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Cronicas-->UM VIAJANTE DO TEMPO NUMA CIDADE SEM-MEMÓRIA E ESCATOLÓGIC -- 09/08/2003 - 09:18 (Carlos Jatobá) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

UM VIAJANTE DO TEMPO NUMA CIDADE SEM-MEMÓRIA E ESCATOLÓGICA*


por Carlos Jatobá


  
    Numa dessas tardes de outono subtropical estou eu, em pleno centro do Recife. Mais precisamente no cruzamento das ruas Nova (antiga Rua Barão da Vitória e, antes Rua Nova da Casa da Pólvora) e Palma (antiga Rua de Santo Amaro). Sinto-me estar, como um nauta, transcendendo o tempo e o espaço. Subvertendo, de certa forma, a cronologia.
    Pareço divisar, nessa mesma esquina, o prédio ars nouveau de nº 318 da Confeitaria "A Glória". Adentro ao estabelecimento pela porta principal da Barão da Vitória. Atiro meu já consumido havana na caixa de trastes e dirijo-me à mesa do canto frontal esquerdo próximo à porta do oitão, na Rua de Santo Amaro.
    Farto do habitual e compulsório "café-com-leite com torradas", peço o petisco do momento: "chá-mate com tapiocas" untadas na manteiga-de-garrafa despertamente amornada.
    Aboletando-me, ponho o palhinha sobre a mesa e a bengala no encosto da outra cadeira. Inicio, finalmente, a leitura do jornal do dia. Detenho-me na data: 26 de julho de 1930. No meu Patek-Philippe, de algibeira, faz-se exatamente 17h00min.
    Passado alguns minutos, testemunho uma insólita cena: Pela porta próxima a mim, adentra um homem de impecável terno de linho branco e chapéu de panamá. Este, transtornado, vocifera para o cavalheiro sentado ao centro do salão: 
João Pessoa? Eu sou João Dantas.
    Após, com um rápido movimento, o agressor saca de uma arma de fogo e detona, à queima-roupa, dois tiros contra o cavalheiro que cai ao chão. De súbito, atónito e estarrecido, levanto-me e ainda ouço o moribundo balbuciar, antes de seu último suspiro: "Canalha! Não se mata assim, covardemente, um homem!". Em seguida, o motorista da vítima atira contra o criminoso, ferindo-o gravemente.
    Nisso, saio desse "transe" inominável ao ser interpelado por um rapaz que me pergunta:
Posso ajudar em algo, senhor? Qual modelo de sapato deseja? Olhando-o de esguelha, agradeço dizendo-lhe que nada desejava e saio da loja de calçados com destino à ponte da Boa Vista.
    Só aí chego à realidade. Estou em 2003. Não mais existe a histórica confeitaria. O morto em questão (o presidente do Estado da Paraíba) que disse "nego" a Júlio Prestes e às oligarquias, não pode fazê-lo à morte atroz e iminente. Isso faz parte da História.
    Daí intuo que, em nossa cidade, ao alargarmos ruas podemos estar estreitando mentes. Somos pobres na preservação da memória histórica; mas, ricos na assimilação da dita virtual.
    Sigo meu caminho. Já em plena ponte, constato que os solados dos meus sapatos estão entranhados de excrementos fecais. Quando, vindo em sentido contrário, um esquálido meninote me aborda e pergunta:
Vai graxa, doutor?
   


*Crónica do autor publicada na FOLHA DE PERNAMBUCO,


Recife-PE., em 28/07/2003, Caderno de Economia, página 8.


 


 


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