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Contos-->Digressões -- 01/07/2004 - 20:53 (Vanessa Zéfiro) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Para Caio Fernando Abreu

Não tenho saco pra suas frases feitas. Não me venha com essa de que já viu, de que já fez – e que nada importa, não, não mais. Nem com esse seu jeito teatral de falar besteira. Pega tua capa, enfia no cu. Sai daqui antes que a vontade de te dar porrada seja maior que minha educação. Vai dar voltinhas na sua roda-gigante dos excluídos, criaturas da noite. Só não me enche mais o saco. Com esse seu papo anos setenta de sexo e saudade da gonorréia. Com as entonações exageradas e falsas das suas frases terminadas em dar o rabo, foder (assim, com ô) e boy. Dá um tempo. Termina logo essa sua bebidinha esperta de quem conhece a noite e vai embora. Porque a mim você não pode comprar. Nem beber até o fim. Bloody Mary, porque você conhece as coisas. Eu continuo amadora, entediada com sua cartilha artilharia pesada sexo-drogas-e-rock’n’roll (esse último item é substituído por sua Ângela Rorô – heroína homossexual setentista de plantão). Eu continuo arriscando, ao invés de me esconder atrás dessa conversa mole e defensiva de que a minha geração tem medo. Talvez, só o medo de repetir as merdas que vocês, damas da noite, fizeram com o mundo, com suas próprias vidas. Isso que as transformou em fantasmas, lamentando um passado idealizado e perdido – mas, que na verdade, nunca existiu. Eu tenho coragem de renegar meu passado, que nem é tão distante quanto o seu. Reservo-me o direito de gozar com o porvir. Porque não tenho medo. Seja o que for. O passado já se foi, querida, escuta. Não adianta dizer que somos todos iguais, porque não somos. Você procura um grande amor? Não acho. Você procura seu passado, aquele carinha que te comeu e te largou, escutando Tropicália e sozinha. Ninguém na sala de jantar. Você procura aquele cabeludo, anoréxico e com sua bolsinha de tricô e tem medo de mim, do cara da mesa ao lado e da garota do caixa. Porque somos carne e osso, pedaços lancinantes de realidade, somos o que você não pode antecipar. Somos o mistério do qual você se esconde. Somos o futuro que você teme conhecer – e teme amar ou sentir qualquer outra coisa que não seja nostalgia. Vai, termina seu drink e seu papo furado. Põe na vitrola seu disco da Ângela e lamenta. Saudade da aurora do seu porra-louquismo, saudade de você mesma, que já não é nada, senão esse banzo, essa vontade de ter, de novo, seus vinte anos. Não é me ofendendo que o tempo volta. Não é me culpando que você vai ter de volta seus anos rebeldes e seu baseado. Não é culpando o mundo, as rodas-gigantes, o ministério da saúde e as doenças sexualmente transmissíveis que vai fazer com que seu Caetano Veloso volte. Pés no chão, dama da noite. Olha a tua volta. Somos todos pessoas, de verdade. Alguns se parecem, assim como você parece uma Maria Betânia high tech, com essa roupinha de coroa gostosa. Mas não é só isso. Não somos só o que parecemos, porque aí seria muito fácil. Somos perigosos, misteriosos – como toda pessoa é. Talvez você também seja, apesar de previsível e, desculpe a sinceridade, desagradável. É porque, às vezes, não é verdade o que sai da boca – mas que não vem do coração. Quando você admitir que tem saudade e sente medo, talvez voltemos a conversar – e talvez nos tornaremos mais interessantes um para o outro. Por enquanto, não. Pega seu dinheiro, sua vida feita e enfia no cu. Eu ainda sou selvagem, tenho medo, claro, mas isso não me impede de tentar. A vida ainda não é lamentar o passado, pra mim. O passado me serve de prelúdio; o que foi bom, na minha cabeça de apaixonada pela vida, pode ser melhor. Não é tão difícil. Deixa de lado esses grilhões que você mesma forjou em aço e saudade. Esquece, porque você não tem certeza (quem tem?). Esquece as frases feitas e me escuta. Tá, não escute a mim, mas ao seu coração. Deixa ele brincar de ser selvagem, de novo. Tenha medo, mas tenha vontade. Esqueça o discurso esquerdista, sexualmente esperto e comece um novo vocabulário. Tente um menos comprometido. Tente aquele que fala ao coração – e não às multidões, aos interesses comuns, como você repete. Você não é importante para o todo, como diria o pessoal do Greenpeace. Basta morrer e você verá: o mundo à sua volta fica de cabeça pra baixo, mas o verão continua, tudo continua, até mesmo essa alegoria de sentido de classe que você reza, continua. A máquina, tento não rir, ainda funciona. A roda-gigante ainda gira. Não deixe a vida te transformar num clichê.
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