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cronicas-->Perdido na Metrópole (26) Campeão da Feiúra -- 25/07/2003 - 18:13 (Silvio Alvarez) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Uma certa revista resolveu eleger, com o voto de trinta personalidades ilustres, os símbolos urbanos mais feios e mais bonitos da cidade que escolhi para nascer e viver.

Expectativa! Divulgaram, finalmente, os campeões da belezura e da feiúra da minha Metrópole. Esta respeitável publicação não tinha um outro concurso melhor para inventar?

Adivinhem qual local foi eleito o campeão da feiúra! Adivinharam? Não? Onde eu moro! Antagónica coincidência. Este belo exemplar da raça humana que vos escreve, um quase Adónis, onze anos de musculação, este charmoso galã de novela das oito, habita no recanto campeão da feiúra. Legal, não?

Minha auto estima foi abalada irreversivelmente (gosto de exagerar as coisas). Deveras magoado, prosseguirei minha jornada existencial carregando esta cruz extra. Serei vítima de comentários maldosos eternamente. - Você mora naquele lugar horrendo? - Hã! Hã! Responderei cabisbaixo.

Resido no centro de São Paulo, na histórica Avenida São João. Sobre ela, um infeliz decidiu erguer um elevado enorme, popularmente conhecido como minhocão (Elevado Costa e Silva). A desculpa foi melhorar o trànsito, caótico até hoje.

Quando criança, e faz tempo, passava de carro com meu pai sobre este viaduto grotesco e pensava: como será que estes doidos que povoam estes edifícios conseguem sobreviver sobre este mastodonte de concreto, barulhento e sem graça. Mordi a língua. Algumas dezenas de anos depois fixo residência exatamente ali. Paulo Coelho escreveu profeticamente: nada acontece por acaso. Batata! Sou o maior fã de Paul Rabbit.

Não é nada fácil morar em um minhocão. Constrangedor. Fico sem graça todas as vezes que convido meus amigos para ir à minha kitchenette. - Passem lá no minhocão para me ver. Não é chato? Não conto a ninguém que fico na janela do meu apartamento apreciando o movimento do minhocão todas as noites. Quem criou este apelido horrível? Colocarei, com muito prazer, no meu caderninho negro. Estou revoltado.

Brincadeirinha! Tó nem aí! Tó nem aí!

Amo este lugar do jeito que é. Sou feliz e pronto. Pensando bem...Não vou deixar barato não. Ninguém tem o direito de me ofender desta forma.

Esta eleição foi covardia explícita. Como campeão da belezura ganhou o Parque do Ibirapuera. Marmelada! Meu minhocãozinho concorreu com o Central Park paulistano. Sacanagem! Impossível comparar uma coisa com a outra. É o mesmo que perguntar: - vocês preferem andar de Brasília ou Ferrari? Burlaram esta importantíssima competição. Quanto custa um apartamento neste parque? Compro já. Pago a vista. Não vai dar. Pode ser em dez vezes? Aceitam cartão de crédito vencido? Cheque sem fundo? Vale transporte?

Querem saber de uma coisa? Vou deixar quieto.

Para esquecer, ligo o Adilsom, meu rádio. - Tó nem aí! Tó nem aí! Ele também entrou na nova onda.

Que música maravilhosa. Conseguiu superar a Éguinha Pocotó, a canção-poema precursora do Pocotoísmo na literatura brasileira, injustamente considerada coisa do passado. Que dó. A Tó nem aí assumiu o trono da saturação auditiva. Meus dois neurónios não gostaram. Genival, meu computador, achou perfeita para quando o provedor decidir sair do ar. Este bate estaca nacional é ainda pior do que o hit equino. Adere com mais eficácia ao cérebro, feito Super Bonder não falsificada. Martela nossas mentes, impiedosamente, por horas depois de ouvida.

Os serviços de atendimento ao consumidor de todo o país foram os maiores (senão únicos) beneficiados com o sucesso desta melodia. Não precisam mais gastar saliva com os chatos (nós) que ligam para lá. Basta colocar a nova musiquinha para dizer o que sempre tiveram vontade (inconscientemente é lógico). Tó nem aí! Tó nem aí!

A canção do século está em todos os lugares e toca o dia inteiro. Parece até que, para facilitar a programação, as rádios optaram por gravá-la na sequência sem intervalos. Ficou mais fácil e os ouvintes nem notam. Eu não suporto mais.

Podem me chamar de velho. Eu não estou nem aí!

Não escrevi isto!

Por falar em velhice, presenciei ontem um triste embate de gerações em uma rua próxima ao lugarejo campeão. Um senhor em seu automóvel parou acidentalmente sobre a faixa de pedestres ao avermelhar do semáforo. Seu pequenino lapso despertou a ira de um rapaz impedido de passar. O troglodita mirim desferiu um forte soco na lataria do carro como protesto. O mocinho não teve dúvidas e prosseguiu. Bradou. - Seu Velho... O senhor, de dentro do veículo, revidou tão agressivo quanto...- Seu pirralho... A tensão nervosa aumentou até que o inocente representante da terceira melhor idade ameaçou sacar uma arma. Desistiu. Tremi na base!

A verdadeira campeã da feiúra em minha metrópole é a violência. A tensão permanente por ela ocasionada gera um estado de stress coletivo incontrolável. Com bom humor, equilíbrio mental e energia positiva podemos, tão somente, amenizar a situação. É o jeito. Até que algum governante perceba que algo deve ser feito. Por enquanto...Tó nem aí! To nem aí!

Silvio Alvarez é assessor de imprensa da banda rock pop YSLAUSS, artista plástico de colagem e colunista. silvioalvarez@terra.com.br
Ilustração - Bruno César: brunoartes@uol.com.br


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