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cronicas-->Cartel dos Flanelinhas -- 29/07/2003 - 21:52 (João Afonso Carvalho Ferreira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
CARTÉIS

Parece que estou vendo as empolgantes discussões no Diretório Acadêmico - naquele tempo ainda não chamávamos DA, isto é, ainda não éramos fanáticos pelas siglas economísticas. Ficávamos horas a fio deleitando-nos, discutindo os grandes temas do momento: marxismo, gigantismo do capital e do Estado engolindo a pessoa, e, como condimento, a ditadura dos cartéis. E quando se falava em cartel, já íamos amaldiçoando as multinacionais, os "macacos dourados" do petróleo, que, em 1973, pegaram pela goela o Ocidente, com aquela elevação maluca dos seus preços do barril.
Como a tendência das coisas é evoluir, também os cartéis se disseminaram no mundo. Imitando o que era tido como prática apenas de multinacionais, começamos a ter cartéis das "multi-estaduais", "multimunicipais", etc. Aflorou o cartel tupiniquim. Era o cimento, a distribuição de combustíveis, a revenda de carro, o setor farmacêutico.... E por aí vai...
Também os conceitos evoluem. O de cartel estendeu-se tanto que, me lembro de ter lido em jornal, em 1991, sobre flagrante que a PF - agora já aderi às siglas - deu, ou melhor, aplicou em alguns bares, porque estavam praticando política de cartel na comercialização do cafezinho. Lembram disso? Todos vendiam o suco da rubiácea pelo mesmo preço. Em outra ocasião, foi a vez das padarias entrarem em "rigoroso inquérito", porque o preço do leite era igual em todas, ou seja, praticavam política de cartel, segundo ouvira no radio do carro.
A moda era perseguir e desbancar os cartéis. Depois, a bola da vez passaram a ser os marajás. Mas isso são outros quinhentos...
Então, resolvi colaborar, denunciando quem eu encontrasse em prática de cartel.
E não tardou para eu constatar o primeiro caso. Mal paro o caro no semáforo, surge um "menino de rua". Um parêntese: Após o Código da Criança e do Adolescente, não se deve mais falar menino, nem menina, mas, criança, ou adolescente, como se essa pretensa mudança alterasse a sina deles, ou lhes tirasse da rua, desse-lhes teto e comida. No caso presente, não sei se devo chamar criança ou adolescente de rua, - não, de rua, não! - porque o seu desenvolvimento físico não lhe revela a idade: o corpo mirrado de faminto e a pele enrugada do sol de pedinte levam à confusão. Mas bem, ele surge, oferecendo limão.
- Quanto custa?
- Dois real a dúzia.
Vou seguir, sem mais olhar para ele, quando aparece outro pequeno vendedor, oferecendo limão:
- É dois real, dotó!
- Quero, não. E aquele, lá, tá vendendo o quê?
- Então, me dê um trocadim... Emenda, sem ligar para a minha indagação
- Lixa. É lixa de unha - informa outro, enquanto arranhava o pára-brisa do meu carro com seu pano duro de areia, à guisa de limpá-lo..
- Ei! Quanto é a lixa?
- Dez por um real. Vai querer?
Nem respondi, pois o sinal ficara verde, e um apressado já buzinava atrás de mim, feito louco, apesar de ser domingo. Pelo jeito, estava atrasado para chegar à praia, distante uns 2.000 metros dali.
A propósito, por que algumas pessoas dirigem com tanta pressa, mesmo quando estão a passeio? Dá para entender?
Já chegando a Boa Viagem - ah, sim, eu estava no Recife - sinal fechado, aproximam-se outros: limpadores de pára-brisa, vendedores de flanela, limão, chiclete, do escambal...
- Tem lixa, aí? - Perguntei.
- Tem. É um real o pacote de dez. Leva aí, vai...
- Tem vendedor de limão, não?
- Tem. Limãozêêêêro!
- Me dê um trocado, pra ajudar minha mãe doente. Não tenho pai...
- Taqui! Tudo por dois real.
Chamei os garotos e sentenciei: Sabem que vocês podem ser presos?
- Preso por causa de quê? Nóis samo trabaiadó. Aqueles vagabundo ali é que roba reloge. Eles é que pode sê preso.
- E o preço do limão e da lixa, heim? Vocês estão praticando política de cartel e...
- Quartel?! Que quartel? Perguntaram, entre atónitos e assustados, entreolhando-se. Um futucou o outro, com o cotovelo.
Antes de dar partida no carro, quando o sinal abriu, ainda vi um deles apontando para mim, e girando o dedo indicador em torno da orelha... Todos eles riam...
É claro que não sou doido e eles não riam de mim, pois se alguém fez a loucura ou brincadeira com essa conversa de cartel de cafezinho, não fui eu, não.

João Afonso
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