O OLHO DELA NO MEU
Era o último jogo do campeonato. Só se falava nisso. Eu ia assistir, é claro. Não iria falar com minha mãe. Na certa, meu pai iria deixar. É que quando era o time dele que ia jogar, e eu tinha certeza que ele deixava, porque queria que eu gostasse e passasse a torcer.
O jogo seria um pouco tarde, mas meu pai é um cara muito legal.
Quando ele chegou, corri logo para ele e pedi:
-Pai, eu posso ver o jogo com você?
-Claro campeão! Você vai torcer pro meu time, não vai?
-Eu vou, - eu disse.
Eu nem torcia na verdade pro time do meu pai. Mas nessa hora...
Quando já ia começar o jogo, minha mãe me disse:
-Está na hora de dormir, filho.
Eu olhei apurado pro meu pai, sem dizer nada, e esperando socorro nessa situação difícil. Depois eu falei quando ela ia saindo:
-Meu pai deixou eu ver o jogo com ele!...
-Deixe o campeão comigo, - disse meu pai me ajudando. E continuou: - se ele dormir eu o coloco na cama. Não é campeão?...
Eu só balancei a cabeça, satisfeito.
-Ponha ele para fazer xixi, - disse minha mãe já de longe.
Então, eu animei com o jogo, e falei pro meu pai:
-Hoje eu sou corintiano!...
-Então vai ser campeão!...
-Pai, que quer dizer: Corinthians?
-É o Nome do nosso timão, filho.
-Não pai, não foi isso que perguntei. Palmeira não é uma planta?
São Paulo não é uma cidade?
-É, palmeira é mesmo uma planta. E Palmeiras, é o nome do timinho do inimigo. São Paulo, é o nome dum santo, a cidade tem o nome do santo, e o outro timinho, também.
-E que significa flamengo?
-Não sei bem. Acho que é um pássaro. Um urubu, parece.
-E fluminense?
-Quer dizer que é do Rio de Janeiro.
-Então, e Corinthians, o que é?
-Não sei campeão. É um nome inglês...Agora fique caladinho que o jogo vai começar.
Minha mãe trouxe pipoca pra nós e cerveja pro meu pai.
-Quero Coca-cola, - eu disse.
-Agora não, que você faz xixi na cama.
-Eu o ponho pra fazer xixi quando for dormir, - disse meu pai.
Minha mãe trouxe a coca, e eu aproveitei. Bebi dois copos cheios.
O jogo estava muito animado, mas logo me deu uma moleza muito grande. Parecia que eu ia ficando longe...O colo do meu pai ia ficando distante...Parecia que eu estava no Morumbi lotado. E eu tive vontade de fazer xixi. Meu pai estava comigo, e eu disse:
-Pai, onde é que faço xixi?
-No banheiro, filho. Vá sozinho.
-Vamos comigo.
-Vá sozinho, campeão. Você já é grande.
Eu levantei e saí. Não encontrava o banheiro. A gritaria era enorme. Parecia que tinha saído um gol. Mas eu estava muito apertado, e vi uma mureta, e subi nela. Comecei a fazer xixi, quando acordei com os gritos da minha mãe:
-Que está fazendo, menino?
Só então foi que acordei e percebi que não estava em cima de mureta nem no Morumbi. Urinava na cama da minha mãe.
Adelmario Sampaio |
