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Contos-->Tiro no Morro -- 06/12/2000 - 23:32 (Maria das Graças Lemos Andreatta) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Tiro no Morro
Escrito em 1998

Àquela mesma hora havia sempre tiros no morro. As pessoas se entrelhavam e, numa cena de robôs íam aindo cautelosamente para suas casas onde se trancavam e lá ficavam até sentir...
Rapazes ainda imberbes povoavam as ruas nesses momentos e se podia vê-los, numa cena impressionista, como carneiros indo para o matadouro, subindo o morro em direção aos tiros.
Entre tantos que subiam, um se destacava: moreno, de olhos claros, magro, um insubstituível boné na cabeça e passos elegantes. Subia, subia e ao voltar tinha os olhos esgazeados, vermelhos, mãos nos bolsos de um casaco imundo que nunca tirava e ria sem cessar.
Era a única oportunidade em que era visto sorrindo, rindo e até gargalhando: após os tiros.
Então ele sumia por uns dias. Dava a impressão de viagem e só se sabia de sua pesença porque nunca faltava às aulas.
Como era muito atrevido, não atendia a ninguém. Este e muitos outros detalhes de uma adolescência conturbada fizeram com que ficasse reprovado. O professor de português se recusava a dar-lhe a devida recuperação.
Ele pediu, circulou por todos os outros professores, fez juras de melhorar, implorou à professora da turma de seu irmão mais novo e, a pedido da direção esta resolveu o problema ministrando-lhe algumas aulas. Mas não poderia ministrar as provas.
Fizeram um pacto de bom viver, ela colocou suas condições e, religiosamente, durante dez dias, no horário marcado, lá estava ele para as lições.
Tirou o casaco imundo, retirava o boné durante as aulas, limpou as unhas e chegava sempre com o cabelo pingando água. Prgredia na leitura e na escrita, gostava dos desafios que ela levava, dos livretos e todo dia chegava com um pirulito. Brincando ou não, dizia;
- Roubei pra você.
Ela então passava pequenos textos sobre bons costumes, respeito, carinho, mundos melhores e suas consequências.
Naquele dia especialemnte estava eufórico: ia fazer o teste. Provara que sabia ler, que ecrevia e que podia "ir para a sexta série" e acompanhar assim o irmão mais novo a quem parecia sempre querer mostrar algo.
Tinha até tomado banho e se perfumado. A roupa arrumadinha, calça comprida e o cabelo que pingava água.
A escola inteira paecia esperar pelo desfecho do episódio. Até mesmo os já aprovados estavam lá com a desculpa de "pegar o resultado". Parecia que o garoto convidara a todos para vê-lo ler.
A professora oficial continuava iredutível a se recusar a dar a prova final. A direção oscilava entre a autoridade da professora e a possibilidade de tentar redimir um aluno.
A escola esperava em expectativa, tensa. Os comentários pró e contra eram repassados de boca em boca. Enfrentar aquele rapaz era "rabo de foguete", enfrentar a professora...
A recuperadora apelou para a platéia e o menino não a decepcionou , leu fluentemente. Redigiu ali mesmo um pequeno texto que dizia ser bom estudar, sonhar... e leu-o em voz alta. Foi aplaudido.
A professora bateu pé e não lhe deu a nota.
Ele pediu à recuperadora que colocasse um dez em sua redação e pediu que cantassem a musiquinha que ela ensinara na turma de seu irmão e saiu seguido por muitos colegas, rindo, gagalhando, mesmo sem ouvir os tiros no morro.
.................................................
A história poderia terminar aqui e seria lindo!
Na segunda-feira o irmão mais novo trouxe de pesente para a professora, enrolado com uma fita, um atestado de óbito. Sorriu, deu meia volta e foi embora.
A última vez que foi visto estava magro, olhos vermelhos, soltando gargalhadas como o irmão e subindo o morro atrás dos tiros...

(A um dos meus muitos meninos mortos pelas drogas, ou, a todos os que ainda conseguem estar vivos). Graça Andreatta
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