ONÍRICO... ONÍRICO
para ADA
Essa noite, num sonho
Reaparecias, vestido estampado
Discreto em teu rosto,
De sorriso amplo, sóbrio.
Como em todo o sonho,
Caminhas, fade-in, sem disfarces
Ou máscaras, o verde olhar
E as mãos que teceram um tempo.
A freqüência cardíaca bate-me pronto,
Ricocheteia sobre esse impacto,
A infantaria de um ego transposto
Um amor náufrago, à deriva.
Bela ainda eras nesse sonho estival
Sem moldura, audiência ou luz dirigida
Por algum cineasta noturno, um Walter
Carregado de mágoas, infestado de frustrações.
Mas Freud talvez tivesse mesmo razão
E me informara antes, que o sonho
É um falso retrato de um caminho
Não percorrido, um rito incontido.
Não consegui resistir, aquariano ímpeto
Sob a imagem nitidamente adaneidiana
Invadindo um final de ano simplório,
Um domingo academicamente pontual.
Perdôo-nos por me traíres em tua
Carência superposta e impaciente.
Perdôo-nos por não te permitires
Conviver com meus fantasmas.
Um sonho apenas. Onírico demais.
Os quarenta e um anos de mulher
A quem, no fundo, ainda espreito
Como um caçador de recompensas.
Os sessenta e um anos de homem,
Absorto em seus presságios, medos
E incertezas na bolsa de ações ordinárias,
Ao portador.
Por fim, perfurando a meia noite
Dessa intervenção onírica, insuspeita,
Volto a bordo dessa realidade
Que consigo deglutir lentamente.
Enfim, apenas um sonho iludindo
A madrugada dos meus dias,
Vagaroso suplício para quem
Tenta enganar o sono e a fantasia.
WALTER DA SILVA
Camaragibe, Pernambuco, Brasil
27 de dezembro de 2005.
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