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Cronicas-->Férias em Pacaraima -- 22/07/2003 - 12:19 (Raul Pinto) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Férias em Pacaraima.


Desde 1992, não gozava férias, ocupando, como estive, variados cargos em comissão. Dos trinta dias, vinte; dez, providencialmente, cumprindo no batente, o que me valeu um pequeno alívio financeiro. Malgrado o adicional bancário, contadas as pensões alimentícias, prestações do carro, filantropias familiares da mulher e papagaio para cobrir o rombo no cheque especial etc., fiquei impossibilitado de alçar vóo mais vigoroso. Intermediado por minha colega de trabalho e contando com a benevolência do pai, recebi, numa sexta-feira, a chave da casa (Modesta! - Alertou-me Yonara), que a digna família dispõe em Pacaraima.
O sábado estava brumoso, a expectativa era de pegar um aconchegante frio naqueles altiplanos que acolhiam as pequenas cidades, a nossa e de lá, Santa Elena, na fronteira com a Venezuela. Ao ócio expectante e alvissareiro - e com minha meiga amante e os dois maravilhosos filhos -, levava um compêndio com três novelas russas: Tarass Bulba de Nicolai Gogol, Khadji Murat de Leo Tolstoi e Os sete enforcados de Leónidas Andreiev - Apesar do que me estava o espírito transbordando de doce paz e arrebatadas volições...
Passamos quatro dias ao encanto daquele pedaço de paraíso. A casa pequenina, de piso cimentado brunido, de cobertura de zinco, numa elevação, nos recebeu com doce hospitalidade: na sala, uma singela cama de solteiro, na parede, o quadro de um varonil pecuarista pioneiro emprestava um ar de densa solenidade ao recinto; linearmente, um quarto com uma cama de casal e um berço, depois, uma modesta cozinha espremida por um banheiro.
As casas são, em Pacaraima, simples como aquela gente recatada, que é, na maioria, composta de servidores federais, estaduais e municipais. O comércio, que é tomado, principalmente, por nossos fenícios cearenses, teve o seu auge por conta do càmbio que induziu nossos vizinhos venezuelanos a consumirem seus produtos...
Decididamente, não obstante, a bucólica Pacaraima abriga um outro tipo de morador, que teve o seu fastígio na belle époque do Melhorando e Crescendo: o dos feriados e dos fins de semana. Sua culminància indelevelmente está esculpida em um outeiro, em delirante contraste com aquela cidade tão acanhada e de topologia sinuosa: uma portentosa mansão a ver de campos. Acima do morro, sua silhueta lembra, consideradas as proporções, um castelo medieval. Tão próxima é da fronteira, que na fímbria daquela elevação, compondo-lhe a singular urbanização, está encravado um dos marcos de concreto que separam os dois países. Não muito distante dessa agressiva ostentação, nas cercanias do castelo d´água que abastece a cidade, imponente, como a afrontar as casas circunvizinhas, está erigida uma mansão esverdeada de dois pisos, com largo terreno ricamente urbanizado, onde é possível se ver um campo gramado de voleibol. Diante de minha perscrutável curiosidade, um morador me deu notícia de que pertencia a um bem-sucedido casal de servidores públicos... É por isso que, em Roraima, todo o mundo quer ser servidor público, disse-me!...

Perdoe-me o leitor de inusitada veleidade, mas cabe a ficção a tanto realismo:

... Lá naquele marco branco, nos tempos da floração, até as pedras desabrochavam. Sorvidos chás exóticos em chávenas de porcelana, os seletos convidados, após os anfitriões, ao roçar de zéfiros em suas faces rosadas de uma tarde maravilhosa, ao zumbido imperceptível do bater de asas de multicoloridos colibris em sófregos haustos dos néctares de viçosas flores, iam ter ao hirto concreto e, mãos dadas, em roda, álacres, cantarolavam árias singulares:

Ah, Roraima, tudo te devemos!...

Eis, então, que o dono da sinuca alemã, opimo plantador de laranjas, extasiado e em alta voz, ao passar pelo lado venezuelano, irrompe:

Mi pecho se abre
Convertido
En rama,
La luz sacude
¡En mi corazón!...

E ouvia-se ainda:

Gira, mundo, gira, gira,
O Gedeão é leniente!
É domingo, tenente!...


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