Não é de admirar a crescente (e quase doentia) idéia do homem de construir monumentos. Esta pratica vem dos primórdios da humanidade e atravessou a história de maneira incólume e quase irretocável, reflete a necessidade voraz do homem pela iconografia palpável que o transforma num ser mais material e menos sensorial, invariavelmente incapaz de solidificar sua identidade como supra criação das divindades que o rodeiam. Esta semana um escritor britânico de origem indiana escreveu importante artigo que foi veiculado em vários jornais do mundo todo. O artigo, que ocupou 1 página inteira de um jornal paulistano de circulação nacional, referia-se á idéia dos americanos de construir um memorial dedicado às vítimas do atentado que derrubou três edifícios do World Trade Center. A idéia, que não é exatamente do autor e que de certa forma é imaginada por todos, revela a incapacidade humana de pensar as tragédias cotidianas, mostra a promiscuidade do pensamento contemporâneo em primar pelas conseqüências em detrimento às causas e desnuda uma das facetas mais angustiantes do homem moderno – a noção superficial e grosseira de coletividade.
Os discursos e ações sobre o atentado evocam os espectros do genocídio, da barbárie e de um certo retrocesso da civilização, tendem a lamentar o acontecido e relembrar aquela angústia interminável. Nada mais justo, e triste. Entretanto a preocupação com a empreita de um memorial é que mais assusta, e entristece. Não pela obra em si, não pelo grau de angústia de nova-iorquinos e americanos, não pelo fato propriamente dito. A questão é a preocupação do homem em levantar mais um monumento visando um efêmero conforto, mergulhando-o numa poça de individualidade, alienando-o da realidade de problemas que o cercam na atualidade.
Os grandes problemas de nosso tempo, numa análise macro, se reportam à ecologia, aos conflitos étnico/políticos e ao insuportável abismo social, cada vez mais descomunal entre países ricos e pobres. Não é necessário dizer que qualquer aluno de ensino médio sabe disso. Mas a questão é, porque o homem moderno se recusa a tomar ações de macro escala no sentido de reverter este perene caos? Porque existe esta necessidade de se criar uma iconografia marcante? Por que não evitar o desmoronamento social ao invés de medidas protelatórias equilibradas em palafitas sustentadas num fétido lodo cheio de cédulas verdes? O turbocapitalismo contribuiu para a construção deste ser iconográfico, contudo longe estamos de saber a origem desta necessidade humana de prolongar os problemas, chorar os mortos e de erguer monumentos. A coletividade está virando um fantasma.