Estou cumprindo, desde o final de março, meu trigésimo ano de magistratura. Tinha me olvidado da data mas, hoje, meu filho primogênito, que segue na carreira aspérrima a trilha do pai, lembrou-se e lembrou-me do evento.
São tres décadas dedicadas ao ofício de julgar. É muito tempo e, no entanto, mergulhado no estudo diuturno dos processos que me são cometidos, nem me dei conta de tanto tempo que já passou.
E, por mais incrível que pareça, tenho na memória os primeiros passos com tamanha nitidez, que nem consigo imaginar que o passado já é tão longo assim.
Os ímpetos iniciais, o desejo de sanar os males do mundo, a presunção de que detinha o conhecimento jurídico total, a sapiência irrefutável para deslindar as questões mais intricadas e a consciência ainda pouco sensível aos dramas pessoais que, inevitavelmente, ressumam da frieza dos autos.
Presidir uma audiência, tomar depoimentos, deitar os fios invisíveis de uma teia destinada a apanhar nas suas malhas o raro e formidável inseto da verdade.; as reações fisionômicas das testemunhas, o olhar fugidio ou desafiador de quem mente ou fala a verdade.; o suor, a vergonha, o medo, a insegurança, o gaguejar, a fuga, ou, em seu lugar, a tranqulidade, a segurança, o destemor, a fala precisa, a presença...
A vida pulsa na sala de audiências, cadinho de conhecimentos, onde o magistrado se perde ou se encontra.
O convívio com os advogados, sempre fustigando e requerendo, provocando estudos e despachos incontáveis. Sem eles a vida do juiz seria monótona "como um longo dia sem sol".
Os funcionários dedicados, suprindo as carências materiais, esforçados e abnegados(no meio deles, é lógico, uns poucos malandros que, até hoje, pensam que me enganaram com a sua lábia barata e as suas desculpas indesculpáveis), ajudando-me a cumprir a minha missão.
É uma missão solitária, difícil, desafiadora, instigante, mas se me fosse dado voltar atrás, nem preciso jurar porque é verdade, impetuoso e jovem, eu a escolheria mil vezes.
E, como me sobra algum tempo, com a Graça do bom Deus, a ele eu peço continuar na marcha que me foi destinada, combatendo o bom combate, procurando, obstinadamente, a cada nova alvorada, ir ao encontro inefável da VERDADE e distribuir a cada um a JUSTIÇA!
DEUS SEJA LOUVADO!