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Cordel-->LAMPIÃO E MARIA BONITA - BARBOZA LEITE - Ed. Pedro Marcilio -- 28/01/2008 - 07:57 (pedro marcilio da silva leite) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Sol, Lua e Fuzil
no coração de Maria Bonita


Sou filho do sertão, criado
com faíscas de lajedo:
entre as mandingas do vento
descubro qualquer segredo:
minha casa é um bornal,
nas asas do um punhal
viajo sem susto ou medo.

A noite usa as estrelas
quando quer se iluminar;
eu acendo o meu fuzil
para as trevas afastar;
tornei-me rei do sertão,
com o nome de Lampião,
o meu ofício é matar.

Não nasci assim, porém
a mão da justiça falha;
nem sempre quem faz recebe,
se anda certo e trabalha,
as linhas do meu destino
traçaram para Virgulino
uma intricada malha.

Fiz do meu corpo um escudo
e, da lua o meu chapéu,
abraçado com meu rifle,
e correndo de déu-em-déu,
para combater os inimigos,
enfrentar qualquer perigo
venha ele até do céu.

O sertão abriu-se, então,
como um abismo atroz,
onde para sobreviver
tornei-me um bicho feroz
no mundo solto, a correr,
sem ouvir e sem poder
atender de Deus a voz.

No lombo do meu cavalo
eu alcanço o infinito,
ele rompe qualquer nuvem
se o seu rumo está aflito,
sobe ao céu sem ter escada,
quando vai em disparada
é mais veloz do que um grito.

Nessas noites de lonjuras
onde eu sempre me afogava
perdi a tranqüilidade
do sono de que gostava,
minha alma se consumia
pelo ódio que eu nutria
contra quem me atrapalhava.

Pois que acaba perdendo
o sento do direito,
foi cidadão mas não teve
condição de ver aceito
o penhor da honestidade
intimidar a maldade,
nunca mais vai ser perfeito.

O cangaço era a família
que a minha vida animava,
para alegrar meu caminho
nenhuma mulher constava,
um cangaceiro assim
só esperava o seu fim
na luta em que se achava.

A manhã, no entanto, veio,
na luz que o sol derramava,
a terra ficou mais mansa
com a doçura que chegava,
era o encanto feminino
que em busca do assassino
ao seu amor se entregava.

Num manso rio de tranças
que a ansiedade tingiu
tornando o negro mais negro
dali o seu rosto surgiu
iluminando o veludo
dos olhos dizendo tudo
que um sorriso traduziu.

Com caça aprisionada
num alçapão sedutor,
sem ter por onde fugir
de um súbito e doce calor,
Maria se viu, então,
nos braços de Lampião,
lua nova em seu amor.

Como a essência da jurema,
do seu corpo se evolavam
os cheiros todos das brenhas
que nela se aglutinavam
e, assim feita e melhor sendo,
do cabra foi recebendo
o carinho que esperava.


Uma renda de vidrilhos
a luz faz sobre o chão,
um incêndio em labaredas
consumindo Lampião,
Maria, morna e morena,.
despida de suas penas,
vestida de emoção.

Um coração de bandido
também padece de dor,
também hospeda no peito
resquícios ternos da flor
que, acesa na infância,
acompanha-lhe nas distâncias
de solidão sem amor.

Maria tornou-se dele
como a luz que traz o dia
afugentando a tristeza
de um coração que doía,
um casal de passarinhos
enrodilhado num ninho
de ternura e poesia.

O coração ficou manso,
De homem tosco e selvagem;
Daí em diante acalmou-se
A fúria de sua coragem,
Nos braços dela aninhado,
Lampião foi dominado
Pela sua doce imagem.

Brusco chão de desespero
Nas caatingas perdido,
Davam-se nele milagres
só por alguém recebidos,
como os teve Lampião
na sublime ocasião
que o seu filho foi nascido.

O CANTO OPIMIDO

Lampião teve família
e adquiriu instrução,
defendia a honradez
como qualquer cidadão,
arrastado para o crime,
sua alma não se exime
de ter pena e compaixão.

Justiça, como ele entende,
é para ser repartida
entre os homens, igualmente;
ninguém é dono da vida
e não é direito do forte,
de frado marcar a sorte
sem licença permitida.

nas lonjuras do sertão
o homem vive sozinho,
a lei ali não percorre
da mesma forma os caminhos,
é difícil à mão amiga
escapar de uma urtiga
ou da ponta de um espinho.

AS VEREDAS

Aquele raso era fundo
bem mais fundo que o inferno,
tão quente que não esfriava
nem com as chuvas do inferno,
e Lampião se determina:
“daqui, do raso da Catarina,
até o mundo eu governo.”

no deserto impenetrável
a selva é uma fornalha,
com a sua cabroeira
Lampião não se atrapalha;
transformou-se num segredo,
naquele imenso degredo
aguarda a próxima batalha.

Nas noites silenciosas
em mistérios consumidas,
as estrelas espiavam
aquela gente oprimida,
no desconforto do chão,
na mira de Lampião,
tendo presas suas vidas.

na extensa selva seca
de meandros infernais,
com crinas de anzóis
no dorso dos areais,
multiplicavam-se perigos,
como inclementes castigos
contra homens e animais.

Os seres vivos formando
no deserto indevassável
uma estranha humanidade
faminta e insaciável
que a justiça perseguia
a qualquer hora do dia
com furor inigualável

É difícil descrever
como se torna o clima
que naquela região
as formas vivas dizima
tornando a sobrevivência
um ato de penitência
que não há verso que exprima.

A água desaparece,
o verde some do chão,
quase não se ouve um pio
de ave sobre o sertão;
no raso da Catarina
coisa nenhuma germina,
a não ser a solidão.

Parece feita de ferro
a galharia sem frondes
onde a cobra venenosa
e traiçoeira se esconde;
da paisagem dantesca
a imagem tão dantesca
ao informe corresponde.

Pois era nesse cenário
que Lampião se escondia;
para resistir, sua gente,
até raízes comia;
vivendo como degredados,
ele e os seus apaziguados,
nas 24 horas do dia.

“ Quem vem lá? – se é de paz,
receio não tenha, não;
mas se vem com má tenência
para descobrir Lampião,
prepare-se sem mais demora,
pois chegou a sua hora
de encomendar o caixão.

Era assim que se dispunha
a tratar um forasteiro
a sentinela avançada,
protegendo os companheiros
contra o azar de uma cilada;
prevenindo uma emboscada,
o seu tiro erro o primeiro.

O ECLIPSE

Escorre e esmorece a lua
luzindo no ermo escuro
como insólita mensageira
que traça sobre o chão duro
grotescas formas vadias
que vaticinam agonias
ao encontro do futuro.

Bosques de mandacaru
que se aconselham a gigantes,
como legiões armadas
formando-se a cada instante,
se insurgem na noite escura
cavando fundo amargura
nos indormidos semblantes.

Da cabroeira acossada
naqueles desvãos esquecidos,
onde os homens se igualam
a animais perseguidos,
Afastados´de um convívio
que trouxesse algum alívio
ao menos para os feridos.

ERA UMA VEZ

catingueira, cajazeira
ou a árvore do juazeiro,
árvores de qualquer maneira
batizam o chão brasileiro;
eis, então como eu explico
que se chamasse Angicos
o refúgio derradeiro,

o sítio onde Lampião
foi, afinal, dominado;
sob chuva, raio e trovão
viu-se ele ali cercado,
coisa que não esperava;
e, assim, se exterminava
o seu odioso reinado.

A cabroeira dormia
esquecida do serviço,
além da chuva não havia
qualquer outro rebuliço,
quando o trovão estrondava
a polícia atacava
disfarçando o estropiço.


Tombava o rei do sertão
no cerrado tiroteio,
mal o fuzil punha na mão
estando no sono a meio,
vitima de uma cilada
muito bem planejada,
não viu de onde a morte veio.

Todo reinado termina
quando um rei é deposto;
a fúria fria e assassina
marcado-lhe ainda o rosto,
sublinhava em Lampião
a amargurada expressão
do mais fundo desgosto.

Dois corpos estavam enlaçados
como duas conchas vazias
sobre o chão todo encharcado
do sangue que deles corria,
e mal se divisava, então,
onde estava Lampião
e onde ficava Maria.
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