamente de tia.
Enquanto Alexandre parte para o trabalho na loja, Adilson continua falando, passando margarina num pedaço de pão:
- Tem uma pessoa que tá sofrendo muito por sua causa Sérgio, acho que já sabe quem é...
- É eu sei quem é. Só que é melhor assim, não quero falar com Rosana!
Sérgio termina de falar e contorna sua cadeira e vai para seu quarto. Dona Dulce, baixinho fala para Adilson:
-Vai atrás dele, tente reanimá – lo:
Adilson segue Sérgio. No quarto procura, mas não consegue ficar frente a frente com Sérgio, pois este torce sempre o rosto e não permite que Adilson veja seus olhos. Na verdade Sérgio disfarça o choro. Adilson senta - se na cama de Alexandre e argumenta:
- Por que cara, por que tá agindo assim? Olhe pra você, você tá chorando Sérgio! Rosana é louca por você, você também ama demais aquela mulher, no entanto fica aí se torturando. O que aconteceu com você foi uma fatalidade cara, não deixe que isso atrapalhe o amor de vocês! Ela quer vir aqui, conversar com você, seja razoável cara!
- Não Adilson, não quero que ela venha, por favor, não deixa ela vir aqui. Ouça: Você é meu único amigo Adilson, é melhor assim, diga para ela me esquecer, que não me procure mais!
- Droga! – retruca Adilson se levantando da cama – O que há Sérgio, você está sendo injusto, Deus do céu! Cadê aquele cara que conheci... Que se dizia tão apaixonado. Seu casamento era pra ser amanhã cara, vai jogar tudo pro ar?!
- Não posso estragar o futuro de Rosana, não quero que ela me veja assim. Sinto vergonha de minhas pernas, é o amor que sinto por ela que me faz agir assim!
- Sabe o que eu acho Sérgio – salienta Adilson – Acho que você se acovardou. Você Sérgio, está sendo derrotado por essa paralisia, é um fraco, incapaz de lutar!
Sérgio ouve Adilson falar coisas tão duras de ouvir, mas se mantém calado e com os olhos marejados. Adilson conclui:
- Você está se destruindo Sérgio – fala Adilson emocionado – Acha que estou sentindo pena de você Sérgio? Não, estou é com ódio de você cara!
Adilson ameaça sair do quarto, mas em consideração a sua amizade por Sérgio não é capaz de sair, também porque ele suplica:
- Por favor, não vá! – vira a cadeira de rodas e olha para Adilson – Não me deixa cara, não me abandone, preciso de você, por favor, me ajude! Olha essa noite eu pensei muito e tomei uma decisão, não quero mais ficar aqui cara, quero me isolar das pessoas, me isolar do mundo!
- Então desistiu da vida, Sérgio?
- Acredito muito em Deus, não desisti de viver não, mas isso mexeu muito comigo, na verdade eu preciso arejar minha cabeça, tentar entender o que aconteceu comigo. Um retiro talvez. Ficar em contato com a natureza. Acho que seria o lugar ideal para mim, vou escrever um livro!
- Então, por que você não vai pra fazenda de seu pai?
- Não, não quero que ninguém fique sabendo onde eu estou!
- Você está seguro disso Sérgio?
- Você me ajuda Adilson?
Adilson novamente se emociona:
- Eu conheço um lugar igual a esse e é claro que vou te ajudar Sérgio!
Então os dois sorriem e se abraçam.
Adilson refere-se ao lugar:
- A casa é de um amigo meu, que foi trabalhar nos Estados Unidos e me pediu para cuidar da chácara pra ele. Lá mora um caseiro, é até bom porque o caseiro vai ser boa companhia pra você Sérgio. Eu costumo ir lá só nos finais de semanas, quando dá.
O plano de Sérgio só foi compartilhado com Adilson.
O lugar referido por Adilson era perto de Abadiânia – Goiás e privilegiado pela natureza. Ao fundo da casa corria um riacho de água cristalina. No lugar repousa muito sossego e tranqüilidade. A casa não era um palácio, mas era bastante aconchegante e cercada de várias montanhas. Sérgio e Adilson dizem para dona Dulce que vão dar uma volta de carro. Dona Dulce pressente que esse passeio de Sérgio e Adilson está muito estranho, pois Sérgio pede para Adilson colocar muitos de seus pertences no carro, até mesmo sua máquina de escrever. Sérgio, auxiliado por Adilson senta - se ao banco do passageiro e Adilson na direção, assim vão para a chácara. O carro usado é de propriedade do delegado de polícia, chefe de Adilson.














A FESTA

Depois de uma semana é que seu Cabral aparece em casa. em casa só encontra dona Dulce. A mulher está triste com o desaparecimento do filho, nem Adilson deu mais satisfação para ela. Na verdade dona Dulce chora baixinho, sentada no sofá da sala. O homem colocou a chave da caminhonete na mesa e sem ser convidado senta-se ao lado da mulher. Ficam por um bom tempo sem dizer nada. Seu Cabral percorre a sala com seu olhar desconfiado, em seguida olha para a mulher e diz:
- Não vai falar comigo Dulce? Por que essa cara? Se demorei foi porque tive muito trabalho lá na fazenda! - seu Cabral não nota que dona Dulce chora - Será que tenho de dar explicações de tudo pra você, Dulce?
Dona Dulce responde:
- Não te perguntei nada Cabral, só acho que fez muito mal não vindo aqui conversar com seu filho!
- É, talvez eu tenha errado nisso, onde está ele?
- Pra quê Cabral, por que quer saber de Sérgio? Que péssimo pai você é! Sérgio sumiu. Meu filho achava que ia ser um peso para nós, principalmente pra você, agora sei que ele tinha razão!
- Sérgio não está em casa?
- Não, não está e ninguém sabe aonde ele tá. A pedido do meu filho, Adilson o levou daqui, ele se achava demais nessa casa, se você estivesse aqui, isso não teria acontecido, isso aconteceu por sua culpa Cabral!
- Adilson então sabe dele?
- É, sabe só que Adilson fez um pacto com Sérgio de não contar para onde ele levou meu filho e não adianta nem tentar que ele não vai te contar onde Sérgio está!
Dona Dulce fica nervosa e sai da sala, seu Cabral não se comove, fala em voz alta:
- Olhe, eu não podia deixar o gado morrendo e vir pra cá. Será que vocês não entendem que eu sou um pecuarista? O que eu podia fazer?
Dona Dulce volta à sala e rebate:
- Então suas vacas são mais importantes para você de que um filho seu, né Cabral? Ora tenha paciência!
- Tá bem, você tem razão Dulce, de ficar brava comigo. Agora, dizer que não sabe de Sérgio é mentira sua, onde Sérgio se meteu, me fale anda! Onde Adilson o escondeu?
Seu Cabral também se levanta já nervoso.
Dona Dulce não se intimida:
- Mesmo se eu soubesse não ia te dizer Cabral, sabe por quê? Porque Sérgio não quer te ver. Você conseguiu fazer com que sua família sentisse desprezo por você. Abandonar seu filho nessas condições, isso é monstruoso!
Seu Cabral se explode:
- Ah é assim então? Pois bem, eu preciso falar mesmo com você Dulce. Eu só vim aqui hoje para te dizer que estou deixando essa casa, eu estou deixando você Dulce, estou me separando de você! - seu Cabral senta novamente - Eu encontrei a mulher da minha vida, só vim aqui pegar algumas coisas minha, vou ficar com ela!
- Seu descarado e por que você voltou nessa casa? Velho safado! Não tem vergonha ordinário, depois de velho arrumar uma prostituta? Você é um covarde Cabral, não aceita a deficiência do filho e por isso quer fugir, foi só Sérgio ficar paraplégico pra você sair dessa casa. Quer saber? Pegue mesmo o que é seu, se é que ainda tem alguma coisa nessa casa seu imundo! Não estou chorando por sua causa, choro porque estou preocupada com meu filho!
Seu Cabral muda de assunto:
- E Alexandre, cadê ele?
- Não adianta Cabral, seus filhos não querem te ver, é melhor você ir embora mesmo dessa casa, eu também não quero mais te ver!
A discussão de seu Cabral com dona Dulce não pára por aí, mas a decisão estava tomada, seu Cabral deixou sua família.

Adilson estava firme em sua promessa. Muitas vezes se via em apuros com as pessoas indagando por Sérgio, porém, foi o combinado entre eles e Adilson jamais ia trair o amigo.
Na conversa que teve com dona Dulce sobre o filho dela, Adilson não relatou nada a respeito de Sérgio. Somente transferiu o que Sérgio mandou dizer para sua mãe. Para ela não se preocupar, que ele só queria descansar e um dia qualquer Adilson poderia levá-la para os dois se verem, mas no momento, nem a própria mãe ele queria ver. O apuro de Adilson era com Rosana, com Rosana não havia como Adilson se justificar, pois ela não aceitava nem esse nem qualquer outro argumento.
Numa noite do mês de Agosto, por volta de 20h00min horas, Adilson em sua casa, prepara o jantar. A televisão está ligada, porém, assistindo mesmo, só um cachorro vira - lata, que fica deitado no sofá diante da televisão. Adilson está na cozinha pilotando o fogão. Alguém bate na porta, o cachorro late avisando ao dono que há gente lá fora e permanece deitado. Adilson da cozinha vem atender a porta falando com o cachorro:
- Você não serve nem pra abrir uma porta né cachorro imprestável?! Primeira vez que vejo um cachorro que gosta de novela!
Adilson se surpreende ao abrir a porta, era Rosana de novo.
- O que faz aqui Rosana, outra vez? Já sei, entra vai!
A moça fica calada, percebendo que ela está muito abalada. Adilson diz, expulsando o cachorro do sofá:
- Senta Rosana! Olha, já sei que você tá querendo: notícias de Sérgio. Me desculpe Rosana, mas você perdeu seu tempo vindo até aqui! Pombas Rosana! Respeite o sentimento dele, não me obrigue a trair meu amigo!
- Ele não me ama mais, né Adilson?
- Ama. Ama muito Rosana, por isso ele prefere que seja assim. Sérgio não quer ver ninguém por enquanto. Poxa, quantas vezes vou ter que dizer isso Rosana? Sérgio está sofrendo muito, tenha paciência com ele, ele só quer pôr a cabeça no lugar! Não insista, por favor!
Rosana chorando fala:
- E eu Adilson? Você faz idéia de como eu estou sofrendo? Você imagina como eu estou me sentindo com esse desaparecimento de Sérgio?! Quem se importa comigo né? Tudo bem - Rosana chorava muito - Eu vou te deixar em paz, não vou te procurar mais, mas diga pra ele, que ele é o homem da minha vida, que eu o amo muito!
Adilson estava comovido, a moça não conseguia mais falar.
Rosana vai saindo do apartamento de Adilson em passos indecisos, deixando Adilson confuso, Adilson por pouco não fala pra Rosana onde Sérgio está, mas mesmo com pena da moça ele se contém.
Rosana não percebe, mas fora do prédio um mistério se segue. Rosana entra em seu carro e sai dali, uma vez por outra ela percebe dois faróis lhe seguindo, porém, no centro da cidade parece normal, entretanto Rodrigo não tinha intenção de abordar Rosana, sua preocupação é saber aonde a moça ia. Aconteceu que, ao passar pelo o carro de Rosana estacionado em frente aquele prédio, ele reconheceu o carro, então ficou de sentinela em lugar discreto para certificar o destino da moça.

O sítio é um verdadeiro paraíso. Muito tranqüilo lá não se ouve nem mesmo barulho de avião, somente os pássaros interrompem o silêncio. Sérgio encontrou muita inspiração para escrever naquele lugar. Ao fundo da casa o gostoso som do correr das águas. Sérgio está fascinado com aquela chácara. O caseiro que mora ali se tornou muito amigo de Sérgio, seu nome é Laércio. Embora tendo apenas 25 anos era um rapaz muito responsável com o seu trabalho no sítio. Era órfão de pai e mãe. Sabia como poucos ordenhar as vacas. Também se formou homem nas fazendas, tinha muita habilidade com a terra, era solteiro, mas muito admirador das mulheres. O que Sérgio não entendia, mas também não comentava com ele, era por que aquele rapaz vivia sozinho. Desde sua adolescência Laércio convivia com a solidão. No sítio havia um carro com carroceria a disposição de Laércio.
Sérgio estava no alpendre da casa sentado em sua cadeira de rodas contemplando o pôr do sol. Em sua companhia a máquina de escrever, exposta em uma mesinha em sua frente. Não havia melhor hora para ele escrever, se econtrava sozinho em casa. Laércio havia ido à cidade fazer compras, contudo não demorou e Sérgio foi despertado com o soar de uma buzina de carro, era o próprio. Laércio chegou à fazenda todo empolgado, fazendo até uma manobra com o carro bem radical, dá uma freada brusca e pára o carro próximo a Sérgio. A poeira que segue o carro invade o ambiente. Laércio desce do carro e enquanto guarda as compras fala para Sérgio o motivo de sua felicidade:
- Como vai nosso escritor? Sérgio tenho uma surpresa, você vai adorar cara!
- Que novidade é essa rapaz, você tá muito afoito. Fale o que foi?
- Sérgio se prepare para conhecer as mulheres de Abadiânia! Olha Sábado que vem vai haver um baile no clube de Abadiânia, você nunca viu coisa igual Sérgio, como tem mulheres bonitas em Abadiânia!
Havia certo exagero no modo de Laércio falar das mulheres de Abadiânia. Sérgio não ficou muito interessado, disse:
- Hei calma Laércio, que animação é essa cara? Só que eu não estou com a mínima disposição para festa!
- É uma inauguração, não sei de quê. Eu tava esperando tanto essa festa Sérgio e você tem que ir comigo, mesmo porque você precisa distrair um pouco!
- Não Laércio, eu não sou boa companhia cara, faz assim: você vai e eu fico, vai ser melhor assim!
Laércio se entristece. Sérgio conduz a cadeira de rodas para dentro da casa, contudo antes que ele saísse de perto de Laércio, este segura a cadeira de rodas, lhe impedindo de prosseguir e indaga:
- Olha aqui cara, qual é a sua? Você está nesta fazenda há mais de um mês, e desde que chegou aqui vive concentrado nessa máquina de escrever! Você não sorri nunca cara, esqueceu de viver foi? Ouça aqui cara, eu não vou permitir isso não, viu? É jovem, inteligente, você quer provar o que cara? E quem se importa com o que está fazendo consigo mesmo?
- É você tem razão Laércio, acho que estou abusando mesmo de sua paciência. Agora, eu numa festa Laércio? Só seria pra atrapalhar a festa! Olha desculpe, mas eu não vou não. Não saberia como me comportar diante das pessoas!
- Eu me preocupo com você Sérgio, por isso é que quero que venha comigo, mas tudo bem, esquece, já que você não quer ir, eu também não vou!
-Ah não, isso não Laércio. Por favor, você vai, tem que ir! É importante pra você! É que eu não tenho saco pra aturar multidões de pessoas cara!
- E deixar você sozinho aqui Sérgio? Não, deixa pra lá. Esqueceu que sou responsável por você, que dei minha palavra pra Adilson? Se você não quer ir eu também não irei!
Laércio vai deixando Sérgio sozinho. Sérgio fala:
- Espere... Que dia é a festa?
- Sábado agora.
- Está bem, você ganhou Laércio, eu quero conhecer as mulheres daqui, nós vamos nesta festa!
Sem sombra de dúvidas Sérgio só concordou em acompanha-lo à festa para satisfazer seu desejo. Embora Laércio estivesse certo, Sérgio precisava se divertir, deixar de dar crédito para sua deficiência, aprender novamente a tirar prazeres que a vida nos proporciona mesmo com o corpo debilitado.

“Sérgio tinha medo de assumir sua deficiência, receoso de ser discriminado, mas era preciso levantar a cabeça, passar por cima das barreiras e enfrentar a sua realidade. Sou o autor dessa estória e portador de deficiência física, no entanto sou muito feliz, agradeço a Deus por ele ter me concedido à vida”.

Abadiânia é vizinha da cidade de Anápolis, por isso certamente grande número de pessoas de Anápolis estaria na festa em Abadiânia.
A semana passou como relâmpago e aquela era à noite da festa. O salão era enorme e estava repleto de gente. Ali dentro havia um barulho infernal, um som de música estarrecedor. Pessoas fumando, outras bebendo, uma parte dançando numa movimentada pista circulada, luzes multicores que davam mais vida ao ambiente e no meio dessa agitação toda estavam Sérgio e Laércio.
Sérgio parecia contente, muito elegante e sorridente, porém com pinta de galã estava mesmo Laércio que usava uma camisa combinando com a calça e desfilava com pose de conquistador. Laércio logo que chegou ao baile enturmou - se com seus amigos e caiu também na dança. Sérgio encosta sua cadeira de rodas numa mesa e fica olhando as pessoas dançando e bebendo. Tomando uma cerveja, o rapaz se sente um pouco perdido entre tanta gente. Discretamente ele tenta fazer amizade, sorri para algumas mocinhas que passam por ele, porém ninguém senta à mesa para conversar com ele. De repente ele avista um antigo colega de faculdade chamado Mauro. Mesmo estando distante Sérgio reconhece Mauro e disfarça para não ser visto por ele. Vez por outra ele toma um gole de cerveja e sem motivação continua sua caça com os olhos, procurando por uma pessoa que notasse sua presença. Em meio aos seus olhares, algo chama a atenção de Sérgio, em uma mesa quase escondida estava uma linda garota e, Sérgio percebe que os olhares eram recíprocos.
Sérgio sente vontade de ir até ela e puxar assunto, mas não tem coragem. O curioso é que a moça também estava numa cadeira de rodas. Parecia que a moça estava tendo o mesmo desejo do rapaz. Sérgio nota que ela estava em companhia de uma amiga. Pouco depois ele se surpreende com a amiga da moça vindo em sua direção. Sérgio se inquieta. A jovem se aproxima dele e diz:
- Minha amiga quer falar com você, ela pediu pra você ir até ela!
A jovem somente disse essa frase e volta para sua mesa se ajuntando de novo à bonita moça. Sérgio não deixa de atender ao agradável convite. Controlando sua timidez, ele toca a cadeira de rodas rumo a mesa da moça e a cumprimenta:
- Como vai, tudo bem?
- Muito bem e você? Você está tão sozinho, por quê?
- Não conheço ninguém aqui.
- Não quer me fazer companhia?
- Seria ótimo ficar perto de uma moça tão bonita!
A amiga, a qual chamou Sérgio recebe um convite de um rapaz para dançar, depois que a jovem sai da mesa, Sérgio manobra a cadeira e se ajeita à mesa. A moça pergunta:
- Me parece que você não é daqui...
Sérgio é preciso em responder:
- É verdade, eu sou de Anápolis, estou aqui em Abadiânia tirando férias em uma fazenda de um amigo. E você?
- Eu moro em uma fazenda aqui perto, estou nesta festa com meu irmão e uma amiga.
Sérgio repara a cadeira de rodas que a moça está sentada e diz:
- Eu sinto muito!
- Sente o quê?
- Por você ser tão bonita e andar de cadeira de rodas como eu!
- Chiiii!!! Já vi que você é daqueles que se acham inferior ao outros porque está em uma cadeira de rodas. Pois saiba que eu sou muito feliz, mesmo de cadeira de rodas!
- Desculpe, é que eu não me acostumo em andar de cadeira de rodas!
- Por que você está nessa cadeira de rodas?
- Foi um acidente de moto... Quebrei a coluna cervical.
- Já comigo foi aos três anos de idade. Tive poliomielite. De lá pra cá não sinto mais minhas pernas, mas não vamos falar de coisas tristes!
Sérgio em seguida pergunta:
- Você não sente vontade de dançar?
- Eu danço, só não estou a fim de dançar.
- Você dança?! Mas como?
- Se quiser eu te ensino, mas não aqui. Em outro lugar e em outro dia.
- Está bem, eu topo! Quero que você me ensine a dançar!
Sérgio e a bonita moça conversam bastante. Para ele foi o único ponto positivo daquela festa. Ficou combinado que ela iria à fazenda onde Sérgio estava hospedado para ensina - lo a dançar. Laércio, com umas e outras na cabeça se aproxima da mesa onde estava Sérgio e o pressiona chamando - lhe para irem embora. Sérgio pensa: “Mas logo agora que a festa está ficando interessante?” Todavia ele não se opõe, concorda em ir embora, antes, porém troca palavras com a moça e a mesma diz:
- Meu nome é Ester e o seu?
- O meu é Sérgio. Espero-te lá na fazenda...
- Estarei lá, tchau Sérgio!
Foi inevitável Sérgio não ser visto por Mauro. Infelizmente quando Sérgio contornou a cadeira para sair da mesa, acabou esbarrando em uma pessoa. Sérgio pediu desculpa, mas quando olhou para a pessoa e ficou cara a cara, notou que era Mauro. Mauro o reconhece e começa a interroga - lo com várias perguntas. Todavia Sérgio não responde nenhuma, alegando está com muita pressa. Encontrar Mauro ali foi o ponto negativo da festa, pois através de Mauro, as pessoas poderiam descobrir onde ele estava, pois Mauro morava em Anápolis.
Na estrada de volta para a fazenda, Laércio falava sozinho na direção do carro. Sérgio parecia pouco interessado em ouvir o amigo contar vantagem. Seu pensamento estava somente na moça Ester. A bonita jovem não saía da sua mente. Seu jeito de falar... Sua graciosidade... Às vezes sem perceber ele até liberava um sorriso de satisfação por ter conhecido aquela moça. Sérgio estava encantado com a singeleza de Ester. Para ele não importava o fato de ter sido visto por Mauro, o importante mesmo foi ter conhecido aquela moça tão especial. Sérgio pensava: “Talvez a presença de Ester em minha vida vai abafar a saudade que sinto de Rosana”. Depois de falar tanto tempo sozinho, Laércio olha para Sérgio e diz:
- Que consideração a sua hein Sérgio? Deixando eu falando sozinho!
Laércio passa a mão na frente do rosto de Sérgio. Sérgio desperta Laércio continua...
- Tô falando com você rapaz, o que achou da festa? Parece que pra você foi boa né? Ficou o tempo todo com aquela gata! Eu conheço bem ela, pintou algo entre vocês?
- É, foi até bom, o chato foi ter encontrado com Mauro lá.
- E o que tem isso Sérgio? Quem vai saber onde você tá morando? Ninguém vai saber, não se apavore cara!
De repente Laércio pára o carro, pois ficam impedidos de seguirem em frente por causa de uma porteira. Laércio desce do carro para abrir a porteira. De fora do carro ele ordena para Sérgio pegar a direção e passar o carro na porteira, Sérgio faz restrições:
- Não consigo Laércio, não sinto as minhas pernas.
- Consegue sim, anda depressa, tá frio aqui fora cara!
Sérgio, cheio de dúvidas olha de um lado para o outro e se decide. Passa para o banco do motorista lutando com as pernas, pisa na embreagem e muda de marcha. Vagarosamente solta a embreagem e pressiona o acelerador, fazendo muita força para isso. O carro começa a andar, Laércio é radical:
- Se você não passar esse carro na porteira Sérgio, eu vou embora a pé e deixo você sozinho com ele, dirija vai!
O rapaz muito nervoso com o esforço que estava fazendo se irrita, mas atravessa o carro na porteira. Laércio estava bem austero, entra no carro do lado do passageiro e diz:
- A viagem continua... Pé na tábua!
- Ah não Laércio, eu não consigo dirigir cara!
- Consegue, vai dirige!
Pouco a pouco Sérgio dominava o medo e novamente arrancou com o carro. Sérgio comete alguns delitos com o carro, mas num clima de expectativa eles chegam em casa da fazenda. Dentro do carro e na porta de casa, Laércio diz:
- Eu disse que você conseguiria!
- É... Aos poucos eu vou me acostumando com essa paralisia!


























A DANÇA

Sérgio é habilidoso com a máquina de escrever. Cada tecla tem o momento certo para ser pressionada e num ritmo só ele conclui mais uma página do seu livro. Concentra-se no papel para corrigir o texto, mas interrompe sua leitura e vai para a sala descontrair um pouco. Laércio está no curral da fazenda curando uma lepra em uma das reses. Trabalho pesado, pois a novilha é bem teimosa. Na sala, Sérgio se serve com uma bebida suave e relaxa o corpo, mesmo sentado na cadeira de rodas, seus pensamentos se voltam para Ester. Porém ele não demora em voltar para seu quarto e continuar com a leitura do seu romance. Novamente sua atenção é desviada, dessa vez com o barulho do motor de um carro que se aproxima da fazenda. Só que Sérgio permanece no quarto fazendo a leitura do texto. Certamente a visita seria para Laércio. Sérgio se mantém de costa para a porta do quarto com os olhos vidrados no papel. Não vê quando a porta se abre e alguém o aborda. Sérgio sente alguém se aproximar e lentamente vira a cabeça para certificar - se de quem era e tal foi sua surpresa ao vê que era Ester, entusiasmado ele cumprimenta a jovem:

- Oi, que bom que você veio Ester!
- É o dia de ensinar você a dançar. Não estou certa? Desculpe invadir seu quarto, é que não tinha ninguém para me receber lá fora. Vi Laércio no curral e ele me disse que você estaria aqui, aí eu fui entrando. Fiz mal?
- Claro que não! Senta aí!
- Mas eu já estou sentada Sérgio!
- Ah é mesmo! Desculpe, eu nem reparei nisso! Mas você toma alguma coisa? Quer um refresco, um uísque?
- Não, não precisa – Ester olha para a máquina de escrever e indaga - Você escreve Sérgio?
- Só preencho folhas... Mas com quem você veio Ester?
Ester já lia o texto, demorou a responder:
- Com meu irmão, ele veio tratar de negócios aqui perto, mas não se preocupe, logo Henrique vem me buscar. Parece interessante o que você escreve, gostaria de conhecer seu trabalho Sérgio!
- Se quiser pode levar os originais que já estão prontos. É um livro. Falta parte da estória, mas estou levando esse projeto muito a sério.
- Está bem, mas hoje eu vim aqui para que você dance comigo! Disse Ester deixando a folha de papel de lado e usando sua simpatia com Sérgio.
Ester conduz sua cadeira de rodas para o aparelho de som que estava no quarto, escolhe o disco de sua preferência e sem pedir licença coloca - o no aparelho. Sérgio só acompanha a moça com os olhos. Posicionaram suas cadeiras e ficaram frente a frente. Ninguém fala nada, somente a música envolve o silêncio. Melodia que fala de amor. Sérgio pensa: “Ela está sendo muito rápida”
Lentamente Ester começa fazer um movimento de vai e vem com a cabeça acompanhando o ritmo da música e, com os olhos fechados passa a instruir Sérgio dizendo:
- Dance com sua cabeça, com os braços, mantenha os olhos fechados...
Sérgio não consegue obedecer à moça, deixando que só ela dance para ele. Ester continua:
- Não abra seus olhos, sinta a magia da música, ela não transporta você Sérgio?
Sérgio dá asas para sua imaginação: o rapaz fecha os olhos e começa a sonhar. Dança com Ester, mas em outra dimensão. Em sua dança eles são normais fisicamente. Ester entrelaça os braços no pescoço de Sérgio e apóia a cabeça em seu ombro. Sérgio era o mais feliz dos homens.
A música chega ao fim. Ester encerra a dança e nota que Sérgio fez tudo errado. Não lhe obedeceu. Depois olhando no fundo dos olhos dele ela pergunta:
- Por que você não fechou seus olhos Sérgio?
Ele justifica:
- Preferi ficar olhando pra você. Você é linda Ester!
Ester recebe com muito gosto o galanteio de Sérgio. Ficam por um bom tempo olhando um para o outro. Sérgio leva uma das mãos ao rosto da moça e não se intimida em acariciar sua face. Ester apóia o rosto em cima da mão do rapaz pressionando - a contra seu ombro e libera um sorriso espontâneo, Sérgio faz seu elogio:
- Você dança muito bem, sabia?
Sérgio é mais ousado: Leva seus dedos para os lábios da moça, em seguida aproximam seus rostos e não resistem, os lábios se tocam e aquele encontro resulta num eufórico beijo.
Não demora e o irmão de Ester volta à fazenda para busca - la. Laércio vai chama - lá no quarto, ao abrir a porta flagra os dois enamorados, lamentando ele transmite o recado de Henrique e rapidamente deixa o quarto. Ela diz para Sérgio:
- Tenho que ir, meu irmão já está aí.
- Quando te vejo novamente?
- Eu te procuro! E trocam outro beijo.
Sérgio pega as folhas com os escritos e entrega para Ester. Ela o tranqüiliza dizendo:
- Pode deixar que cuidarei muito bem de suas memórias. Agora vem comigo, quero que você conheça meu irmão.
E ambos conduzem suas cadeiras para a sala.
Na sala, Henrique admira uma miniatura de carro de boi exposto na estante, mas Ester interrompendo diz:
- Quero que você conheça um amigo bem especial Henrique!
Henrique vira seu corpo para os dois e só diz:
- Oi.
- Henrique, esse aqui é Sérgio. Sérgio, esse aqui é meu irmão Henrique.
Henrique estende sua mão para Sérgio e cumprimenta com graciosidade:
- Como vai? Então você é o famoso Sérgio de quem minha irmã fala tanto?
Ester corrige o irmão:
- Henrique! É mentira Sérgio. Sérgio é escritor Henrique, eu vou começar a ler um romance dele.
- É mesmo? Quem bom! Eu admiro muito os escritores. Eles são tão misteriosos! Apesar de não ler muito, sou muito grato aos escritores, pois eles alimentam nossas almas com seus escritos!
- Eu tento ser um deles Henrique, quem sabe um dia eu conseguirei! - Diz Sérgio. E acrescenta olhando para Laércio:
- Laércio sirva algo para eles!
- Não precisa Sérgio! Laércio já me ofereceu uma bebida, mas não quero beber nada. Sabia Sérgio que Laércio é um grande amigo nosso? Ele só não me falou ainda de você, né Laércio? - Diz Henrique.
- É que só estou aqui há uns três meses.
- Fico contente sabendo que você está fazendo tão bem para a minha irmã. Ester nunca sai de casa, não se diverte, não têm amigas, mas bastou ela te conhecer naquela festa para seu rosto ganhar novo brilho, né maninha?!
Ester reclama com o irmão:
- Henrique pare com isso! Você não sabe ficar de boca fechada, né!
Henrique manifesta - se novamente:
- Quero fazer um convite a vocês. Quero convidar vocês para irem lá em casa para serem nossos adversários no jogo de baralho. Sabe jogar truque? Não sabe Sérgio? Que tal Laércio, vocês vão né?
Laércio confirma:
- Claro que vamos, pode contar conosco!
Sérgio diz:
- Não domino bem esse jogo, mas não costumo perder quando jogo!
- Então está combinado. Ouviu maninha? Nosso pai vai gostar de você Sérgio. Laércio sabe o caminho pra chegar lá, né Laércio? - diz Henrique.
- Lógico que nós vamos! Pode esperar. - confirmou Laércio.
Individualmente Sérgio e Ester agradeceram o convite de Henrique, pois era um pretexto para eles se verem novamente. Marcaram o jogo de cartas para a noite de sexta – feira, três dias depois. Antes de saírem trocam mais algumas palavras e Henrique ainda não havia percebido que Sérgio e Ester já estavam namorando.

Em algum lugar da Cidade de Anápolis encontrava - se Rodrigo. Naquela noite ele estava em uma lanchonete bem no centro da cidade. Nada anormal, pois toda noite saía em busca de aventuras com prostitutas. Assim também procurava esquecer seu amor doentio por Rosana. Rodrigo continuava obcecado. Não sabia mais o que fazer, suas tentativas eram inúteis. Rosana não queria mais vê – lo, Rodrigo estava à beira da loucura por isso.
Rodrigo agia com muita brutalidade e estupidez com as mulheres da noite. As infelizes, por causa de alguns trocados viravam capachos nas mãos de Rodrigo. Rodrigo atribui somente a Sérgio a culpa por Rosana não o querer mais. Sérgio continua sendo seu grande rival. Rodrigo queria destruí – lo, mas também não sabia seu paradeiro. Quem já tentou uma vez, perfeitamente faria novamente. Para Rodrigo Sérgio tinha que morrer.
Rodrigo estava bastante perturbado naquela noite. Estava embriagado e violento. O álcool era o motivo para ocorrer um desentendimento na lanchonete entre Rodrigo e o dono do estabelecimento. Afinal, Rodrigo estava insuportável na lanchonete, se achando o mandão ali dentro. O motivo da discussão fora porque Rodrigo estava assediando a esposa do vendeiro, que ajudava o marido atendendo os fregueses. A mulher fugia das cantadas de Rodrigo, mas tudo tem seu limite. Sem causar tumulto ela conta para o marido a inconveniência de Rodrigo. O homem fica muito chateado e foi tirar satisfações com o rapaz. O proprietário da lanchonete não agride Rodrigo, mas o rapaz sente medo do vendeiro. Rodrigo fica acuado sem defesa, pois o marido da mulher o segurou de jeito, depois o expôs ao ridículo. A frase que deixou Rodrigo abalado foi quando o marido da mulher disse para todo mundo que estava na lanchonete ouvir:
- Você é um despeitado Rodrigo! Não consegue conquistar a mulher que gosta e vem mexer com mulher dos outros! Quem diria Rodrigo, um aleijado te passar a perna! Hei pessoal, aquele ali perdeu a mulher para um homem de cadeira de rodas, ele foi derrotado por meio homem!
Todos riram de Rodrigo. O rapaz sente - se humilhado perante todos, mas não perde a pose. De repente se ira contra todos, pega uma cadeira, joga longe e desabafa:
- Vocês ainda vão ver se eu perdi essa parada, seus idiotas! Ainda vou desfilar na frente de vocês com Rosana. Podem rir bastante... Quem rir por último ri melhor!! Mas tenham a certeza de uma coisa... Vou pegar aquele desgraçado onde ele estiver e vou acabar com a raça dele! Podem escrever isso!
Joga uma nota de cinqüenta reais na mesa e vai saindo do estabelecimento tropeçando nas pernas e repudiando a todos que não controlam seus risos. Do lado de fora da lanchonete havia uma mulher lhe esperando, Rodrigo dispensa a mulher e diz para ela:
- Toma esse dinheiro e suma da minha frente, vai desapareça!
E caminha em direção a seu carro. Já dentro do carro, ele é impedido de prosseguir, pois é cumprimentado por um amigo. Rodrigo sem olhar pede para a pessoa deixa - lo em paz, porém quando percebe que é Mauro, desliga o carro e resolve dar atenção ao rapaz. Mauro fala:
- Já tá indo embora cara? Agora que cheguei! Olha, tenho duas mulheres comigo. Humm!!!! Coisa do outro mundo!
Rodrigo novamente desce do carro e diz:
- Não dá mais para ficar aqui, não suporto essa gente rindo da minha cara. Droga! Só por causa daquele desgraçado! Estão dizendo Mauro que perdi minha mulher para um aleijado. Não é engraçado Mauro, estão falando que fui derrotado por um inválido... É, acho que eles têm razão! É Sérgio quem me impede de ser feliz com Rosana. Mesmo desaparecido aquele desgraçado está presente na vida de Rosana. Ela fala que ele vai voltar por isso tá esperando por ele! - Irritado pergunta: - E se Sérgio voltar Mauro? Pelos menos se eu soubesse onde ele está escondido... Ah Mauro! Eu juro que dessa vez ele ia sair do meu caminho pra sempre!
- Calma Rodrigo, que ódio é esse cara? O cara está numa cadeira de rodas, esquece aquele infeliz Rodrigo!
- Mauro, você é meu amigo cara, me ajude a encontrar ele, pelo amor de Deus, me fala onde ele está! Sérgio não pode voltar cara!
Mauro sente pena de Rodrigo e diz:
- Rodrigo, vou te contar uma coisa, não faz muito tempo eu estive com ele, foi muito rápido, mas sei que ele está em Abadiânia hospedado em uma fazenda. Foi em Abadiânia que eu o vi, não sei qual, mas é numa fazenda, o lugar exato eu não sei.
- E só agora é que você me fala isso Mauro? - protestou Rodrigo.
Mauro continua:
- Por favor, Rodrigo. Não vai fazer nenhuma loucura com o rapaz, o deixa sossegado. Só não te contei isso antes porque tenho medo do que você possa fazer com ele. Pra ser franco com você Rodrigo, tenho medo de suas ações, você é imprevisível cara. Larga essa mulher, você pode ter quantas mulheres que quiser cara! Que ciúme doentio é esse? Sérgio ficou numa cadeira de rodas por sua causa. Você é capaz de provocar mais sofrimento pro pobre?
Rodrigo é taxativo:
- Para ter o amor de Rosana Mauro, eu sou capaz de tudo, de tudo! - Rodrigo fala enquanto vai entrando em seu carro, dá a partida e sai cantando os pneus.
Mauro articula para falar algo, mas não consegue. Mauro só acompanha o carro de Rodrigo com os olhos. Não sabia se havia agido certo contando aquilo para ele, pois conhecia bem Rodrigo, tinha consciência que Rodrigo nunca foi normal, mesmo não apresentando nenhum distúrbio mental, poderia ser comparado a um psicopata.
Mauro então volta à companhia das mulheres que estavam esperando o rapaz a poucos metros.

Rosana conserva o hábito de ler um livro antes de dormir. Assim era que atraia o sono. Deitada em sua cama a moça percorre os olhos em um texto de Rachel de Queiroz. Seu sossego, porém é dissipado por um chamado ao telefone. Rosana, no entanto, não demonstra nenhum interesse em atender o aparelho que toca incessantemente. Depois de tocar por várias vezes, Rosana conduz a mão até o aparelho, traz o telefone ao seu ouvido e por três vezes sucessivas ela responde:
- Alô, alô...
Rodrigo fala do outro lado da linha:
- Sou eu meu amor. Não está reconhecendo minha voz?
Rosana abandona o livro e reforça a voz:
- Quer dizer quem está falando? Se não vou desligar o telefone. - Mas Rosana percebe que aquela voz era de Rodrigo.
Com voz bem suave, Rodrigo diz:
- Não, você não vai desligar meu bem. Sabe Rosana, eu já descobri onde seu amado está escondido. Brevemente meu amor, você não terá mais motivos para não me querer, isso não é ótimo Rosana? Você vai ficar sozinha pra mim e eu serei o homem mais feliz do mundo!
Aflita Rosana pergunta:
- Pelo amor de Deus Rodrigo, o que você vai fazer? Não faça nenhuma besteira!
- Ué! Não foi ele que roubou você de mim Rosana? Sérgio vai me pagar caro meu amor. Nós éramos tão felizes juntos Rosana! Você se lembra? Foi só ele aparecer pra você virar a cabeça. Aquele desgraçado não vai ser mais um problema pra nós meu amor. É lamentável... Porém você nunca mais vai ver aquele cara Rosana! Sérgio não vai ser mais uma pedra no nosso caminho!
- Não Rodrigo, não faça nenhuma loucura, deixe – o pra lá. O que Sérgio te fez pra você ser tão malvado com ele? Se você fizer alguma coisa com ele, aí sim é que eu nunca vou perdoar você! Não faz nada com Sérgio, Por favor! - Rosana já chorava.
- Então basta você ser minha de novo Rosana, somente isso meu amor!
- Rodrigo entenda, eu não gosto mais de você, eu tenho é medo de você. Sai da minha vida Rodrigo, me deixa em paz, pelo amor de Deus! Sabe de uma coisa? Nada me sai da cabeça que você está envolvido com o acidente de Sérgio! Você é um monstro Rodrigo! Só que não adiantou nada viu? O amor que sinto por ele nada pode destruir e sei que ele vai voltar pra mim! - Rosana ameaça desligar o telefone - Não quero mais ouvir sua voz, vou desligar o telefone e, por favor, não me procure mais!
Rodrigo alerta:
- Espere! Olha, sinto muito meu amor, mas não vou sair da sua vida, vai ser como antigamente, você vai ser minha novamente, então se esqueceu das minhas promessas, esqueceu que tudo que eu quero eu contigo?
Rosana pergunta:
- Como você sabe onde Sérgio está?
- Não te interessa como eu descobri, só te liguei para dizer que estou de partida para onde ele está e pode ficar certa Rosana que dessa vez eu vou acabar com aquele cara, será como você quer! Não será minha por bem, será por mal! Tá bom pra você?
Rodrigo termina de falar sorrindo forçadamente se achando vitorioso. Coloca o telefone no gancho e sorri exageradamente. De repente seu sorriso se transforma em mau humor e seu semblante muda. Do outro lado da linha Rosana, ao perceber que Rodrigo não está mais ouvindo, desliga o aparelho furioso e consigo mesma ela comenta:
- Meu Deus, Rodrigo é um louco, ele pode até matar Sérgio se o encontrar, o que faço? - Seu desespero é incontrolável, chora amargamente - Preciso avisar Adilson. Adilson tem que impedir que Rodrigo cometa essa loucura. Sérgio está correndo risco de vida. Rodrigo é um louco! Talvez se eu ficasse com Rodrigo, ele deixaria Sérgio em paz...
Rosana chora ainda mais:
- Não meu Deus! Eu não suporto aquele homem! Eu iria acabar com minha vida ao lado daquele homem... O que eu faço agora? Como avisar Sérgio?
Rodrigo tinha que ser detido. Sua intenção era mesmo matar Sérgio. Não tinha nenhum problema para ele em executar alguém, pois já havia sido indiciado por ter cometido um homicídio. Foi um crime ocorrido em Anápolis e ele havia ficado impune, pois a polícia não havia descoberto que Rodrigo era o assassino. Rodrigo também gostava de violentar mocinhas. Sorte ou não, ele nunca foi pego pela polícia.


























JOGO DE CARTAS

Naquele início de noite Sérgio explora sua vaidade, diante do espelho ele ajeita a gravata, penteia os cabelos. Seus olhos brilham e embalando sua felicidade assobia uma canção. Uma empolgação que não se via em Sérgio há muito tempo. Em seguida conduz sua cadeira de rodas para a sala e reclama a demora de Laércio. Sérgio parece tenso. A causa de sua euforia era porque aquela noite ia com Laércio à casa de Ester, para o jogo de baralho e com o objetivo de conhecer o pai da moça. Logo Laércio aparece na sala perguntando se Sérgio tinha visto a chave do carro. Sérgio aponta para a mesa onde estava a chave. Antes de saírem, porém, Laércio se dirige para o barzinho, ali mesmo na sala se serve com uma dose de cachaça, segurando o copo ele corre os olho em Sérgio e ironicamente faz uma observação:
- Sérgio, o que é isso? Gravata cara? Que ridículo, nós estamos indo é para um jogo de truque, não para um concerto!! Vai tirar essa gravata cara!
Sérgio concorda:
- É, acho que você tá certo, acho que exagerei um pouco, pra que tanta formalidade? – tirando a gravata acrescenta – Me dá um pouco dessa cachaça aí! Sérgio não esconde seu nervosismo.
Na casa de Ester ocorre a mesma afobação, para receber o convidado especial. Ester também se preparou, se embelezou diante do espelho, enriqueceu sua maquiagem, se bem que a moça já era muito linda, não precisava de maquiagem, mas fez questão de se maquiar para o encontro.
Ester circula na sala, já impaciente, em sua cadeira de rodas, esperando aflita por seu amor, que já estava bem atrasado.

Ester tem os cabelos bem cuidados, pretos e bem lisos, que não passa da altura dos ombros e repartido de lado, um pouco do cabelo fica sempre escorrido na testa, por isso freqüentemente ela passa a mão para tirá-los dos olhos, detalhe que combinava com os olhos verdes e com a pele clara. Os traços do rosto parecem que fora feito por um desenhista que domina perfeitamente a arte. Sobrancelhas grossas, tornando ainda mais atraente o seu rosto.
Ester confere seu relógio de pulso e constata que os dois não mais apareceriam, então se retira para seu quarto, um pouco aborrecida, contudo, resolve esperar mais um pouco no quarto. Dez minutos depois, seu irmão Henrique entra no quarto sem bater na porta e diz:
- Adivinha quem acaba de chegar?
Ester abre um sorriso e pergunta:
- É ele Henrique?!
- Pode desamarrar esse bode, Sérgio está te esperando lá na sala!
A moça renova o semblante e coloca um brilho nos olhos, Henrique se oferece:
- Vem, eu empurro sua cadeira!
E com o irmão empurrando a cadeira, foram recepciona - los.
Sérgio e Laércio perecem dois cavalheiros na sala, com um comportamento exemplar aguardam a moça.
A casa sobra espaço, a sala é imensa e possui muitos outros cômodos, que se estendem para dentro da casa. Os rapazes ficam reparando os móveis de Antigüidade que há na sala e no meio da sala corre um tapete com uma estampa vermelha.
De repente invade a sala uma criança correndo, logo atrás do menino um senhor já idoso, que também corre, o menino tenta escapar do velho dizendo:
- Não vô, o senhor não vai me pegar!
O velho sorri e ameaça o menino:
- Vou te pegar menino safado, me espere que você vai ver!
- Não vai e não vai! - diz o menino correndo pela sala.
Era uma brincadeira saudável entre avô e neto. O menino corre para o colo de Sérgio e pede socorro, diz apavorado:
- Socorro tio!
Sérgio segura o garoto e diz:
- Que menino bonito!
- Ele quer me pegar tio, sai daqui vô bobo!
Sérgio protege o menino, abraçando – o. Ao ver o rapaz o velho esquece a brincadeira e diz:
- Quem é você? O que faz aqui Laércio e você meu jovem?
Antes que qualquer um deles responder, Henrique aparece trazendo Ester, que estampa um imenso sorriso em sua face, Laércio se levanta e caminha em direção a moça cumprimentando - a, em seguida é a vez de Sérgio, que conduz a cadeira com certa dificuldade, pois o menino ainda está em seu colo. Henrique faz a apresentação:
- Esse aqui é meu velho pai Sérgio! Pai Irineu, este aqui é quem tá de olho em sua filha!
Fazendo Sérgio se empalidecer.
- Que isso Henrique? Corrige Ester.
Irineu é o pai de Ester e Henrique: Homem forte, ombros largos, mesmo tendo estatura média. Usa bigode, mas no alto da cabeça quase não tem cabelos, era viúvo. As marcas da velhice e do trabalho se revelam em seu rosto, pelas rugas mal trilhadas, no entanto, tem uma alegria contagiante.
Depois de olhar bem para Sérgio, Irineu comenta:
- Olha, eu faço bom gosto nesse namoro dóceis. Tá ouvindo minha filha?
- Que isso pai, vocês estão muito apressados!
Sérgio, acariciando o menino em seu colo, indaga:
- E essa criança tão bonita, de quem é?
Henrique responde:
- Esse é meu filho, seu nome é Marcos Paulo, desce do colo do moço Marcos!
- Parece que ele gostou de ficar no colo de Sérgio. Disse Ester.
Sergio diz:
- Eu adoro crianças!
O menino aparentava ter uns três anos de idade e era muito esperto, olhando no rosto de Sérgio ele pergunta, ainda sem coordenar bem as palavras:
- Cadê sua mamãe?
- Minha mamãe tá lá na minha casa e a sua?
- Papai é quem sabe dela, eu não sei da minha mamãe. Porque você tá sentado nesse carro, minha tia também tem um carro que nem o seu, eu ando no carro dela, né tia?
Sérgio propõe ao garoto:
- E você quer andar no meu carro também?
- Eu quero!
- Então segura, lá vamos nós!
Sérgio imita com a boca o barulho do motor de um carro e começa a dar voltas na sala com a cadeira de rodas, provocando no menino um pouco de medo, mas o garoto gosta de passear com Sérgio e delira de tanto rir. “Piiii!” Sérgio buzina com a boca. Depois Henrique se coloca na frente da cadeira e diz que é o guarda rodoviário e dá sinal para parar o carro pegando o filho nos braços, fazendo todos sorrirem. A brincadeira sem dúvida alegrou muito a casa. Mas uma babá veio e conquistou o menino levando - o, mas antes que saísse Sérgio diz:
- Depois você volta tá?
O menino fala:
- Agora vou tomar banho porque tô sujo, depois eu volto!
- Nossa, ele é uma gracinha! Exclama Sérgio.
- A mãe dele está hospitalizada, não é nada sério, o médico dela me garantiu que logo ela estará boa. Explicou Henrique.
- Parabéns pelo seu filho Henrique, ele é uma criança encantadora!
- Bem, agora oceis vão provar da branquinha, é uma preciosidade. - sugere Irineu indo buscar uma garrafa de aguardente e pegando também alguns copos, em seguida serve a todos, menos a filha é claro, contudo a maior dose é a sua, Laércio nota isso.
Henrique ressalta:
- Somos cinco, o jogo de baralho é de quatro pessoas, um de nós vai ficar sobrando e esse, que tá sobrando vai cuidar da carne que tá assando!
Sérgio olha para Ester e comenta:
- Vocês não acham que é cedo para começar o jogo?
Laércio se prontifica:
- Opa! A carne eu cuido, num gosto mesmo de truque, eu sirvo vocês.
- Mas Laércio, você é o parceiro de Sérgio. Argumenta Ester.
- Ué fia, oce vai ser a parceira de Sérgio e Laércio vai cuidar da carne! Aconselhou Irineu.
Sérgio se surpreende.
- Ora papai, joga de truque não é para mulheres! Salientou a moça.
- Se tá com medo, fala logo fia!
- Sérgio você está falando com uma profissional - refere Henrique - Olha minha irmã, acho que você deveria jogar, nosso pai te desafiou, se bem que acho que vai ser canja ganhar de vocês dois, não é mesmo pai? Henrique falou com ironia.
- Sérgio, papai é um veterano nesse jogo, não conheço ninguém que tenha conseguido derrota - lo, mas pode deixar que sua invencibilidade vai acabar hoje! - comentou Ester.
- Tomara minha fia. Mas vamos pra outra sala. Disse Irineu.
Dito e feito.
Laércio pergunta:
- A onde é a cozinha hein?
- Siga esse corredor, a primeira porta à direita. Vai lá bichão! Respondeu Henrique.
Ester, primeiro dá algumas instruções para Sérgio sobre vários sinais que há no jogo, sinais que servem para identificar as cartas. Sérgio, sabendo que Ester é sua parceira, fica até mais interessado pelo jogo, afinal estaria perto de sua musa.
Os jogadores se posicionam em volta da mesa e Ester inicia dando as cartas. Sérgio observa a moça fazendo seu malabarismo com as cartas entre as mãos e reparti - las a cada jogador. Ester faz alguns sinais para Sérgio, porém o rapaz não entende coisa alguma. Irineu descarta primeiro e o jogo segue normal. Uma vez por outra Laércio se aproxima da mesa com um espeto carregado de carne assada e um aperitivo para acompanhar e entre uma pausa e outra eles saboreiam o assado, nessas alturas até mesmo Ester. O jogo dura aproximadamente três horas. A previsão de Ester prevalece, o jogo termina em dois a um para Ester e Sérgio, Irineu e Henrique não ficam rancorosos, se conformam de terem perdido o jogo, o que valeu a pena foi a diversão do encontro que promoveram, da deliciosa carne assada, que enriqueceu o jogo, da famosa cachacinha que alegrou mais a mesa, porém ninguém abusou do aperitivo, com exceção de Irineu que se excedeu, por isso se recolheu assim que o jogo terminou.
Ester também havia abandonado a sala, conduzira sua cadeira para o alpendre da casa, a fim de respirar ar puro lá fora se pôs a contemplar o luar. Henrique dormiu no sofá da sala. Sérgio se sente sozinho na sala, então seguiu os “rastros” de Ester. A moça não consegue continuar sua concentração na lua, pois Sérgio comenta com ela:
- Está brilhante a lua hoje, né?
- É verdade, ela está muito bonita esta noite! Sabia Sérgio que a lua é meu astro rei?
- É mesmo e como você sabe disso Ester?
- Porque meu signo é câncer e toda pessoa de câncer tem a lua como seu regente!
- Olhe só, eu não sabia que a lua influenciava a minha vida, pois também sou canceriano como você Ester. Mas você se interessa por horóscopo?
- Um pouco. Toda pessoa do signo de câncer é sonhadora, romântica e tem uma imaginação muito fértil, querendo sempre se realizar sentimentalmente. Quando eu estava lendo os originais de seu livro, deduzi que você tem todas essas características, ai percebi que você só poderia ser de câncer, tá vendo como eu adivinhei?
- E você gostou das coisas que eu escrevi Ester?
- Realmente são profundas, mas é muito tristes, você é triste Sérgio?
- Desde que encontrei você não sou mais, você é de uma doçura Ester! Preciso te contar o que aconteceu comigo, não é justo esconder isso de você! Ester, apenas ouça! - Sérgio continua - Olha, na verdade eu quase me casei, só que na véspera do meu casamento aconteceu o acidente que me deixou paraplégico e por causa de minha paralisia desisti do meu casamento. Sabe Ester, quando me vi nessa cadeira de rodas eu queria morrer, a vida não tinha mais sentido para mim, sentia ódio das pessoas, de minha namorada. Eu via as pessoas de cadeira de rodas e ficava com pena, com muita pena, pensava que graça poderia ter vivendo em cima de uma cadeira de rodas, ser limitado, depender de outras pessoas, jamais eu concordaria com isso e veja você o que o destino fez comigo! Sérgio já tinha os olhos marejados.
- Porque não quis mais se casar Sérgio?
- Sei lá, porque tive medo, pois minha namorada não seria feliz casando com meio homem, porque eu me achava um inválido!..
Ester embala com ele em suas falas:
- Porque você é um derrotado, não é Sérgio? Você morria de medo de se tornar um deficiente físico, porque isso pra você seria o fim! Pessoas, como você Sérgio pensam que nós paraplégicos não podemos nos casar, ter filhos, ou seja, ter uma família. Eu estou decepcionada com você Sérgio!
Ester termina de falar e força a cadeira de rodas para sair dali, no entanto é impedida por Sérgio que diz:
- Espere Ester! Não vá! Ajude-me, eu te amo!
- Não acredito no seu amor Sérgio! Só diz isso porque infelizmente ficou como eu. Lamento muito Sérgio!
- Não, não é verdade, entenda Ester, está sendo muito difícil para eu suportar essa cadeira, fique comigo! Por favor, você está me fazendo compreender o que aconteceu comigo! Sérgio chora diante de Ester.
- Acho que quando você andava Sérgio, você seria incapaz de se apaixonar por uma mulher paraplégica!
- Não diga isso Ester, isso não é verdade!
- Como não é verdade Sérgio? Você menosprezava um deficiente, agora que se tornou um de nós, quer se atirar no abismo, vai, pule... Para mim Sérgio, não é suas pernas que estão doente não cara, acho que é sua cabeça que precisa de tratamento! Ester procura conter o choro.
Sérgio se justifica:
- Perdão Ester, é que estou muito confuso, tenha paciência comigo, a coisa que jamais quero ver nesse mundo é você magoada. Você foi a melhor coisa que me aconteceu nesses últimos dias! Sérgio enxuga seu rosto.
- E sua noiva, ela também tem sua mentalidade?
- Não, Rosana aceitou tudo, por ela nós estaríamos casados.
- Então será inútil eu alimentar meu amor por você Sérgio, porque a qualquer momento sua noiva vai aparecer por aqui e roubar você de mim! Não, ela tem direito sobre você, você precisa rever suas atitudes Sérgio. Não vou me arriscar, pois sei que vou sofrer!
- Isso não vai acontecer Ester. Eu não disse pra Rosana onde estou e mesmo que ela aparece por aqui, nada vai mudar entre a gente, o que eu sentia por Rosana acabou, sua presença me fez esquecer dela. Por favor, Ester fique comigo!
- Com uma condição Sérgio.
- E qual condição?
- Que você nunca mais lamente nosso estado físico, que você jamais se sinta inferior a outras pessoas!
- Desculpe Ester, te prometo que não vou mais falar sobre isso, me perdoe, é que eu não estava preparado para isso!
- Olha meu bem, se você não mudar sua forma de enxergar as coisas, não passará mesmo de um morto quando na verdade só está em uma cadeira de rodas.
Os dois se abraçam e Sérgio fica nos braços da moça como uma criança de colo, recebendo carinho. Em seu íntimo, Ester sentia que Sérgio ainda amava muito sua ex - noiva, por isso não ia alimentar esperança, embora estava disposta a manter seu namoro com ele.
Já era bem tarde. Laércio, que também tirava um cochilo na cozinha, se preocupa em ir embora e interrompe Sérgio, queixando-se das horas, dizendo que já era tempo de irem embora. Sérgio permanece nos braços de Ester e disfarça a umidade dos olhos. Levanta a cabeça do colo da moça e rapidamente despedi - se saindo, a jovem fica imóvel, olhando seu amado conduzir a cadeira de rodas rumo ao carro, Laércio nota que Sérgio esta muito estranho, porém prefere ignorar, ao contrário de Ester, que conhecia perfeitamente a causa do sofrimento do rapaz. Por isso não fala mais nada com Sérgio. Laércio, antes de seguir atrás de Sérgio diz para a moça:
- Tchau Ester, foi muito bom a gente ter vindo aqui, despede de seu pai e Henrique por mim. Hei Sérgio, me espere cara...
A moça fica a contemplar o carro em movimento, que vagarosamente desaparece na escuridão. Henrique aparece por trás de Ester, colocando as mãos em seu ombro e comenta:
- É, Sérgio gosta muito de você maninha, olhe minha irmã, eu estou morrendo de inveja de vocês dois. Acho que você encontrou o grande amor da sua vida!
Ester continua de olhos fixos na estrada.
Henrique dá um beijo na testa da irmã.
Ester diz:
- É meu irmão, mas eu tenho medo!
- Ué, medo de quê?
- Medo que ele não agüente. Sérgio não aceita sua deficiência, perdeu até a vontade de viver! É meu irmão, ele precisa de um estímulo, coitado!
- E você não acha que ele já tem razão para se alegrar? Não minha irmã, um jovem tão saudável, que escreve coisas tão bonitas, eu não concordo com você, acho até que Sérgio é muito feliz!
- Não é bem assim Henrique. Sérgio me disse que quando andava, no momento que ele se preparava para o seu casamento, aconteceu o acidente que o deixou paraplégico, a partir daí ele se sentiu discriminado, porque passou a depender de uma cadeira de rodas. É por isso que está aqui Henrique, está fugindo da sua ex-noiva e pelo que ele me disse, sua ex - noiva ainda o ama muito. Sérgio, no entanto, tem medo de se casar com ela e faze - la sofrer. Sérgio na verdade, tem é vergonha de que ela o veja assim, impossibilitado de andar com as próprias pernas!
- E daí? O que importa é que vocês dois estão felizes, já pensou que se não fosse isso vocês não teriam se conhecidos e não estariam juntos?
- É Henrique, já vi que você não entendeu nada, não vale a pena te contar isso... Eu vou é entrar e me deitar - enquanto manipula a cadeira para seu quarto acrescenta - Quando for deitar apague as luzes.
Henrique fala em alto tom:
- Pois eu não me incomodo nem um pouco com isso, o importante pra mim é saber que você está feliz! - depois comenta consigo - Oh, minha irmã, ninguém vai roubar sua felicidade de novo, ninguém!
A exemplo de Ester, também entra, fecha a porta, apaga às luzes e vai se deitar.
O que parece é que Ester sofrera uma desilusão amorosa no passado, por isso Henrique estava tão interessado na felicidade da irmã.























BUSCANDO A VERDADE

Abadiânia fica localizada a cerca de oitenta quilômetros da Capital de Goiás. Por motivos político, quase não se desenvolveu. Seus habitantes eram todos conhecidos entre si e, havia grande harmonia entre eles, portanto qualquer visitante que chegasse na cidadezinha despertaria a curiosidade da população.
Rodrigo chega à referida cidade e estaciona seu carro à porta de um humilde bar, a fim de pedir informações. Adentra o bar, sem notar os fregueses que se encontram ali, porém, ele desperta a curiosidade das pessoas. Rodrigo apóia seu cotovelo no balcão e diz:
- Me dá um cafezinho aí, por favor!
O vendeiro é prestativo, prepara o café, mas sempre de olho no sujeito, que nem um bom dia pronunciou ao entrar no bar. Rodrigo se mantém calado e bebendo o café, depois, o vendeiro puxa assunto:
- O moço parece que é novo por essas bandas...
Rodrigo fala secamente:
- Só quero que o senhor me indique uma pensão para ficar, talvez eu precise ficar alguns dias por aqui.
Um dos fregueses, que ouvia, responde:
- Quem aluga quarto por aqui é dona Judite, mas é bom que saiba que é só pra quem se identifica, não é mesmo pessoal?
Rodrigo pergunta para vendeiro:
- Onde fica essa dona Judite?
- Só que tem um porém. O moço não ouviu? Responde o vendeiro, com certo desconfio.
- Olha, se estão pensando que sou um fugitivo, estão enganados, tá ouvindo? Eu sou de bem! Completa Rodrigo.
- Se o moço tiver mal intencionado nessa cidade, ninguém aqui te vai serventiar não, aqui só tem gente honesta moço, trabalhadora. Conclui o vendeiro.
Um dos fregueses concorda:
- É isso mesmo moço!
- Bem pessoal, sou de Anápolis, estou aqui a trabalho, não sou nenhum bandido ou criminoso. Vou ficar aqui por alguns dias, quero ser amigo de vocês todos.
O vendeiro fala, ainda com certo receio:
- Olha, a pensão de dona Judite é na próxima esquina.
- Muito obrigado! Agradece Rodrigo tirando uma nota do bolso, jogando - a no balcão - Fique com esses dez reais pelo café!
Quando ele sai do estabelecimento, um deles comenta:
- Na certa o moço é endinheirado, pagar um cafezinho com dez reais!
- Que ele é rico nós já sabemos, mas não me pareceu que é boa gente. Desconfia o vendeiro.
Rodrigo vai direto para a pensão indicada. Modesta pensão, mas a única da cidade. Na recepção não há ninguém para recebe - lo. Rodrigo vistoria o lugar, vê algumas mesas e cadeiras, em uma das mesas ele coloca seus pertences: uma pequena mala. Começa a chamar por alguém, batendo palmas, sempre de olhos nas paredes sujas.
- Oh de casa! Logo aparece uma senhora de idade já bem avançada, Rodrigo diz antes de qualquer fala da mulher:
- Bom dia minha senhora, a senhora que é dona Judite?
- Sim, pode falar moço.
- Me falaram que a senhora aluga quartos, é que preciso me hospedar por aqui por alguns dias. Olha, posso pagar o aluguel adiantado, se a senhora quiser! Disse folheando algumas notas de dinheiro.
Dona Judite é uma mulher que, apesar de já bem velha, era bem conceituada em Abadiânia: personalidade forte e determinada, merecedora de muito respeito da população. Apesar de ter o rosto acidentado e com a vista já fraca, tanto que, para auxiliar sua visão, trazia um óculo na frente dos olhos e amparados pelo nariz.
Dona Judite observa o rapaz minuciosamente e diz:
- Guarde seu dinheiro rapaz! Primeiro vamos negociar. Por que um bonitão da cidade quer se hospedar na minha humilde pensão?
- É que eu preciso desvendar um mistério aqui. Olha, prometo que não vou incomodar a senhora, nem tumultuar seu estabelecimento.
A mulher argumenta:
- Mas quero dizer pro moço, que aqui na minha pensão, só hospedo gente de bem, se o senhor veio aqui em Abadiânia pra perturbar a paz desse povo, pode picar a mula daqui, nesse caso minha pensão num tem lugar pro senhor não. Não mesmo!
Dona Judite tira os óculos, limpa as lentes, com a ponta da manga que usa e fica olhando para o rapaz, que diz:
- Jamais senhora vou semear a discórdia nessa cidade, quero só mesmo é descobrir um parente meu que está trabalhando numa fazenda nessa região.
Dona Judite termina de limpar os óculos, mas sempre observando o rapaz, coloca – o novamente e começa diminuir suas dúvidas:
- É... O moço é vistoso e tem boa aparência, posso estar enganada, mas não vejo falsidade nos seus olhos. Tá certo, agora, não me deixa estar enganada não, tá?
- Então posso ficar senhora? A senhora vai me alugar o quarto?
Ela abre a gaveta da mesa, pega um molho de chaves e intima o rapaz:
- Me acompanhe, vou te levar até seu quarto. Olha aqui o café da manhã é servido às oitos, o almoço às... Vai dizendo dona Judite sendo ouvida atentamente por Rodrigo.

Adilson acabara de chegar à delegacia após uma captura, junto com mais dois policiais. A busca foi satisfatória, pois os policiais têm o bandido sobre controle. Na movimentação que estava na delegacia, Adilson não nota que há ali alguém a sua espera, foi necessário que a secretária anunciasse Rosana para ele.
- Policial Adilson, tem uma pessoa te esperando há horas. Acho que é importante, ela parece tensa. Diz a secretária.
Adilson vira o rosto e dá de cara com Rosana, que levanta da poltrona, onde estava sentada, ele fica sem iniciativa, ordena para um dos policiais:
- Entregue esse marginal pro delegado Rodolfo.
- Pode deixar Adilson.
E o bandido, algemado e humilhado, foi conduzido ao delegado. Felizmente a polícia detém mais um profissional do crime, sem dúvida era uma vitória para a policia poder engaiolar o sujeito, pois, por muitas vezes, os policiais haviam sido driblados por aquele que estava sendo preso.
Rosana está nervosa, a ponto de estar trêmula. Começa a suplicar para Adilson:
- Por favor, Adilson, não me manda embora, só você pode impedir que aconteça uma desgraça. - Rosana abraça Adilson - Você precisa ir onde está Sérgio e avisa - lo, é preciso Adilson, por favor, não deixe que Rodrigo faça isso!
- Calma Rosana, por que está chorando, calma, o que foi?
Vira - se para a secretária:
- Eleonora, por favor, traga um copo de água para Rosana. Vem cá Rosana, senta aqui, o que está acontecendo?
Rosana senta, controla o choro e diz:
- É aquele louco do Rodrigo Adilson, não sei como, mas ele ficou sabendo onde Sérgio está. Adilson, Rodrigo falou pra mim que vai matar Sérgio! Eu tenho medo que ele faça isso mesmo!
- Espere Rosana, você está muito confusa. Olha, toma um pouco de água!
A moça pegou o copo de água, com as mãos trêmulas e enquanto bebe a água, Adilson confere o relógio de pulso e diz:
- Bem, já é hora de almoçar, vamos até o restaurante aqui em frente, lá você me conta essa estória com mais calma, vem comigo.
Dirigem-se para o restaurante onde Adilson sempre estava habituado a fazer suas refeições. No restaurante sentam - se à mesa. Rosana parece estar mais calma. Adilson pergunta:
- Agora sim, o que foi que aconteceu realmente?
- Adilson, Rodrigo enlouqueceu!
Adilson é gentil com a moça:
- Almoça comigo Rosana?
- Não, obrigado!
Ele faz o pedido para o garçom, segura nas mãos da moça e menciona:
- E agora, está mais relaxada Rosana?
- Só posso recorrer a você Adilson, porque é a única pessoa que sabe onde aquele “cabeça dura” se enfiou, sei que não vale a pena eu ficar chorando, me humilhando para você, pois sei que você não vai me dizer onde posso encontra - lo, mas você tem que impedir isso Adilson! Ai! Se você soubesse o que tenho passado Adilson, das minhas aflições, do medo que tenho de Rodrigo, medo que ele faça alguma coisa de ruim e ele vai fazer Adilson, se não for detido, você vai me entender quando eu te contar!
- Infelizmente é verdade Rosana, eu não vou poder te falar nada sobre Sérgio.
- Tudo bem Adilson, que se dane meu coração, não vou mais insistir com você, sei que nada que eu faça vai fazer com que eu arranque algo de você.
O prato é servido, Adilson parece faminto, enquanto come fala:
- Você acha que não falo isso pra ele Rosana? Só que Sérgio não quer ver você, é como você falou, ele é um “cabeça dura”, não adianta, sinto muito Rosana!
- Está bem, não precisa me dizer isso de novo, só te procurei para pedir que você vá até ele e impeça que aconteça uma desgraça!
- Que desgraça é essa, de que você está falando?
Rosana é objetiva:
- Ontem recebi um telefonema, já tarde da noite, era Rodrigo, e ele me afirmou que sabe onde Sérgio está escondido e estava indo para lá para acabar com ele de vez. Rodrigo parecia muito seguro do que falava Adilson, ele me jurou que ia matar Sérgio, por favor, Adilson, isso não é brincadeira!
- O que você está me dizendo Rosana? Que Rodrigo é um louco nós sabemos, mas por que esse desespero todo? Fique descansada, ele não sabe nada, ninguém sabe onde Sérgio está, é tudo mentira dele!
- Você está enganado Adilson, Rodrigo me disse que sabe da redondeza por onde ele tá e sabendo disso estava fácil saber do lugar exato, por favor, Adilson, vá até ele e diga para ele ficar prevenido!
- E você acreditou nisso Rosana? Rodrigo estava testando você. O lugar em que ele está não é longe daqui, mas é muito discreto não tem a mínima possibilidade de Rodrigo encontra - lo. Olha Rosana, não se preocupe, Sérgio está muito bem, tá escrevendo seu livro, ele está até mais conformado com sua paralisia. Aquele lugar tá fazendo muito bem pra ele, ele tá mais otimista com a vida!
- Escute, Rodrigo está no encalço de Sérgio, se ele o encontrar, certamente o fará mal, se você não quiser ir, é só me dizer onde posso encontrar ele. Você mesmo Adilson nos disse, que iria nos proteger, não foi?
- Sim, foi! É verdade Rosana.
- Mas não é verdade Adilson, você não está preocupado com a gente, pelo menos comigo, você não tá nem aí!
- Talvez Rosana, isso que você está me dizendo, seja um pretexto para eu te dizer onde Sérgio está.
Rosana lhe olha, sentindo ódio, levanta e vai saindo, pois Adilson falou com certa ironia. Antes de sair Rosana pergunta:
- Então você tá me chamando de mentirosa? Tanto tempo que te conheço Adilson, estudamos juntos, sempre confiei muito em você, mas só agora vejo que você não é aquele superamigo! Só agora percebo que é um cara insensato e egoísta! Rosana foi embora chorando.
Rapidamente Adilson se corrige:
- Hei, espere Rosana! – ela cessa seus passos – Desculpe, não é minha intensão que você se ofenda comigo, esqueça vai, me perdoa!
- Pensei que podia contar com você Adilson!
- Você sabe que pode contar comigo Rosana!
- É, pois não parece!
-Volta aqui vai, se sua afirmação for verdadeira, como é que ele sabe pra onde levei Sérgio, quem poderia ter contado isso a ele? Não dá para entender Rosana, Sérgio não matou, não roubou, não é fugitivo de ninguém, no entanto, tem que correr desse louco. Droga será que não bastou ele ter ficado preso naquela cadeira de rodas? O que mais esse Rodrigo quer fazer com ele?..
Rosana conversa em pé e apoiada na mesa, diz:
- É muito revoltante Adilson, você não imagina como eu sofro com as ameaças desse crápula! - Rosana faz uma pausa e continua – Certamente você não está sabendo que aquele acidente de moto que houve com Sérgio não foi premeditado? Foi ele Adilson, foi Rodrigo que rompeu o cabo de freio da moto dele!
Adilson fica horrorizado, diz:
- Meu Deus, isso é verdade Rosana? Você não está delirando? De onde você tirou isso?
Rosana senta novamente e desabafa:
- Eu já suspeitava disso Adilson há muito tempo, até que obtive a confirmação por Mauro. Mauro conhece toda sujeira de Rodrigo, os dois estão sempre juntos!
- Diz que isso é mentira Rosana, esse cara é um paranóico Rosana, ele é um bandido perigoso, que está solto por aí. Por que você não me disse isso antes Rosana, é muito grave essa história! Então esse Rodrigo não é normal?
- Ele é bem normal Adilson, ele tem é que ser preso imediatamente!
Adilson pergunta:
- Você sabe onde mora esse tal de Mauro?
- Ele é muito da noite, gosta de freqüentar as casas noturnas, mas onde ele mora, eu não sei.
- Eu preciso desse cara Rosana, só assim eu poderei botar Rodrigo na cadeia! Se esse Mauro me confirmar o que você está falando, Rodrigo está encrencado com a polícia!
Rosana indaga:
- Você nunca soube da verdadeira causa do acidente de Sérgio, né Adilson?
- Não, o resultado da perícia, afirma que foi realmente ausência de freio e falha do condutor da moto. - Adilson continua sem acreditar - Ah não! É absurdo demais Rosana o que você tá me dizendo, eu não posso acreditar que Rodrigo rompeu os cabos de freio da moto de Sérgio!
- É fácil você saber Adilson, procura Mauro, ele te confirmará o que eu te disse com mais clareza.
- Se sua acusação proceder Rosana, eu te juro, eu mato esse Rodrigo!
Adilson não mais se contém sentado, deixa seu almoço por terminar, aliás, não comia a tempo, sentindo ódio de Rodrigo. Paga o almoço à dona do restaurante e acrescenta para Rosana:
- Pode deixar Rosana, que eu resolvo essa parada do meu jeito! Agora vou voltar pra delegacia.
Rosana entra em seu carro e vai embora. Adilson segue em rumo oposto de Rosana, andando a pé.
À tarde daquele mesmo dia, Adilson vai até o colégio, o mesmo que havia feito a faculdade, para ter acesso às fichas dos ex – alunos: Os formandos do ano de 1983, no qual participaram, entre outros Sérgio, Rosana, Rodrigo, o próprio Adilson e Mauro. O interesse estava apenas nesse último nome, pois logicamente, em sua ficha constariam todos os seus dados, assim sendo, ele descobriria seu endereço.
Apresenta - se ao reitor da faculdade que, por coincidência era o mesmo do período em que ele fazia a faculdade. Diz que é policial e expõe ao reitor o motivo da investigação e então Adilson consegue autorização da faculdade para vistoriar os arquivos do referido ano, mesmo assim, Adilson não entra na sala sozinho, uma pessoa de confiança na faculdade é incumbida de acompanha - lo.

No fichário de cada aluno, Adilson lê nome por nome, após ter lido vários nomes, até mesmo o seu, deparou com o nome: Mauro Miranda de Melo, logo abaixo do nome seu endereço: Rua Rui Barbosa, Número 402 – Centro – Anápolis – Go.
Não havia o que ser mais procurado, Adilson se contentou. Anotou o endereço e tudo foi colocado de volta no devido lugar. Adilson agradece o reitor da faculdade, a pessoa que o acompanhou e vai embora.
O meio de Adilson se locomover na cidade é em uma moto. Adilson procura pelo endereço, mas parece em vão, a impressão é que aquele número não existe. Já estava quase desistindo, porém, no final da rua, finalmente ele encontra seu alvo, o endereço confere. Era uma casa já gasta com a ação do tempo, telhado enfraquecido, as paredes denunciam falha no reboque e rachaduras, casinha, que pela sua aparência era a mais antiga da rua. No portão, quase caindo, havia uma placa, onde se lia o número 402 e também: “Cuidado com o cachorro”, Adilson nem lê a frase e abre o portão, é surpreendido com um cachorro mal humorado, o animal late muito, rapidamente Adilson fecha o portão, então começa a chamar por alguém, batendo palmas, a casa continua fechada, mas não demora e uma pessoa abre a janela. Um senhor já bem idoso atende Adilson, com a janela entreaberta o senhor pergunta:
- O que o senhor quer?
- Por favor, senhor. Mauro está em casa?
- Não, ele saiu, o que o senhor quer com meu filho?
- Olha senhor, não é nada que comprometa seu filho, só quero umas informações dele.
- Que tipo de informações o senhor quer? O velho parece assustado.
- É que sou policial senhor e preciso falar com seu filho.
- O senhor é policia? Indaga o velho.
- Sim, sou, mas fique calmo.
Enquanto falam o cachorro continua latindo, incomodado com a presença de Adilson, embora o cachorro não causasse medo, pelo seu tamanho físico, Adilson mantém o portão fechado para evitar um possível ataque do vira - lata. Mas o som do latido atrapalha o diálogo com o velho, Adilson se sente constrangido, pois o senhor da janela, não fala nada para afastar o cachorro, então, notando que não estava sendo bem recebido na casa, prefere ir embora, mas diz:
- Então eu volto outra hora senhor.
- Espere! Vou abrir a porta pra mode o senhor entrar. Responde o velho na janela. O cachorro insiste em enxotar o rapaz dali, mas não demora e o velho abre aporta e brada com o animal, dizendo:
- Vai deitar Gafanhoto, vê se aquieta cachorro sarnento!
O cachorro obedece a seu dono e se cala. Apoiado em uma bengala, o velho diz para Adilson:
- Pode entrar polícia, ele não deve demorar. Enquanto Mauro não chega, nós vai bebendo um cafezinho! O moço parece que é boa gente, não vejo por que não te receber em minha casa.
Adilson conquistou o velho:
- Isso é ótimo seu... Um café seria bem - vindo! Adilson abre o portão e caminha para dentro da casa.
- Raimundo, seu criado!Diz o velho, estendendo a mão enrugada para Adilson.
Apesar de humilde, a casa é bem organizada, tudo em seu devido lugar, embora sem móveis luxuosos, há zelo nos poucos que tem. Adilson prevê que, companhia para o velho, parece que é somente o cachorro, que, aliás, passa a cheirar Adilson e balançar sua calda. Seu Raimundo novamente repudia o cachorro:
- Sai daí Gafanhoto, deixa o moço em paz! O cachorro obedece ao velho novamente.
Seu Raimundo se senta e convida Adilson também para sentar - se, Adilson senta numa poltrona com o forro rasgado. Seu Raimundo diz uma frase com grande voz:
- Andréia, serve um café para nosso visitante!
- Já vou pai. Responde a pessoa em outro cômodo.
O velho volta para Adilson, segurando sua bengala:
- O senhor desculpe minha ignorância, mas o senhor entende a preocupação de um pai quando a polícia vem na sua casa atrás de seu filho, ainda mais se esse filho é Mauro... Qualquer pai ficaria preocupado!
Adilson é razoável com seu Raimundo:
- Fique calmo seu Raimundo, não há nada contra seu filho, o problema é com um amigo dele. Ouça seu Raimundo, uma pessoa me procurou e fez uma acusação muito séria contra um sujeito aí e disse que seu filho pode provar tudo desse sujeito, só quero que ele seja testemunha.
Seu Raimundo expõe:
- Mas se Mauro sabe de toda essa tramóia desse amigo, por que é que ele não denunciou pra polícia? Olha moço, o senhor tem carta branca para arrancar de Mauro toda confissão, se meu filho tiver alguma culpa nisso, se ele também estiver devendo para a justiça, eu não vou me importar que o senhor dê uma lição nele também. Filho meu tem que andar na lei, Mauro precisa mesmo de uma lição!
- Não seu Raimundo, não vai acontecer nada com seu filho.
Nesse estante aparece na sala uma bonita mocinha carregando uma bandeja com duas xícaras de café, que de tão quente, o café libera fumaça. Com muita educação ela serve Adilson, Adilson pega a xícara, não tirando os olhos da mocinha. Com timidez no andar, ela serve a outra xícara para o pai, seu Raimundo pega a xícara com as mãos trêmulas, chamando a atenção da filha, por não haver cumprimentado o visitante:
- Oce num vai cumprimentar o moço, não?
- Como vai senhor? Cumprimenta a moça com simplicidade.
- Bem e você? Responde Adilson encantado.
- Bem também!
Seu Raimundo apresenta sua filha:
- Essa é minha filha Andréia, é a que cuida da casa, é minha companhia, ela e esse cachorro.
Adilson fica com a xícara de café na mão e hipnotizado, olhando pra mocinha.
Adilson levanta do sofá e estende a mão para Andréia:
- Seu café está uma delicia!
Andréia disfarçadamente fica perturbada na presença de Adilson, porém sua inocência lhe leva a indagar:
- Obrigado, o senhor prende gente?
“A resposta de Adilson só no próximo capítulo”.

























DESEJO DO CORAÇÃO

Andréia transmite graciosidade, simplicidade e simpatia. Tem o comportamento muito humilde. Sua beleza deixa Adilson impressionado. Seu olhar é arisco, mas com a idade própria para despertar o interesse de um homem. A moça tem 18 anos de idade e só carrega tristeza no coração. Ao contrário do irmão, Mauro toda noite se divertia, sua vida é regrada aos prazeres e a curtição, Andréia coitada, sua vida era totalmente dedicada ao pai.
Depois de um espontâneo sorriso, Adilson responde à Andréia:
- Não Andréia, que isso? Eu não prendo ninguém que não mereça ser preso, além disso, eu só levo pro delegado, ele é quem prende os bandidos!
Andréia não compreende nada, seu Raimundo comenta:
- Liga não seu Adilson, Andréia é meio burrinha mesmo! Pra ela, o senhor é matador de gente.
- Que isso seu Raimundo, sua filha é muito encantadora, é um anjo de pessoa!
Andréia fica sem graça, caminha até o pai e diz:
- Chovê a mão do senhor pai, o senhor tá passando a pomada que o doutor falou pra passar?
Seu Raimundo tem na mão esquerda a marca de uma ferida já cicatrizada.
Como aquela mocinha é prestativa com o velho, tira a xícara de café da sua mão, já vazia, depois limpa a boca do velho com um guardanapo, que carrega em suas mãos e depois segura a mão do velho, para ver se havia ainda vestígio de sangramento ou de alguma perfuração. Adilson coloca sua xícara em uma mesinha, junto com a xícara que Andréia havia tirado do pai.
Seu Raimundo confronta a filha dizendo:
- Num tem mais nada pra ser curado aqui não menina, não tem mais pereba nenhuma aqui não sô!
Mas Andréia rebate o pai:
- Bem se vê que o senhor não passou o remédio né pai? Vai logo passar a pomada pra sarar de vez essa pereba!
- Ara filha! Pra quê esse incomodo, se não tá mais doendo, olha aqui mode o senhor vê seu Adilson - disse o velho mostrando a mão para Adilson.
- Pai, mas é pra o senhor ficar bão de vez!
Adilson concorda com Andréia:
- Sua filha tem razão seu Raimundo, isso pode infeccionar novamente, é melhor o senhor fazer o que sua filha está dizendo.
Seu Raimundo reclama, mas acata a ordem da filha:
- Tá melhor, mas se ocê tá mandando eu vou passar de novo...
Seu Raimundo era um idoso de oitenta anos de idade. O velho pede licença para Adilson e se apoiando na bengala adentra a casa para procurar a tal pomada, deixando Andréia e Adilson sozinhos na sala.
Andréia pergunta:
- Carece de ajuda pai?
- Careço não, faz sala pra seu Adilson, fica a vontade seu Adilson!
Um silêncio insiste em ficar entre Andréia e Adilson. Adilson procura puxar assunto com a moça, mas não encontra a frase certa, o jeito foi dizer:
- Bem, tenho que ir embora, Mauro está demorando muito, diz para seu pai que volto outra hora. Adilson caminha para a porta de saída.
- Espere mais um pouquinho moço! Diz Andréia.
- Só se você fizer questão que eu fique.
- Tá bão, eu faço! Responde ela timidamente.
- Estou muito impressionado com você Andréia, achei tão bonito essa sua preocupação com seu pai, admirei muito você, é tão cuidadosa com ele!
- É de valia, o senhor não acha seu Adilson, meu pai tá muito velho, ele precisa de mim, é com gosto que eu cuido dele e da casa. Ele tá bem fraquinho, logo nosso Senhor Jesus Cristo chama ele e aí eu num sei o que vai acontecer comigo, tenho muito medo quando isso acontecer, porque eu não tenho mais ninguém nessa vida!
- Mas, em falta de seu pai, você fica amparada por seu irmão Andréia.
- Não seu Adilson, acho que quando meu pai morrer eu vou ter é que cair no mundo.
- Por que você está dizendo isso Andréia? Você é jovem, é bonita, não pode ter esses pensamentos.
- Mauro não liga pra mim seu Adilson, quando meu pai morrer ele vai é colocar um rabo de saia aqui dentro e fazer eu de escrava dele, eu quero ir é pra bem longe dele.
- Você não quer se casar Andréia, ter filhos, você não pensa nisso?
- Eu moço? Nem sei falar direito, acho que eu sou memo uma burrinha, que nem o pai falou!
- Aposto que por trás desses olhos triste têm uma mulher bem interessante, uma mulher com muitas qualidades notáveis! Você tem o rosto tão bem desenhado Andréia!
- Que isso moço, o senhor tá é falando lorota de eu.
- Não, não estou Andréia. Mas você é infeliz morando com seu irmão, por que menospreza tanto seu irmão Andréia?
- Eu sou feliz aqui, meu pai é bão pra mim, toda vez que ele recebe a aposentadoria dele ele compra um vestido pra mim, sempre o pai faz um agrado pra mim.
- E seu irmão Andréia, ele também é bom pra você?
Ela não quis responder essa pergunta de Adilson. Ele insiste:
- Então Andréia, Mauro te trata bem?
- Trata!
Adilson não se convence da resposta de Andréia. O rapaz percebe que ela tem um pouco de receio em falar do irmão. Então ele volta a falar:
- Andréia, já me considero seu amigo, tenho que te dizer que você está mentindo pra mim, me deixa ajudar você!
Andréia se conduz para um canto da sala, dando as costas para Adilson e diz:
- É melhor o senhor não bulir nesse caso seu Adilson!
- Existe algo misterioso entre você e Mauro e eu quero saber, sabe por que Andréia? Porque eu me interessei por você – Adilson caminha de encontro à Andréia e segura em seus ombros – Me deixa te ajudar, você não pode ser tão humilhada assim Andréia! Se existe algum trauma do seu irmão eu quero saber!
Andréia não consegue encarar Adilson, parece mais perturbada, Adilson continua:
- Por que você se amedrontou quando falei do seu irmão, porque você tem medo dele né? Por isso você não quer me contar, você tem medo do seu irmão Andréia? Me responda!
- Não, ele também é bão pra mim!
- É mentira sua, está mentindo pra mim, você não confia em mim? Por favor, me fala a verdade!
Andréia estava confusa, porém, fala olhando nos olhos de Adilson:
- Oia moço, eu nunca vi o senhor antes, mas parece que é merecedor de muita confiança e lealdade, mas o moço tá baratinando minhas idéias, eu queria é que o senhor fosse embora e não viesse mais aqui!
- Andréia, me desculpe por estar me metendo na sua vida, mas você precisa de proteção, você tá muito assustada, você tem medo até de conversar – Adilson vai se afastando de Andréia acrescentando – Se você prefere que eu vá embora, tudo bem, mas eu vou voltar aqui, isso você não vai me impedir! Posso vir?
A moça distorce o assunto:
- Deste que minha mãe morreu seu Adilson, fiquei assim, sem amparo. Meu pai, coitado, já perdeu a bravura da palavra e a defesa do corpo, meu pai já não manda mais na casa, é Mauro que manda na casa e em nós também, Mauro diz até o que o pai tem que fazer!
Andréia interrompe suas explicações e enxuga suas lágrimas, escondendo seu pranto de Adilson. Caminha rumo à porta, abre – a e suplica para Adilson:
- Por favor, seu Adilson, vá embora!
Adilson em passos curtos caminha, saindo da casa, antes, porém, ele menciona:
- Diga pra seu irmão que quero falar com ele, é muito importante, eu vou voltar aqui. Tchau e não precisa disfarçar suas lágrimas, não tenha medo Andréia, porque eu vou descobrir o que está te incomodando!
Adilson sai dali dividido. Agora eram duas preocupações, além da preocupação com Sérgio, passa a se preocupar com Andréia, a moça dava a entender que estava sendo torturada pelo o irmão, o problema de Andréia passa a ser preocupação também para Adilson, mesmo porque ele ficara completamente deslumbrado pela a moça.
Na noite do mesmo dia, por volta das vinte e duas horas, Adilson descansa em seu quarto, se sente solitário. O rapaz relaxa seu corpo estirado na cama pensativo e com os olhos fixos no teto do quarto. Vê o rosto de Andréia refletido no teto, depois senta na cama e comenta consigo:
- Que isso cara! Tira essa mulher da cabeça, não há tempo para você se apaixonar, tenho é que encontrar esse tal de Mauro e confirmar essa história de Rosana. Depois sim, vou conquistar aquela menina!
Decidiu dar uma volta na rua. Põe-se em pé, ajeita o revólver na cintura e sai. Adilson só quer organizar as idéias e fazer hora para dormir. Dirigindo sua moto, ele vai de encontro ao vento sem destino certo. Foi a alternativa que encontrou para não dar asas à sua imaginação. Adilson não tinha o costume de sair à noite, quando não estava de serviço, costumava recolher - se bem cedo e ler um bom livro policial, de preferência.
Talvez por coincidência ou não, Adilson vê nas ruas quem ele anseia. Ao trafegar perto da lanchonete Uberlândia, ele vê Mauro sentado em uma mesa. Então estaciona sua moto à porta da lanchonete e, com pretexto de beber uma cerveja, ele adentra no estabelecimento, senta numa mesa disponível e faz o pedido. A lanchonete está repleta de freqüentadores, porém seu alvo é Mauro. Adilson se apressa, pois Mauro já deixa o local na companhia de duas mulheres, que usam pouquíssimas roupas. Adilson não o perde de vista, quase gritando ele fala com Mauro:
- Hei, espere cara, preciso falar com você!
Mauro ouve perfeitamente a frase de Adilson, mas não dá importância. Adilson não tem nem tempo de tomar sua cerveja, pois sai correndo atrás de Mauro. Mauro se apresa em fugir e já manobra seu carro para ir para outro ponto da cidade, é rápido, ainda mais quando percebe que tem alguém querendo falar com ele, no entanto, Adilson é ágil e consegue impedir que Mauro saia barrando seu carro. Nervoso Mauro pergunta:
- O que foi cara, por que está me perseguindo?
- Você que é Mauro, não é?
- Sim, sou eu mesmo!
- Preciso falar com você cara!
- Tudo bem, mas agora não tá? Hei... Você que é Adilson, você é dá policia, não é?
- Sim, sou!
- Só que agora não dá cara, depois eu falo com você.
Adilson é ousado:
- Dá sim, desce do carro.
- Qual é Adilson? Já ouviu falar em mulheres? Eu tenho duas delas aqui comigo no carro e no momento tô mais interessado é nos prazeres que elas vão me dar, dá um tempo tá? Sai fora, me deixa em paz cara!
Mauro novamente aciona a ignição do carro, dando partida, deixando Adilson irritado. Adilson então demonstra seu ódio e saca do seu revólver, apontando – o para Mauro, dizendo:
- As meninas podem esperar, porque agora você vai desligar esse carro e me ouvir!
As mulheres, dentro do carro, ficam apavoradas. Mauro demonstra seu medo, se sentindo acuado diz:
- Que isso cara, pedindo com essa delicadeza toda! É claro que vai ser agora, mas guarde essa arma.
Mauro desce do carro e junto com Adilson se direcionam para o interior da lanchonete e se sentam. Mauro salienta:
- Olha, eu não devo nada para a polícia, está bem? O fato de você ser um policial não te dá o direito de me ameaçar com uma arma, que loucura é essa cara? E fale logo, porque não quero deixar as meninas me esperando por muito tempo.
- Desculpe Mauro, mas eu preciso que você testemunhe algumas coisas. Aquele amigo seu...
- Que amigo? Não conheço nenhum bandido não cara!
- Conhece, conhece sim Mauro! Você se lembra do acidente de moto que aconteceu com Sérgio? Diga - me Mauro, foi sabotagem, não foi?
Mauro se empalidece e pergunta assustado:
- Quem disse que foi sabotagem? Eu não sei do que você tá falando!
- Sabe sim Mauro, Rosana me disse que você sabe de tudo, da maneira como Rodrigo planejou tudo isso. Diga-me Mauro, esse seu amigo foi o responsável por aquele acidente, não foi? E não satisfeito, porque Sérgio está vivo, ele foi atrás dele, dizendo que vai mata – lo. Estou certo?
Mauro se sente coagido, não diz nada. Adilson prossegue:
- Não me esconda nada Mauro, senão vai ser pior pra você, quero saber da verdade sobre essa história!
- Eu não sei de nada Adilson!
- Sabe sim! Você sabe e vai dizer tudo o que sabe!
Mauro abre o jogo e denuncia Rodrigo:
- Bem, é verdade! Olha Adilson, eu estimo muito Rodrigo, mas às vezes ele passa da conta. Agora tem uma coisa cara, tudo que ele fez foi por amor. Mas Rodrigo é muito violento! Aceite um conselho Adilson: Vai salvar seu amigo, avise Sérgio que Rodrigo quer acabar com ele! Foi ele realmente que cortou os cabos do freio da moto do cara, a intensão de Rodrigo é matar Sérgio. Se você não avisa - lo, pode ser tarde demais!
- Por que você não me disse isso antes Mauro? E pelo jeito, você não ia me falar nada sobre isso, né cara? Olha cara, você pode ser acusado de omissão.
- Qual é cara, eu não participo das besteiras que Rodrigo apronta não, o que eu posso fazer? O cara é louco! - continua Mauro acendendo um cigarro. - Rodrigo é louco por Rosana, ela só quer saber de Sérgio, Rodrigo tá doido de ciúme cara!
- Sei e por causa desse ciúme ele quer mata – lo?
- É, mas me deixa em paz cara, o que eu sabia já disse à Rosana e a você.
- Você sabia que Rodrigo planejava cortar os cabos do freio da moto de Sérgio bem antes né Mauro?
Mauro se irrita, levanta da cadeira e diz em tom alterado:
- Não cara, eu não sabia, quando ele me contou já era tarde demais!
Adilson também se altera, levanta – se da cadeira e diz:
- Pois reze cara, reze por seu amigo, porque eu vou pegar esse cara e quando eu pegar esse Rodrigo ele vai me pagar, o que ele fez com Sérgio não ficará impune, ouça bem Mauro, se Rodrigo tentar contra a vida de Sérgio novamente, pode apostar, eu mato esse cara!
- É simples você matar alguém né Adilson? Afinal você é policial, vão dizer que é só mais um bandido que a polícia matou e nada vai acontecer com você, vai em frente cara!
Mauro termina essa frase e deixa o ambiente, porém Adilson diz outra frase que mexe com Mauro:
- Espere, tem outra coisa Mauro! - Mauro pausa os passos e põe - se a ouvi - lo. - Hoje estive em sua casa.
Mauro fica nervoso, mas se controla, perguntando:
- E daí, o que foi fazer lá?
Adilson nota que Mauro fica tenso e perturbado.
- Só queria encontrar você lá.
- Perdeu seu tempo indo lá.
- Sabe que não, conheci seu pai e sua irmã.
Mauro se enfurece quando Adilson se refere à sua irmã, pergunta:
- O que você conversou com Andréia? Não quero que volte mais lá, deixe minha família em paz!
- Conversei muito pouco com Andréia, mas o suficiente para eu perceber que ela é muito traumatizada. Qual o problema dela Mauro? Andréia é muito receosa, ela tem medo até de abrir a boca.
Adilson mexeu na ferida de Mauro. Mauro argumenta:
- Andréia é problemática, ele não tem noção de nada, não passa de uma bobinha. Você não deveria ter conversado com ela Adilson, não procura mais minha irmã cara!
Mauro novamente ameaça sair da lanchonete, Adilson indaga:
- E por que não? Você maltrata sua irmã, não é Mauro? Obriga a coitada a fazer o que você quer, eu vi em seus olhos que ela está sofrendo naquela casa, que está precisando de ajuda e eu vou ajuda - la.
Mauro se volta outra vez para Adilson, aponta seu dedo indicador no rosto de Adilson e diz:
- Você é quem sabe cara, se eu souber que voltou em minha casa, que foi investigar a vida de Andréia, não respondo por mim cara, você não sabe do que eu sou capaz quando o assunto é sobre Andréia!
Mauro não dá tempo para Adilson articular palavras, sai às pressas da lanchonete. Adilson comenta consigo:
- É... Se Mauro soubesse que estou amarradão na irmã dele! Pois é Mauro, agora acho que apareceu uma pedra em seu sapato, Andréia agora tem alguém que vai defende – la!
Fora da lanchonete Mauro explora seu ódio, dizendo palavrões chuta seu carro, a ponto de amassar a lataria do mesmo. Acende outro cigarro e abre a porta do carro e diz para as mulheres que ficaram no carro:
- Meninas voltei! Já me livrei daquele cara chato!
Mas Mauro tem outra surpresa desagradável ao ver que as mulheres não mais lhe esperavam, se cansaram da demora de Mauro e foram servir outros fregueses. Se bem que Mauro, depois da estressante conversa com Adilson poderia até maltrata - las. Deita a cabeça sobre o volante e fica pensando em Andréia.
Mauro liga o carro e arranca bruscamente dali, fazendo os pneus deslizarem no asfalto. Logo depois de Mauro também Adilson, que sem afobação, monta em sua moto e toma o mesmo rumo, Adilson, porém, para sua casa.
Uma hora depois Mauro chega a sua casa. Aconteceu que, quando Mauro saiu da lanchonete se embriagou em outros locais da cidade e em sua casa chegou completamente bêbado. Foi um sacrifício para ele enfiar a chave no buraquinho da fechadura, mas sem muito esforço consegue abrir a porta e entrar em sua casa. Dentro de casa, ele joga a chave do carro sobre a mesa, Mauro continua furioso. Vai ao quarto de cada um e verifica que seu pai e irmã dormem, mas não hesita em ascender todas as luzes da casa, cambaleando vai para a geladeira e pega uma latinha de cerveja e bebe todo seu líquido, depois larga a latinha num canto qualquer e caminha de novo para o quarto de Andréia, no quarto da moça ele se aproxima do seu rosto e começa a dar tapinhas em sua face com intuito de acordar a jovem, Andréia acorda assustada, arregala seus olhos e grita de pânico. Mauro sorrir, Andréia se enoja com o bafo de pinga de Mauro, se encolhe na cama e exclama:
- Você está bêbado! O que quer de mim Mauro?
Mauro coloca seu dedo na boca e salienta:
- Psiuuu!... Fale baixo, se não você acorda o velho. Então Andréia, você recebeu uma visita hoje e andou falando demais foi?
- Num sei do que você tá falando Mauro, vai pro seu quarto e deixa eu dormir!
- Não se faça de sonsa Andréia. Olha, você sabia que Adilson achou você muito bonitinha e disse que vai tirar você dessa vida, agora eu quero saber Andréia, que vida é essa, heim Andréia? Quem ta maltratando você aqui?
- Eu num sei por que ele te falou isso Mauro, eu num falei nada pra ele não!
De repente Mauro segura forte o cabelo de Andréia e imobiliza a moça, trazendo a mesma até seu peito. Mauro havia enchido sua mão direita com os cabelos longos e escorrido de Andréia e sem piedade faz força fechando a mão, aumentando a dor da moça. Andréia começa a chorar, mas permanece calada e com muito medo de Mauro. Mauro é muito covarde com a moça, o modo como segura, como puxa os cabelos de Andréia é desumano. Expondo a moça a mais ridícula humilhação, ele diz:
- O que mais você contou pra ele heim? Ouça bem Andréia, dessa vez passa, mas toma cuidado, não fale mais com esse cara, tá? Tá ouvindo?
Andréia sem defesa balança a cabeça afirmando, Mauro prossegui falando:
- Se Adilson vier aqui de novo, eu quero que você feche a porta na cara dele, o expulse daqui Andréia, senão você vai levar uma lição maior, cuidado comigo Andréia!
Mauro lança a moça contra a cama. Finalmente a moça fica livre das garras do irmão, Andréia chora muito abraçada ao travesseiro.
Soltando fogo pelas ventas, Mauro sai do quarto da moça, dirigindo - se para o seu quarto, apoiando nas paredes e tropeçando nas próprias pernas ou talvez em sua estupidez.

Naquela noite, por volta das duas horas da manhã na casa de Rosana, todos dormem, Rosana, no entanto, tem o sono desfeito, pois o telefone, no criado mudo na cabeceira da sua cama, começa a tocar: “Trim, Trim” lentamente Rosana se transporta do submundo para o real, ascende a luz e atente o telefone:
- Alô, quem é? Alô...
Do outro lado da linha responde:
- Alô, Rosana!
De imediato Rosana reconhece a voz, diz:
- Adilson, o que foi que aconteceu?
- Me desculpe Rosana eu te ligar essa hora, mas eu tenho que falar com você ainda essa noite. Escute, primeiramente eu quero te pedir perdão!
- Perdão, por que Adilson?
- Eu tenho mesmo sido injusto com você Rosana, me desculpe por não confiar nas suas palavras. Olhe, eu cheguei a conclusão que não posso mais manter você e Sérgio longe um do outro, é burrice minha não acreditar em você, se você quiser encontrar com Sérgio, então vem comigo, assim que amanhecer eu irei até o local onde ele está, você quer ir comigo?
Rosana se emociona ao ouvir essas palavras de Adilson e diz, com lágrimas nos olhos:
- Se eu quero ir Adilson? Meu Deus é o que mais quero na minha vida! Nós precisamos nos unir e livrar meu amor daquele maluco. Por favor, Adilson me leve com você! - Rosana não sabia se sorria ou se chorava com tamanha felicidade - Você não faz idéia de como me faz bem ouvir isso. Que bom poder contar com você de novo Adilson! Pensei que nunca mais eu fosse vê - lo!
- Você estava certa de ter ficado aborrecida comigo, eu tenho agido mal com você, não tenho te dado atenção, porém, não vou compartilhar mais com Sérgio a idéia de ficar longe de você, nem ele quer realmente que seja assim. Eu conversei com Mauro e ele me confirmou tudo o que você falou sobre Rodrigo. Ah Rosana... Eu gosto muito do Sérgio e não vou permitir que nenhum outro mal aconteça com ele! Agora, eu quero te pedir uma coisa, gostaria que fossemos pra fazenda no seu carro.
Rosana, toda entusiasmada responde:
- Ora Adilson, pra quê tanta cerimônia pra falar isso, é lógico que vamos com meu carro pra fazenda!
- E seus compromissos aqui em Anápolis?
- Cancelo todos Adilson! Nada é mais importante para mim de que me encontrar com Sérgio!..
Rosana se especializou na área de odontologia. E passou a ser uma das melhores profissionais no tratamento dentário da cidade.
As horas passam, menos para Rosana, que anseia pelo amanhecer sem conseguir dormir.





































RECONCILIAÇÃO

O galo da fazenda com seu canto anuncia o amanhecer. Uma de suas utilidades, servir de despertador, porém, nesse dia a ave parece atrasada, pois Laércio madrugara e já estava no curral, cumprindo sua obrigação matinal de ordenhar as vacas. Depois de tirar quase todo leite, ele desamarra o bezerrinho, que até então, estava preso na pata dianteira da mãe, Laércio passa para próxima vaca e realiza o mesmo processo. É fascinante o modo como o bezerrinho agarra seu focinho na teta da mãe e briga para sugar a sobra do leite. Sérgio também levantou cedo este dia, fica no alpendre da casa admirando a habilidade de Laércio na execução do trabalho. Não é hábito de Sérgio levantar tão cedo, mas esse dia o rapaz se inquietou na cama e antes que o sol despontasse no horizonte ele se pôs sentado em sua cadeira de rodas. Contempla o raiar do dia no campo, ouve a orquestra organizada dos pássaros nos galhos das árvores, não só os cantos dos pássaros, mas também se encanta com o cacarejo das galinhas no quintal. É um espetáculo as nuvens no céu se desfazendo para dar lugar ao sol que já revela seus primeiros raios...
Laércio volta do curral para a casa da fazenda carregando o balde cheio de leite, entra na casa e ao passar por Sérgio diz:
- Não demore em entrar, vem tomar seu café, o leite fresquinho sustenta mais.
Sérgio parece muito pensativo e desinteressado. Porém ele manipula a cadeira de rodas e segue Laércio sem dizer uma palavra. Laércio percebe que ele está um pouco triste e melancólico, pois não responde seus assuntos. Sérgio encosta sua cadeira à mesa e Laércio prepara o leite com pão e murmura do árduo trabalho na fazenda, da dura rotina, Sérgio não dá crédito para o que Laércio fala. Na verdade ele está preocupado com sua vida, saudoso por sua família, por Rosana. Aquele lugar é maravilhoso, Laércio é uma companhia e tanto, mas não é onde deveria estar, pela ele primeira vez ele sente saudade dos seus.
Laércio também se coloca sentado em volta da mesa e junto com Sérgio toma seu café. Laércio continua falando sem parar, Sérgio calado. Porém um barulho de motor de carro, que se aproxima da fazenda, deixa os rapazes em alerta, Laércio interroga:
- Ué, quem pode ser tão cedo?
- Deve ser o comprador de leite. Comenta Sérgio.
- Acho que não, hoje não é dia dele passar.
O carro pára em frente à casa, Laércio sai para receber a visita um pouco desconfiado.
Sérgio ouve na sala os cumprimentos entre Laércio e Adilson. Desmotivado Sérgio espera que Adilson venha até ele, o que logo acontece. Depois de todas as saudações, Adilson fala da companhia que ele tem:
- Bem Sérgio, veio uma pessoa comigo, você pode me xingar, ficar com raiva de mim, fazer o que quiser, mas ela quer uma explicação sua e eu também, porque ninguém conseguiu entender você e eu não vou esconder mais você. Pode entrar Rosana.
Rosana entra na cozinha sorrateiramente. E diz:
- Oi!
- Por que você a trouxe aqui Adilson? Não devia ter feito isso!
Sérgio distorce seu rosto de Rosana e toca a cadeira, buscando outra dependência da casa. Laércio não sabe o que falar, diante de Rosana ele fica abobalhado e pergunta:
- Você que é a Rosana?
- Como vai? Você que deve ser Laércio. Disse graciosamente Rosana estendendo a mão para Laércio.
Adilson é mais rápido de que a cadeira de Sérgio. Com autoridade ele barra Sérgio na sala. Sérgio ia se trancar em seu quarto. Adilson segura e vira a cadeira, fazendo com que Sérgio lhe olhe cara – a – cara e é bem severo com ele:
- Você não vai fugir de novo cara!
- Não estou preparado para rever Rosana, leve ela daqui Adilson, por favor!
Rosana intervem lá da cozinha e diz:
- Não adianta Sérgio, eu não vou embora, só saio daqui se você for comigo, caso contrário, ficaremos nós dois aqui para sempre!..
Rosana se emociona, Sérgio olha em seu rosto e também se emociona, todavia, se mantém firme e controlado, disfarça o que seu coração e seus olhos não conseguem esconder. Pergunta com certa dureza:
- Por que sua insistência Rosana?
- Porque eu te amo Sérgio e porque sei que também me ama... Então... Será que não mereço nem um beijo!?
Sérgio olha dentro dos olhos da moça e deixa que lágrimas saiam dos seus, que rolam pela sua face, Rosana caminha vagarosamente para ele e enxuga suas lágrimas com os dedos e também, com os olhos marejados diz:
- Adilson e Laércio, vocês querem prova maior de que Sérgio me ama?
Sérgio e Rosana se abraçam e liberam seus prantos de vez, Adilson e Laércio também se emocionam. Adilson limpa a garganta e ressalta:
- Laércio, vamos dá um passeio por ai para ver o gado. Como eles estão?
Certamente Adilson fez o convite para deixar Sérgio e Rosana a sós.
Rosana fica da mesma altura do rapaz, se coloca de joelho ao lado da cadeira, facilitando os abraços com Sérgio, Rosana salienta:
- Pelo amor de Deus Sérgio, nunca mais me deixe, não sabe o quanto sofri! - Rosana olha para o físico de Sérgio - Mas como você tá magro meu amor, tá abatido. Oh Sérgio, por que você se meteu nesse fim de mundo? Sua mãe está muito triste, você não dá notícias, puxa Sérgio, a gente não merecia isso, foi maldade sua!
- Quase que morri longe de você Rosana, longe da minha mãe! E Alexandre, como ele tá? Fiquei muito traumatizado quando você me disse, naquele hospital, que eu não podia mais andar, tudo fez uma revira volta na minha cabeça Rosana, mas eu estou superando minha paralisia, olha Rosana, nesse tempo todo, eu escrevi um livro, me fez bem escrever, me ajudou muito contar uma estória e essa fazenda é um paraíso! Você vai conhecer esse lugar, ele é ótimo!
Rosana senta no colo de Sérgio e diz:
- É, mas eu não devia te perdoar, você foi muito injusto comigo Sérgio, o pior era que eu não sabia onde você estava, pensei que nunca mais ia te ver, juro!
-É, eu sei, agi mal com você, com minha mãe, coitada! Mas parece que o mundo tinha desabado em minha cabeça Rosana, queria me isolar de tudo, não ver ninguém e, foi aí que Adilson, tão preocupado comigo, me falou desse lugar e me trouxe pra cá, só assim pude aceitar essa desgraça que aconteceu comigo, eu não queria que você me visse nessa cadeira de rodas, queria que você ficasse longe de mim, na verdade eu tinha vergonha das minhas pernas Rosana!
Rosana cerra a boca de Sérgio com as mãos e diz:
- Chiiii! Não fale mais, agora você nunca mais vai sair de perto de mim!..
- Mas, Rosana e suas obrigações lá em Anápolis? Adilson me disse que você se especializou em odontologia, você queria tanto essa profissão, parabéns! Eu acho que vou dar mais um tempinho aqui na fazenda, vou concluir meu livro, quero voltar para Anápolis, mas só quando ele estiver pronto para ser editado, já estou quase terminando.
- Que estória é essa desse livro meu amor? Adilson me falou sobre isso, mas parece que você tá levando esse projeto muito a sério.
- Você não faz idéia de como está me fazendo bem escrever Rosana, acho que me identifiquei com a literatura!
- Que bom Sérgio, fico feliz por você! Você vai conseguir editar seu livro, vai escrever outros livros, vai ser um famoso escritor, já pensou: Eu esposa de um escritor. Vai ser o máximo! Entusiasma - se Rosana, sentada no colo de Sérgio.
Adilson adentra a sala e faz uso da palavra dizendo:
- Esqueça Sérgio, você não vai ficar mais aqui; Rosana e eu viemos apenas te buscar. Sabia que corre risco de morte se continuar aqui? Mauro me delatou que Rodrigo tá a caminho deste lugar com propósito de mata - lo.
- O quê? O quê você tá falando Adilson? Vai me matar? Então, quer dizer que sou foragido! Ham... Ouviu Rosana? Eu estou jurado de morte e não sei por que!
Rosana levanta do colo de Sérgio e reitera:
- É verdade Sérgio, eu ouvi isso do próprio Rodrigo, a partir daí não tive mais sossego, porque ele sumiu de Anápolis, não tenho dúvida que ele tá por aqui, vamos embora meu amor!
- Esse cara amedrontou vocês, que isso gente? Eu não tenho medo dele; vou voltar para Anápolis sim, mas não agora, não vou sair correndo daqui, pelo amor de Deus gente! Ouviu isso Laércio?
Adilson fala:
- Bem, eu não posso ficar aqui, tenho uma missão esperando por mim em Anápolis, se você não quer vir Sérgio, paciência! Você vem comigo Rosana?
Rosana responde:
- Não, sem Sérgio eu não volto pra Anápolis. Vá em meu carro Adilson, porque eu vou ficar com ele até o dia que ele quiser, se Rodrigo aparecer por aqui nós dois enfrentaremos ele juntos!
Laércio toma parte na conversa:
- Nós três! Esqueceu que eu tô aqui? Não precisa ter medo uai, ele não tem chance contra nós.
Sérgio estipulou uma data e combinaram que, nesse dia, Adilson viria à fazenda para busca – los. O tempo que ele pediu para ficar ali fora duas semanas.
Sérgio acha tudo aquilo uma piada, mas Rosana e Laércio ficam receosos.

A vida de seu Cabral se transformara numa ruína total depois que se juntou com Vânia, se arrependimento matasse certamente seu Cabral já tinha morrido.
Após alguns meses de convivência com Vânia, a vida de seu Cabral mudara radicalmente. O casal ainda morava na fazenda do velho Cabral, mas logo teria que mudar da fazenda, pois as terras de seu Cabral foram penhoradas pela justiça para cobrir as contas do casal, as dívidas passaram a ser um pesadelo na vida de seu Cabral. Vânia só tem vaidade, e o velho Cabral escravizado por um corpo sedutor como o de Vânia, que esconde todas as armas necessárias para dominar um homem. Seu Cabral, em virtude disso, realizava todos os desejos de Vânia em troca de noites de amor ardentes, foi onde o velho Cabral se deu muito mal, em pouco tempo ele perdera tudo o que possuía.
O velho Cabral, de andar com belas vestes, passou a vestir roupas velhas e encardidas, barba sempre por fazer, desiludido da vida e o pior, sem nenhuma reserva bancaria, devendo para todo mundo. Vânia na verdade, não queria um marido e sim, um gigolô, que só servia para pagar suas contas, assim sendo, quando seu Cabral se deu conta, todos seus bens tinham ido pelo ralo, então o velho Cabral resolve ser pão – duro, mas já é tarde demais e se vê sem nada. Mas mesmo na pior, seu Cabral é orgulhoso, jamais demonstra para Vânia que tá na falência, mesmo sem condições, procura satisfazer a mulher em tudo, talvez se contasse para a mulher, sua crise financeira, provavelmente Vânia maneirava e deixava de explorar tanto o marido. A única coisa que tinha era sua aposentadoria, mas já não era suficiente e, o velho Cabral agora era um fracassado financeiramente.
Seu Cabral sempre foi um homem de posses, mas como acontece muito por ai, perdeu toda sua fortuna.
No seu íntimo seu Cabral não suporta o remorso, a vontade é chegar para cada um dos filhos e pedir perdão, abraça – los e beija – los. Dizer para Sérgio o quanto seu senso o acusara por haver abandonado o filho naquele momento tão difícil da vida. O velho Cabral estava sendo tão torturado pelo remorso, que já não conseguia mais dormir.
Na casa de autopeças, Alexandre se ocupa em atender os fregueses. Já passa das desesseis horas, Alexandre não percebe nada de anormal, nenhum comprador que chamasse sua atenção, mas não demora e ele observa um freguês esquecido adentrando na loja. O homem apóia seu cotovelo no balcão e não tira mais os olhos de Alexandre, de vez enquanto, Alexandre corre o olho no estranho, mas não é capaz de reconhece – lo.
Seu Cabral está mesmo irreconhecível. Por fim Alexandre se sente incomodado com os olhares do homem e pergunta:
- O que o senhor deseja?
Com certa paciência o homem argumenta:
- Não conhece mais o seu pai filho?
Alexandre curva a cabeça, depois erguendo - a segura a emoção, Alexandre indaga:
- O que o senhor quer aqui?
- Podemos conversar um pouco?
- O senhor não tá vendo que eu estou ocupado, o que o senhor quer?
- Será que você não tem um tempinho para seu pai? Olhe pra mim filho!
Alexandre não consegue encarar seu pai. Indeciso ele diz para um jovem que o ajuda no balcão:
- Roberto, toma conta da loja, eu já volto.
Alexandre caminha, saindo da loja, seu pai o segue. Dirigem - se para um bar na esquina.
Alexandre encaminha - se para esse bar, porque tem como proprietário um amigo seu. Ambos puxam suas cadeiras e se assentam em volta de uma mesa, olham desconfiado um para outro. Seu Cabral tem os olhos marejados, porém não libera o choro, diz para o atendente do bar:
- Hei! Por favor, traga uma cerveja e dois copos. Você toma cerveja Alexandre?
Alexandre balança a cabeça afirmando.
Rapidamente a mesa é atendida, o atendente não esquece de cumprimentar o amigo Alexandre:
- Como vai Alexandre?
- Bem! Como é que está as coisas Gilmar?
- Está tudo muito bem. E o senhor? Gilmar se refere ao outro na mesa.
- Tudo.
Depois de beberem um pouco de cerveja, seu Cabral acende outro cigarro, mas permanece calado. Alexandre observa e comenta:
- O senhor tá usando barba, sua aparência tá horrível!
- É que ando muito ocupado, quase não tenho tempo para fazer a barba, também para que andar com a cara limpa quando se vive pelos matos?
- Sabe o que eu acho? Para mim pai, essa barba só vem provar que o senhor não ta nada bem, tô mentindo?
Seu Cabral dá uma risadinha sem graça, passando as mãos na barba e com os olhos sempre vidrados no filho ele diz:
- Você tem razão filho, foi tudo ilusão, deixar vocês para morar com Vânia foi a maior burrada que já fiz na vida!
- Por que o senhor tá falando isso pra mim pai, não acha que é bem velho para saber o que o senhor quer?
- É filho, mas às vezes nós adultos também erramos. Você também já tá um homem feito, tá mais gordo filho! Eu, não tenho mais reputação, estou devendo pra Deus e o mundo...
- Chega pai! O senhor faz idéia do sofrimento que causou pra minha mãe, do que transformou nosso lar depois de duas tragédias? Aliás, não foi essa tal de Vânia que tirou o senhor da gente não, foi por causa da deficiência do meu irmão que o senhor saiu de casa... Ver seu filho em uma cadeira de rodas foi o motivo de tudo, né pai? O senhor foi muito covarde pai!
Seu Cabral curva a cabeça e dos seus olhos escorrem lágrimas, parece que estava de acordo com tudo que Alexandre falou. Ergue novamente a cabeça e suplica para o filho:
- Não diga isso Alexandre, não jogue isso na minha cara filho! Sabe por que eu tô aqui? Para pedir perdão, pedir perdão para você, sua mãe e para seu irmão!
- Principalmente para meu irmão, né pai?
- É, acho que sim! E você? Será capaz de perdoar seu pai? Eu imploro filho! Nunca fui homem de pedir perdão, você sabe disso, mas às vezes é preciso errar para não ser tão prepotente, reconhecer o erro e aprender a se humilhar!
Alexandre ouve o pai, mas com muita revolta, diz:
- Esqueça pai, quer saber? Não procura mais a gente, nem Sérgio, nem eu vamos perdoar o senhor, o senhor foi muito injusto com ele pai! Esqueça que tem filhos!
- Meu Deus! A que ponto cheguei? Até os meus filhos me renegam! Então Alexandre, eu não represento mais nada pra vocês?
Alexandre levanta da cadeira, passa a mão no rosto, tentando conter as lágrimas, enche os pulmões de ar e é taxativo com o pai:
- Não sei quanto a Sérgio pai, mas eu não te perdoarei nunca!
O jovem termina de falar e sai da mesa, porém seu pai o detém dizendo:
- Espere filho, não mereço que você me trate assim, tem a vida toda pela frente filho, Deus te proteja, que você nunca venha conhecer a revolta de um filho seu!
- Pede ter certeza que não conhecerei pai, porque serei um pai de verdade, pode ter certeza disso!
Alexandre deixa o pai ainda à mesa. Na verdade ele não suportava mais ficar ali e controlar o desejo de chorar. Seu Cabral pensou que o filho havia ido embora, mas ele havia se dirigido para outra dependência do estabelecimento, sentando - se em um lugar discreto deixando fluir toda emoção, logo Gilmar vem até o rapaz, coloca outra cadeira ao lado de Alexandre e pergunta:
- Você tá bem triste, né Alexandre?
Cabisbaixo Alexandre diz:
- Ele é meu pai Gilmar!
- Chora amigo, põe pra fora sua dor! Gilmar faz cafuné na cabeça de Alexandre e continua:
- Eu percebi que ele é seu pai e olha Alexandre, seu velho não tá nada bem - Gilmar avista seu Cabral de longe - Olhe lá! Dá pena cara, ele tá arrasado, olha, eu me lembro de seu pai, sei que ele era um homem de muita pose, se achava o maioral, às vezes era até arrogante, mas agora ele não é nada cara! Alexandre, se eu fosse você voltava lá e o perdoava dando um abraço nele cara!
Seu Cabral continua à mesa bebendo a cerveja, seu aspecto é imundo, despertando a curiosidade e causando comentários dos outros fregueses que estão no bar. Um menino atende no balcão, por isso Gilmar conversa com Alexandre.
Alexandre argumenta para Gilmar:
- Não vou perdoar meu pai Gilmar, não dá cara! Na hora que meu irmão mais precisava dele, ele o deixou!
- Você está dizendo que não vai perdoar seu pai, mas tá doido pra ir lá e abraçar seu velho, não estou certo Alexandre? Ouve seu coração cara! Não faz idéia de como é triste não ter seu velho. Você não imagina o que sofri para sobreviver sem o meu pai. Ele morreu muito cedo, eu devia ter uns dois, três anos de idade, mamãe, coitada! Era muito pobre, perdeu a saúde de tanto trabalhar, era peão de obra, trabalhava dia e noite para nos dar de comer...
Gilmar se emociona com essas lembranças.
Alexandre, um pouco mais calmo justifica:
- Não Gilmar, ele ter trocado nossa mãe por aquela mulher é até aceitável, agora o que eu não consigo perdoar é a malvadeza, a sacanagem que ele fez com Sérgio. Sabe Gilmar, eu morria de inveja, do tanto que meu pai paparicava aquele meu irmão; parecia que só Sérgio tinha seu sangue, talvez fosse idiotice minha, porque nosso pai nos amava do mesmo jeito. Mas quando Sérgio ficou paraplégico, nosso pai se afastou dele cara, justamente na hora que ele estava mais precisando de apoio, isso não dá para perdoar!
- Nessa estória, Sérgio foi o mais prejudicado, por isso na minha opinião, ele é quem deve decidir se vai perdoar ou não. Você não acha?
Alexandre fica nervoso, levanta da cadeira e começa a andar de um lado para o outro no cômodo onde estavam, diz com certo rancor:
- Não cabe não Gilmar, esse homem feriu meu irmão e a mim, aliás, a família toda. Você não tem irmão Gilmar, não sabe o que é sentir a dor do seu irmão! Quando vi Sérgio ali, deitado naquela cama, todo imobilizado, minha mãe chorando num canto, um monte de gente chorando e, eu ali sem poder fazer nada, nada cara!
- Ninguém podia fazer nada Alexandre!
- E onde tava meu pai Gilmar, o nosso pai herói? Eu sei onde ele estava? Estava se amasiando com uma vagabunda qualquer!
Alexandre senta de novo e curva a cabeça entre os joelhos e desaba a chorar. Gilmar fica preocupado e não sabe o que dizer, não tem uma palavra de consolo. Em seguida, Alexandre se coloca em pé e abraça o amigo.
Gilmar diz:
- Calma Alexandre, força cara!
Alexandre se retira, Gilmar sozinho comenta consigo:
“É Alexandre, acho que você tá certo, o pai que faz isso com um filho não merece perdão!”
Alexandre, para sair definitivamente do bar, tinha de passar pelo salão, onde estava o pai, sendo assim, seu Cabral e o filho ainda trocam olhares, porém, não há mais o que ser dito entre eles, pelo menos por parte de Alexandre. O moço sai calado e com muito pesar. Seu Cabral inclina o copo na boca, bebendo o resto da cerveja, seu desejo é de seguir o filho e obriga – lo a lhe perdoar, mas nem sempre os pais estão certos. Seu Cabral paga a cerveja, deixando uma nota de pouco valor sobre a mesa, caminha para a rua, toma um táxi e também vai embora, em sentido contrário ao do filho.

“Resumindo, essa foi à estória de seu Cabral, como abandonou a família de forma podre, não apoiando seu filho que ficara paraplégico. A partir daquele dia, Sérgio se tornou um inválido no conceito de seu Cabral”.
Infelizmente essa é a dura realidade, muitos pais não aceitam um membro da família deficiente, chegando ao extremo de discriminar o próprio filho a ponto de destruírem o lar em virtude disso, depois arrependidos tentam encobrir seu erro. Como foi o exemplo de seu Cabral.



























FARSA DE IRMÃO

Mais um começo de noite, entre tantos que Andréia fica em casa sentada no sofá da sala vendo televisão. O pai, o velho Raimundo, como sempre, tira uma soneca deitado no sofá e com a cabeça apoiada no colo da filha. A televisão apresenta certas distorções na imagem, Andréia mal consegue distinguir a real imagem do aparelho. A jovem acompanha a novela. Andréia, na verdade só conhece o mundo fictício, pessoas do seu conhecimento somente os personagens das novelas, dos episódios que assiste.
Os diálogos dos atores da novela se misturam com o roncar do velho Raimundo dormindo no sofá e, para piorar, o cachorro começa a latir lá no quintal. Andréia ouve batidos de palmas no portão, devagarzinho ela ajeita a cabeça do pai no sofá e levanta, caminha até a janela abrindo a mesma para certificar - se de quem se trata, no entanto, a escuridão da noite dificulta que ela reconheça a pessoa que está no portão, a pessoa diz:
- Seu Raimundo! Ô seu Raimundo!
Andréia sente medo e brada com o cachorro:
- Passa cachorro, vai deitar, que fuzuê é esse aí fora sô?
Adilson se manifesta no portão:
- Oi Andréia. Sou eu, Adilson. Preciso falar com você urgente. Olha, tomei uma decisão e quero te contar, deixa - me entrar pra falar com você!
- E daí seu Adilson? Eu não quero saber de decisão nenhuma, não posso deixar o senhor entrar. Vá embora que é melhor, eu não posso falar mais com o senhor, vá embora daqui!
- Andréia! Não faz assim, é sério. Olha, nunca mais você vai ser humilhada nessa casa, te prometo. Eu decidi Andréia que quero você pra mim!
Adilson fala em tom de voz alto para que Andréia ouça. Andréia no mesmo tom responde:
- O senhor tá doido! Que bestagem é essa que o senhor tá dizendo seu Adilson?
Seu Raimundo desperta do sono e pergunta pra filha:
- Tá falando com quem Andréia?
- Com seu Adilson pai. Ele ta lá no portão querendo entrar aqui. Só que Mauro falou pra eu num receber ele aqui mais não, por isso eu quero que ele vá é embora.
- Ora Andréia, você vai obedecer a seu irmão sô? Faz o que seu coração tá mandando, deixa o moço entrar!
- Eu tenho medo de Mauro pai, Mauro mata eu se eu abrir a porta pra seu Adilson, aquela vez ele judiou muito de mim, o senhor sabe o tanto que Mauro é brabo comigo!
- Ah, mata o quê! Vai lá filha, deixa o moço entrar e falar o que ele quer.
- Mas pai...
- Ora, faz o que eu tô mandando menina, vai lá abrir o portão pra ele, caminha!
Andréia cheia de dúvidas acata a ordem do pai, abre a porta e vai abrir o portão para Adilson.
O moço tem uma calorosa recepção por parte de seu Raimundo, já Andréia estava receosa, pensa na fúria do irmão. Porém no seu íntimo ela se contentou muito em revê-lo, mas esconde seu sentimento. Depois de cumprimenta - lo, seu Raimundo diz:
- Que bom ver o senhor de novo em nossa humilde casa seu Adilson! Só que mais uma vez Mauro não tá.
- Não, dessa vez não é por causa de Mauro que estou aqui, é que gostei muito de conhecer o senhor e a sua filha Andréia! Eu queria vir antes, mas estava muito atarefado.
Enquanto fala, Adilson não pára de olhar para Andréia.
- Eu acho que o senhor tá falando mentira seu Adilson, vai me dizer que gostou de um velho quiném eu? Acho que o senhor gostou mesmo foi de minha filha Andréia!
Andréia fica sem graça e rebate o pai:
- Que isso pai! Que doidice é essa que o senhor tá falando? Pára de falar isso pai! O senhor tá bestando, é?
Mas os olhares dos dois persistem. Adilson quer dizer algo com seu olhar fixo e não se intimida, diz:
- É, o senhor tem razão seu Raimundo. Eu quero pedir a permissão do senhor para conversar com sua filha, leva - la para conhecer a cidade. Quero falar com ela dos meus planos e se ela aceitar a minha proposta seu Raimundo, eu vou me casar com sua filha!
Seu Raimundo fica pasmo, olhando para Adilson, não menos abobalhada fica Andréia, mais que depressa a jovem replica:
- O senhor é mesmo muito do desaforado seu Adilson pra vim aqui e falar umas esquisitices dessas pru meu pai!
Adilson insiste:
- Tenho sua permissão seu Raimundo?
Seu Raimundo se põe em pé e anda pela sala, apoiado em sua bengala, depois cochicha no ouvido da filha:
- Melhora essa cara menina, você num vive reclamando da sua sorte?
Em seguida seu Raimundo diz para Adilson:
- O senhor tem meu consentimento sim seu Adilson! Pode levar minha filha para passear mais o senhor.
Adilson sorri, Andréia contesta:
- Mas pai! O senhor vai deixar seu Adilson levar eu pra rua? O senhor num tem medo do que ele vai fazer comigo?
- Num tem nada de mais filha, seu Adilson só quer conversar com você, uai!
- Então? Vamos dar uma volta por ai Andréia? Pergunta Adilson.
Andréia, indecisa indaga:
- O senhor promete que num vai desrespeitar eu não, seu Adilson?
- Que isso Andréia! Jamais eu tentaria qualquer coisa contra você, eu nunca faria isso! Só quero te proporcionar um pouco de diversão, ver um sorriso nesse rosto.
O velho retruca:
- Deixa de falar bestagem Andréia! Vai vestir um vestidinho mais bonito de que esse e colocar uma água de cheiro, pra ficar mais cheirosa, você não reclama que nunca sai de casa? Chegou seu dia filha, vai!
Com simplicidade na voz ela diz:
- Já volto. Andréia entra para seu quarto com o propósito de se embelezar.
A jovem não deixa transparecer, mas aquele convite de Adilson foi bem - vindo para ela.
Quando Andréia não mais ouve os dois, Adilson pergunta:
- Seu Raimundo, sinceramente eu estou interessado por sua filha, mas me parece que Andréia esconde uma mágoa muito grande, ela é muito amedrontada. Há algum trauma com Andréia? Pode me falar seu Raimundo, ela tem alguma particularidade?
O velho pensa um pouco, depois fala:
- Meu filho Mauro é muito ruim pra ela seu Adilson, qualquer motivo ele bate nela, por isso ela tem esse medo todo, medo de Mauro!
- Mas, por que seu Raimundo, por que seu filho a maltrata?
- Andréia é minha filha só de coração seu Adilson. Eu e Irany, minha esposa, já morta, pegamos Andréia bem novinha para criar. A mãe de Andréia engravidou dela ainda solteira e era muito pobrezinha, ela não tinha como alimentar a criança, então, para a criança não morrer de fome, eu e minha mulher adotamos o neném, porque era uma menina e a gente queria uma filha mesmo. Só que logo depois minha patroa morreu e eu fiquei doente, vivo assim escorado. Andréia, coitada, sofreu e sofre inté hoje nas mãos de meu filho Mauro, porque é ele que controla tudo nessa casa, Mauro manda e desmanda em Andréia e também em mim, faz o que bem quer!
Adilson ouve atento e pergunta:
- Então Andréia nunca teve mãe seu Raimundo?
- Não, se tem tá aí nesse mundão de Deus. Eu não pude fazer meu papel de pai. Mauro estudou, se formou, mas nunca deixou que Andréia aprendesse a ler. Eu quase não posso fazer nada por ela, pois estou quase entrevado e também porque já não mando em nada aqui! – o velho anda de um lado para o outro apoiado na bengala e Adilson escuta atentamente – Eu prezo muito essa menina seu Adilson, mas estou preocupado com o destino dela, por isso eu te peço seu Adilson, se o senhor gostou dela case - se com ela, num deixa que Mauro judie dela pro resto da vida!
Adilson ressalta:
- Que estória seu Raimundo! Então Mauro enfrenta até o senhor?
- Enfrenta. Teve uma vez que Mauro foi bater em Andréia e eu fui defender ela, pra quê seu Adilson! Quase que eu apanhei também. Tira ela dessa casa seu Adilson, eu estou perto de morrer e não quero que Andréia fique a mercê de Mauro, esse é meu pedido seu Adilson!
O velho senta numa cadeira perto da televisão, Adilson se compadece daquele homem debilitado e cansado. Seus olhos naquele momento estavam úmidos. Adilson contempla suas mãos enrugadas e trêmulas segurando a bengala. O velho se cala e as lágrimas escorrem em seu rosto. Adilson tem um impulso: abraça o velho, mesmo este estando sentado, beija sua cabeça e diz:
- Não se preocupe seu Raimundo!
Adilson também tem os olhos marejados. Seu Raimundo conclui:
- Acho que agora posso morrer em paz!
- O senhor não vai morrer seu Raimundo! Por que o senhor ta falando isso?
- Porque Andréia encontrou alguém que vai zelar dela, agora ela vai ficar amparada, eu estou contente do pedido que o senhor fez seu Adilson!
- Olha seu Raimundo...
Adilson não conclui sua frase, pois Andréia aparece na sala já pronta. Adilson olha para a jovem e exclama:
- Nossa! Você está linda Andréia!
Então Adilson e Andréia têm um contato mais próximo. A intenção de Adilson é de iniciar um relacionamento com Andréia. Porém, Andréia jamais poderia ter saído, pois justamente naquela noite Mauro resolvera voltar cedo pra casa.
Por volta de vinte e duas horas, Mauro chega em casa e vai direto para o quarto do pai, abre a porta e constata que seu pai dorme. Em seguida vai para o quarto de Andréia e lá vê a cama da jovem vazia. Mauro se enfurece, desarruma a cama e depois volta para o quarto do pai. Já bem nervoso, gritando ele indaga:
- Cadê ela pai?!
O velho se assusta, acorda subitamente e responde:
- Andréia saiu com seu Adilson.
- O quê?! Saiu com quem pai? - Mauro anda de um lado para o outro no quarto - O senhor disse que ela saiu com aquele policial?
- Sim, foi.
Mauro solta fogo pelas ventas. Todo objeto no quarto passa a ser alvo para ele dar pontapés. Depois sai do quarto, seu Raimundo levanta e com a bengala para se apoiar, caminha atrás do filho argumentando:
- O que tem Mauro? Adilson é nosso amigo! Calma filho!
- Calma uma ova! Velho maluco! Como o senhor deixa pai? O senhor sabe que Andréia não conhece nada na cidade, Adilson vai é abusar dela! O senhor não serve nem pra segurar aquela desgraçada dentro de casa pai!
Mauro é agressivo com todo objeto ao seu redor, o velho fala:
- Seu Adilson é bom homem Mauro, não carece seu brabismo. Ele só levou ela pra ela se alegrar um pouco. Não precisa disso filho! Andréia também tem que se divertir.
- Deixa ela! Andréia de hoje não passa! Hoje ela me paga, ah se paga! E o senhor, não se mete, ta?! Termina de falar e volta para a rua.
- Volta aqui Mauro! Aonde você vai?
Seu Raimundo fica sem resposta.
Mauro bate a porta fortemente depois que sai de casa.
Infelizmente, sérias conseqüências sobreviriam sobre Andréia. Conhecendo bem Mauro, a desobediência da moça não ficaria impune. Certamente ele voltaria da rua mais exaltado.
Cerca de uma hora da manhã Adilson regressa à casa de Andréia para devolver a jovem. O carro que Adilson usa é o de Rosana. Parece que o plano de Adilson deu certo, Andréia está agarradinha com ele, sem dúvidas, Adilson havia conquistado a jovem.
Adilson leva Andréia até o interior da casa e suas despedidas são rápidas, para não acordar o velho, mas é inútil, seu Raimundo flagra os dois se beijando. Aliás, o velho não conseguiu mais dormir, desde quando o filho esteve lá. Envergonhada com a presença do pai, Andréia diz:
- Pai, ainda de pé essas horas?
Adilson também fica desconfiado e diz:
- Desculpe seu Raimundo, eu já estava de saída...
O velho expõe:
- Eu tava mesmo esperando oceis acordado filha. Olha, seu irmão teve aqui, ele revirou a casa toda procurando oce, tive de dizer a verdade.
- Então pai, dessa vez ele vai matar eu. Eu num devia ter saído com o senhor seu Adilson, tá vendo o que o senhor arrumou pra eu?
- Calma Andréia - Adilson diz abraçado com ela - Você não precisa ter medo, eu tô aqui, fique calma!
Andréia repudia Adilson:
- Fique fora disso seu Adilson, por favor, não complique mais as coisas pra mim!
-Tá bem, já que é assim, eu também vou esperar por Mauro. Isso é um absurdo Andréia! Ele não pode controlar você assim!
- Mas é assim seu Adilson, eu te suplico, vai embora! Implora Andréia.
Andréia termina de falar e corre para seu quarto e se tranca lá dentro.
Adilson fica comovido, vai atrás de Andréia e bate na porta dizendo:
- Andréia! Ô Andréia... Abre essa porta!
- Vai embora seu Adilson! - Seu Raimundo diz - Deixa Andréia com o sofrimento dela seu Adilson!
- Eu vou esperar por seu filho seu Raimundo, eu quero me explicar com ele.
- Carece não seu Adilson, Andréia não quer que o senhor fique aqui, deixa que ela se entenda mais ele, é melhor o senhor esquecer, o amor dóceis dois nunca vai dar certo!
Adilson não mais insiste, diz:
- Tá bem, eu vou embora, mas seu Raimundo, isso vai acabar, tenha certeza disso, eu não vou desistir de Andréia!
Adilson se conduz para fora da casa e entra no carro, raciocina um pouco, mas fica compadecido em deixar Andréia daquele jeito. Então, liga o carro, se conduz para certa distância da casa e fica de sentinela esperando por Mauro. Aquela noite ele ia desvendar o que estava acontecendo entre os irmãos. A intenção de Adilson era conferir se realmente Andréia era maltratada por Mauro, pois se suas suspeitas se confirmassem, ele estaria disposto a defender a jovem.
Trancada em seu quarto, Andréia começa a clamar por sua mãe, que já havia falecido:
- Oh minha mãe! Leva eu pra onde a senhora tá, num deixa eu sofrer mais na mão de Mauro, eu num agüento mais apanhar dele mãe! - Andréia chora muito - Eu queria ir pra junto da senhora mãe! Eu tô com muito medo dele mãe!
Em meio as suas súplicas e lágrimas, a moça adormece. Durante seus poucos minutos de sono Andréia contempla um anjo que lhe diz:
- Não tenha medo, minha filha! Deus está cuidando de você!
Mauro retorna à casa, dessa vez completamente bêbado. Fica na sala se encorajando para entrar no quarto de Andréia. Atrás do sofá, ele mantém escondida uma garrafa de pinga. Remove o sofá do lugar e se apossa da garrafa, vai para a cozinha e se serve com uma dose da bebida. Seu Raimundo ouve o filho, mais finge que está dormindo. Uma só dose não é o bastante, toma uma após a outra. Cambaleando vai para o banheiro e ascende a luz, liga a torneira do lavatório e lava o rosto, sai do banheiro sem apagar a luz e caminha para o quarto de Andréia e forçando a maçaneta da porta. Mauro empurra a porta, mas é impedido de entrar, pois está trancada por dentro. Seu Raimundo se levanta, porém continua em seu quarto, grita para o filho:
- Vai deitar Mauro! Larga sua irmã!
Ele ignora o pai, tá obcecado em entrar no quarto.
- Vai dormir pai! Responde ele.
Mauro começa a bater vagarosamente na porta, chamando por Andréia.
- Andréia! Ô Andréia! Abre a porta, eu quero falar com você! Eu sei que tá aí dentro, abre...
Andréia, coitada, havia adormecido mal posicionada na cama, mas quando Mauro começou a empurrar a porta, ela acordou. A jovem fica muito apreensiva dentro do quarto, em tom baixo ela responde:
- O que ocê quer Mauro? Deixa eu dormir.
- Abre a porta! Eu quero conversar com você!
- Quando o dia clarear ocê fala o que quer falar, agora não. Vai deitar.
Pela maneira como Mauro estava falando, Andréia percebeu que ele estava bêbado.
- Abre essa porta que eu estou mandando! Me obedeça sua cadela! Anda! Mauro ordenou.
Andréia tinha que abrir a porta, do contrário ele arrebentaria, assim sendo, seria pior. Ela diz:
- Já vou!
Depois de abrir a porta, ela se afasta rapidamente, Mauro entra e fecha a porta, dá volta na chave, trancando – a novamente. Austero ele caminha em direção a jovem e pergunta:
- Então a mocinha me desobedeceu? Me diz Andréia! Onde você foi com aquele cara? Anda! Responda sua vagabunda! Onde estava com o policial, hein?!
A resposta de Andréia é o silêncio. Ele segura a garganta da jovem, faltando pouco para estrangula - la e continua:
- Não falei pra você não receber mais aquele cara aqui? O que queria com ele Andréia?
Mauro aperta Andréia contra a parede e a esbofeteia sem piedade, então começa a sessão de espancamento. Seu Raimundo vem de seu quarto em socorro de Andréia, mas é inútil qualquer tentativa, o que faz é pedir que Mauro pare com aquilo, ele implora para filho:
- Pelo amor de Deus Mauro, pare com isso! Não bate mais em Andréia, por favor! Ela não agüenta mais isso! - e chorando completa - Nem eu agüento!
Ninguém pode com a fúria de Mauro, ele responde:
- Não se meta velho! Andréia nunca vai esquecer dessa lição, sai daqui!
Mauro segura o maxilar de Andréia e aperta - o. Sem poder falar, ela fica sem ação. Mauro arrasta Andréia pelo rosto e obriga a moça a ficar cara a cara com ele encostando seu rosto ao da jovem e fortemente segura o rosto e os cabelos de Andréia e pergunta:
- Onde esse cara te levou Andréia? Por que não quer falar, hein?! Fala logo!
Mauro não tem limite, se enche de ódio e joga Andréia contra a cama. Com muita violência, Mauro começa a tirar a roupa de Andréia.
- Eu sei o que você quer sua vadia! É isso aqui o que quer, não é?
A partir daí, Mauro começa a fazer gestos obscenos para ela e dá sorrisos de sarcasmo. Do lado de fora do quarto, permanece o desespero de seu Raimundo. Ele sabia perfeitamente o que estava acontecendo dentro do quarto, porém, não podia fazer nada para impedir a violência de Mauro. De repente ele ouve um chamado na porta da sala:
- Seu Raimundo, abre a porta! Sou eu Adilson! O que está acontecendo aí dentro? Abre logo seu Raimundo!
Rapidamente seu Raimundo caminha para a porta abrindo - a:
- Graças a Deus o senhor tá aí! Corre seu Adilson! Ele tá batendo nela. Pelo amor de Deus seu Adilson, socorre ela!!!
Adilson corre para o quarto de Andréia e força a porta para abri - la, mas é em vão seu esforço. Seu Raimundo diz:
- A porta tá trancada...
- Esse cara é louco? Seu Raimundo, não chegue perto! Eu vou arrebentar essa porta e se Mauro tiver feito algo com ela, não sei o que faço com ele!
Adilson toma distância e corre em direção à porta. Com brutalidade ele a derruba. Adilson é surpreendido e não acredita na cena que está a sua frente. Por um momento fica sem ação, foi um choque para ele. Ele surpreende Mauro em cima de sua amada tentando violenta - la. Quando Mauro ouve o barulho da porta caindo no chão, ele sai de cima da jovem e se vira. Adilson não dá tempo para ele se defender, avança contra ele, tirando - o da cama e lhe acerta um soco no queixo. Mauro cai a certa distância, Adilson novamente avança sobre o rapaz. Mesmo bêbado Mauro é esperto, consegue se esquivar do segundo golpe de Adilson, ergue a calça e não se intimida. Prepara - se para lutar. Adilson novamente avança em direção a Mauro, mas dessa vez é Mauro que leva vantagem e dá o troco em Adilson. O soco de Mauro não faz efeito em Adilson, rapidamente ele retribui Mauro com um soco certeiro e o ato é repetido diversas vezes. Andréia encolheu - se na cama, cobriu o rosto com as mãos e não conseguia assistir àquela cena tão violenta. Seu Raimundo voltou pra sala e sentou - se. O velho estava indignado, pois viu o filho tentando violentar Andréia. Jamais desconfiou que a pretensão de Mauro era abusar da moça. Isso ultrapassou os limites.
Andréia, toda machucada corre para o pai e o abraça, seu Raimundo não agüenta mais esse tipo de emoção. Sente uma forte dor no peito, mas disfarça sua dor e não permite que a filha tome conhecimento que passa mal.
Adilson bate mais do que apanha, resolve dá um basta naquela situação: saca da arma que tem na cintura, apontando - a para Mauro e diz:
- Dê mais um passo e eu te mato seu desgraçado!!
Mauro fica parado e insulta:
- Vai cara, atira! Você não tem coragem, seu covarde! Diz Mauro em tom sarcástico.
Seu Raimundo entra no quarto e vendo aquela cena, se desespera e implora:
- Não faça isso seu Adilson, guarde essa arma!
Mauro continua sendo sarcástico:
- É, guarde a arma!
Adilson olha para o velho, depois retorna o olhar para Mauro dizendo:
- Dessa vez passa crápula! Mas se você tocar nela outra vez, nem seu pai vai me impedir de te matar! - Adilson guarda o revolver e completa - Seu Raimundo, eu quero pedir a mão de sua filha seu Raimundo. Você quer se casar comigo Andréia? Andréia estava abraçada com o pai, amparando o velho.
Depois de ouvir o pedido de Adilson, Andréia o abraça dizendo:
- Quero sim Adilson! Tira eu daqui! Não agüento mais ficar nessa casa!
Todos se dirigem para sala, menos Mauro.
Na sala há grande revolta, Andréia chora abraçada a Adilson. Seu Raimundo renega o filho:
- Nunca pensei que Mauro fosse capaz de uma barbaridade dessas, eu tô muito envergonhado! Oh Deus, por quê?!
- E eu pai? Não consigo nem olhar pro senhor de tanto que tô envergonhada! Disse Andréia chorando.
Adilson pergunta:
- Ele chegou fazer alguma coisa com você Andréia?
- Não. Mas se ocê não chega àquela hora ele ia fazer. Mauro é um monstro, ele bateu muito em mim, ele ia me violentar...
Adilson revoltado diz:
- Desgraçado! Se ele não fosse filho do senhor seu Raimundo, eu matava esse cara!
Seu Raimundo contesta:
- Ele não é mais meu filho seu Adilson! Nesse momento Mauro sai em direção à rua ouvindo as duras palavras de seu pai que repete:
- Tá ouvindo Mauro? Se vai sair, sai pra sempre! Você não é mais meu filho. Se manda dessa casa! Nesse pouco tempo de vida que me resta, me poupe de te ver na minha frente!
- O senhor tá me expulsando de casa pai? Pergunta Mauro.
- Estou!
- É, tá vendo o que você conseguiu Adilson? Parabéns! - diz Mauro com ironia e continua - tudo bem pai, não volto mais aqui! E quanto a você Andréia, me perdoe, não queria fazer aquilo com você!
Mauro vai embora com a roupa do corpo, sem destino.
Adilson e Andréia marcaram o dia do casamento.














VÍTIMA TROCADA

Embora com a idéia fixa de encontrar Sérgio em Abadiânia, Rodrigo investiga pacientemente. Ninguém no vilarejo desconfia o motivo do moço permanecer ali. Rodrigo já havia percorrido várias fazendas, porém ainda não havia obtido nenhuma pista que o levasse ao seu rival.
Aquela tarde fazia frio em Abadiânia, sentindo - se só na pensão, foi até o barzinho da esquina, com o propósito de conversar e de obter alguma informação. Rodrigo desfila na humilde cidade, em um luxuoso carro, desfazendo dos pedestres. Estaciona o carro à porta do barzinho, desce e entra calado no modesto local. Apóia seu cotovelo no balcão e observa dois homens bêbados que jogavam sinuca.
Mesmo depois de algum tempo hospedado na pensão de dona Judite, Rodrigo não era bem visto por aquela gente.
Então Rodrigo pergunta para o atendente do bar:
- O senhor tem cigarros aí?
- Tenho. Que marca o senhor quer?
- Me dá uma carteira, pode ser de qualquer marca.
Enquanto o vendeiro pega o cigarro na prateleira, Rodrigo continua olhando para os jogadores e indaga:
- O senhor pode me dá uma informação?
- Pois não. Pode perguntar.
- Eu estou procurando um rapaz, que está morando perto de Abadiânia, ele anda em uma cadeira de rodas.
- São dois reais. Diz o vendeiro pondo a carteira de cigarros no balcão. Rodrigo tira o dinheiro do bolso e conclui:
- Preciso muito ver esse velho amigo! Mas já revirei a cidade toda, fui a várias fazendas e nada. Disseram-me que eu o encontraria por aqui, mas infelizmente não estou encontrando.
- Como que ele é?
- Ele anda de cadeira de rodas, pois é paraplégico.
- Conheço não moço, deficiente aqui só sei da filha do compadre Irineu, que mora lá na fazenda Santa Rita.
Sempre de olho nos beberrões, Rodrigo comenta:
- Então é possível que essa moça o conheça?
- É. Se ela é igual ao seu amigo, pode ser que ela saiba onde ele mora, talvez seja inté amigos também.
- E onde fica essa fazenda? É perto daqui?
- É aqui perto. Se o moço tem boa intensão, eu posso ensinar como o senhor faz pra chegar lá.
- Por favor, eu sou de paz, seu...
- Bosco, seu criado!
Bosco contempla alguém entrando em seu comércio, então diz para Rodrigo:
- Parece que o moço tá com sorte. Quem tá chegando ai é Henrique, o irmão da moça que lhe falei.
- Como está seu Bosco? Cumprimenta Henrique.
- Oi Henrique!Como está o compadre Irineu?
- Bem.
- E minha afilhada Ester?
- Também vai muito bem!
Henrique e Rodrigo se olham e trocam palavras:
- Boa tarde.
- Boa tarde.
Henrique entrega um pedaço de papel para o dono do bar e diz:
- Me providencia essas mercadorias seu Bosco, é a compra do mês.
Bosco lê cada item escrito e se prontifica:
- É pra já! Ocê espera só um pouquinho?
- Espero.
Bosco prepara atenciosamente os pedidos. Henrique se apóia na ponta do balcão esperando por Bosco. Rodrigo na outra ponta fumando um cigarro olha disfarçadamente para Henrique, que também explora sua curiosidade em relação a Rodrigo, na verdade ele fica encabulado, se perguntando:
- O que faz uma pessoa tão bem alinhada entre esses beberrões?
Enquanto providencia as mercadorias, Bosco comenta:
- Ah Henrique! O moço ali tava justamente me perguntando onde é a fazenda doces. Eu num sei quem é, nunca vi ele por aqui, mas é bom ocê conversar com ele, pra saber quem ele é.
Henrique se aproxima do rapaz e diz um pouco cauteloso:
- O moço quer saber onde é nossa fazenda? Mas eu não conheço o senhor. Tá querendo o quê? Negociar terras, comprar ou vender gados...
- Não! Não é nada disso! Não tenho intimidade com a vida rural. É que o seu Bosco me disse que em sua família tem uma pessoa que é aleijada. Como eu estou procurando uma pessoa, que também é aleijada, pensei que talvez essa pessoa de sua família pudesse me dizer onde eu posso encontra - lo.
- Bem moço, quero que o senhor saiba que ninguém da minha família é aleijado. Mas, como é esse seu amigo?
- Desculpe se eu me expressei mal. O nome dele é Sérgio, ele tá preso numa cadeira de rodas, é só isso que eu sei.
Henrique tem uma leve desconfiança, pois além de Rodrigo lhe causar uma má impressão, percebe que ele tem uma arma na cintura, que mesmo bem escondida, não passa despercebida. Henrique diz:
- Acho que sei de quem o moço tá falando, nós o conhecemos bem, mas nós aqui somos muito cismados com gente de fora e o moço não parece ser boa gente.
- Que isso seu Henrique! É um velho amigo que sinto muita saudade, há dias que não o vejo. Então? Vai me dizer onde eu posso encontrar esse amigo?
- Não antes de saber o que o moço quer de verdade com ele. Olha, Sérgio é namorado da minha irmã. Meu pai e eu gostamos muito dele.
- É... Ele sempre cativa as pessoas. Diz Rodrigo sorrindo ironicamente e continua:
- Seu Henrique me desculpe, mas eu tenho que rir, na verdade Sérgio é um oportunista, ele está enganando sua irmã e a vocês todos. Namorado é? - Rodrigo joga o cigarro fora - aquele cara destruiu minha vida, ele quer destruir a de vocês também! Ele tirou de mim a mulher que eu amo, nós íamos nos casar e ele fez a maior sujeira comigo. Rosana minha noiva, foi induzida por ele, então ela não quis mais saber de mim, do nosso casamento. Olha, eu sinto é pena de sua irmã. Abre seus olhos, cuidado com ele!
Henrique ironiza a conversa:
- Mas mesmo de cadeira de rodas ele te passou a perna cara? Tomou sua mulher? Que coisa hein!
Bosco ouvindo a conversa dos dois, não se contém, acaba dando uma gargalhada.
- Quem diria seu Bosco! Um cara bonitão desse, perder ponto pra um cara que anda de cadeira de rodas! Eu lamento cara! Ironiza Henrique.
- Sérgio andava e tinha pinta de grande conquistador, foi há pouco tempo que ele ficou aleijado. Disse Rodrigo.

Toda mercadoria já estava exposta sobre o balcão. Henrique tira do bolso o talão de cheque e enquanto vai preenchendo uma folha de cheque diz:
- Olha moço, se o senhor quer falar com Sérgio, não sou eu que vou ensinar o caminho pro senhor chegar na fazenda dele. Quer um conselho? Acho melhor é o moço picar a mula daqui! Me parece que tá é querendo ajustar contas com ele! Agora, toma cuidado rapaz, porque ele já tem amigos aqui também!
- E você acredita que ele realmente gosta da sua irmã, não é?
Henrique não dá mais atenção para Rodrigo. Com a ajuda de Bosco pega as compras e leva para o carro. Bosco despede - se de Henrique e diz:
- Dê um abraço em Ester e vai com Deus!
- Obrigado seu Bosco! Agradece Henrique.
Rodrigo, que também vai saindo comenta para Bosco:
- O rapaz é nervosinho hein?! Até mais seu Bosco!
- Hei moço! - diz o vendeiro para Rodrigo - Não procura encrenca aqui não!
Rodrigo entra em seu carro e segue Henrique não o perdendo de vista. A turbinada caminhonete de Henrique passa velozmente por uma estreita estrada de volta para sua fazenda. A certa distância de Rodrigo, Henrique pisa fundo. Rodrigo não consegue manter a mesma velocidade e se orienta pela poeira que os pneus da caminhonete provocam na estrada. Rodrigo não tem nenhuma habilidade em dirigir em estradas tão estreitas e com curvas de difíceis contornos. Aquela estrada para ele parecia um labirinto. Rodrigo sente medo, teme não manter o carro na estrada com subidas e descidas perigosas. Dirigindo um pouco mais rápido, avista a caminhonete de Henrique parada em uma fazenda. Rodrigo pára seu carro e discretamente fica examinando o lugar. Acende um cigarro e, sem sair do volante ele observa Henrique, que volta à caminhonete e pega as compras. Na porta do casarão ele vê uma bonita jovem de cadeira de rodas. Após avistar uma porteira, com uma pequena taboa, com um letreiro: “Fazenda Santa Rita”, comenta consigo:
- É, foi você mesmo que me trouxe à sua casa Henrique! Agora ficou bem mais fácil!
Rodrigo achara melhor não chegar à fazenda aquele momento, pois temia que desconfiassem que ele havia seguido Henrique. Prefere voltar para Abadiânia e, em outra hora visitaria a fazenda para conversar com Ester. Segue o caminho de volta para Abadiânia, mas já no dia seguinte retornaria àquela fazenda.
Rodrigo, infelizmente estava perto de chegar ao seu alvo.


Henrique decide não mencionar à família sobre o rapaz que encontrara no bar de Bosco, mas em seu íntimo ele sabia que aquele moço era uma ameaça para Sérgio.

Rosana se delicia com o lugar. Seu fascínio é cavalgar pelo campo. Contemplando a beleza do lugar, fica horas e horas apreciando a paisagem, admirando o gado no pasto, respirando o gostoso ar puro da fazenda. Laércio escolheu o melhor cavalo para moça. Tinha que ser o mais manso, pois Rosana não tem nenhuma habilidade em montar a cavalo. O animal, apesar de robusto, tem um suave e vagaroso trote.
Na casa da fazenda, Sérgio faz a correção dos originais de seu livro. Finalmente está pronto, o passo seguinte é procurar uma gráfica e editar seu livro. Está ciente que no dia seguinte, voltaria para Anápolis. Sérgio não mais temia seu estado físico, estava disposto a encarar sua nova vida. Laércio que parece triste, pois não ia contar mais com a companhia de Sérgio. Naquele memento ele entra no quarto e inicia um assunto com Sérgio dizendo:
- É, ocê vai embora, vai esquecer dessa fazenda, de mim... Vai deixar saudade cara! Mas tô feliz porque vai publicar seu livro, parabéns cara! Mas tô triste por mim.
- Que isso Laércio, que lamentações as suas! Sem motivos! Você acha que vou esquecer de você e desse paraíso que é essa fazenda? Foi aqui que eu organizei minha vida cara!
- E também seu coração, né Sérgio?
- É, também meu coração... Estou feliz Laércio, feliz por ter terminado meu livro e de ter Rosana aqui comigo!
- Agora, tem uma coisa Sérgio... E Ester? Ocê num acha que tá sendo ingrato com ela?
Sérgio larga seus afazeres ao ouvir a pergunta de Laércio e muda seu semblante:
- É, estou sendo muito injusto com ela. Preciso explicar isso a ela, só que não sei como!
- Ester vai sofrer muito Sérgio.
- Eu sei Laércio, ela não merece isso, não sei o que faço cara! Um dia Ester me disse que ia me perder, porque Rosana ia aparecer por aqui e eu voltaria para ela. Ela previu tudo isso! Ester é uma doçura, um encanto de pessoa!
- E o que ocê vai fazer Sérgio?
- Não queria que fosse assim Laércio, pensei que eu resistiria, mas ninguém domina o coração. Eu amo muito Rosana, mas pensava que conseguiria esquece - la, porém, foi só ela aparecer aqui, pra todo o amor que sinto por ela vir à tona!
- Apesar de tudo Sérgio, Ester vai entender. Ela sempre soube que você ama Rosana. Ela não vai atrapalhar o amor doce dois. Acho que Ester se aproximou de você Sérgio só para reanimar ocê!
Sérgio faz um pedido a Laércio:
- Laércio, amanhã logo cedo quero que vá até a casa de Ester e diga que quero falar com ela. Traga ela com você!
- Acho melhor ocê ir lá Sérgio falar com ela. Rosana vai tá aí, não acha perigoso?
- Não Laércio. Não sei o que dizer para seu Irineu e para Henrique. É melhor que Ester e Rosana se vejam de uma vez, acho que estou sendo um pouco covarde, mas só quero dar explicações para Ester.
- Se ocê prefere assim Sérgio, tudo bem, vou lá na casa dela amanhã cedo!

Então, na manhã do último dia do mês de Julho, no qual Sérgio e Rosana iam para Anápolis. Foi a data combinada para que Adilson regressasse à fazenda para buscar os dois.
O brilho do sol nem bem se revelava e alguém chama na porta da casa de Éster. Uma mocinha de pele negra veio atender a porta. A criada da casa abre a porta e não conhece a pessoa, é Rodrigo, que educadamente diz:
- Bom dia minha jovem, é aqui que mora a senhorita Ester?
- É sim senhor.
- Ela está, posso falar com ela?
- Quar o nome do senhor?
- Rodrigo.
- Vou avisar pra ela que o senhor quer falar com ela, entra. Convida a moça.
- Eu sou de Anápolis e é importante que eu fale com ela.
A mocinha, que aparenta ter uns quinze anos de idade, tem muita simplicidade no jeito de falar. Um pouco desconfiada ela vai chamar Ester. Henrique não estava em casa, havia viajado bem cedo para Goiânia.
Rodrigo aguarda na sala, Ester, porém logo aparece na sala tocando a cadeira de rodas. Rodrigo desvia seu olhar dos objetos de decoração e olha para a moça, que vem em sua direção. Ester é direta, pergunta:
- Cida me disse que o senhor quer falar comigo moço, pode falar, eu sou Ester.
Rodrigo usa seu cavalheirismo:
- Encantado senhorita Ester, - diz Rodrigo pegando em sua mão - Desculpe te abordar tão cedo, é que preciso de uma informação sua. Há tempo que estou procurando uma pessoa por esses lados e me disseram que talvez a moça conheça, pois a pessoa que procuro tem o mesmo defeito físico que a moça tem, ela também não anda.
- Acho que sei de quem o senhor está falando, por acaso o nome da pessoa seria Sérgio?
- Exatamente, é essa a pessoa! Sérgio!
- Sim, eu o conheço, mas o que o senhor é dele, um parente, um amigo?
- Sou um amigo dele, se a moça puder me dizer onde eu posso encontro - lo, eu lhe serei eternamente grado.
- Se o senhor é amigo dele, eu vou te ensinar como o senhor faz pra chegar na casa dele. É...
Ester é interrompida, pois chega nova visita. Por ser já conhecido da família Laércio toma a liberdade de entrar na casa sem bater na porta. Porém quando Laércio depara com Rodrigo fica um pouco envergonhado e não diz nada, fica olhando para Ester e Rodrigo. Ester saúda – o:
- Oi Laércio, como vai, que surpresa você aqui? Entra, senta aqui perto de mim!
Laércio, segurando o chapéu e diz:
- Não Ester, só vim trazer um recado procê. Sérgio mandou eu aqui pra buscar ocê, porque ele tá indo embora hoje pra Anápolis e primeiro quer falar cocê.
Ester muda o semblante e pergunta:
- Embora? Meu Deus, Sérgio vai embora hoje Laércio?
Rodrigo fica só ouvindo o que eles falam, Laércio continua:
- Ele vai voltar hoje pra Anápolis, você vai lá Ester?
- Claro que vou... Você estar de carro aí?
- Tô, eu levo ocê.
Ester fala para Rodrigo:
- Agora não posso te dar atenção senhor, volta outra hora, tenho que sair agora.
Rodrigo diz:
- Tudo bem, não se prenda por mim.
Ester chama por Cida:
- Cida! Cida...
Cida é rápida em atender sua patroa.
- Cida diz para papai que fui pra casa de Sérgio

Após a saída de Ester e Laércio, a empregada da casa pergunta:
- O senhor quer um cafezinho?
- Não, obrigado. Diz Rodrigo estupidamente.
Rodrigo se apresa em ir embora, seu objetivo é seguir o carro de Laércio e, acendendo um cigarro se põe a fumar e não perde Laércio e Ester de vista.
Distante dali outro carro se conduz à fazenda onde Sérgio está, é Adilson que ia buscar Sérgio e Rosana e leva - los de volta para Anápolis. Adilson transborda de felicidade, parece não acreditar no seu casamento com Andréia, dirige ansioso para chegar à fazenda e convidar Sérgio e Rosana para serem os padrinhos do casamento.
Na fazenda, Sérgio e Rosana conversam, ambos estão sentados no sofá da sala e juntos planejam o futuro. Notando que Sérgio não parece bem, Rosana pergunta:
- Você não me parece contente Sérgio, não está feliz em rever sua mãe, de editar seu livro?
- Você está enganada Rosana, estou muito feliz em rever minha família.
- O que você está escondendo de mim Sérgio? Conheço você meu amor, conta vai...
Sérgio no sofá deitado e com sua cabeça apoiada no colo de Rosana sente que é hora dela saber de Ester e decide falar:
- Olha Rosana, brevemente Laércio vai chegar aqui e com ele virá uma pessoa.
- Que pessoa é essa Sérgio?
- Uma jovem que foi muito especial pra mim, ela substituiu você Rosana, eu estava me sentindo muito só, precisava de companhia, mas eu tinha vergonha das pessoas e dessa jovem eu não sentia vergonha Rosana, sabe por quê? Porque ela também anda numa cadeira de rodas. Então, eu me envolvi com ela, pensei que gostava dela, tentei gostar, mas foi só você aparecer aqui para eu perceber que estava enganado, que não era amor o que realmente eu sentia por Ester - Rosana ouve atentamente e se entristece - Rosana, por favor, me ajude a explicar isso a ela, Ester não merece nada disso, ela me deu muito amor, me fez acreditar novamente na vida! Seja amável com ela Rosana!
Sérgio tem seus olhos umedecidos. Rosana sente pena do amado, não vê Ester como sua rival, Rosana sente gratidão pela moça.
Rosana, no entanto não diz nada. Contém as lágrimas, levanta do sofá, caminha para um canto da sala, dando as costas para Sérgio.
Passados alguns minutos Laércio adentra a sala empurrando a moça em sua cadeira de rodas. Ester primeiro vê Sérgio e, sempre sorridente diz:
- Oi, vim atender seu pedido! - e percorrendo os olhos na sala ela vê Rosana e seu entusiasmo vai por água a baixo. Ester continua - Aconteceu né Sérgio? Eu sabia, ela voltou... Que bom!
Os olhos de Ester ficam marejados.
Do lado de fora da casa Rodrigo anda sorrateiramente para não levantar suspeita e estuda uma maneira de enxergar seu interior. Então pela abertura da janela ele tem uma boa visão, fica ouvindo a conversa das pessoas lá de dentro, Sérgio diz:
- Você estava certa Ester, essa aí é Rosana!
Rosana vira o rosto para Ester, que diz:
- Não precisa me dizer o que estar acontecendo Sérgio, foi tudo fantasia. Um sonho né? Eu sei que essa aí é sua noiva - virando para Rosana acrescenta - Desculpe por tentar roubar seu noivo Rosana!
Rosana diz:
- Não Ester, você não me causou nenhum mal, só tenho que agradecer você por ter cuidado tão bem dele!
- Eu sabia que no fundo era você que Sérgio amava Rosana!
- Me perdoa Ester! Exclama Sérgio.
Ester demonstra que está tudo bem com um tímido sorriso, mas não consegue disfarçar a emoção e Sérgio também se emociona. Ester diz:
- Fico feliz por você Sérgio! Você tem razão, ela é muito bonita mesmo! Quando vocês vão se casar?
Rosana abraça Sérgio e responde:
- Assim que a gente chegar em Anápolis, né amor? Você está convidada para o nosso casamento Ester!
Sérgio não tira os olhos de Ester e formaliza um convite:
- Quero que você e Laércio sejam nossos padrinhos de casamento.
Laércio se manifesta:
- Eu nunca fui padrinho de casamento, mas eu só aceito com uma condição...
- Que condição Laércio? Pergunta Rosana.
- Que Ester também aceite, por favor, Ester, aceite vai! Suplica Laércio de joelho ao lado da cadeira de Ester.
Ester se sensibiliza com o teatro de Laércio e diz:
- Calma Laércio, não precisa disso. Eu também aceito o convite!
A conversa foi toda ouvida por Rodrigo, que se irrita, pega a arma de fogo, que tem na cintura e consigo comenta:
- Não vai não Sérgio, eu disse que com Rosana você não se casa, não queria fazer isso cara, mas não tem outro jeito, você vai ter que morrer seu desgraçado pra desaparecer da vida dela, pode deixar. Dessa vez você não vai escapa!
Dominado pelo ciúme e pela ignorância, Rodrigo caminha para a porta, abrindo - a com um chute, surpreendendo a todos com sua brutalidade. Rodrigo aponta o revolver para Sérgio:
- Finalmente te encontrei Sérgio, estava fugindo de mim cara? Eu não te disse que não quero que se case com Rosana, hein?! Que pena, vou ter que usar de violência com você cara, você não me ouve! E você Rosana, o que tá fazendo aqui? É bom, para você ver que não tô brincando!
- O que pretende fazer Rodrigo? Indaga Sérgio.
Rosana fica aflita, apela para Rodrigo:
- Por favor, Rodrigo, guarda esse revólver, vai embora daqui!
- Como você chegou até aqui moço? Sérgio, ele não é seu amigo? Pergunta Ester.
- Eu segui você coração. Você é tão bobinha! Parece que os pombinhos querem mesmo se casar! Que bobagem... Vocês insistem nisso?! - Rodrigo continua com a arma apontada para Sérgio.
Rosana rebate:
- Sim, nós vamos nos casar Rodrigo e você perdeu seu idiota, se manda daqui, vai!
Rodrigo reforça a mira em Sérgio e diz:
- Não, não vai não meu amor...
Laércio não estava mais na sala, havia ido para cozinha preparar um cafezinho e, no exato momento que Rodrigo dá impressão que vai atirar, ele aparece na sala carregando a bandeja com as xícaras de café, ao deparar com a cena, deixa cair a bandeja, ergue os braços e fica imóvel e se empalidece, suplicando:
- Pelo amor de Deus gente, o que é isso, quem é esse maluco?
- Esse que é Rodrigo Laércio. Disse Rosana.
- Meu Deus, esse homem foi na minha casa Sérgio, para saber de você, então ele quer te matar!? Diz Ester desesperada.
Rodrigo fala:
- Vocês tentaram me enganar! Ah fizeram muito mal! Se Rosana não vai ser minha, também não vai sua cara, da primeira vez você escapou, mas agora você vai morrer!
Rosana se desespera:
- Que loucura é essa Rodrigo, não faça isso, pelo amor de Deus!
Sérgio fica imóvel, com os olhos fixos no revólver. Rosana e Ester começam a chorar. Rodrigo, porém está disposto a matar Sérgio. Em seu descontrole, Rosana corre em direção a Rodrigo e avança em sua mão, a qual segura o revólver e tenta tomar a arma dele, inútil. Os dois ficam cara - a - cara e o revólver entre eles. Rosana não pensa na conseqüência de seu ato. Ela suplica em prantos:
- Me dê essa arma Rodrigo, não faça isso!
- Se afasta de mim Rosana! Grita Rodrigo.
E na disputa pelo revólver, este dispara. Ouve – se um tiro entre eles.
Sérgio grita:
- Nãããooo!!!!!
Nesse instante Adilson entra na sala, mas já é tarde. Adilson presencia Rosana se curvando e caindo no chão ensangüentada. Todos ficam apavorados e vão a socorro da moça. Enquanto isso Rodrigo vai saindo de mansinho para não ser pego. Porém, sua infelicidade foi que Adilson acabara de chegar e percebe que ele pretende fugir. Adilson não perde tempo, vai atrás de Rodrigo, antes, porém dá uma ordem pra Laércio:
- Laércio leve Rosana urgente para Anápolis, eu vou atrás desse cara, tenha certeza Sérgio, esse cara vai sair do seu caminho!
E uma perseguição tem início entre Adilson e Rodrigo
Rosana sangra muito e agoniza de dor. Sérgio segura uma de suas mãos e lamenta:
- Oh, meu amor, por que fez isso!?
- Acho que você terá que acrescentar mais um capítulo no seu livro meu amor! Dizia Rosana gemendo.
- Por favor, não morra Rosana, agüenta meu bem!
Laércio forra com um lençol a carroceria do Fiat, pois Rosana tinha que ficar deitada. Volta para sala, se aproxima da moça, pegando - a nos braços. Coloca - se novamente na vertical e, às pressas remove Rosana para o carro, Sérgio também sobe na carroceria do carro, se arrasta e fica junto de Rosana. Ester fica sozinha na fazenda, antes de seguir viagem Sérgio diz:
- Perdoa-me Ester!
- Sérgio, estou admirada da forma como essa moça te defendeu, nada pode destruir o amor de vocês dois, vai com Deus!
Laércio, já na direção menciona:
- Sérgio segura aí. Ester me espere aqui, já volto e te levo em casa.
Sempre chorando Ester diz:
- Ela vai ficar boa Sérgio, tenha fé, muita fé!!!
Rosana perdera o sentido, a moça estava desmaiada. Estava deitada na carroceria da Pampa, com a cabeça apoiada no colo de Sérgio.
Uma considerável distância separa Adilson de Rodrigo. Rodrigo tem certeza que Adilson está em seu encalço, por isso pisa fundo. O cinto de segurança foi ignorado, embora estivesse ao seu alcance. Seu carro adquiriu grande velocidade, os pneus provocam nuvens de poeira na estrada. Rodrigo se vê apurado novamente com as curvas e o estreitamento da estrada, seria fatal se outro veículo viesse em sentido contrário, certamente aconteceria uma colisão sem chance de sobreviventes. Ao mesmo tempo ele confere a estrada e o retrovisor, pressente que está perdendo terreno. A cada momento, parece que Adilson está mais perto dele. Rodrigo se apavora, a estrada parece se fechando para ele. Adilson já tinha experiência nesse tipo de perseguição, mas para Rodrigo, aquilo era um tormento. Sua insegurança é tamanha que não sabe pra que lado contorna o volante. Parar o carro, jamais. Rodrigo estava assim, apressando seu destino trágico. O rapaz transpira muito e o medo aumenta. Adilson está a poucos metros dele. Adilson percebe que Rodrigo tem dificuldade em manter o carro na estrada e consigo mesmo diz:
- Pare esse carro filho da mãe, você é maluco? Vai acabar batendo esse carro, você não tem saída bandido safado.
Outro fator crucial para Rodrigo: enormes árvores às margens da estrada, uma mata fechada que tira quase toda visão e numa curva, Rodrigo perde de vez o controle da direção do carro. O carro, em alta velocidade anda cerca de cinqüenta metros dentro da mata, até encontrar um velho tronco de árvore, já sem vida e de diâmetro bem avantajado pela frente. Adilson presencia um acidente que nunca vira antes. O impacto da batida é tão forte que a porta do carro se abre e Rodrigo é lançado para fora, dá várias voltas no chão e sua cabeça vai de encontro a uma grande pedra, imediatamente o sangue escorre sobre a pedra. Rodrigo sofre um traumatismo craniano, que de tão grave proporção, encerra instantaneamente todas as funções do cérebro.
Adilson pára seu carro, desce e se aproxima de Rodrigo estirado no chão e com a cabeça coberta de sangue. Rodrigo estava detido para sempre, mas não era assim que Adilson queria dete - lo. Adilson chama pelo seu nome:
- Rodrigo, Rodrigo...
Confere a pulsação do rapaz e certifica que não há mais batimentos cardíacos.
Aquele era o fim de um rapaz que tinha uma longa vida pela frente, mas pôs tudo a perder desde o momento em que deixou o ciúme domina - lo. Sendo vítima do seu próprio egoísmo.
“Por que o amor é forte como a morte e duro como a sepultura é o ciúme” (Cantares de Salomão 8.6)































SUPERANDO BARREIRAS

A viagem até Anápolis foi bem rápida, do contrário, Rosana não chegaria viva ao hospital e, então a moça foi entregue aos cuidados dos especialistas do hospital Evangélico Goiano de Anápolis.
Os homens vestidos de branco conduzem em uma maca apressadamente o corpo de Rosana pelo corredor do hospital. Vão direto para a sala de cirurgia. A bala ainda está alojada no abdômen da moça. Teria que ser extraída urgentemente, pois Rosana corria risco de morte. Apenas sendo submetida a cirurgia, é que Rosana teria chance de sobreviver, chance remota, mas era a única alternativa.
Sérgio e Laércio, na recepção do hospital, aguardam ansiosamente por notícias. Sérgio percorre com a cadeira de rodas toda a sala. Não contém a ansiedade nem as lágrimas. Laércio havia, por telefone, avisado a família de Rosana e de Sérgio, que logo foram chegando. O reencontro de dona Dulce com o filho aumenta a emoção da família, porém, a mãe de Rosana anda amparada pelo marido e, desde quando recebeu a notícia do ocorrido com a filha, passa a depender de sedativo.
Após horas de espera, na recepção do hospital, um dos médicos vem até a sala e conversam com os familiares da moça, todos perguntam ao mesmo tempo o estado de Rosana, o médico espera que todos se acalmem e diz:
- Eu compreendo a aflição de vocês pessoal. Mas procurem se controlar foi muito difícil para nós remover a bala, ela estava alojada numa região muito delicada e Rosana demorou muito para chegar até aqui. Há uma equipe bastante competente cuidando de Rosana, estamos fazendo o possível!
- Faz o impossível doutor! Se Rosana morrer eu não sei o que vai ser de mim! Eu não posso ficar sem ela! Suplicava Sérgio para o médico.
- Calma meu rapaz – continua o médico – Eu lamento, mas não vou alimentar a esperança de vocês! Felizmente ocorreu tudo bem na cirurgia, mas ela perdeu muito sangue, precisamos repor a quantidade perdida, já estamos fazendo isso, consiga o máximo de doadores que vocês puderem e ore por sua noiva rapaz!
- Minha filha vai morrer doutor? Seja franco com a gente! Pergunta o pai de Rosana desesperado.
- Sua filha é muito forte seu Carlos Alberto. Ela tem um desejo de viver incrível, aliás, foi um milagre ela ter chegado nesse hospital com vida. Acreditamos que o pior já passou! - o médico se compadece das lágrimas de Sérgio e acrescenta - Se Deus quiser ela não vai morrer. Rosana e você Sérgio merecem ficar juntos. Lembra-se que fui eu que cuidei de você, quando se acidentou? Você venceu sua paralisia, agora não é essa bala que vai separar vocês dois!
O médico termina de falar e volta para seus afazeres sumindo no corredor.
Adilson cruza pelo médico e, apressadamente vem ao encontro de Sérgio. Sérgio nota que Adilson está inquieto. O rapaz balança a cabeça, cumprimentando a todos na recepção e, sem falar com ninguém, se dirige a Sérgio, cochicha em seu ouvido, lhe chamando para um particular. Antes de Sérgio ir conversar com Adilson, para saber o que acontecera com Rodrigo, Laércio se despede:
- Bem, tenho que voltar pra fazenda, Ester está esperando por mim.
- Espere Laércio, vem cá ouvir isso, depois você vai. Diz Adilson.
Os três se afastam para um cômodo discreto do hospital, Adilson pergunta:
- E Rosana, como ela está?
- Nada bem Adilson, eu estou com medo que ela morra!
- Calma Sérgio, ela vai ficar boa cara!
Laércio pergunta:
- E aquele desgraçado? Você agarrou ele Adilson?
- Olha Rodrigo na verdade está morto!
- Adilson, você é louco?! Você matou o cara, por que fez isso? Isso vai complicar sua vida cara! Diz Sérgio.
- Uai Sérgio! Adilson fez o que devia fazer, eu também se fosse você Adilson, também matava esse desgraçado! Diz Laércio.
- Não! Não fui eu que o matei! Ele tentava fugir dirigindo seu carro em alta velocidade, percebi que ele estava com muito medo porque eu já estava quase lhe alcançando, mas de repente, não sei o que aconteceu. Só vi o carro dele andando desgovernado na estrada e indo direto ao encontro de uma enorme árvore à beira da estrada e então aconteceu uma forte batida. Eu assisti tudo, pois estava logo atrás dele. A porta do carro de Rodrigo se abriu com o impacto da batida e ele foi lançado a uma longa distância. Ele saiu rolando no chão. Eu desci do meu carro e fui a seu socorro, mas já era tarde. Quando cheguei perto dele, sua cabeça estava numa poça de sangue, ele havia batido a cabeça fortemente em uma grande pedra e acabou morrendo! Na hora eu também tive a sensação de que eu mesmo havia o matado, mas não fui eu! Explica Adilson.
Laércio comenta:
- Será que não foi melhor assim? É, porque pelo que eu sei desse cara, ele é totalmente pirado. Foi ele que colocou você nessa cadeira de rodas Sérgio e, ainda não satisfeito com isso, ainda queria te matar! Olha, pra mim foi um alívio esse cara ter morrido!
Adilson reforça:
- É... Talvez você tenha razão Laércio, não foi grande perda, não vale a pena lamentar a morte desse crápula.
- Não, isso não poderia ter acontecido! Lamenta Sérgio.
Na verdade Sérgio está mais preocupado é com Rosana, ela que não pode morrer.
- Bem, tenho que ir até em casa, depois vou ver Andréia. Não fique triste Sérgio, Rosana te ama muito cara, ela não vai morrer. Deus é grande meu amigo, tenha fé!
Laércio também se despede:
- Também tenho que ir embora, fique com Deus Sérgio. Olha, tenho certeza que em breve vou voltar aqui em Anápolis pro seu casamento com Rosana e vou trazer Ester comigo.
Sérgio dá um sorriso sem querer e diz:
- Deus te ouça Laércio! - se abraça com ele e acrescenta - Muito obrigado cara, você é um grande amigo, me fez muito bem ficar naquela fazenda! Diga para Ester que ela está no meu coração, diz que logo vou visitar seu Irineu e Henrique!
- Quando for lá na fazenda, não esqueça de levar seu livro, mesmo não sabendo ler, vou gostar de ver o bichinho na minha estante!
- Sabia que você é personagem do meu livro Laércio?
- É mesmo Sérgio? Fique com Deus amigo!
Os dois apertam as mãos e, juntos saem Adilson e Laércio.
Sérgio se ajunta aos seus, buscando consolo nos braços de sua mãe.
Muitos voluntários doaram sangue para Rosana, Sérgio foi um deles e, com o passar dos dias a moça dava sinais de melhora. Sem dúvidas, Rosana encontrou força e vitalidade para voltar à vida, pois a energia, que Sérgio lhe passava era imprescindível. O tempo todo ele estava ao seu lado. Depois de um mês e meio ela estava totalmente recuperada.
Finamente Sérgio vê o resultado do seu esforço. Consegue editar seu livro. Tudo acontece muito rápido na vida do rapaz, ele não estava preparado para essas mudanças.
Acontece um grande evento na noite do lançamento do livro de Sérgio. A imprensa o cerca para entrevista - lo. Ele também se ocupa em autografar os livros. Aquela é, sem dúvida, a noite de seu glamour. Era um romance de cento e oitenta páginas, capa dura com uns letreiros na capa destacando o título e o nome do autor: “DESISTIR JAMAIS – ROMANCE DE SÉRGIO ANTONIO”.
Rosana estava linda ao lado de Sérgio. Ambos exibem no dedo a aliança de compromisso, eles estão noivos.
Seqüenciado, Sérgio e Rosana se casam. A igreja estava deslumbrante para a cerimônia e entres os convidados especiais estavam Laércio e Ester. Dois casamentos iriam acontecer na mesma igreja, na mesma hora: o de Sérgio e Rosana e o de Adilson e Andréia. Há um comprido tapete vermelho estendido no centro do piso da igreja com uma das extremidades, que vai do rol de entrada da igreja até o altar da mesma.
Os dois noivos, impacientes à frente do padre aguardando suas noivas. Sérgio, sentado em sua cadeira de rodas, não consegue disfarçar seu nervosismo. O rapaz estala os dedo das mãos, puxa o nó da gravata e toca a cadeira para um lado e para outro.
Adilson rói as unhas, sua ansiedade não é menor que a de Sérgio. De repente começa a música, o público olha pra trás e as noivas, sorridentes, caminham rumo ao altar. Seu Carlos Alberto caminham de braços dados com a filha Rosana, do mesmo modo seu Raimundo, que anda com dificuldade, leva sua filha Andréia. Todos se põem de pé. Alguns parentes dos noivos se emocionam e não contém as lágrimas. À frente das noivas vão dois casais de crianças jogando flores pelo caminho. O padre em seu posto espera as noivas se aproximarem. Seu Carlos Alberto entrega a filha para Sérgio e seu Raimundo entrega a filha para Adilson. O coral encerra a música. Adilson e Andréia dão as mãos e ficam em pé, diante do padre. Sérgio e Rosana também dão as mãos e, em virtude da cadeira de rodas, Rosana se ajoelha ao lado da cadeira, diante do padre.
Ester irradia beleza, um encanto de moça. Seus olhos fixos em Sérgio brilham. Demonstra grande felicidade na companhia de Laércio. A jovem, embora portadora de deficiência, havia de fazer um bom casamento, pois, tem um brilho muito especial. Outro bem acompanhado é Alexandre, que tem em sua companhia uma mulher bem mais alta do que ele.
Para ficar de recordação aquele momento, alguém filma toda a cerimônia. O pai de Sérgio, seu Cabral, assiste o casamento do filho, mas de longe, envergonhado, não permite que ninguém o veja. Se seu Cabral aproximasse do filho aquele momento, certamente receberia perdão, pois Sérgio se comparava a uma manteiga derretida, não havia mais lugar para tanta emoção.
Finalizando a cerimônia, o padre diz:
- Eu vos declaro maridos e esposas, que Deus abençoe a união de você e vão em paz!
Adilson e Andréia caminham de braços entrelaçados, agora se distanciando do altar da igreja. Rosana anda atrás de Sérgio empurrando a cadeira de rodas de seu marido. Andando um pouco mais, já à porta da igreja, os parentes e amigos congestionam o caminho dos casais e a festa começa ali mesmo, na porta da igreja.
Uma calorosa recepção aguarda pelos recém casados na casa de Sérgio. Laércio e Ester não se separam, parece que brota um sentimento entre eles, suspeita que é confirmada, pois Adilson fraga os dois em um ardente beijo dentro do carro. Adilson fica até comovido de ver tanto amor entre Sérgio e Rosana e também entre Laércio e Ester, pois passariam a enfrentar não só os problemas cotidianos, mais também obstáculos físicos.
Sérgio, Adilson e Laércio se excedem um pouco na bebida, tanto que Sérgio sente o desejo de dizer algumas palavras. Queria expor o que estava no seu íntimo. Combinam entres eles que Sérgio iria fazer um discurso. Laércio vai até o sonoplasta e pede para ele abaixar o volume da música. Sérgio conduz sua cadeira para o centro do salão, Adilson, com o copo em uma das mãos, diz:
- Atenção pessoal, um momento, Sérgio vai falar!
Todos aplaudem o rapaz. Rosana pergunta pra dona Dulce:
- O que meu amor vai falar?
Dona Dulce responde:
- Acho que meu filho tem muitas coisas pra dizer, ele está muito alegre essa noite!
- Olha pessoal, quero que vocês prestem muita atenção nas palavras que vou dizer, desculpe se eu chorar, mas há um nó aqui, na minha garganta e preciso falar - todos prestam muita atenção em Sérgio - Olham, barreiras existem, mas desde quando você acredita que elas existem. Eu juro, eu pensava que a paralisia fosse um passo para morte. Depois que fiquei assim, me senti completamente derrotado, eu não via motivo para continuar vivo, tudo estava acabado para mim. Durante minha vida toda, eu fui muito mimado pelos meus pais e privilegiado por Deus. Nunca tive queixa da minha vida e se algum dia a vida me cobrasse algo, sinceramente, não saberia como agir. Então, um dia o destino resolveu não ser mais bonzinho comigo e um canalha qualquer, armou uma armadilha para mim e isso provocou um acidente comigo, no qual me deixou nessa cadeira de rodas e, junto com minha desgraça, tive que suportar o preconceito do meu pai! Mas sabe que hoje eu sou até grato a esse cara que me colocou nessa cadeira? Sou porque ele me mostrou que a vida não é um eterno conto de fada. - todos estavam emocionados ouvindo Sérgio falar. Dona Dulce não contém as lágrimas - Acreditem vocês: Eu visitei o inferno! Pelo menos, em meu subconsciente. Eu não queria mais saber de minha família, de meus amigos, feri as pessoas que me amam, principalmente minha mãe e até então minha noiva e, duas pessoas não permitiram que eu continuasse lá no fundo do poço e, mesmo contra minha vontade, eles me trouxeram de volta para mundo!
Sérgio faz uma pausa em sua explanação, tenta conter suas lágrimas, se refaz da emoção e prossegue:
- Essas pessoas que me ajudaram a encarar o mundo de novo, são muito especiais para mim, são elas Adilson e Ester obrigados meus amigos! Se não fossem vocês dois eu não teria conseguido. Eles são os responsáveis por tanta felicidade, se não fosse o apoio de vocês dois, não teria chegado até aqui e não estava casado com a mulher que amo!
Sérgio fez todos que estavam ali, chorarem. Rosana em prantos corre e abraça seu marido.
Aumenta - se o volume da música, porém a emoção é tanta, que muitos custam retomar o clima de festa. O bolo tem quatro andares. No último andar há dois casais de bonecos, simbolizando os noivos.
Com o passar do tempo, Sérgio revela sua intimidade com a literatura. Torna - se famoso romancista, autor de vários livros e obras consagradas. Rosana abraça, com muita dedicação, sua profissão de odontologa e juntos constitui uma família composta de um casal de filhos muitos saudáveis.
Não poderíamos deixar de dizer a famosa frase: “E viveram felizes para sempre!”.


















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