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cronicas-->UM VIAJANTE DO TEMPO NUMA CIDADE SEM-MEMÓRIA E RUIDOSA -- 23/08/2003 - 06:13 (Carlos Jatobá) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

UM VIAJANTE DO TEMPO NUMA CIDADE SEM-MEMÓRIA E RUIDOSA*


por Carlos Jatobá


  
    Numa dessas andanças pelo centro do Recife, me chama atenção a esquina da rua Nova com a avenida Dantas Barreto. No edifício contíguo ao da esquina - em sentido à avenida - na antiga agência do Banco da Lavoura (hoje de um seu sucessor de origem holandesa) há, em seu oitão, um grande painel sobre a famosa Batalha dos Guararapes retratando a vitória das forças luso-brasileiras sobre o invasor estrangeiro. Peça esta, confeccionada em 1961-62, de autoria do artista plástico pernambucano Francisco Brennand.


A obra é, antes de tudo, um códice em forma de mural tal sua representatividade e beleza para o que se propõe a configurar. Diante de tal, sinto-me estar, como um nauta, transcendendo o tempo e o espaço. Subvertendo, de certa forma, a cronologia.


Pareço divisar, diante do vilipêndio à obra, os cidadãos-patriotas Francisco Barreto de Menezes, André Vidal de Negreiros, João Fernandes Vieira, Henrique Dias e António Felipe Camarão. Estes insurgentes mais uma vez se rebelam ante o ignóbil. Reclamam-me sobre o descaso dado, pelos atuais proprietários, ao verdadeiro panegírico à formação do nosso Exército em particular e à História brasileira em geral.


Nisso, vejo surgir diante dos meus olhos a figura mameluca de Domingos Fernandes Calabar. Este, deita o arcabuz numa grande pedra e senta-se sobre a mesma com o capacete entre as pernas. Noto-lhe um semblante cansado e expectante como um grito pairado no ar. Dirige-se a mim num português-arcaico (o moderno, de fato, só existiria após a reforma pombalina), de forte sotaque pausado do tupinambá, dizendo o que agora ouso traduzir: ─ No tribunal da História meu processo já transitou em julgado!. Deram-me o benefício do non liquet e fui impronunciado! Meu caro amigo, bestunto não sou! Não estive nem contra os meus irmãos "brasilianos" e muito menos contra os "lusitanos". Tive sim que escolher entre os castelhanos e os flamengos. Optei por estes últimos! Agora brado à humanidade o que fiz - em surdina - ao frei Calado, meu confessor, defendendo-me da pecha de traidor: "São partidários dos flamengos todos os que querem esta terra farta e acarinhada, sejam eles de que nação for". E ao general Matias de Albuquerque, quando este acenou com anistia total na tentativa de trazer-me de volta, respondi: "Tomo Deus por testemunha de que meu procedimento é o indicado pela minha consciência, não como traidor, mas como verdadeiro patriota".


Nisso, saio desse "transe" inominável ao ser interpelado por uma simpática senhora, que dizendo-se educadora, me pergunta: ─ Por que será que o poder público ainda não tombou esta obra? Ela poderia estar num grande monumento nos Montes Guararapes, e não aqui! Concordo de pronto e troco algumas palavras mais sobre o assunto. Despeço-me e sigo meu caminho com destino ao Largo do Carmo.


Só aí chego à realidade. Estou em 2003. A região dos Guararapes, nessa memorável epopéia, é o berço do Exército Brasileiro. Isso faz parte da História.


Mais uma vez intuo que, em nossa cidade, ao alargarmos ruas podemos estar estreitando mentes. Somos pobres na preservação da memória histórica; mas, ricos na assimilação da dita virtual.


Sigo meu caminho. Já em plena Praça do Carmo, apronto-me para uma visita ao templo da Ordem Terceira. Nesse instante, sou quase detido, à minha frente, por um carrinho de vendas de "CDs genéricos" soando, pra lá dos noventa decibéis, uma maçante e ensurdecedora música. O dono da geringonça pede-me desculpa e pergunta: ─ O senhor não quer levar o último lançamento da dupla sertaneja (tal)...?!.


   
*Crónica do autor publicada na FOLHA DE PERNAMBUCO,


Recife-PE., em 17/08/2003, Caderno de Economia, página 4.


 

 


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