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Poesias-->Andas Revisitado (título provisório.¬ prosa poética) -- 13/01/2006 - 09:01 (Vilas Maia) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
- Por onde andas?: pergunta o amante. Enquanto a pergunta viaja de um para outro meandro, o amante pensa. Os rostos conhecidos apareciam espalhados na única folha, virginal, de fotos do livro de ponto, revendo-as quando o sol pela janela branca faz emergir o reflexo sobre elas . Intactas, as fotos continuavam lá, com vontade de voltarem para o bolso do amante. A turma toda a começar a sentar, o fim dos risos de fora, o tapar a boca reavendo a gargalhada dada o expirar mudo nasal, as canetas que caem, o sussurro para quem está atrás, os olhos dela de soslaio, escrevinhando qualquer coisa.

[Toque]

O arrastar das mesas, das cadeiras, o compor a camisola, o abrir fechar das mochilas, os estojos de lata a soar o tamborilar das canetas, a porta da sala a abrir-se com a liberdade por fora, o ultrapassar da fila por entre as mesas, e ela a demorar-se, conquistando posição para o duelo de olhares, a arranjar-se altiva, caminhando no compasso indiferente, o tocar a amiga que a faz realojar o boneco, um pára! sorridente e cúmplice para a amiga que dá o sinal à outra, a par. A porta chega aos seus passos a demora do quem passa quem, o escancarar da porta com passo atrás dela, o gesto satírico-cortês do deixa passar, o obrigado mudo do olhar límpido amendoado convidando ao mergulhar dele, o sair dela, o braço ajuda ao lanço, o passo-salto dele cumpre-se, o tocar com a mão no ombro dela, ela abre a figura, ele: Até amanhã... ela: ciao... as amigas chegam, risos reiniciam-se, mas o olhar dela pousa no ombro dele...

- Por onde andas tu?: pergunta o amante ainda deste lado do pensamento. A rotina dos cumprimentos, os sorrisos, os cigarros trocados, o lume dado, o café situado no outro lado da rua, construíam-se por lá as pontes entre eles e elas era primavera e o sol era ameno, mas seguro.

As conversas surgiam numa cadência cada vez mais cúmplice, os desabafos, os anseios, o querer de uma vida diferente de todas, os sonhos fundidos em reluzes filtrados pelas folhas... o desejo aparecia entre os silêncios, interrompidos por alguém que chegava.

Na altura, ao amante chegou uma outra amante, que se mostrou mais perto da cumplicidade imaginada, e com ela quis florir, sem no entanto nada semear... era uma, mais uma foto da folha do livro de ponto, que teimosamente ficava no bolso, mas rapidamente desvaneceu aos primeiros raios de luz. A amante sabia disso, e com isso soube esperar. Enquanto o amante experimentava uma nova sensação que a fingida cumplicidade fazia cumprir, ela olhava-o com ternura, jogando, nos intervalos das aulas, pedindo sempre um cigarro. De longe os olhares continuavam a cortar o vento que os separava... até que o amante desfaz a máscara da outra amante, encerrando-a na escolha que deveria ter feito tempo atrás... encontrou a sã solidão, separou-se de quem pensava ser o seu corpo, abraçando os amigos de sempre... a amante permanecia por lá.



– Por onde andas?: perguntava o amante deste lado do pensamento. A maresia penteava-lhe o rosto percorrendo os regos das primeiras rugas, e ao semicerrar dos olhos defenestrou



reavendo o corpo que no café estava mergulhado num mar de gargalhadas e olhares, em toques semi-acidentais por debaixo da mesa, o encostar o pé, o roçar da perna, o sorriso por entre a passa, o sacudir do cigarro com a outra mão, a mão sobre o joelho próprio, a espera/chegada do tom dos dedos dela passa funda, arrepio].

Um café... dois três 20 mil gritava-se do fundo, e o amante sorria plenamente, naquele relento tempo, onde a música era sonoridade e crivava devagar as fendas dos ires... deles os meios abraços à volta da mesa, a amiga que (d)es(es)pera pela hora do autocarro, o vens dela o meu sim, o irem .

O passeio era sempre curto para irem todos a par, a dança do atraso/avança, o descer do passeio, a mão dada, o passeio subido, o avanço da amiga, o silêncio ocular entre faróis dos carros que passam, o desviar o olhar, o voltar a olhar, o querer mais corpo... o então?! abrupto, respondido com o sorrir síncrono para quem espera o beijo imaginado pelas fotonovelas, lidas às escondidas entre a almofada e a lua, na sombra do crucifixo pendurado na berma da cama.

“Éramos apenas amigos” sussurra o amante, sentindo o vento, procurando um banco de jardim vistas para si mesmo... mais uma vez a amante esperou, com entrada de uma nova aparição, longe das folhas de ponto conhecidas, sentindo-se ameaçada. Distraído seguia na vida o amante de então, fazendo grandes caminhadas por entre névoa e fumo, cruzando jardins góticos, de dúbia beleza. O amante não conhecia o dizer não... aprendeu-o então a afirma-lo, em privado, na rua... o amante deparou que naquela altura o mundo reduzia-se a uma comunidade, e tudo que viesse de fora era considerado bizarro... e em bando explorava a noite boémia, e a sensação de impunidade invadia e evocava o assalto ao vazio, como descobridores, sendo a noite a arena perfeita para testar as máscaras de cartão, que toda a gente usava.

E foi numa dessas noites que as garras estavam mais afiadas do que o esperado, levando os amantes a quebrar o jugo do silêncio, que a cumplicidade mais profunda que explanada, por vezes obriga, cruelmente... “Eu nunca vi as mulheres a namorarem com o seu melhor amigo, e no entanto, anseiam por um homem com essas mesmas características... namorando com outro, sendo o oposto”... a amante apenas retorquiu com um mordiscar do lábio, levando o copo à boca, terminou o cigarro, pegou-lhe no queixo, passou o fumo para à boca dele, e quando este saiu pelo nariz do amante, beijou-o... foi de beijo guardado que se juntaram ao resto do bando... cada um virado para a sua janela do carro.

O amante, sentado no banco de jardim, fuma sorrindo... o silêncio sobre aquela noite foi enorme estando os amantes confinados aos gestos do costume, como se nada de anormal tivesse acontecido, com máscaras ainda rasgadas dos golpes sofridos, com silêncios a serem cautelosamente evitados. O medo da verdade do beijo inundava aquele tempo, fazendo colidir dois mundos, o da máscara e o do rosto, e até ali nenhuma relação tinha sido de pele, onde o sangue e as lágrimas tinham sabores diferentes, mas mais do que isso, nunca indistintos.

- Por onde andas?: pergunta o amante reconhecendo o seu mais belo amor. Talvez por ter sido o primeiro, talvez por ter sido o único com a verdade da inocência, talvez por ter sido o mais sofrido... talvez por ter apenas sido. “Foi ela quem quis...” recorda o amante esticando as pernas pelo banco de jardim. Por via de uma amiga comum concluir o seu curso de moda, os amantes encontram-se num aparente acaso. A noite passava na passarela, e eles lado a lado, de máscaras retocadas. E pelo escuro da plateia, os dedos entrelaçavam-se cafeínamente fazendo nascer os arrepios que os toques sentidos provocam, não havendo senão o olhar para deles falar... e como eles evitavam olhar, um no outro, para reviver os silêncios, os sorrisos, as confissões, a cumplicidade semeada... por acaso.

O dia seguinte surgiu em força, rápido, não deixando tempo para digerir o que se tinha passado. Os amantes evitavam-se, e as conversas tendiam todas para o desfile...

A amante recusada aparecera de novo no café, numa espécie de reconquista sob forma de cavalo de Tróia. A amante inquieta sai do café.

O amante observa a saída... olhar de soslaio, forte e penetrante, o sacar do cigarro com convicção, o acender do isqueiro à segunda tentativa, a passa curta, o passo apressado... a amiga segue-a.

O amante reafirma o não, esperando o retorno da amante.



Desamparado, distraído com o café, ela volta em furacão, lançando com ímpeto da verdade que sentia “Quero falar contigo! Chega cá fora...” ele foi, talvez assustado, talvez adivinhando a conversa, mas foi o beijo deixado em suspenso que tinha de ser continuado, era inevitável sendo por isso soberano a todas as palavras, que poderiam ter sido proferidas... ali. O amante voa para o primeiro beijo, de plateia. Na cadência síncrona da língua que prova o fruto de olhos cegos, sente o sabor da primeira boca verdadeira, ceifeira de todo o real, tontura dissecante da história, revelando o presente agora, numa ágora sem recordação, onde as mãos se davam, onde os pés caminhavam em seco, e o abraço os fazia demorar era a vida brilhante, a esperança recém-nascida. “Tantas voltas para chegar aqui...” pensavam os dois, largando de vez as fotos restantes dos bolsos, com tudo o que poderia ter sido por lá.

Rapidamente a vida de um consumia a vida do outro, e em cada ida mais vida havia, num dar desmedido, onde as cores eram verdadeiras, onde o tenro era carne, a flor um beijo, um toque o desaguar: assistiam assim, ao natural desmoronar das barreiras ficando por fim, frente a frente, nús.



No quarto entrava a luz da tarde. As madeiras eram claras, e o silêncio amortalhava-os em indelével defesa nada mais existia além deles, sós os dois.

A confiança naquilo que sentiam era mensurável pela vida tida...os dois nús, o passo em frente, ela virgem ele como se o fosse, ela escalava-o como algo a conquistar, sentando-se, meio a medo meio satisfeita, no pico da sua insustentável leveza com que levava a vida, enquanto o amante saboreava a segunda estocada, ouvindo o romper da porta recém--aberta, que espreita a nova luz... a cadência inocente era a mais perfeita, fazendo jorrar doçura em ternura, naquele sofá... “A tez dela moldava-se, a pele em si de seda se forrava...” recordava o amante do seu texto antigo, como se esse fosse o seu melhor verso, embora soubesse que estava muito longe da expressão que ela ostentava perante o sol, arqueada, cega, de boca entreaberta.



- Por onde andas?: perguntava o amante, revirando o passado como se ela ainda por lá vivesse, esperando um novo raio de sol vespertino para poder renascer... foi a partir dali que as mãos dos amantes se mais davam, rompendo o vento pelas ruas, ao som da cadência primordial, a da luz, encandeados pela água que sorviam como vinho dos seus dares, os lares eram todos os lugares. O mundo deixava-se invadir, abrindo alas, por força dos amantes que em arestas de diamante, desfaziam em cetim o cristal que os envolvia o amante pegava um pedaço de vidro do chão, sonhando que ainda era o último resto do seu cristal, aguçando o pensamento em flecha, rumando para o outro lado, imaginando um laivo de sincronia...





- E se a brisa do teu beijo chega?: esperava agora o amante, recompondo o rosto pelo qual as suas mãos tinham perdido a compostura, procurando sempre o bolso vazio, num esgravatar amortalhado pela palma da mão. Os cigarros e os copos eram muletas fantásticas para fazer descansar os bolsos, permitindo ao amante poder falar um pouco mais com as mãos, desviando o regresso que os seus olhos criam, vendo em revista os sonhos já tidos, encontrando lares por visitar, em companhia de sempre, a única que o fazia ver o presente como dádiva conquistada, por existirem como vida. “Os olhos dela, assim espalhados, diziam isso” murmura o amante ao corpo ausente, o amigo confidente, ao qual mostrava as feridas pedindo socorro, em esplanadas de cor e carinho o tempo corria suave, “e feitos lordes bebíamos um fino de óculos de sol e pernas cruzadas, ao fim da tarde, à beira mar, elas lá à frente fingiam-se de senhorinhas, molhando os pés em contraluz, e nós sorrindo...” (cala-se o amante). Nas palavras viviam apenas restos dessas florestas densas de crina voluptuosa já não havia corpo do confidente... o tempo tinha-o levado com ele, ficando apenas o seu silêncio, aquele de quem ouve e quase nada diz.





- Ela deve ter vivido assim... tão intensamente: esgravatava o amante, por entre as faúlhas da memória, que de tanto em carvão já em diamante jaziam, pour(?) todos os sorrisos que ela tinha tido com ele, abriam-se em flor, de novo, num mundo envolto de cristal.

O amante sorria como dantes e sentindo o repuxar das cicatrizes, deitou-se no banco de jardim, fechando-se naquele limbo... passado, cansado.



- E se a brisa do teu beijo chega?: voltava o amante, enquanto o presente fluía por debaixo do banco de jardim por cima, o tempo não passava, parava como a gaivota planava naquela tarde do último beijo sincero, onde havia vida por ainda jorrar... - Então... não me beijas?! disse ela, como se o beijo fosse toda a cura... senti-o como tal o amante olhou a gaivota, fechou os olhos, sentiu o vento e o sol, e quando abriu nada mais interessava uma vez mais, as mãos deram-se como dantes, o abraço era o mesmo, o perfume era único, os rostos em cada uma das palmas, ombro/ninho, o primeiro lar recebia-os em lençóis mornos mas acabou por não curar. O colapso anunciava-se a cada esquina, e só por temor da dor futura, o mundo não tinha partido antes era inevitável... caminhávamos sempre descalços explicava a si mesmo, o sangue perdido.

“Mas viveste tudo tão intensamente como eu... e se a brisa do teu beijo...” murmurava o amante, sentindo a transformação em eco do pensamento do outro lado, fazendo-o entreabrir os olhos, derretendo-se para apanhar o vento/lança do eco.... “ lá aparecias, emergindo da multidão, caminhando altiva, escondida pelos óculos de sol. Quando reparei que eras tu, estremeci...” e lá ia o amante, de vento em popa, para o sonho que mais conhecia, despindo-se das cicatrizes, livrando-se do amor-próprio, nú do corpo baleado de peito aberto, livre de tudo, caminhando o seu único trilho conhecido, por onde, apesar de tudo, sempre quis ser feliz.

“ ... sempre quis ser feliz”, e corroborando a ideia, esticava-se ainda mais pelo banco de jardim, acendendo mais um cigarro... mais uma vez, a dança dos cigarros voltava à cena, os olhares apenas mudavam de ares, e o sentimento mergulhava, fundindo-se com a existência, quase própria exigência de ser... mas como era possível ao amante apenas conhecer um trilho de felicidade, renegando todos os outros possíveis e imagináveis?! Que felicidade seria aquela prisão? Era pura, e simplesmente por ter sido, foi sumptuosamente trilhada.

Ao amante a vida chega-lhe de um rasgo, fazendo-o lembrar que ainda existe por si mesmo, regressando à palma da sua própria mão, visitando incólume as suas feridas em carne, sarando-as com um laivo de sorriso, em desprezo pela cruz que passou e pela qual quis passar, ou aquela outra pela qual creu ser a mais altiva, por onde pensou ser herói grego, de intransponível túnica, crendo ser dor um estado de espírito, sendo este elevado por um imperativo categórico: o dever ser em redenção da culpa, nunca tendo aceitado o erro de querer ser deus, sendo homem.



E se os meus lábios não estão, onde a tua brisa chega?: sente o amante a fonte que ele também é, tomado pela loucura de ser, único e puro, numa verdade emergente, em ave, saboreando aquilo que também é sem ela, sentindo o que os corpos mais maduros de sangue sussurraram, enquanto exibiam as cicatrizes de tronco aberto, tatuagens por engano, apêndices cortados, trilhos calcorreados, com olhares de orgulho por ainda serem vivos... o seu peito baleado já há muito tinha sarado.; não tinha era sido visitado convenientemente, pois ainda fazia fé na dor fantasma que permanecia. A saudade e a convicção de pertença a um mundo, agora, só de um, levavam o amante à idolatria do tempo passado, como Adão à procura de Eva por entre um Éden cristalizado, perecível, afinal, por um só toque... a da verdade. O tempo, de facto, tinha passado por lá, sendo já cicatrizes e não feridas encarnadas à espera de esperanças... sem corpo, o espaço ficou vazio, e o tempo das esperanças expirou, tendo o amante entrado num outro mundo, sem ter dado conta dos inúmeros trilhos a percorrer, incomensuráveis possibilidades, de voltar a ser feliz. Quando teve conhecimento que haviam trilhos a sonhar, o amante estava de novo enredado num trilho sem saída, sem ar, sem nada a aspirar... a solidão do seu corpo tinha pedido aconchego, e ele chegou de quem nunca havia gostado.

“Precisava de mais tempo...” massacrava-se o amante, por ter cedido à sede do seu corpo, por viver numa culpa, por recusar-se a ser humano, por não aceitar que errara. Apesar de emocionalmente ausente, desprezando-a, a nova amante continuava a amá-lo e ele não conseguia libertar-se, talvez por falta de coragem, talvez porque ainda era ou ser suportável, a verdade é que os anos foram somando-se, esperando o amante por uma paixão que o resgatasse. A boémia voltava em força, com mãos mais hábeis, conhecendo mulheres por tactear, respirando adolescência como adulto, seguro que vida não o levava mas sim ele que ia... por entre cortinas de fumo as mulheres revelavam-se, transpondo-as com um simples andar... as danças começavam em lentos abraços de cheiros novos, arrepios sábios, usando a amora, como morango entre champagne, até que os beijos apareceram de forma natural, sem hesitações, sabendo que nada iria mudar lá fora.





O amante, no banco de jardim plantado, passa a mão pelo seu peito já cicatrizado. A ranhura por onde foi penetrado estava disfarçado pelos pêlos penteados... tacteavam os dedos sem saber muito bem porquê, lembrando-se então do dia... “Já, como ontem, amo-te... mas quero outra vida.... “ e o pau! encheu o ar, enquanto a amante fazia extravasar as lágrimas da decisão... justa cisão, mas sem coração... ela sabia-o, até deu um passo em frente logo mesmo após o disparo... mas a razão foi a mais forte, e o gatilho tinha sido apertado, as palavras disparadas.



Por que andas te fizeste andar?: volta de novo o amante ao banco de jardim, virado ao mar, lembrando o amor primordial e a cruz que quis carregar... “ É duro demais ser não crente...” lembrava o amante, como sussurro de quem fala ao coração se calhar, o mais crente. A palavra Deus dandyssiava-se na boca de todos os que o amante conhecera como crentes... “a vaidade com que essa palavra passava do palato à língua, enfunada por um quase-beijo era tanta, que aspirava tudo de único que cada qual tinha a espraiar não admira terem-me restado raros amigos” escrevera, um dia, em finito alívio o amante, reconhecendo em sorriso ter continuado a Serem Sentidos os abraços dados/recebidos, quando chega a hora do seu espaço, pátio entre paredes de uma fortaleza erguida em sentido único: para os de fora.

A cumplicidade... é a verdadeira seira que embala as sementes da amizade. “Com ela tudo se constrói, por ela tudo se destroi....” murmura o amante, mudando de posição, no banco de jardim, em ternura tecendo os abraços por dar. Eles, os amigos, eram o único Deus que conhecia. Com eles comungava, por eles era exorcizado. Deu-se a todos que não o queriam, até o dia em que aprendeu a dizer não. “foi uma mulher que me ensinou a dizer tal...” e embalado pela cantilena de sempre, lá foi de novo o amante rumo ao seu quarto de brincar, com os seus cubos preferidos, todos eles coloridos, onde de peça em peça, se refazia o amante-novo, muito mais Ken do que verdadeiro.



A plasticidade do recorrente processo de construção emergiu, fazendo congelar o pensamento do amante.







O amante conhecia-se agora noutro homem. Adulto, com os primeiros laivos de rugas no olhar, “talvez até” de mãos nas ilhargas, olhando de fronte o mar. Conhecia as duas maresias de um mesmo mar... orquestrava os seus cheiros, já fazia marés, já sabia em qual delas fazer o ninho, quando a própria solidão obriga a um espaço qualquer. Na consciência do passatempo, com o qual enrola o caminho para casa, o amante enrosca-se na ida do pensamento futuro, como se a felicidade fosse chegada, sorrindo enquanto se desenrola na onda do ninho. “Como é doce esse abraço maternal” murmurava o amante, enquanto sentia o sol que pousava sob a sua mais madura face. Lá tudo faria sentido, desde o pequeno lanço até ao defenestrar para dentro de outra janela, noutro nível sempre superior, porque sempre diferente. Mas a paz de tudo resolvido fazia-o vazio de vida, porque essa permanecia adiada, do seu mais puro imaginário. E no “reme! reme!” da vida, este pequeno cofre que guarda o nosso imaginário vai ganhando poeira, numa prateleira de segunda fila, esquecida, esperando pela pausa da solidão... que teima encontrar a platina da vida. Um dia o amante tinha até chegado mais cedo, e encontrou a sua mulher na cama com a prima com a qual dividira a cama na adolescência.



Por onde andas? voltava o amante, no banco de jardim, desta vez descrente da possibilidade de parede, que provocasse o eco desejado... os anos tinham dado muitas cartas, todas de naipes diferentes.. . o baralho era sempre mudado ao fim da quarta ronda, e as apostas já não conferem com a realidade dos jogadores em jogo... apostava-se a madeira oca, sem corpo, sem alma, sem nada. Porém, as cartas circulavam, sobre o tapete verde da esperança, que já nem por fé podiam contagiar.



Perdido no pensamento, o vazio assola a existência, a inércia perturba o sonho do amante, e já não há réstias de memória FIM

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