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Contos-->Psicodelia Revolucionária -- 25/11/2000 - 15:53 (Daniel Lima de Souza) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Essa é a história dum cara normal, ou quase, que era meio depressivo e tendenciosamente psicótico, mas ainda não sabia desse detalhe. Cresceu como um moleque qualquer, torturando sapos, asfixiando pássaros e bebendo sangue de gatos. Com dezessete anos, teve seu primeiro surto: espancou a mãe e urinou em cima dela enquanto gritava "Viva La Revolución!!!". A mãe ocultou o fato da família, para poupar o pobre rapaz, e tentou durante meses livrá-lo desses ataques com religião, comida e fitas eróticas de todo o tipo. Nada deu certo, continuava de tempos em tempos tendo ataques violentos que destruíam sujavam seu quarto-prisão, com revolta e mijo. Então ela desistiu de todos esses meios naturais para apelar aos ácidos, ou LSD, especificamente. Aplicava nele através de tatuagens coloridas, iguais àquelas que vinham com chicletes, com desenhos que a garotada curte, molha o braço, pressiona por 15 segundos e pronto! Sua própria réplica selvagem, iguais aos rockeiros junkies de antigamente - vide Motörhead e Motley Crue e etc. A sua preferida era a da She-Ra, pois adorava sua mini-saia esvoaçante. Com os ácidos, viajava em vôos lisérgicos e visões psicodélicas fora da realidade. Para reforçar a experiência, sua mãe deu-lhe LPs dos Mutantes, Doors, Pink Floyd (fase Baret), King Crimson, Yes, Jimi Hendrix e um vídeo com o clipe de "With A Little Help From My Friends", versão Joe Cocker no Woodstock; um kit completo de psicodelia. Adorou. Passou a permanecer mais tempo calmo, mas ainda urinava em determinados solos das músicas. Era muito emotivo.
Manteve-se nesse ritmo até os 23 anos, quando sua mãe morreu e seu pai expulsou-o de casa quando flagrou-o queimando sua coleção do Roberto Carlos em culto a um demônio pagão. Sem grana, sem juízo e apenas com as roupas do corpo, caminhava pelas ruas falando sozinho, coisas como "Mundo porco" e "foda-se o Tancredo". Enquanto caminhava, deparou-se com uma concentração de pessoas, ouvindo um cara de terno, suado, e que não parava de gritar e balançar um livro, dizendo "Jesus" e "Senhor" um número realmente impressionante de vezes. Parou e ouviu alguns minutos, não entendia nada. Resolveu interromper o negócio:
"Seu Deus é nojento e repressor, o meu é um cara de barba que fuma maconha e me aconselha cuspir na fuça de idiotas como você", e cospe no evangélico, forçando-o a xingar obscenidades e contradizer-se frente ao seu público, que apoia o psicodélico. "Hippie do caralho!", grita enquanto corre da multidão. É ovacionado pela galera que presencia a cena e discursa a respeito de liberdade e amor. Palmas e elogios para o novo messias da paz que surge em plena rua; recebe até propostas de criar uma igreja, ganhar dinheiro. "Sai dessa, bicho", recusa-se. Urina-se todo e sai de cena, ainda sob aplausos. Na saída, recebe dinheiro e pão de uma cara de barba com camiseta do Jethro Tull.
Compra uma garrafa de absinto e uma de tequila e dorme na praça, bebericando de vez em quando suas essências da paz. Sonha com a She-Ra, só de mini-saia, gritando "morte ao FHC" enquanto exibe um vibrador ligado, fazendo som de aparelho de barbear. Perturbador.
Sente cada vez mais falta das tatuagens, e vai até tattoo uma no centro da cidade, e pede uma "da She-ra, por favor, da boa". O cara diz que com a grana que ele tem, só dá pra fazer do Gorpo, miniatura, e olhe lá. Percebe então que sem dinheiro, e sem mamãe, não terá tatuagens legais para viajar. Não sabia que o que procurava era na verdade o LSD. Acho que nunca descobriria sozinho. Lembrou-se do conselho de abrir uma igreja com suas idéias, "para ganhar dinheiro", disse o cara. Precisava agora mesmo.
Voltou ao lugar do dia anterior e deparou-se com o mesmo cara de terno, o mesmo livro na mão e Jesus na boca. Expulsou-o a pontapés e insultos cabulosos, sob risadas do pessoal que assistia a tudo. Começou:
"Vêem este céu, a paisagem, as cores cinzas? São sem vida e sem graça, alienam, reduzem nós, humanos, a uma existência limitada, medíocre. Sabe como devemos levantar vôo? Com os "expansores da musculatura mental", os salvadores da percepção, deixarão o ar mais limpo e fácil de respirar, os carros mais rápidos, as mulheres mais belas e os homens mais atraentes."
"Mas o que é, afinal, senhor?!", pergunta um atento ouvinte na multidão.
"Tatuagens.", declara, simples assim.
Burburinho e cochichos, "que porra é essa?", "louco?", "VAMOS TENTAR!" grita um maluco no meio de tudo isso, causando discussão e iniciativas a favor do psicodélico. O que seguiu-se durante dias foram reportagens em rede nacional registrando uma onda de aplicações de tatuagens em todo o centro de São Paulo, depois a cidade inteira, e o interior, e estados vizinhos até espalhar-se pelo país inteiro, cheio de malucos com o corpo pintado andando de braços abertos pelas ruas e beijando e abraçando os transeuntes. Começou um maciço comércio de incenso e miçangas, calças boca-de-sino e camisas coloridas, discos em vinil e fitinhas cassetes, todas com bandas dos anos 60 e 70, causando até iniciativas de montarem-se um Woodstock tupiniquim, com surgimento até de protestos e manifestações de naturalistas nus em plena avenida Paulista, reivindicando liberdade de expressão corporal. O Governo, no início, mostrou-se estupefato e careta, reagindo, ora crítico e tradicionalista, ora violento e repressor. O movimento persistiu forte e atuante, não deixando intimidar-se por tais atitudes ditatoriais e estúpidas, pelo contrário: com a censura dos Governantes, obteve-se maciço apoio da imprensa no país, que divulgava atos públicos, concertos ao ar livre, exposições de arte e palestras sobre "Revolução Pacífica" e "Amor Livre nos tempos da AIDS", para citar alguns exemplos. Artistas famosos aderiram ao movimento, engrossando o caldo de pessoas desgarradas do sistema. Os países vizinhos interessaram-se pelo movimento e declararam-se "simpatizantes" da atitude, mas a Europa e os EUA repreenderam o Presidente, exigindo "ordem e respeito à Ordem Mundial". Os brasileiros ignoraram estas besteiras, e o índice de crimes e delitos no país caiu a algo próximo do zero, "absolutamente impressionante, contrariando uma utopia para nós que é a solução da violência no país" , declarou, estupefato, o Secretário de Segurança de São Paulo.
Nesse alvoroço todo, nosso herói era requisitado pelo Brasil inteiro para dar sua opinião a respeito da Revolução espiritual que causou na população, registrando sempre os benefícios da paz e fraternidade na sociedade, estimulando o desenvolvimento cultural e formando cidadãos mais conscientes da importância da coexistência do homem com a natureza. Mas sempre era questionado a respeito dos efeitos impressionantes que as tatuagens trariam para seus "usuários", o ar colorido e tudo mais. Respondia sempre que o efeito era gradual, mas já duvidava um pouco do que dizia.
O mundo inteiro tomou conhecimento da Revolução que tomou conta do Brasil e já contagiava os países vizinhos. Secretamente, espiões do FBI foram enviados pelos EUA para seqüestrar o psicodélico e extrair-lhe informações a respeito da coisa toda, pois desconfiavam ser, na verdade, uma operação alienígena para alienação dos humanos (perdoem o trocadilho) e domínio da população através de loucuras neo-hippies e coisas do gênero. Falharam: gostaram do esquema daqui e ficaram, nus, numa praia em Pernambuco. Milhões de turistas vieram de férias até o "País da Liberdade", onde ficavam nus, flertavam com os nativos e compravam lembrancinhas, movimentando a economia local, que elevou o país até o tal do primeiro mundo.
Tudo corria bem no mundo inteiro, cessaram até as guerras no oriente médio, quando um cara, meio chato, começou a reclamar da falta das tais visões que o psicodélico prometera, reclamando que enchera, literalmente, o corpo de tatuagens e nada de colorido e belas mulheres. Começou uma revolta, a início reduzida, depois violenta contra nosso herói, que desculpava-se dizendo que ainda não fizera o efeito. A revolta espalhou-se pelo país inteiro, na mesma proporção que a paz fora alcançada, produzindo quebra-quebra e saques nos centros urbanos.
O psicodélico foi preso, torturado, espancado, linchado, esquartejado em 276 partes diferentes e teve sua cabeça exposta em uma comitiva que percorreu o país servindo de exemplo para as pessoas que queiram ameaçar a ordem pública.
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