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Contos-->Homem, Que é Homem, Não Lava Suas Cuecas -- 04/05/2004 - 23:04 (Antonio Perdizes) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Homem, que é homem, não lava suas cuecas

Camilo estacionou defronte ao pequeno shopping. Queria dar um tempo, coordenar as idéias resolveu aproveitar. Saiu para comprar cuecas. Possuía muitas, mas desde que se separara de Ângela, não tinha vontade de lavá-las, e elas iam se acumulando no cesto de roupas sujas, atrás da porta do banheiro e embaixo da cama.
- Homem, que é homem, não lava suas cuecas, é uma indignidade, costumava dizer.
Então ele comprava mais e mais cuecas. Riu da idéia que um dia lhe ocorreu: usar fraldas descartáveis. Pensou nas geriátricas, grandes o suficiente. Ficou admirado porque ninguém do ramo teve a idéia de fabricar cuecas descartáveis. Se dependesse dele, seria um sucesso de vendas. Usar fraldas foi considerado uma demência e, então, deixou essa idéia de lado. As calças e camisas eram enviadas para uma lavanderia, mas as cuecas não: elas estavam ali como um pedido de socorro. Compraria mais e mais cuecas, e o monte de usadas aumentaria, até o dia que alguém providenciasse a lavagem. Esse alguém não seria ele.

Entrou numa pequena loja de roupas masculinas, onde havia muitas camisas na vitrine. Uma balconista, sozinha, o atendeu sorridente. Não gostou de nenhuma camisa, mas ela, com uma blusa que apertava os seios, fazendo-os saltarem para cima e deixando-os parcialmente à vista, usava perfume que lhe recordara alguma coisa excitante, o conquistou.
Com a carência total em que se encontrava, os sentidos se aguçaram. O olhar e o jeitinho dela transmitiram ao cérebro a informação de que precisava. Para não desgostá-la, comprou uma camisa e duas dúzias de cuecas. Ela compreendeu na hora, parecia que todos os descasados entravam para comprar cuecas naquela loja.
- Há quanto tempo você mora sozinho? perguntou.
- Como você adivinhou? Fez-se de inocente.
Ela sorriu.
- Não, não foi só pelas cuecas, foi o seu jeito perdido, o olhar triste.
Será que ela é psicóloga, pensou. O ar triste e desamparado estava refletido no semblante de Camilo. Qualquer um poderia captar isso. Desde que se separara de Ângela não havia conseguido se relacionar com outra mulher, só tivera sexo com prostitutas, e hoje era o que ele, mesmo precisando, não queria. Sexo falso, gemidos falsos, orgasmos fingidos. Melhor mesmo era aquela mulher a sua frente.

Ao se separar, pensou: “agora sim vou transar com todas”. Descobriu que as melhores mulheres já possuíam dono: sobraram as feias e as doidas, todas desesperadas por um casamento, de que ele queria distância.
Eles sentaram frente a frente no balcão de atendimento da loja, e ela começou a falar em Deus, em como Ele mudou sua vida e em como agora vivia feliz.
Que droga! Ela é evangélica, pensou.
Vani contou a história da sua vida. Até há pouco tempo fora prostituta (bem que ele sentira o cheiro). Criara, com o dinheiro da prostituição, os dois filhos e sustentara um marido, que sabia disso, e vivia mostrando aos próprios filhos a origem do dinheiro. Tivera uma casa com algum conforto, mas não foi feliz, nem tinha paz no coração. Separara-se e, agora, mesmo com o pouco que ganhava, vivia feliz em um pequeno apartamento, num bairro distante. Apesar das dificuldades, conseguia criar os filhos, pagando até a escola particular em que estudavam. Ele se comoveu com a coragem da moça.
Vani tomou suas mãos e fez uma longa oração, com os olhos fechados, em louvor a Deus e pedindo por ele. Camilo sentiu, no calor de suas mãos, um carinho e ficou ali, com uma vontade de tomá-la nos braços e retribuir com um beijo. Ela o convidou para, na sexta às 10:00 horas da noite, participar de um encontro religioso no alto do morro do parque, junto ao estacionamento das bandeiras. Saiu de lá com a cabeça aliviada, a não ser pela vontade de fazer amor com ela, lhe dar carinho. E quem sabe...
Será que ela gosta de lavar cuecas? Queria saber.

No dia seguinte, chegou quando já haviam iniciado uma oração em louvor a Deus, todos numa roda de mãos dadas. Estava escuro e mesmo assim ela o encontrou. Estava linda, com um sorriso leve e espontâneo. Sentaram no chão de asfalto. Um cantor passou a entoar músicas que evocavam os sentimentos de fé cristã e agradecimentos pelas graças alcançadas.
Camilo olhou para o céu. A lua era a única iluminação existente, sendo, de quando em quando, oculta por alguma nuvem solta que, ao passar por ela, ficava mais branca. Distraiu-se procurando relacionar o formato de cada nuvem com um objeto e achou uma igual ao de uma cueca samba-canção. Ao longe, as luzes da cidade mostravam a amplitude do lugar, e a brisa que vinha do mar trazia um ar gostoso. Respirava fundo, absorvendo aquela atmosfera.
Vani também começou a cantar, erguendo as mãos para o céu. Ele se apaixonou. Teve vontade de tomá-la nos braços, carregá-la para o mato ao lado do estacionamento e cobri-la com beijos.

Ficou admirado em ver que um grupo de pessoas (humildes, pelo que percebera) saíam de suas casas, nessa hora da noite, locomovendo-se até aquele local para louvar e agradecer a seu Deus, e ver o quanto isso fazia bem para elas. Considerou importante essa fé.
O que seriam delas sem isso? Quanto a fé em Deus mudou a vida de Vani?
Ele não tinha essa fé, nem poderia ter, vez que possuía opinião formada sobre tudo. Para ele, inferno, satanás e demônios estavam dentro da cabeça de cada um. Na dele, existiam muitos, que afloravam e infernizavam a sua vida. Deus, o seu com letra minúscula, era a bondade que também vivia dentro das pessoas, para equilibrá-las e ajudá-las a conviver melhor com todos.
Por isso, fechou os ouvidos quando o pastor começou a falar em satanás e outras baboseiras. Só tinha ouvidos para o ruído distante da cidade e do vento, agitando as bandeiras que tremulavam nos mastros.
Alguém se aproximou, era uma amiga de Vani. Foi avisá-la que ele havia chegado.
- Ele quem? Quis saber.
- Meu namorado, respondeu Vani num tom de preocupação.
- Vá logo! Ordenou a amiga.

Vani saiu apressadamente. Camilo ficou decepcionado e transtornado. Não dá mesmo para confiar em mulher, nem numa evangélica.
- Ele é ciumento, explicou a amiga que permanecera ao seu lado. Vão morar juntos no mês que vem.
O culto chegou ao fim e também as esperanças de Camilo. O que farei com minhas cuecas? Pensou. Todos começaram a se movimentar. A amiga não saiu do seu lado e ele, por gentileza, perguntou se ela morava longe.
- Moro muito longe e, nessa hora da noite, o ônibus demora.
- Não estou fazendo nada. Você não quer uma carona?
- Olha... eu não quero incomodar.
- Não é incomodo algum. Qual o seu nome?
- Clecy, com y.
Caminharam juntos até o carro, mas, antes de entrar, algo lhe ocorreu e falou.
- Clecy, posso lhe fazer uma pergunta?
- Bem... pode, respondeu ela intrigada.
- Você sabe lavar cuecas?
- Claro que sei, respondeu sorrindo.
Aleluia, sua vida estava salva.

Antonio Perdizes

Leia deste autor (entre outros).
- Sabedoria Chinesa.
- Crista de Galo.
- O corpo dela dentro do meu.
- Gostosa69.











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