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cronicas-->Perdido na Metrópole (30) Amizade Lusitana -- 31/08/2003 - 01:46 (Silvio Alvarez) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Perdido na Metrópole - Silvio Alvarez
Ilustração: Bruno César

Resido em um antigo edifício da aclamada avenida São João, no coração da cidade de São Paulo, minha querida metrópole. É um condomínio pacato, até demais, levando em consideração o burburinho adjacente. Meus vizinhos são exageradamente tranquilos. É comum cruzar com alguns deles no elevador ou na portaria. Ofereço uma saudação tradicional, nem sempre correspondida. O mundo lá fora nos obriga a criar mecanismos de defesa, estes acabam por gerar uma carapaça, um escudo protetor evidenciado através de feições amarradas, de poucos amigos. As pessoas não querem ser ilhas isoladas de tudo e de todos. Mas é o que acaba acontecendo.

Sou um ser humano carente e só. Um coitado. Ninguém me ama, ninguém me quer, ninguém me chama de meu amor. A vida passa e eu sempre assim (grande Nat King Cole). Sou uma vítima solitária do capitalismo selvagem globalizado. Um fingido egocêntrico que adora fazer cena para chamar a atenção (não caiam nessa, acabou de dizer o Genival, meu computador traidor). Queria tanto receber mais e-mails dos leitores! Bom, chega de choradeira.

Neste mundo cruel, o meu zelador, o Seu Santos é uma exceção à regra. Não mais sobrevivo sem o seu bom dia escancarado e feliz! Alegra a minha alma. Saio contente para o trabalho, otimista para com o mundo. Quando Seu Santos tirou férias entrei em crise existencial. Um mês sem o seu bom dia. Foi difícil. Nesta fase cumprimentava o extintor de incêndio. Ele não respondia. Mal educado.

Meu velho e simpático condomínio tem um certo charme. Desfruto de um autêntico elevador de filmes noir. Aqueles que a porta é automaticamente manual. Uma porta de ferro que tem por esporte esmagar dedos afoitos e desavisados. Foi dentro deste elevador fashion que conheci Helena, minha vizinha portuguesa moradora do terceiro andar. A princípio conversamos poucos segundos sobre aqueles assuntos de quem não tem o que dizer. - Parece que vai chover hoje. - Está frio não? No segundo encontro casual, ao notar sua lusitana procedência, lembrei que fora convidado a participar de um encontro com o escritor José Saramago, seu conterràneo. Estava com dois convites e a convidei. Foi o início de nossa amizade. Quebrei o gelo. Tomei contato com uma figura humana sensacional.

Como soube que ela era portuguesa? O sotaque é inconfundível. Logo a primeira vista, ou melhor, à primeira ouvida, saquei que era da terrinha que nos descobriu. A mensagem de sua secretária eletrónica é o melhor exemplo. Ela tentou disfarçar o estrangeirismo, mas não deu. Gravou assim:

- Você ligou para trêêês, màia, màia, settte...

Falamos o mesmo idioma. Entretanto, eu falo o português- brasileiro e ela, o português-português. São muitas as diferenças.

Helena é de Lisboa. Nasceu lá e cresceu no meio de adultos. Amadureceu cedo. Seu pai foi diretor da Penitenciária local. Ainda miúda Helena acompanhava o pai ao presídio, quando este ministrava aulas de alfabetização aos detentos. Estudou piano clássico e chegou à concertista. Apresentou-se por toda a Europa. Casou e teve dois filhos, Sara e Pedro. Aceitou as pressões e abandonou a carreira. Separou-se. Criou seus putos (crianças em português-português) com esmero e tocou a nau da vida.

Na Internet, em um chat, conheceu um brasileiro de São Paulo. Paixão a primeira teclada. Flertaram virtualmente por dois anos. O pretendente tupiniquim viajou à Europa a negócios e seu vóo fez escala na capital lusa. Em meia hora conversaram o suficiente para chegar à conclusão de que o amor é lindo! (Isto ficou muito brega - ficou igual àquelas mensagens que vinham nas Gotas de Pinho Alabarda - Se amar é viver, vivo porque amo você. Alguém lembra? É do tempo do onça). Pode parecer enredo de filme. Mas é tudo verdade.

O namorado voltou ao Brasil e o romance continuou via Internet por outros longos dois anos. Até que Helena resolveu ouvir os incansáveis apelos de seu coração e vir para cá de mala e cuia em busca da felicidade. Com total apoio dos filhos, que ficaram por lá, cruzou o oceano em nome do amor (Nunca assisti aos programas do Silvio Santos. Juro). Helena trabalha com o namorado em uma empresa de assistência à saúde e faz alguns bicos na área de informática criando home pages.

Acabou vindo morar no mesmo prédio deste Perdido na Metrópole que vos escreve, conquistando minha amizade.
O tempo foi passando desde que nos conhecemos no elevador noir e a intimidade foi aumentando. Conversa vai, conversa foi, sabemos tudo um do outro. Às vezes jantamos juntos, quando resolvo dar uma folguinha ao meu macarrão instantàneo de todos os dias. Ela cozinha muito bem, como eu. Na semana passada me convidou para degustar um arroz de tomate à minhota (da região do Minho). Uma delícia.

Nossas conversas são regadas a mexerica. Somos fanáticos por mexerica. Comemos duas dúzias em quinze minutos de papo.

Helena, além de grande companheira tornou-se minha professora de português-português. Daqui para frente esta simpática portuguesa será personagem constante, figurinha carimbada, de minhas aventuras.

Silvio Alvarez é assessor de imprensa da banda rock pop YSLAUSS, artista plástico de colagem e colunista. silvioalvarez@terra.com.br
Ilustração - Bruno César: brunoartes@uol.com.br
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